ABRUPTO

7.8.03


DOENÇA

A doença é um dos elementos mais importantes para perceber a obra de Thomas Mann. Ela está presente por todo o lado e é o elemento central da Montanha Mágica. Na Montanha Mágica todos os que para lá vão querem ficar “doentes” e acabam por ficar “doentes”. O poder da doença é essa revelação do corpo, essa percepção acrescida, essa perturbação do equilíbrio hormonal – de que tantas vezes fala o dr. Behrens - que actua como um revelador das diferentes personalidades que habitam a Montanha.

Quando não se tem nenhuma grande doença, mas só pequenas, ligeiras, subtis doenças há como que uma “chamada da intimidade”, - aqui está uma coisa que só os alemães eram capazes de transformar numa palavra expressiva - uma acomodação do corpo sobre si próprio, um torpor e uma modorra agradáveis, resultado de uma vaga febre, de um amolecimento do corpo. Na Montanha eram as temperaturas de 37º que davam mais lucidez.

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UM PORTUGAL DESCONHECIDO

O fragmento seguinte faz parte de um colecção de papéis que pude salvar de serem vendidos a peso, oriundos do Centro Republicano Democrático do Porto, manuscritos e portanto únicos. Datam na sua maioria de 1911.

Entre esses papéis consta a lista de “voluntários republicanos” preparados para actuar e do armamento que possuíam: espingardas, pistolas, etc. distribuídos pelas diferentes frequesias do Porto. Esta era uma época em que uma parte dos portugueses, homens, de profissões da pequena burguesia e operários realtivamente especializados, tinham armas na sua posse. O grau de violência inscrito na vida comum era grande.

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OUTRO OLHAR


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INCÊNDIOS

de novo à minha frente, dois, um maior do que o outro, começados à mesma hora em locais separados por trezentos ou quatrocentos metros. De novo só a ausência de vento permitiu que não fossem um perigo.

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JÁ CHEGA DE “TAMBÉM ELE”

Hoje é um dia urbano dedicado à vida de que S. Bernardo não gostava.


“TAMBÉM ELE” – MAIS ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

O que tenho estado a fazer – parte a defender-me, parte a atacar - a propósito da notícia do 24 Horas, no Abrupto é um uso delicado deste meio, que nunca previ vir a fazer. Mas que sentido teria pronunciar-me sobre outras coisas, sobre o que leio e o que gosto, e não sobre o que me revolta? Pensei duas vezes e decidi-me a escrever no Abrupto, o meu pequeno jornal pessoal. Para além disso pode ser pedagógico ver como evolui um “escândalo” ad hominem do lado do alvo.

Neste caso impus-me uma regra: nunca escrever aqui o que não faria num orgão de comunicação social normal, sujeito aos mesmos condicionamentos e às mesmas regras deontológicas.

O assunto saiu num jornal tablóide e não chegou à imprensa chamada séria. Estou convicto que chegará, dado que o próprio tablóide gera o pretexto para esse salto. É uma técnica conhecida, ninguém quer publicar em primeiro lugar, mas depois todos acham que continuar a “notícia” é legítimo. A prudência aconselharia silêncio, o assunto podia morrer por si. Mas não sei porquê, o meu silêncio parecia admissão de culpa e eu não fiz nada de que tenha que me condenar.

Vi finalmente o insultuoso título – “Pacheco dá volta ao fisco” com honras de capa, fotografia e uma página inteira no interior, e isso ultrapassa a minha medida. Sobre ele consultarei o meu advogado para saber se há fundamento para processar o jornal com todo o vigor e sobre todas as formas possíveis.

DIVULGAR A DECLARAÇÃO DO IRS?

Quando se está revoltado, e não tenham dúvida que é essa a palavra exacta, pensa-se fazer algumas coisas nem todas sensatas. Uma das que apesar de tudo penso mais sensata foi publicitar a minha declaração de rendimentos e todos os documentos conexos aos rendimentos associados aos direitos de autor, para se ver não só extenso e inequívoco traço de papel que vai desde a TSF ou a SIC até à SPA e às declarações de IRS. Por aí se verá que não há qualquer “volta ao fisco” – está lá tudo preto no branco. Pode depois haver uma diferença de interpretação sobre a categoria de determinados rendimentos, e a parte colectável que lhe é aplicada, mas num país civilizado seriam as Finanças a fazer essa chamada de atenção para que insisto, tem todos os elementos. Nunca o fizeram.

Ainda não decidi se divulgo ou não a minha declaração, mas se o fizer será no Abrupto para não me sujeitar ao tratamento selectivo dos seus elementos. Será integral e cada um julga por si.

Há, no entanto, razões de outro tipo que me fazem hesitar. Há uns anos, escrevi um programa para a Distrital de Lisboa do PSD que continha dois aspectos polémicos: um, o fim da televisão pública, outro, o acesso generalizado às declarações de rendimentos, como acontece nalguns países nórdicos. Da mesma maneira que qualquer pessoa pode pedir algumas certidões sobre terceiros poderia aceder á sua declaração de rendimentos. É evidente que se previa uma alteração radical dos impressos, que poderiam ter uma parte confidencial, mas o que dizia respeito aos rendimentos seria pública. Na altura, e isso não é segredo nenhum, a drª Manuela Ferreira Leite, que fazia parte da lista, opôs-se com argumentos que merecem toda a ponderação e são vários. Técnicos e políticos. Voluntariamente retirei essa proposta, mas fez-se então uma primeira discussão sobre a matéria.

Decidindo no impulso do momento, eu quebraria uma regra de violar mais um passo da privacidade, mais um direito que me assiste, para gaúdio de um voyeurismo populista que continuaria a tratar-me como dando a “volta ao fisco” , porque ele não se alimenta de informação mas de um desejo no qual se mistura inveja socializada e preconceitos contra a democracia e os políticos. Insisto, ainda não decidi, mas hesito.

Parte do preço que hoje muitos lamentam se estar a pagar com as escutas telefónicas, prisão preventiva facilitada e longa, poderes excessivos a magistrados, começou aqui, nesta continua cedência ao populismo, na qual há muita consciência de culpa.

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6.8.03


"TAMBÉM ELE"

foi actualizado.

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CRATERA


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MEDIDAS A MEIO CAMINHO NÃO RESOLVEM NADA

Li a notícia que o MAI “cancelou hoje as licenças para o lançamento de foguetes durante a actual situação de risco de incêndios.” Se fosse assim ficaria contente – é um risco desnecessário, a que sem custo nos podemos poupar.Mas depois quando se analisa o texto só surgem ambiguidades.

O MAI ”ordenou à GNR e à PSP que não procedam à concessão de licenças para o lançamento de foguetes ou queima de outros fogos de artifício, excepto nos casos em que os bombeiros da área certifiquem que não há risco.” Já temos excepções e uma pura abstracção para as definir: não estou a ver os bombeiros assumirem essa responsabilidade, nem que tenham meios, ou burocracia, para, no meio deste inferno de fogos, irem agora “certificar” a terra X ou Y.

Depois há pior:

O ministro Figueiredo Lopes determina ainda que seja dado conhecimento ao coordenador distrital do Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil das licenças já concedidas antes da actual situação e cujos lançamentos ou queimas ainda não tenham sido efectuados, para que sejam tomadas medidas de prevenção contra incêndios.”

Pode ser que o defeito seja de quem redigiu a notícia , mas depois de a ler ficam-me imensas perplexidades. Foram ou não “canceladas as licenças”, ou seja, é proibido deitar fogo? Se é assim porque razão se abre uma excepção “para as licenças já concedidas antes da actual situação e cujos lançamentos ou queimas ainda não tenham sido efectuados, para que sejam tomadas medidas de prevenção contra incêndios.” Toda a gente sabe que a maioria das festas ainda estão para vir no mês de Agosto, portanto o fogo deitado até agora é pouco significativo. Eu aqui só vejo uma prevenção possível: não deitar o fogo.

Esta é um medida que, para ter efeito, devia ser genérica pelo menos no âmbito dos distritos de risco e não ter excepções, nem um processo burocrático complicado que ninguém está em condições para garantir, a uma semana das festas do 15 de Agosto. Para além disso num mesmo distrito criaria desigualdades entre aldeias cujas festas competem entre si. É mais fácil de aplicar se, num âmbito distrital, for igual para todos.

Se nos ficarmos por isto, e conhecendo-se a realidade de desresponsabilização da cadeia de autoridade, das Juntas de Freguesia aos Governos Civis, vai haver foguetes em todos os lados. O MAI deve saber isso porque termina dizendo

A Guarda Nacional Republicana e a Polícia de Segurança Pública devem também reforçar a fiscalização no âmbito do uso de foguetes ou queima de outros fogos de artificio.”

Mas estamos a falar de uma proibição ou de um “uso” controlado? Como é que eu convenço alguém com este texto que não se pode deitar foguetes. Nem vale a pena tentar.



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UMA HISTÓRIA DE JOÃO PULIDO VALENTE DE 1958

está nos Estudos sobre o Comunismo.

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A CAMA DO GADO

Isto de se ser itinerante, vagabundo e curioso às vezes dá para aprender algumas coisas. Uma das funções económicas das matas era fornecer tojo para a “cama do gado”. Literalmente aquilo sobre o qual o gado (bois de trabalho, vacas de leite) dormia. Todos os anos se vendia o tojo e depois, pouco a pouco, deixou de se vender. O tojo passou a acumular-se nas matas aumentando a sua carga térmica. Os incêndios são feitos de muitas destas coisas.


DIÁLOGOS SOBRE FOGUETES

- Talvez este ano fosse bom não deitar foguetes…

- Acha? E depois ninguém vem à festa.

- É um risco, mas os incêndios são um risco maior.

- Os foguetes não provocam incêndios, para além disso avisamos os bombeiros.

- Mas e se os bombeiros não tiverem gente que chega nesse dia e se estiver vento …

- Não, não acontece nada e as pessoas querem os foguetes nas festas. Ainda se alguém que mandasse proibisse…

(Por absurdo que pareça ninguém que “manda”, o governo civil neste caso, proíbe.)

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O NEGRO

Vivi, num dos meus “lugares de ascensão”, numa casa que ficava no limite de uma área que tinha ardido recentemente, em Pinho, Boticas. À noite, quando regressava a casa, atravessava a área do incêndio e pude “ver” como o negro absorve a luz. Os faróis do carro quase que não iluminavam a estrada e a luz fugia para dentro do negro dos pinheiros queimados nas bermas e para o chão coberto de cinzas. Não sabia que este efeito existia e pensei que as lâmpadas estivessem a acabar. Não.
Onde está negro fica mais negro.

(Actualização)

Fotografias deste mesmo negro, nas redondezas de Amor, Leiria estão na Aldeia de Amor.

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5.8.03


NOVO - FÍSICA E MATEMÁTICA - 3ª SÉRIE DE COMENTÁRIOS

Actualização mais atrás

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OUTRA VEZ À LUZ DE SKAGEN


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“TAMBÉM ELE”

Como imaginam este é o último dos comentários que eu gostaria de aqui colocar, mas neste tipo de escrita está-se aqui para o bem e para o mal. Este é o mal.

Também não tenho feitio para olhar para o lado, como se nada fosse. Podia ficar calado para não “amplificar”, mas eu não sou da escola do ficar calado. Segundo me disseram, o 24 Horas acusa-me de fugir aos impostos por receber as colaborações nos órgãos de comunicação social como direitos de autor, o que, segundo o jornal. não seria conforme às regras fiscais. Não li o texto do jornal, e por isso atenho-me apenas ao que sei da notícia.

Sobre isto queria esclarecer o seguinte:

1) não recebo um tostão que não declare para efeito de impostos e desafio quem quer que seja que diga o contrário;

2) não tenho outros rendimentos que não sejam os do meu trabalho, quer como deputado, quer como autor;

3) não sou jornalista, pelo que não posso declarar as minhas contribuições nos órgãos de comunicação social como “jornalista”:

4) tratando-se de colaborações originais, comentários, conferências e textos é para mim óbvio que se trata de”autorias” , prática aliás comum seguida por outros autores, tanto quanto eu saiba, nas mesmas exactas circunstâncias; isto significa , de facto, pagar menos impostos porque a lei protege os autores;

5) de há dois anos para cá, agrupei na Sociedade Portuguesa de Autores o recebimento de todas estas colaborações; tudo é feito com recibo; tudo está contabilizado quer no órgão de comunicação social respectivo, na SPA e nas declarações às Finanças, onde consta como é obvio a origem , e o carácter de direitos de autor do dinheiro recebido; não há qualquer informação que seja sonegada, nem qualquer truque, tudo claro e transparente:

6) aliás, só um doido é que tendo actividades políticas faria qualquer truque com dinheiro que recebe de órgãos de comunicação social:

7) nunca até agora isto suscitou qualquer dúvida a ninguém, a começar pelas Finanças e eu, não sendo especialista, nunca me passou pela cabeça que tal pudesse suscitar dúvidas;

8) se alguém tem que colocar objecções são as Finanças (que tem os papéis todos com a clara indicação do que se trata ) e se o fizer procederei em consequência; se as Finanças tiverem razão pagarei o que devo, se me parecer que a interpretação é abusiva contestarei legalmente, como é direito de qualquer cidadão; o meu único interlocutor nesta matéria são as Finanças;

9) enquanto não o fizer não tenho nenhuma razão para alterar o meu comportamento, porque , insisto, não sou jornalista mas autor do que escrevo, e do que digo.

Uma penúltima observação: admito que não tenha sido essa a intenção do 24 Horas, mas já esperava que em vésperas das eleições europeias de 2004, dizendo eu o que digo, estando eu a empecilhar alguns arranjos, alguma coisa deste tipo acontecesse.

Uma última observação: talvez o aspecto mais penoso da actividade política seja este, ser misturado com quem deve e teme, ouvir o ruído invisível do “também ele”. Provoca revolta e tristeza, grande revolta e tristeza, porque este tipo de acusações não tem emenda possível, alguma coisa sempre fica.
Mas não é, não é “também ele”.

(Actualização)

Agradeço a correspondência que recebi e as manifestações de solidariedade nela contida. Alguma dessa correspondência é de carácter técnico e muito interessante. Dela decorrem vários aspectos que sintetizo a seguir.

Trata-se de uma prática comum e generalizada (não só entre políticos, mas também entre jornalistas e comentadores académicos) que nunca suscitou reparos. O meu nome foi obviamente escolhido a dedo. É uma matéria controversa sobre a qual há práticas e pareceres contraditórios, tanto mais que a legislação foi feita antes de se generalizar este tipo de actividades na rádio e televisão, dado que a descrição de um comentário como “discursos proferidos em debates públicos” dificilmente se aplica a esta nova realidade. Para além disso, os programas são muitas vezes repetidos pelo que também não é verdade que “os direitos de autor esgotam-se no momento da comunicação. Não existem direitos posteriores.” Tanto existem que os contratos o estipulam para as emissoras poderem comercializar programas que incluam comentários.

No entanto, eu não sou jurista e percebo pouco de finanças, pelo que também tenho em conta as opiniões abalizadas que dizem que tal não é possível. O que vou fazer é suspender de imediato os pagamentos na SPA, até esclarecer porque razão uma entidade que é suposto saber se é legal ou não receber direitos de autor de comentários, aceita recebe-los e pedirei um parecer às Finanças.

É minha intenção manter os leitores do Abrupto informados de como evolui este caso.

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S. BERNARDO E A ARTE COMO DISTRACÇÃO DE DEUS

Uma das alegrias de quem é curioso, na definição antiga do curioso, amador, coleccionador, é estar a sempre a encontrar palavras, objectos, imagens, na espantosa variedade do mundo, e dos livros. Enquanto o mundo for assim, como é possível haver aborrecimento? Como é possível não haver nada para fazer?

Vejam-se estas palavras, enviadas por V., uma amiga que gosta de Bernardo, S. Bernardo de Claraval, sobre o que os monges podiam ver, olhando em volta numa capela já antiga para o seu século. Bernardo pergunta “para que serve”, ele que achava que a arte era uma “distracção”:

«De resto, para que serve, nos claustros, onde os frades lêem o Ofício, aquela ridícula monstruosidade, aquela espécie de estranha formosidade disforme e disformidade formosa? O que estão ali a fazer os imundos símios? Ou os ferozes leões? ou os monstruosos centauros? Ou os semi-homens? Ou os tigres manchados? Ou os soldados na batalha? Ou os caçadores com as trombetas? Podem ver-se muitos corpos sob uma única cabeça e vice-versa: muitas cabeças sobre um único corpo. De um lado,avista-se um quadrúpede com cauda de serpente, do outro, um peixe com cabeça de quadrúpede. Ali um animal tem o aspecto dum cavalo e arrasta atrás de si uma metade de cabra, aqui um animal cornudo tem o traseiro de cavalo. Enfim, por todo o lado aparece uma estranha e grande variedade de formas heterogéneas, para que se tenha mais prazer em ler os mármores do que os códigos, para que se ocupe o dia inteiro a admirar, uma a uma, estas imagens em vez de se meditar na lei de Deus. Oh Senhor, já que não nos envergonhamos destas criancices, porque não lamentamos, ao menos, os dispêndios?»

Tudo é interessante neste texto. A força das frases, com o fôlego do contemplativo que vê mais que os outros, a descrição magnifica do que um homem do século XII podia ver numa capela românica, e o argumento final, a que hoje chamaríamos “economicista”, dos “dispêndios”. O verdadeiro “dispêndio” era naturalmente o corpo:

Se desejardes viver nesta casa, é necessário deixar fora os corpos que trazeis do mundo; porque só as almas são admitidas nestes lugares, e a carne não serve para nada”.

Essa veemência contra o corpo, que o levou a atirar-se para dentro de uma tanque de água fria quando viu uma rapariga, ou a dominar o sabor para não ter gosto na comida, ou a não querer dormir para não perder o controle de si, é , como nós sempre suspeitamos, pura sensualidade. Por isso nos seus textos há das melhores descrições da beleza, das “carícias do corpo” , em nome da negação da própria beleza, uma “distracção” que nos afasta de Deus:

«Nós, monges, que já nos isolámos do povo, nós que, por Cristo, abandonámos todas as coisas preciosas e formosas do mundo, nós que para merecer Cristo consideramos como esterco todas as coisas que resplandecem de beleza, que acariciam o ouvido com a doçura dos sons, que lançam odores suaves, que têm um gosto doce, que agradam ao tacto, e o que, em suma, acaricia o corpo...»

Bernardo sabia que a arte nascia do corpo, mesmo quando era cosa mentale.

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FÍSICA E MATEMÁTICA – COMENTÁRIOS - 3ª SÉRIE

O Abrupto recebeu ( e continua a receber) muitos comentários sobre a questão das notas de Física e Matemática. Considero que esta é uma questão estratégica para combater o nosso atraso endémico, pelo que todo o espaço que se lhe der é pouco.

*

Sei que o timing para comentar este assunto já passou, mas gostaria de acrescentar algo sobre a questão dos exames de Matemática e Física. Em geral, os comentários são todos a culpar o sistema. Acho mais interessante analisar o que causou esse tal entorpecimento do sistema e o que não deixa que se modifique. Mas aqui não há grupos de pressão, interesses das multinacionais, pelo menos directamente. Todos somos culpados, como se costuma dizer, mas talvez seja útil apontar o dedo a alguns deles: pais, intelectuais, programadores de televisão. Propositadamente deixei políticos e agentes de ensino de fora, porque as suas culpas e desculpas já são bem conhecidas.

Os pais, em geral, não demonstram qualquer interesse na educação dos filhos. Para eles a educação é apenas uma forma de conseguir um bom emprego, de atingir estatuto social ou talvez apenas uma forma gratuita de ocupar os filhos. O saber tem que ser utilitário, tem que servir para algo que dê dinheiro ou poder, é essa a visão geral. É comum um pai perguntar ao filho o que aprendeu na escola? Partilhar com eles conhecimento? Não, os pais não se interessam, os pais não acompanham diariamente os filhos, apenas querem ver notas, resultados, sucesso ou falhanço. São juizes, não são orientadores.

Depois culpo os intelectuais. Coloco-os entre itálico devido ao pouco respeito que tenho pela classe que em Portugal se costuma denominar assim. Por cá, intelectual é a figura que se deixa deslumbrar pelo poder, que comenta nos jornais e na TV, que fala com suposta autoridade. Como dizia um filósofo, há pessoas que só consegue convencer os ignorantes, e é assim que vejo os nossos intelectuais. E o meu pouco respeito deriva precisamente dessas pessoas serem, na sua quase totalidade, analfabetos em Física e Matemática. Estes intelectuais não sabem em que mundo vivem, não sabem o que é um electrão, o que diz o 2º princípio da termodinâmica, o que é a luz, o que é o princípio da incerteza e nem sabem pensar matematicamente - e tudo isto são coisas fundamentais, tão essenciais ao homem culto como saber a História do seu país ou dominar a língua materna. O baixo nível que atinge a pseudo - intelectualidade faz com que aos verdadeiros intelectuais lhes repugne o contacto com estas pessoas. Porque temos muitos bons investigadores em Portugal na área científica, mas estes preferem falar com quem lhes está à altura, os seus pares por cá e no estrangeiro. Por isso, os verdadeiros intelectuais normalmente estão escondidos do público, substituídos por medíocres sedentos de protagonismo.

Por último, os programadores de TV. Trata-se de um problema global. A linguagem televisiva actual privilegia o óbvio, a última novidade, mostra tudo rapidamente e pronto a consumir, sem necessidade de pensar. As maravilhas da ciência não se explicam desta forma. O pior é que muito dificilmente se explicam de qualquer forma. Existem muitos livros que fazem uma boa divulgação científica, mas aí já são os leitores que tomam iniciativa (quase sempre) e já estão dispostos a fazer um esforço para compreenderem. A TV como meio de divulgação científica quase não existe e quase nunca existiu. Desde os programas de Carl Sagan que não foram feitos outros que conseguissem entusiasmar tantas pessoas pelo mundo fora pela ciência. A verdade é que não é fácil falar de ciência para toda a gente com rigor e poesia, mas se não for assim não se consegue cativar.

Claro que o sistema está mal. Um simples exemplo: há uns anos atrás, numa livraria, abri um manual de Física do secundário. Li o prefácio e apenas em algumas linhas detectei uma meia dúzia de erros crassos. Assim é difícil aos alunos aprenderam alguma coisa.

Gostava de lançar um desafio que acho interessante. Eu tenho formação científica, como se pode ver pela minha escrita tosca e directa. Agora vou tentando me complementar procurando saber mais de artes, literatura, história, ciências sociais. Que tal as pessoas ligadas às letras, artes e ciências sociais procurarem saber mais de ciência? Não lhes faria mal nenhum e iriam descobrir muitas coisas interessantes. O conhecimento pode ser uno, se fizermos por isso. Seria o primeiro passo para muita coisa.

Mário Chainho

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Embora concorde com as considerações do seu post acerca deste tema e com o ponto de vista de que resultam os seus comentários, parece-me que há um ponto que está a fugir ao debate e será mesmo uma das razões base do actual estado das coisas.

Parece-me haverem dois grandes patamares, ou fases, na aquisição do conhecimento.
Uma 1ª Fase, que pode ser encarada como Fase de aquisição do conhecimento elementar e uma 2ª Fase, um patamar já mais ligado à criatividade, investigação, experimentação, etc. Acontece que o debate se centra sempre no falhanço desta segunda fase, sem que tomemos consciencia de que é o falhanço da fase anterior que gera a impossibilidade de se obterem resultados na fase seguinte.Se nem os alunos, nem os professores são menos capazes do que eram há 20 anos, por exemplo, o que é que está a correr mal?
Penso que na 1ª fase do ensino, há que dotar os alunos dos conhecimentos elementares que são essenciais. Sem pretender ser exaustivo, a História, a Física, a Matemática, as Ciencias Naturais, o Português, o Inglês, a Química, a Filosofia, etc., são exemplos das áreas que fornecem as ferramentas do "conhecimento" que tem que ser adquiridas num certo grau mínimo, para ser possível avançar para patamares posteriores, com as condições básicas asseguradas. Aqui, há que fazer uma separação entre os alunos que estão preparados e os que não o estão. Sejam Exames, Testes, ou o que se quiser, há que ter uma maneira objectiva de aferir, com verdade, o grau de preparação dos alunos. Se estão ou não de posse dos tais conhecimentos base. Depois, só os que estão preparados deveriam poder avançar, pois os outros nunca poderão ter resultados efectivos, enquanto lhes faltarem os conhecimentos essenciais.Isto parece-me lógico.

A situação de os professores terem medo de reprovar os alunos é um aburdo porque não resolve nada e no final, gera uma insuperável frustração em todos os envolvidos. Mesmo não sabendo o essencial, os alunos, chegam ao 10º ano sem reprovarem. A partir daqui, como as coisas se complicam e eles não têm os conhecimentos essenciais, "estacionam" no 10º ou 11º e ficam à deriva. Entretanto, passaram os anos e já não é possível voltar ao secundário para aprender aquilo de que necessitam. Ficam, literalmente, sem saida e intala-se a frustração. A frustração dos alunos, dos professores e dos pais.É essencial que se façam Exames em vários níveis de modo a garantir a "qualidade" dos alunos que transitam à fase seguinte.Por analogia, veja-se por exemplo o que se passa na Indústria Alimentar. Há já alguns anos foi criado um sistema de controle de qualidade nos EUA, chamado HACCP (Hazardous Analyses and Control of Critical Points) que consiste resumidamente no seguinte :
Na fase de produção de um bem, são identificados os pontos críticos para a qualidade do produto final.Sempre que no processo de fabrico, o produto sofre uma tranformação para passar a uma fase superior e esse ponto é considerado crítico, o produto é sujeito a testes de qualidade nesse ponto.O produto só avança para a fase seguinte se "passa" nos testes. Deste modo se garantem 3 factores. A melhor qualidade do produto final, O menor número de rejeições, O mais baixo custo total envolvido. Se o produto passou em todos os pontos críticos, já não precisa do controle de qualidade final que antigamente era aquele que servia para "aprovar" o produto.

Sem querer ser "redutor" parece-me que o nosso problema é sempre o mesmo. Estamos todos de acordo quanto ao problema. No entanto, nenhum Governo resolve tomar uma decisão, mesmo sabendo que existirão alguns erros, para depois se ir construindo (aperfeiçoando) nessa plataforma. Assim, vamos debatendo, debatendo e o tempo a passar. Parece querermos encontrar o Óptimo, quando ainda estamos no Sofrível. Fazer o Bom era um avanço significativo. E nisto, francamente não me parece estar a ser "faccioso".

António Torres

*

Sou uma estudante do 12º ano que pretende candidatar-se ao curso de economia na Faculdade de Economia na Universidade do Porto, a qual exige como prova específica a tão temida Matemática. O meu propósito ao escrever-lhe é para lhe contar uma experiência pessoal invulgar e as conclusões que tirei daí. Frequento um liceu Público do Norte do País no qual obtive um esforçado 16 a Matemática no 12º ano. Fui fazer o exame bastante nervosa e assustada pois todos os professores e alunos nos descreviam o exame como algo de terrível, embora tivesse noção de ter estudado o necessário. Para meu espanto, correu-me bem e no passado dia 1 de Agosto constatei que tinha obtido um 18.5 no exame. Então, face a esta invulgar situação de subida de nota em exame, parei para pensar. Será que estudei mais para este exame do que para os testes? (Penso que não) Será que fiz testes mais difíceis? (Não, mesmo porque os meus testes eram uma selecção de perguntas de exames de anos anteriores integralmente ou adaptadas), será que fui injustamente avaliada?

Afinal os exames até nem são difíceis e seguem sempre o mesmo esquema, concluía que o que me permitiu tirar esta nota foi o facto de nos dias antes do exame ter feito todos os exames dos últimos 4 anos. Então percebi, que estive durante um ano inteira a ser preparada para aquele exame, que tinha feito dezenas ou talvez centenas de exercícios estereotipados. Mas porque é que ao percorrer no sentido vertical as pautas de Física e Matemática na minha escola era possível encontrar 10 alunos seguidos com notas negativas?
Na minha opinião, as razões que explicam tal facto são as seguintes:

1.Alguma incompetência por parte dos professores. Muitos nem sequer são formados em Matemática ou Física e não sentem a mais pequena vocação para leccionar. Um aluno é capaz de faltar a todas as aulas de uma disciplina como História, estudar em casa pelo livro e apontamentos e tirar uma boa positiva. Por outro lado em relação à Matemática, bastava ir a todas as aulas, não estudando em casa, a partir do momento em que percebesse tudo nas aulas. Porque os exercícios não variam muito, se se perceber, porque é que se usa uma derivada, não será preciso fazer centenas de exercícios com
derivadas, até se mecanizar, bastará face a um novo exercício raciocinar e depois aplicar. Por fim é de salientar a dificuldade que muitos professores têm em atribuir notas altas aos alunos, especialmente por parte das escolas públicas. Citando um antigo professor meu: “20 é para Deus, 19 para mim, e o resto para os alunos”...

2.A inércia total por parte dos alunos. Pois para muitos a Matemática e a Física são difíceis e por isso não vale a pena estudar. Os alunos vão-se acomodando a esta situação e até vão passando de ano até se depararem com um exame final.

3.O problemas das escolhas múltiplas. Por exemplo, num exame de matemática há 7 perguntas de escolha múltipla com quatro respostas possíveis, no valor de 0.9 cada uma, perfazendo um total de 6.3 valores. No entanto, sempre que um aluno falhar a opção que escolhe é lhe descontado 0.3 às restantes perguntas feitas. Acho que pelo menos devia ser obrigatório que o aluno além da resposta escolhida, indicasse uma breve explicação do raciocínio elaborado. Pois por muitas vezes me senti injustiça devido à escolha múltipla.

4.A culpa dos nossos governantes. Como diz o velho ditado “ de pequenino é que se torce o pepino”, o que neste caso não poderia ser mais verdade, pois o gosto pela matemática adquire-se desde pequeno, não é só importante criar projectos, como por exemplo a “ciência viva”, como é urgente incentivar os mais novos ao mundo dos números, pois quando se gosta, é mais fácil estudar e obter melhores resultados. Não sendo de descurar a revisão dos programas, dos exames e das aulas do ensino secundário. Sei que não será fácil, pois apesar de os exame por vezes serem injustos, no contexto actual são a melhor forma de fazer justiça. Pois é a única maneira possível de nivelar os alunos à entrada na faculdade face a critérios de avaliação e técnicas tão vastas e diferentes a nível nacional.

Diana Silva




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ANÚNCIO DA SUA MORTE

Texto do anúncio da sua própria morte feito por João Pulido Valente:

"Eu, João Pulido Valente, informo os meus Amigos que morri hoje, 4 de Agosto de 2003, de manhãzinha. Convivi com Ideias, mulheres, tabaco e álcool. Contraí cadeia, sífilis, cancro e ressacas. Não estou arrependido. Julgo ter pago o preço justo por ter vivido. Quando eu morrer não quero choro nem velas, quero uma fita amarela, gravada com o nome dela: Liberdade."

Ainda há homens assim.

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4.8.03


À LUZ DE SKAGEN


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INCÊNDIOS

Nestes momentos, que todos sabemos serem difíceis, falar de outras coisas pode parecer escapismo, mas também falar delas é, muitas vezes, ruído. A destruição de uma parte de Portugal pelos incêndios, é apenas uma parte de outras destruições mais lentas, menos visíveis, menos dramáticas, mas nem por isso menos eficazes. As razões de umas e outras são mais próximas do que parecem, remetem para um laxismo governamental muito antigo, para a diluição das autoridades intermédias que não cumprem as suas responsabilidades, e para resistências sociais profundas. É tudo menos um problema de dinheiro.

As causas dos incêndios são conhecidas (todos os estudiosos da nossa floresta sabem porque é que ela arde), são complexas (porque mexem com o tecido social, com a propriedade e com as mutações no uso económico da floresta) e tem soluções também conhecidas, embora menos fáceis do que neste momento de indignação parecem.

Quando passarem os incêndios é uma discussão a que se deve voltar. De fundo e a fundo. Agora é natural a indignação e que, quem possa fazer alguma coisa, faça.


RESISTÊNCIAS

Experimentem fazer esta coisa tão simples como seja convencer uma Comissão de Festas a não deitar foguetes. Não falo em abstracto, mas em concreto. Chamar a atenção para que não há quaisquer condições de segurança para se deitar foguetes é ser “contra a Festa” de imediato. É assumir a responsabilidade do “falhanço” da festa, porque, como muitas coisas que se fazem voluntariamente, estão presas por um fio ténue entre o desastre económico e o magro sucesso. Os meios pequenos são cruéis na atribuição de responsabilidades e incapazes de as assumirem.

O fogo está comprado e presumo que pago e ninguém imagina uma festa sem as dezenas de foguetes às 8 da manha para a “alvorada” e durante o dia repetidas vezes para marcar eventos ou pura e simplesmente mostrar que há festa. Não é fogo de artifício para iluminar os céus, são foguetes para fazer barulho. Já sugeri que gravassem o barulho e o atirassem para o ar como se fossem os foguetes. Não adianta. O sucesso da festa é ter foguetes, mesmo que ninguém saiba se eles têm algum papel em trazer pessoas para os espectáculos, ou se estes foram bem ou mal escolhidos.

Deitar foguetes, por muito treino que se tenha, não é uma ciência exacta. O vento atira-os para qualquer lado e vastos espaços com erva seca e vegetação rasteira estão apenas à espera de serem incendiados. Também isto não é abstracto, os foguetes provocaram regularmente pequenos incêndios nas festas dos anos anteriores e os bombeiros são chamados quase como um hábito. Toda a gente sabe isto, ninguém verdadeiramente liga. Ninguém imagina sequer que este ano possa não haver bombeiros porque estão ocupados noutro sítio e não chegam para as encomendas.

Seguros? Não existem. Alguém se responsabiliza? Ninguém. Do governador civil que deveria este ano proibir em determinados distritos de risco o fogo de artifício, à Junta que não quer aborrecimentos e incompatibilidades. E o mais provável é que haja foguetes e depois a culpa não seja de ninguém.


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PRESENTES MATINAIS PARA OS AMADORES DE LIVROS

Para o Almocreve das Petas

Mesmo que o “almocreve” já conheça, aqui vai uma recomendação do livro de Nicholas A. Basbanes, Among the Gently Mad. Strategies and Perspectives for the Book Hunter in the Twenty-First Century , Nova Iorque, A John Macrae Book, 2002. Para a tribo dos “gently mad” dos amadores dos livros é uma boa leitura.

Para os Textos de Contracapa



Esta reprodução do início de uma carta de 1 de Agosto de 1970, faz parte de um conjunto de cartas de Vergílio Ferreira sobre a sua obra, sobre a juventude, o Maio de 1968, o cinema, etc., fragmentos de uma correspondência que com ele mantive nesses anos.

Para os entusiastas dos Sopranos

... nos quais eu me incluo, o melhor que se publicou até agora é a antologia de ensaios editada por David Lavery, This Thing of Ours. Investigating the Sopranos, Columbia University Press , 2002 . Entre os ensaios, com títulos como “Fat fuck! Why don’t you take a look in the mirror?”. Weight, Body Image, and Masculinity in the Sopranos” ou “Soprano-speak” Language and Silence in HBO’s The Sopranos”, típicos dos académicos americanos há muita coisa que vale mesmo a pena ler. Para a esquerda politicamente correcta há o livro de David Simon, Tony Soprano’s América. The Criminal Side of the American Dream, Boulder, Westview Press, 2002, muito menos interessante e que se dedica a dizer o que se espera – os Sopranos são a América, violência, mentiras, extorsão, ou seja, a culpa é do capitalismo, etc.

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3.8.03


ONDE


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EARLY MORNING BLOGS 23

A blogosfera está um fio de água, um pequeno ribeirinho, não corre de dia, não corre de noite. Agora é que as férias profundas estão cá, secando tudo.

Não me custa imaginar como vai ser o princípio de Setembro: chuvas poderosas, torrentes de palavras de novo a encher este vale. Trovoadas, estrondos, Zeus lá em cima de relâmpago na mão, fúria, sturm und drang, águas do Sul, águas do Norte, águas a quererem correr para trás desafiando a gravidade, águas ligeiras flutuando sobre outras águas, águas negras do fundo, clareza, limpidez, obscuridade, desejo de ser rio, desejo de ir para o mar, desejo de não ir para parte nenhuma.

Todas revolvendo-se num pequeno espaço de um vale profundo, a querer deixar um sulco que diga – “esta é a minha água e corre por aqui”.

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2.8.03


UMA VELA

Aqui, fica-se sempre. Como a vela que Yuri observou na rua, num principio de noite russa, tão precoce, tão cedo e tão tarde. Como no poema de Pasternak que vem no Dr. Jivago, que traduzi a seguir. O poema resulta de um olhar casual:

Quando passavam na rua Kamerger, Yuri reparou numa vela que tinha derretido uma abertura na camada de gelo de uma das janelas. A luz parecia querer dirigir-se para a rua, quase conscientemente, como se estivesse a observar as carruagens que passavam ou esperando por alguém.
“Uma vela arde na mesa, uma vela arde …” murmurou para si próprio – o princípio de alguma coisa confusa, informe, que esperava que assumisse uma forma. Mas nada lhe surgiu


O que mais gosto no poema é o toque chekoviano, algo que só a literatura russa do principio do século XX era capaz de dar, uma delicadeza infinita a tratar das coisas humanas, sem exageros ou dramas, só a frase simples e leve e terrível. Nos momentos mais difíceis, quando tudo soçobrava à nossa volta, lá ficava a vela ardendo na fronteira entre o quarto e a rua, na “noite de Inverno”. A presença da vela é a última esperança, a da persistência.


Todas as tempestades
Cobrem a terra.
A vela arde em cima da mesa
A vela arde.

Como no Verão, as traças são empurradas
Para a chama,
Os flocos de neve batem
Contra a janela.

No vidro, anéis brilhantes de neve
E fios de água escorrem.
A vela arde em cima da mesa
A vela arde.

No teto iluminado
As sombras oscilam.
Braços e pernas,
Cruzados pelo destino.

Duas botas caem no chão
Fazendo barulho,
E lágrimas de cera
Tombam no vestido.

O nevoeiro de neve
Não nos deixa ver.
A vela arde em cima da mesa
A vela arde.

Um sopro vindo do canto
Faz tremer a vela,
Duas asas cruzam-se
Como num anjo.

Nevou muito durante Fevereiro
Como é costume.
A vela arde em cima da mesa
A vela arde.

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VERÃO ANTIGO


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A CATÁSTROFE DO DIA SEGUINTE É SEMPRE MAIOR DO QUE A DO DIA ANTERIOR

Não obtenho qualquer informação dos noticiários da comunicação social, em particular nas televisões, sobre os fogos. O mesmo já acontecia nos anos anteriores. Desde que começaram os fogos, os do dia seguinte são sempre piores do que os do dia anterior. É a única constante. Para além disso é sempre tudo uma “catástrofe”, sempre tudo descrito de uma forma tão hiperbólica, tão dramática, tão excitada, que, a uma dada altura, as palavras estão tão gastas que não servem para nada. Não há dados objectivos, áreas, mapas, dimensões, é tudo a olho. A combinação entre a excitação para o espectáculo, a ignorância daquilo que se fala, e a lógica do sempre novo, sempre maior, sempre mais dramático, destrói qualquer conteúdo informativo.

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FÍSICA E MATEMÁTICA – NOVOS COMENTÁRIOS ADICIONADOS NA 2ª série

Há novos comentários adicionados na 2ª série um pouco mais abaixo no blogue. O debate sobre a educação cíentifica é um dos mais importantes que se pode ter no Portugal de hoje e a qualidade e o conteúdo das intervenções dos leitores do Abrupto demonstram essa necessidade. Os textos são mais longos do que o habitual para este meio, mas o seu interesse justifica o agrupamento numa entrada única.

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VER A NOITE - INCÊNDIO

Tenho um incêndio a quinhentos metros, atrás de uma curva de estrada , numa ravina coberta com mato. Não oferece perigo nem a pessoas, nem bens porque está uma noite sem vento. Os bombeiros não terão dificuldade em impedir que atravesse a estrada. Com vento seria indomável e subiria sem tréguas.

Um enorme clarão vermelho vulcânico ilumina a própria nuvem que produz. Ouve-se crepitar e o cheiro intenso penetra em tudo. É irónico que este festival de destruição produza um cheiro magnífico, à urze, ao mato queimado. Os carros de bombeiros passam sem as sirenes, desnecessárias porque não há trânsito. Uma agitação silenciosa perpassa nas pessoas, apanhadas na sua maioria já a dormir, pequenos grupos de vizinhos juntam-se a ver, a vigiar, inquietos.

Desci ao sítio das chamas junto do local onde os bombeiros esperam que o fogo se possa combater. O poder do fogo é enorme, uma coluna de chamas sobe e desce em altura conforme os arbustos que apanha, atirando línguas de fogo para o próximo ramo, para a erva seca. Atrás fica um círculo negro do que já ardeu, claramente delimitado por um risco de chamas.

É ainda um pequeno incêndio, sem perigo previsível, mas ajuda a perceber o que se tem passado.

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VER A NOITE

não é possível. O fumo dos incêndios espalha-se e tapa tudo. Não há estrelas, nem planetas, nem a jovem Lua se mostra. “Que farei quando tudo arde?” , perguntaria o meu mestre Miranda no canto superior esquerdo, no sítio onde Marte se deveria estar a mostrar.

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1.8.03


DE PARTIDA


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FÍSICA E MATEMÁTICA – COMENTÁRIOS - 2ª série (Actualizada)

NOTA: O Abrupto não tem comentários pelas razões já expostas. Através do correio electrónico recebe contribuições dos seus leitores, que são muito bem-vindas. Em função da economia geral do blogue e de regras editoriais de bom senso, serão aqui publicadas todas as contribuições para o debate, independentemente da minha concordância ou discordância com o seu conteúdo. Os textos estão publicados em ordem inversa da data de recepção.

"(...) o lançamento dum debate sobre o assunto, num país com reduzida tradição científica, e com muito pouca vontade para a construir.

O país em que Cultura-com-c-grande-nos-jornais-e-na-tv é sinónimo de Eça, Emmanuel Nunes, Vieira da Silva (só para mencionar alguns dos nacionais unânimes), mas nunca de Arquimedes, Galileu, ou Newton. Um país em que é escandaloso os alunos chegarem ao fim do 12º ano sem saberem quanto cantos tem "Os Lusíadas", mas não é escandaloso os mesmos alunos não compreenderem(!) que, desprezando o atrito, duas pedras de massas diferentes, lançadas simultaneamente da mesma altura atingem o solo ao mesmo tempo. Um país com uma intelligentsia que delira com Eduardo Prado Coelho ou Boaventura Sousa Santos mas ignora as calamidades pseudo- científicas que estas "talking heads" propagam nos anfiteatros da indústria de professores do Ensino Secundário. Um país que não compreendeu que Cultura Científica é, antes de tudo, questionar, criticar, experimentar, verificar e compreender, atitudes fundamentais para a cidadania nas sociedades democráticas.

(…) existe concerteza uma deficiência estrutural no sistema educativo nacional, mas esta deficiência é mental, e do sistema social português. Em comparações internacionais, os países asiáticos lideram sistematicamente os rankings da Física e da Matemática. Nestes países, o conhecimento é fortemente valorizado socialmente. Aprender Ciência, ensinar Ciência, fazer Ciência, são actividades com prestígio social, que os pais incentivam os filhos a prosseguir, o equivalente nacional a "fazer" a capa de revista cor-de-rosa, participar no próximo reality-show da tv, ou ser transferido para o futebol italiano. Os nossos valores são definitivamente diferentes dos valores sociais dos países que deram o salto do desenvolvimento científico e tecnológico.

E os nossos governantes têm tentado alterar esta atitude nacional? Numa lógica contabilística tudo indica que sim: escolaridade obrigatória alargada, melhores condições físicas nas escolas, e mais alunos nas escolas (em todos os níveis de ensino). Com que preço? Basta percorrer as escolas secundárias e falar com os professores e com os alunos. O sentimento generalizado é desmotivação. O nível médio de exigência dos programas é baixíssimo, fruto da pressão massificadora, e a escola substitui a família de forma indiferenciada e uniforme. Sucessivas reformas baixaram os padrões de exigência e automatizaram a promoção de multidões de analfabetos conceptuais a detentores da escolaridade obrigatória. A nova reforma do Ensino Secundário mantém esta bela tradição de inovação, sendo possível um aluno chegar a uma Escola de Engenharia sem ter tido Física e/ou Química nos três anos finais do Ensino Secundário (ver parecer do Instituto Superior Técnico sobre a reforma do Ensino Secundário). Todo este cenário torna-se ainda mais perturbador na Física ou na Matemática, em que a ausência de docentes com formação científica específica nestas áreas é quase total.Pergunta JPP: porquê estes resultados com a Física e a Matemática e não com as outras disciplinas? A resposta encontra-se subtilmente escondida no seu texto ("... o edifício da educação científica ...").

A Matemática, a linguagem das ciências "duras", é uma disciplina que exige um saber cumulativo, como bem descreveu Nuno Crato em intervenção televisiva recente. A sua aprendizagem não se compadece com lacunas na formação precedente e portanto supõe continuidade e estabilidade, características que raramente encontramos na composição do corpo docente das escolas públicas. Como qualquer linguagem, é exigente: o seu domínio implica muito treino e muito trabalho. A Física é um pouco diferente: compreender a linguagem matemática é fundamental, mas não é suficiente. A Física, como ciência experimental, obriga(-nos) a pensar e a confrontar a realidade, não se compadece com o saber sem compreender, o saber sem saber fazer, o saber-livresco-com-cheiro- a-mofo que impregna a nossa herança cultural francófona. Em qualquer dos casos, o nível de exigência e rigor das disciplinas é elevado e a qualificação científica dos docentes é crucial, sempre aliada à capacidade de transmitir o encanto e o prazer da Ciência. Muito deste prazer não se aprende no dia-a-dia de um estudante universitário. Encantamo-nos quando fazemos Ciência.

O contacto dos futuros professores com esta realidade é, em geral, reduzido e fortemente limitado: o estado, através das regras de financiamento, não incentiva as universidades que fazem Ciência, não incentiva a integração dos alunos em projectos de investigação e penaliza o ensino experimental/ laboratorial. Incentiva o ensino massificado, "barato" e com muito papel e lápis, a antítese da atitude que é necessário transmitir aos alunos do ensino secundário.Não existem soluções novas para descobrir a pólvora.

A teoria é unânime e do domínio público. Substâncias tão simples como trabalho, motivação, exigência, responsabilização, valorização e recompensa são, regra geral, suficientes. Contudo, não é óbvio que Nação/governantes/"opinion makers"/ professores/pais/alunos estejam preparados ou motivados para esta mistura explosiva. Citando um dos melhores conhecedores da psique lusa, Alexandre O'Neill, "Na prática, a teoria é outra."Nem tudo está perdido. Todos os Setembros encontro novos (e excelentes) alunos de Física à minha frente, acabados de sair do liceu, cheios de sonhos de cientistas e engenheiros, motivados para unificar as interacções fundamentais, compreender os buracos negros, resolver o problema energético da humanidade, desenvolver novos materiais, construir aceleradores de partículas. E de Setembro a Julho trabalho em deslumbramento ("awe" é o termo correcto) com as questões (e com as respostas) destes 45. O seu segredo é simples: motivação e dedicação. Como muitos noutros domínios científicos e tecnológicos, acabam por percolar para o resto da sociedade e transportar consigo a paixão pela Ciência e valores tão simples como a exigência, o trabalho e o rigor. Será aí que encontraremos algumas das respostas para o futuro."


Luís O. Silva

*


"Sou professor de Física e Química há cerca de 10 anos, neste momento frequento um mestrado na área da pedagogia de Física e Química. Lendo algumas opiniões, conhecendo a situação e vendo o estado dos actuais exames, aqui ficam algumas opiniões pessoais:

- Creio que a nota de matemática se deveu à crónica deficiência na área. A nota de física sempre foi baixa, este ano os exames foram excepcionalmente mais difíceis, daí a nota ter baixado, e só por isso deu nas vistas (até agora era a segunda nota mais baixa e já ninguém falava dela). Apesar destas notas, gostava que se reparasse que as médias das outras também não são propriamente alta...

- Como ciências de ponta, onde todos os factores têm importância, é natural que estas disciplinas revelem mais as deficiências do sistema que as outras. Creio, que enquanto uma disciplina como física necessita de um bom acompanhamento de um professor e de um domínio mais completo da matemática, do português e da física, outras disciplinas como a história ou a filosofia podem ser abordadas muitas vezes na solidão da casa, com o estudante apenas munido de livros.

- Os métodos de ensino existem, têm resultados e são passíveis de ser aplicados. Conheço colegas com graus de sucesso e que pretendem ensinar os seus alunos. Mas também conheço o contrário... e aqui reside um dos grandes problemas da estrutura excessivamente corporativa dos professores. Este ano fiquei a lecionar numa escola secundária em que me entregaram uma das disciplina mais fáceis e menos influentes das químicas. Se lá continuasse iria lentamente a receber disciplinas cada vez mais complexas até o dia em que poderia lecionar o 12º. Noutras escolas, colegas minhas com menos experiência receberam desde logo os 12º anos porque os professores mais velhos não queriam ter «o trabalho» nem «a responsabilidade». Esforce-me a ensinar os meus alunos, ou falte metade do ano, sei que vou progredir na carreira da mesma forma e ganhar o mesmo ao fim de x anos. É assim que o sistema funciona.

- Claro que os alunos não estudam, claro que é difícil a sua preparação. Mas talvez seja a hora de explicar que nem todos tem capacidade de serem neurocirurgiões ou físicos nucleares. Quando o ministério fala de prolongar o ensino obrigatório para o 12º eu penso na via profissional, no regresso aos cursos de carácter mais técnico. Espero que assim seja, porque sinceramente não percebo para que temos de obrigar os nossos alunos a ler os Maias ou a entender os campos magnéticos, quando sabemos de antemão que o futuro de muitos deles é ler «A Bola» ou trocar msgs de telemóvel enquanto esperam na fila para a entrevista de emprego, ou do autocarro.

Há muito para mudar e repensar, já agora uma observação interessante: Num país de maus estudantes e maus resultados, temos um físico como João Magueijo, uma pessoa que curiosamente não percorreu o caminho tradicional do estudante português para chegar ao fim do 12º. Mero acaso?"


Emanuel Ferreira

*

"Os fracos resultados obtidos a Matemática e a Física pelos estudantes do Ensino Secundário não se devem, obviamente, a um único factor. Mas antes de abordar algumas causas que me parecem estar por trás desse fraco desempenho, parece-me que é de realçar um facto tão ou mais preocupante do que este, nomeadamente que em testes feitos a nível da União Europeia (o Estudo Internacional PISA) os estudantes portugueses ficaram muito mal colocados. Temos então que averiguar não só porque é que os alunos do Ensino Secundário têm, nos exames a nível nacional, classificações tão inferiores às que lhes foram atribuídas pelos seus professores, como também porque é que são os piores da União Europeia no que se refere à Matemática.

Creio que é melhor começar por descrever uma aula de Matemática do Ensino Secundário a que fui assistir há sete anos atrás. A aula foi de uma hora, era dirigida a alunos do décimo ano e tratou-se de uma aula normal dada a uma turma normal. A única coisa que foi feita na aula foi a resolução de uma série de exercícios, todos do mesmo tipo, e que consistiam em aplicar uma técnica que já fora dada na aula anterior. Durante uma hora a professora ia propondo exercício atrás de exercício (todos iguais, com ligeiríssimas variações) e, após dar algum tempo aos alunos, mandava um deles resolvê-lo no quadro, corrigindo-o eventualmente em caso de necessidade. Foi-me explicado que ainda se continuariam a fazer exercícios do mesmo género na aula seguinte.

Imagine-se agora toda a matéria de Matemática e de Física do Ensino Secundário a ser leccionada deste modo, anos e anos a fio. A que é que isto leva? A uma situação ainda pior do que a simples análise des médias dos exames nacionais pode levar a supor. De facto, o que acontece é que:

1) A percepção com que a maioria dos alunos fica da Matemática e da
Física é de se tratar da uma matéria para a qual «conhecimento»
equivale a saber fazer uma série de exercícios padrão ou, pior
ainda, aplicar cegamente uma série de fórmulas. Naturalmente, isto
leva a alunos a quem se pede para calcular uma área, dão como
resposta uma quantidade negativa e depois queixam-se a quem os
quiser ouvir que os professores descontam imenso só por causa de
um erro num sinal.

2) Os alunos mais inteligentes e dotados de iniciativa intelectual
sentem muitas vezes repugnância por esses assuntos precisamente por
causa da percepção acima descrita.

3) Um grande número de alunos fica com a impressão de que até têm
queda para aqueles assuntos, ingressando por isso em cursos
universitários dessa área para depois terem um «despertar» muitas
vezes brutal. Tive uma vez alunas do primeiro ano de uma
licenciatura em Matemática a queixarem-se de que «a Matemática no
Secundário é tão fácil que até é chata»!

Mas porque é que as notas dos exames nacionais são tão inferiores àquelas que os alunos costumam ter no final dos anos lectivos? Porque cada vez mais o ensino é compartimentado em pequenas unidades estanques e as boas notas são devidas a testes que são feitos ao longo do ano para examinarem os conhecimentos obtidos nessas unidades. Mas há uma causa mais profunda e mais perturbadora: é que os professores que reprovem um aluno têm que elaborar um relatório a explicar detalhadamente porque é que o aluno em questão não teve aproveitamento e que métodos alternativos de ensino foram empregues. Nestas circunstâncias não deixo de compreeender (embora censure) os professores que optem por baixar a fasquia. Note-se que ninguém incomoda os professores que dêem sempre notas muito altas nem muito menos os professores que não proponham exercícios mais estimulantes aos melhores alunos.

E isto leva-me a mencionar aquela que considero como a maior perversão de todo o sistema, que é aquela que consiste em chamar «insucesso escolar» à taxa de reprovação. Ou seja, ter sucesso não é ter obtido novos conhecimentos, ter integrado os conhecimentos já obtidos numa estrutura coerente ou ter desenvolvido novas competências. Não: «ter sucesso» é «passar de ano» e nada mais. O símbolo torna-se na coisa em si. E esta é a linguagem empregue no Ministério da Educação.
"

José Carlos Santos

*

"Infelizmente a Matemática e a Física são apenas a face mais visível do problema.

O que se passa hoje em dia no sistema educacional é escandaloso. Quer no ensino liceal, quer no ensino superior. Antes de mais vejamos alguns exemplos verídicos: em 2002, no Instituto Superior Técnico, à cadeira de Análise Matemática I, base da formação matemática de todos os cursos daquela universidade, passaram 3% dos inscritos. Na mesma cadeira, mas na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, de cerca de 500 inscritos, só 33 foram aprovados.

Estes são só alguns exemplos de um panorama nacional ultrajante e degradante. Será que só temos escolas que não servem para nada? A continuar assim, apenas nos andamos a enganar e a enganar os outros; são anos e anos da suposta preparação, em que se gasta tempo e muito, muito dinheiro, que de pouco vai servir. São recursos mal alocados, num sistema lento ineficaz e enganador.

Ora vejamos: em primeiro lugar está a escolaridade básica e obrigatória que nada mais é que uma fantochada. Se por acaso tivéssemos como colegas, alunos interessados e trabalhadores e bons professores, talvez o sistema até funcionasse. Porém não podemos partir do princípio que todos os alunos são interessados e trabalhadores, principalmente quando a práctica nos diz que são poucos. E quanto aos bons professores? Nem sempre os professores são bons, mas são injustas a maioria das críticas que a opinião pública e muitas vezes o próprio ministério faz aos professores. Um bom professor faz-se não só por ele próprio, mas também pelos alunos que têm. Que ânimo terá então qualquer professor, bom ou mau, se os seus alunos não se interessam minimamente e se não dispoem de um mínimo de ferramentas que lhe permitam aumentar a exigência? A verdade é que nos tempos que correm, é muito, mas mesmo muito raro alguém chumbar até ao 9º ano. Vêem-se alunos passar com mais de duas negativas e muitas vezes até com reprovação às disciplinas de Português e Matemática, que antigamente eram os dois monstros sagrados, a que ninguém podia chumbar simultâneamente.

Que estímulo terá então um professor que por tão maus que sejam os seus alunos os vê passar para o ano seguinte, sem que pouco possa fazer? Sim, porque os procedimentos para se chumbar um aluno são tão complicados, que a própria burocracia se encarrega de o fazer passar. E que vontade de fazer um esforço extra tem o aluno que já não é muito dado aos livros e que sabe que se não se esforçar passa na mesma? Que ânimo dá isto aos bons alunos que no fim de um ano de trabalho são apenas premiados com a aprovação dos colegas que nada fizeram para a merecer? Com este sistema, só as estatísticas ganham e mais nada.

No ensino secundário, o percurso deixa de ser tão facilitado, mas a base é a mesma: os níveis de exigência são um pouquinho superiores mas ainda assim os professores de hoje em dia foram amputados dos mais básicos meios de contolo e exigência, como por exemplo os trabalhos de casa, que muitos alunos, simplesmente abstêm-se de fazer. Os liceus são hoje em dia uma salganhada, uma mistura de escola para os alunos que pretendem ir para universidade e de jardim-escola para uma grande percentagem de desorientados que não sabe bem o que há-de fazer da vida, mas que por lá vai passando o tempo até se decidir.

E chegando ao ensino superior? Bem de tanta liberdade há alunos que se dão ao luxo de chumbar todas as cadeiras do primeiro semestre. Há elevadíssimas percentagens de reprovações nos primeiros anos e também de alunos que nesses dois primeiro anos mudam de curso, universidade, ou que abandonam mesmo a vida de estudante.

Estes são apenas alguns dos problemas que afectam a educação nacional, a nível do percurso académico e formação dos alunos. Concerteza haverá quem diga que também os encontramos no conteúdo da informação fornecida aos estudantes, bem como nas saídas profissionais, no acesso ao ensino superior e até mesmo nas infra-estruturas. Não digo que não, mas em minha opinião grande parte do problema da educação nacional poderia ser resolvido solucionando os problemas cujas manifestações acima descrevi. Para tal apresento algumas soluções, que, a meu ver, contribuiriam muito, caso fossem aplicadas.
Em primeiro lugar é absolutamente necessário exigir. Ninguém trabalha se não se exigir, se não existirem patamares de qualidade e de obrigatoriedade. Exija-se e premeie-se os trabalhadores. Crie-se não só uma cultura de trabalho e produção como de louvor e exaltação desse mesmo trabalho. Não se pode permitir o desleixo nem o eterno desafogo, que permitem aos alunos, mesmo não trabalhando, continuarem a progredir no seu percurso escolar. Notas negativas existem e são para se dar quando merecidas, assim como as notas elevadas, se os alunos o merecerem.

A cultura da mediocridade não pode continuar e portanto não se pode nivelar por baixo. Advogo a separação entre maus e bons alunos. Não por descriminação mas pelo facto de que, em turmas mistas, ou se acompanha o ritmo dos bons alunos, o que torna ainda mais difícil a aprendizagem dos alunos mais fracos, ou se procede conforme as capacidades dos mais fracos, o que pode provocar o desinteresse dos bons alunos e um subaproveitamento das suas capacidades. Assim ninguém aproveita. A meu ver, seria portanto favorável criar-se turmas adequadas ao nível de cada grupo de alunos.

A escolaridade obrigatória é, sem dúvida, uma conquista preciosa e necessária a toda a população. Mas escolaridade obrigatória não é sinónimo de infantário ad aeternum, ou de depósito de crianças e muito menos de parque de diversões. Sai muito caro ao estado manter um aluno quer no ensino básico, secundário ou superior e portanto não se deve permitir o autêntico estado de sítio em que muitas instituições vivem. Os alunos reprovam uma vez, duas vezes, três vezes, até quatro... e continuam a poder estudar como todos os outros. Tal não deveria acontecer: são permitidas um número limitado de reprovações e partir de então, caso voltasse a chumbar o aluno deveria ser obrigado a financiar a sua própria educação. Aconteceria uma de duas coisas: ou abandonavam a escola, - o que nunca é agradável - ou acabaria o regabofe. Nos dias que correm ao permitir-se que os alunos reprovem como reprovam, permite-se que se roube ao Estado, que se roube aos pais e educadores que têm de sustentar mais tempo os seus filhos em casa e permite-se ainda que as escolas e universidades sejam povoadas por ociosos que têm exactamente os mesmos direitos que os trabalhadores.

É necessário compreender-se e fazer-se compreender que para se alcançar o sucesso não é obrigatório passar-se pela universidade, nem que seja só pelo simples facto de que há pessoas que não foram feitas para estudar. E para tal é também preciso criar alternativas dignas e de qualidade que permitam o acesso à via profissional e também o colocamento na vida activa do país. Um país só de doutores é um país que não sabe reparar canos furados, não tem pessoas capazes de construir casas, nem móveis e que não cultiva os seus campos. E a educação também passa por apoiar e patrocionar (e isto não significa apenas dar subsídios) jovens artistas, músicos, pintores, escultores, escritores e tantos outros necessários a uma boa saúde cultural do país.

Quem faz um país são os seus habitantes. E um bom país precisa em primeiro lugar de cidadãos e depois de cidadãos educados, cultos e bem formados. Isso não significa que todos necessitem de ir à universidade, nem que passem anos infindáveis sentados em carteiras de escola. Significa apenas e só que lhes seja dado o direito de receberem uma formação útil, de qualidade e adequada às necessidades futuras, sendo-lhes exigido um esforço, dedicação e trabalho necessário à produção de um processo de aprendizagem de qualidade e exigente.

Não podemos continuar a formar indivíduos medíocres, nem a enganar tudo e todos sob o bom nome da nobre acção de educar."


Francisco Delgado


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PERCA

O Terras do Nunca lembra-me que no “EARLY MORNING BLOGS 22, onde está a palavra perca seria preferível estar perda. O primeiro termo é uma versão popular, mas a verdade é que, enquanto substantivo, corresponde a uma espécie de peixe.” Neste caso não era nem erro, nem gralha, era voluntário (no entanto, fiz a substituição pedida).

É daquelas palavras a que uma pessoa, uma escrita, se agarra há tanto tempo que não sabe dizer certas coisas sem elas. Faço esta nota porque me permite recordar uma amiga que já morreu, M.J.A., e que também nos idos da ditadura me lembrou que não se usava “perca”. Num texto qualquer clandestino , eu com o nome de “Rui” ou “Carlos” já não me lembro, usei a palavra “perca” e M.J.A. que se chamava então “Saúl”. lembrou , em devida comunicação ao “organismo superior” (que era eu) , que o uso dessa palavra poderia identificar o “camarada Rui”…
É por isso que eu resisto em perder a perca.

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FÍSICA E MATEMÁTICA – COMENTÁRIOS (Actualizado)

"Algumas considerações rápidas sobre a questão do ensino da física e da matemática:

1. O objectivo do ensino não deve ser preparar os alunos para um exame, mas ministrar os preceitos da ciência em estudo. Só assim se cria o espírito críto tão importante para o desenvolvimento intelectual e para o avanço da própria ciência.

2. Os exames não têm nem devem reflectir a qualidade do ensino. Um exame deve ser um seleccionador, ou seja, permitir distinguir os melhores, os que têm maior aptidão, os que conseguém ir além da norma. Só assim se pode incentivar a meritocracia e a competição. Caso contrário, e considerando a pouca qualidade no ensino nacional, acabaremos por ter uma massa uniforme de alunos em que todos aparentam ter competências equivalentes.

3. O ensino nacional é de facto muito mau e está completamente ultrapassado. O estudo de ciências naturais ainda continua a ser feito à custa de tediosos manuais quando deveria recorrer cada vez mais à experimentação, ao trabalho de campo e à investigação. A física é a ciência que interpreta as leis da Natureza. Logo, o seu estudo deveria iniciar-se na experimentação, só depois passando para a matemática. E a química? E a biologia?

Enfim... Pode ser que um dia alguém faça uma reforma do ensino. Até lá, teremos que viver com remendos!"
(Olindo Iglesias)


Acerca das más notas nos exames de matemática, eu tenho uma teoria (baseada na minha experiencia de há 11 anos atrás, logo já deve estar desactualizada):

Durante o secundário, os alunos fazem o teste, e depois o professor olha para o teste: se está tudo bem, o aluno tem a cotação toda; se está quase tudo bem, mas, a dada altura, o aluno trocou um "+" por um "-", tem parte da cotação; se o metodo de resolução de exercicio está mal de partida, o aluno tem "0" (nessa questão).

Não sei como é actualmente, mas há 11 anos, os exames eram por escolha múltipla, o que faz com que qualquer erro anule a questão, já que o aluno vai por a resposta no quadradinho errado. Inclusivamente, "trocas de sinais" acabam por ser mais penalizadas do que a ignorancia pura e simples, já que, quem não sabe, pura e simplesmente, não responde, tendo "0" nessa questão; quem comete um engano, muitas vezes acaba por
responder no quadradinho errado (até porque as "respostas alternativas" são feitas já a pensar nos erros mais prováveis), e logo, não só não tem cotação, como até vai descontar nas outras respostas.

Talvez seja essa a razão pelo qual alunos que foram sendo aprovados no Secundário "afundam-se" nos exames (mas não me pergunte qual dos dois sistemas é o melhor que eu não faço ideia)
.” (Miguel Madeira)


Como professor que sou, embora de história, tenho por hábito reflectir e tentar analisar o estado do ensino em Portugal.
Como se deve depreender, muito há para reflectir e analisar. Em relação ao seu comentário sobre as causas desta situação, considero que as duas que aponta são verdadeiras.
Por um lado, o ensino da Física e da Matemática não prepara os alunos para os exames. Por outro, os exames e respectivos de critérios de avaliação não têm em conta as condições reais de ensino.
Este problema pertence a vários intervenientes, e não podemos dele retirar os alunos. Basta ver que há muitos bons alunos, com óptimos resultados. Só que estas disciplinas não se compadecem com a falta de disciplina e de métodos de trabalho rigorosos e exigentes. Ora, por mais que os professores queiram, por mais qualidade que tenham, não conseguem motivar todos os seus alunos a trabalhar o necessário para atingirem os objectivos por todos pretendidos, os bons resultados.
Se é verdade que um professor tem que se esforçar ao máximo para que o maior número possível dos seus alunos atinja bons resultados, também é verdade que é praticamente impossível que todos o consigam.
Onde está a fronteira do possível? Se a maioria dos alunos tem resultados positivos o professor pode dar-se por satisfeito? Não.
Um professor nunca está satisfeito com os resultados que os seus alunos conseguem obter. Mas o que é certo é que os resultados que eles conseguem obter também não dependem apenas dele.
Dependem então de quê? De múltiplos factores como o professor actual, os professores anteriores, o esforço dos alunos, a adesão e motivação dos alunos ao ritmo de trabalho imposto, dos programas, dos critérios de avaliação, enfim, de uma quantidade enorme de factores a que não podemos subtrair as condições familiares, financeiras, emocionais, e outras. Nenhum destes factores é determinante, mas há uns mais determinantes que outros.
Na realidade, tudo gira, em última análise, à volta do professor e do aluno. Porquê então subtrair o aluno como factor importante a ter em conta?

Por todos estes factores, e por não me querer alongar mais, considero que isentar os alunos das suas responsabilidades não é uma boa resposta
.” (Fernando Reis)


José Carlos Santos chama a atenção para esta mensagem que surgiu no newsgroup pt.ciencia.geral:

Assunto: Sobre o ensino da ciência

Sou um aluno do ensino secundário e estou agora a preparar-me para os exames nacionais de física e matemática (da segunda chamada). São duas disciplinas difíceis, é verdade mas também tenho consciência que este ultima ano, o meu empenho foi mínimo. E há várias razões para isso.

Sempre tive um certo interesse por astronomia, magnetismo, electricidade quando isso era dado nas aulas ate ao 9º, i. e. eu gostava de física, lia livros de divulgação cientifica de qualquer da área. Arrastei me ao longo de 2 anos de físico-química do secundário. Apenas se davam forças e movimentos mas lá ia fazendo a disciplina. Chegado ao 12º ano, estava ansioso, a matéria mais abrangente toda a disciplina um pouco mais desafiadora, julgava que ia ser interessante.

Estava enganado. Ao longo do 12º ano não tive uma única aula de física! O que eu tive seria mais correctamente chamado de aulas de preparação para o exame de física do 12º ano. Da primeira á ultima aula, com tendência a aumentar a medida que nos aproximávamos do fim do ano, só se falava no exame. Em vez de nos ensinar física, explicaram nos como resolver "este tipo de exercícios de física, pois são típicos de exame!". A prof. lê alto do manual, propõe uns exercícios que acaba por resolver, os alunos entram no esquema e sabem com que formulas jogar para obter o resultado, e pronto. Hordas de colegas meus, chegam ao extremo de decorar, i. e., pôr na cabula, todas as formulas de todos os exercícios que já resolvemos na aula. Chegam ao teste e passam. E provavelmente repetem a proeza no exame. Isto faz me lembrar a ciência do culto da carga de que Feynman descreveu. As pessoas sabem resolver os problemas com recurso ás formulas sem fazerem a mínima ideia do que se esta a passar. Sabem as formulas de cor mas não sabem interpretar as formulas para explicar alguma coisa a luz daquilo que sabem. As pessoas SABEM mas não COMPREENDEM.

Dizem nos que há disciplinas das quais nunca mais nos vamos servir para o resto das nossas vidas, mas que servem para desenvolver o raciocínio. Mas, da maneira como supostamente se ensina a Física garantidamente não aprendemos a pensar, antes pelo contrario, ensinam nos a aceitar passivamente o que os profs. nos apresentam sem questionar sem perceber, afinal o que importa são os teste e um bom exame.

Quase tudo o que disse se aplica a matemática do 12º. As coisas caiem do céu e nós temos que as absorver para o grande exame.
-Para resolver este problema, que é típico de exame, usam este truque assim, assim...
-Mas stôr, qual é razão de isso funcionar?
-Ah isso não interessa, funciona e acabou-se.
De uma maneira geral a matéria caí do céu desconexa do resto da matéria.
-Número de Nepper serve para... para... têm muitas aplicações, não importa quais!

É assim que os professores respondem a muitas perguntas feitas por sincera curiosidade. Curiosidade essa que é frustrada, por que não contribui para fazer um bom exame. Como é que um sistema educacional assim quer cultivar o interesse pela ciência? Não é um paradoxo gastar dinheiro em projectos que aproximam os jovens da ciência quando na escola esse interesse é sistematicamente destruído?

Conforme se deduz do primeiro parágrafo o ano correu me mal. Não estou a culpar outros por aquilo que só eu sou responsável, estou a apontar um problema que penso ser grave. Numa sociedade onde um mínimo de espírito critico é necessário para nos protegermos de aparelhos que supostamente curam recorrendo a feixes de neutrinos e outras tretas, é triste ver em que estado esta o ensino da ciência que supostamente nos ensina a pensar. Corrijam-me se estou enganado
.” (David Asfaha)


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FÍSICA E MATEMÁTICA

O problema das notas de Física e Matemática dos exames do 12º ano revela uma deficiência estrutural gravíssima do sistema educativo português. São matérias em que não tenho qualquer capacidade de avaliação própria sobre os programas, mas em que entra pelos olhos dentro de qualquer amador que há algo de muito errado. Acresce que Física e Matemática são disciplinas estratégicas para qualquer sistema de ensino que pretenda um mínimo de qualificação e para a modernização do país. Sem elas todo o edifício da educação científica cai.

O sistema educacional público presta um serviço fornecendo aulas de Física e Matemática aos alunos do ensino secundário. Depois o mesmo sistema avalia-os e chega à conclusão que os seus resultados estão estatisticamente abaixo dos critérios mínimos. Segundo o Público, a média em Física na 1ª chamada é de 8,1 valores e 7 na segunda, e, em Matemática, respectivamente 9,3 e 7,4.

Uma de duas coisas está errada, ou as duas. Ou o ensino de Física e Matemática é ineficaz para preparar os alunos para o exame, ou os critérios de avaliação não correspondem à qualidade do ensino, mas a uma ideia abstracta de como ele deveria ser. Este é um dos casos em que claramente toda a responsabilidade está a montante dos estudantes que são as suas vítimas.

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EARLY MORNING BLOGS 22

Mário Filipe Pires do Retorta escreveu-me sobre as horas de actualização dos blogues nocturnos:

Acerca da entrada que fez com a imagem dos anjos, queria dizer-lhe que as aparências podem iludir.
Embora pense que a maioria dos sistemas não o permite, no meu caso o Typepad permite definir a data de publicação de uma entrada, quer no futuro, quer no passado.
No meu weblog visual Lumen, deixo as entradas programadas para serem publicadas por volta da uma e um quarto da manhã, quando eu já estiver fora do computador.
É esse sistema que me vai permitir deixar entradas definidas quando for para férias. No meu weblog principal não conto fazer isso, mas tanto no Estética-metrica como no Lumen assim farei.”


Esta e outras questões sobre a manipulação do real no virtual têm uma dimensão crescente pela cada vez maior importância do mundo virtual, e pela maior eficácia das ferramentas de manipulação do real. Horas, lugares, fotografias, textos, identidades, autorias, personae, tudo pode ser manipulado no mundo virtual para parecer o que não é. Mas será que já era aquilo que parecia? E como é que o nosso desejo se liga, “se linka” entre o real e o virtual? Só com perda? Talvez com ganho? Onde, em cada linha electrónica, feita do “azul eléctrico” de que falam os Reflexos está escondida a “Hot babe” da Carta Roubada?

Exactamente porque esta fronteira ficcional é cada vez mais débil e entra cada vez mais para dentro do mundo dos átomos, é que no mundo virtual se vai poder “escrever” (”ver”,”viver”) as mais absolutas das ficções. A arte do futuro vai viver ali, naquelas dimensões imateriais tornadas carne visível pela fragilidade dos nossos sentidos. Para a arte não é novidade, para o homem que vive entre os signos também não, mas para as massas é a nova forma da Catedral. Razão tinha o sr. Naphta na Montanha Mágica – o mundo vai ser colectivo para os pobres, individual para os ricos. Cada vez mais.

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ESTADO DO ABRUPTO (JULHO 2003)

Como todos podem ver o último contador, o mais recente mas o mais público, passou ontem os 100000. De facto, o número de “pageviews” desde 6 de Maio , ou seja há três meses, é bastante superior aproximando-se das 130000 ( pelo Bstats, o contador com a série mais longa).

No dia 2 de Julho atingiu 3700, o maior número de leituras registado. A média actual de “pageviews” diária é de mais de 2200 ( mais de 100 do que no mês passado) notando-se um decréscimo de médias desde valores à volta de 2500, na primeira quinzena, à medida que o mês de Julho entra na segunda quinzena. Tanto pode ser um efeito de férias, como uma perda de interesse dos leitores. Ver-se-á.

Nos outros elementos estatísticos – distribuição dos leitores no mundo por fusos horários, dias, horas de maior afluência, e origem dos visitantes - não há grandes variantes em relação a Junho.

As “acções” no Blogshares conheceram uma subida acentuada, seguida de um queda, seguida de uma outra subida vertiginosa (atingiram 432 dólares) para depois caírem de novo, abruptamente, para 124 o valor actual. Parece haver alguma especulação bolsista à volta do Abrupto.

Talvez a mudança mais significativa entre os dois meses seja a do número de blogues e de referências que se ligam ao Abrupto : segundo o Technorati há hoje 356 “inbound Blogs” e 492 “inbound Links” no blogosfera.

Estes números revelam que o Abrupto tem neste momento uma dimensão comparável a um pequeno órgão de comunicação, com um número regular e estável de leitores diários, muitos dos quais são exteriores à blogosfera. É uma comparação que não recuso, embora esteja longe de esgotar para mim o sentido do Abrupto.

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© José Pacheco Pereira
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