ABRUPTO

30.6.04


ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO

em actualização.

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EFEITOS

Um dos efeitos induzidos do populismo é a deserção do centro político. Porque é difícil, porque dá trabalho, porque não dá votos, porque não brilha na televisão, porque não estou para me aborrecer com esses miúdos, porque tenho mais que fazer, porque isto já não tem salvação, porque é o que as pessoas querem, porque não vale a pena fazer nada, porque …

Passaremos a ter um combate entre o Bloco de Esquerda e o Bloco de Direita. É a luta final…

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OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: DE NOVO, A BELEZA



Na NASA alguém falou de "peaceful beauty" a pretexto deste planeta, na sua glória e esplendor. Olha-se para a fotografia, da sonda Cassini que chega hoje a Saturno, e vê-se o silêncio, o movimento perfeito dos gases, a matemática da lei dos grandes números a domar o caos, num equilibrio quase impossível. O Sol come uma parte da esfera e dos anéis com a sua sombra. Tudo parece frio e silencioso, exceptuando essa pequena máquina humana, rugosa e eriçada de antenas, que está a colocar-se para nos dar, aos nossos olhos, mais um pouco da beleza do mundo.

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DEPOIS DO EARLY MORNING, DOIS EARLY MORNING, OU UMA CANÇÃO DE MISS ELLA PARA REFRIGÉRIO DAS ALMAS PREOCUPADAS

Não resisto. Estou à procura do tom certo para o artigo do Público. Difícil. Difícil. Não é a falta de tema, é a abundância de tema. O tom. O difícil é o tom. Inspiração em Miss Ella Fitzgerald. Está tudo aqui:

Gather 'round me, everybody
Gather 'round me, while I preach some
Feel a sermon coming on here
The topic will be sin
And that's what I'm agin'
If you wanna hear my story
Then settle back and just sit tight
While I start reviewing
The attitude of doing right

You got to ac-cent-tchu-ate the positive
E-lim-i-nate the negative
And latch on to the affirmative
Don't mess with mister inbetween

You got to spread joy up to the maximum
Bring gloom down to the minimum
And have faith, or pandemonium
Liable to walk upon the scene

To illustrate my last remark
Jonah in the whale, Noah in the ark,
What did they do, just when everything looked so dark?
Man, they said, we better

Ac-cent-tchu-ate the positive
E-lim-i-nate the negative
And latch on to the affirmative
Don't mess with mister inbetween


Pois é. E o tom? Já sei que “The topic will be sin”. Atitude, a de “doing right”. Bem vistas as coisas, o mundo não acaba amanhã. E se calhar temos mesmo que ter a lição colectiva de que “a prova do pudim está em comê-lo”. Vai ficar caro, o pudim… “have faith, or pandemonium”. Pandemonium, mais provavelmente. Pandemonium, grande palavra. Tudo à solta. Noé na arca, Jonas dentro da baleia.

You got to ac-cent-tchu-ate the positive
E-lim-i-nate the negative
And latch on to the affirmative
Don't mess with mister inbetween.


A continuar assim, não há artigo.

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EARLY MORNING BLOG 239

L'inverno si prolunga, il sole adopera


L'inverno si prolunga, il sole adopera
il contagocce. Non è strano che noi
padroni e forse inventori dell'universo
per comprenderne un'acca dobbiamo affidarci
ai ciarlatani e aruspici che funghiscono ovunque?
Pare evidente che i Numi
comincino a essere stanchi de presunti
loro figli o pupilli.
Anche più chiaro che Dei o semidei
si siano a loro volta licenziati
dai loro padroni, se mai n'ebbero.
Ma...


(Eugenio Montale)

*

Bom dia ! E cuidado lá fora!

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29.6.04


ELE HÁ



janelas assim. Ar fresco.

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POBRE PAÍS

o nosso.

O abaixamento dos mínimos critérios de qualidade, vindo “de cima”, é um poderoso factor de popularidade e sucesso. No fundo, ficamos todos mais iguais, não é? E não é esta “igualdade”, o nome que se dá à inveja ressentida que tão profundamente enche a nossa sociedade?

Pensando bem não é de admirar, é o mundo de Eva Péron, a mulher que dizia que não se importava que houvesse pobres, o que a incomodava é que houvesse ricos.

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POBRE PAÍS

o nosso.

Há uns anos, nos momentos mais complicados de dissolução da URSS, nada funcionava na Rússia. Todos os dias de manhã, no Hotel Ukraina, o pequeno almoço era uma saga. Chegava o samovar com o chá e não havia chávenas lavadas. Chegavam as chávenas, não havia colheres. Chegavam as colheres e não havia chá outra vez. Os estrangeiros recém-chegados protestavam em vão. Os russos e os velhos habitantes do Hotel Ukraina, que já conheciam todas as rotinas, iam buscar chávenas à cozinha, acumulavam duas ou três chávenas em cima da mesa para armazenar o precioso chá, etc. Um amigo meu disse-me: “vais ver, ao quinto dia já estamos como eles, a ir buscar chá à cozinha, muito caladinhos”. Ao terceiro dia já íamos buscar chá à cozinha.

Não há nada como o hábito e como o sentimento de impotência para que se aceite tudo. Não há nada como a ecologia envolvente para se achar tudo normal. O resvalar contínuo para a mediocridade, o abaixamento dos requisitos mínimos, que antes juraríamos nunca aceitar. Que eram mesmo inimagináveis. Não, meus amigos, é na cozinha que está o chá, que estão as chávenas, que está o açúcar. É na cozinha. O que é que querem mais? Qualidade no serviço? Isso não é aqui. Nem no Hotel Rossya, do outro lado.

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EARLY MORNING BLOGS 238

A Sancho Panza (Fragmento)

Sancho-bueno, Sancho-arcilla, Sancho-pueblo,
tu lealtad se supone,
tu aguante parece fácil,
tu valor tan obligado como en la Mancha lo eterno.
Sancho-vulgar, Sancho-hermano,
Sancho, raigón de mi patria que aún con dolores perduras,
y, entre cínico y sagrado, pones tu pecho a los hechos,
buena cara a malos tiempos.

Sancho que damos por nada,
mas presupones milenios de humildad bien aceptada,
no eres historia, te tengo
como se tiene la tierra patria y matria macerada.

Sancho-vulgo, Sancho-nadie, Sancho-santo,
Sancho de pan y cebolla,
trabajado por los siglos de los siglos, cotidiano,
vivo y muerto, soterrado.

Se sabe sin apreciarlo que eres quien es, siempre el mismo,
Sancho-pueblo, Sancho-ibero,
Sancho entero y verdadero,
Sancho de España es más ancha que sus mil años y un cuento.

Vivimos como vivimos porque tenemos aún tripas,
Sancho Panza, Sancho terco.
Vivimos de tus trabajos, de tus hambres y sudores,
de la constancia del pueblo, de los humildes motores.

Sancho de tú te la llevas,
mansa sustancia sin mancha,
Sancho-Charlot que edificas como un Dios a bofetadas,
Sancho que todo lo aguantas.

Sancho con santa paciencia,
Sancho con buenas alforjas,
que en el último momento nos das, y es un sacramento,
el pan, el vino y el queso.

Pueblo callado, soporte
de los fuegos de artificio que con soberbia explotamos,
Sancho-santo, Sancho-tierra, Sancho-ibero,
Sancho-Rucio y Rucio-Sancho que has cargado con los fardos.

[...]

(Gabriel Celaya)

*

Bom dia!

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28.6.04


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: UMA CERTA FORMA DE PERFEIÇÃO


esta.

Faltam três dias para lá chegar.

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CORREIO 4 E ABRUPTO

Continuam a chegar centenas de mensagens, pelo que me é impossível agradecer a todas. Uma selecção do seu conteúdo será publicada logo que possa.

O Abrupto baterá também hoje o seu recorde absoluto de visitas e "pageviews", estando já próximo das 10000 . Alguma coisa está a mexer lá fora e ainda bem.

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É O QUE ACONTECE

Cito do precioso e erudito Almocreve

"Uma nêspera
estava na cama
deitada
muito calada
a ver
o que acontecia

chegou a Velha
e disse
olha uma nêspera
e zás comeu-a

é o que acontece
às nêsperas
que ficam deitadas
caladas
a esperar
o que acontece"


[Mário Henrique Leiria]

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PELA CORAGEM



Para a Manuela Ferreira Leite.

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O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES

"Que raio de Europa é esta que privilegia as pessoas aos estados membros? Que convida pessoas independentemente das suas funções, independentemente de colocar as situações internas dos estados membros em "crise"? Que não tem (aparentemente) qualquer percepção do clima e da vida interna dos seus estados membros?"

"O silêncio, conveniente ou intimidatório é o apanágio de Portugal. Temos a “qualidade” de só procurar confronto quando nos enquadramos na linguagem final do interlocutor. Ou seja, nunca é desafiada a linguagem final, nunca são postos em causa os limites ou os estratagemas da linguagem ou do discurso. Tudo se passa dentro de uma esfera em que seja permitida, em última instância, a conciliação. Só assim nos sentimos bem. Só assim nos sentimos “dentro”. Provocar... sim. Confrontar... dentro dos limites. Mas, na realidade, tudo se destina a obter protagonismo. Não se trata nunca de confronto "sentido". De desafio de linguagem ou conceito. De defesa ou ataque de ideias convictas. CONVICTAS! São coisas, a vida portuguesa é apenas um perpétuo fait divers. Será que isto acarreta alguma qualidade? Talvez..., aquela que releva da aprendizagem que faço do meu gato quando me demonstra, todos os dias, que o tempo não existe. Lembro sempre nestas alturas o meu querido amigo Agostinho da Silva quando me dizia que o povo português se situa numa encruzilhada: “povo de ateus, de moral católica. Povo que esqueceu Cristo e nunca conheceu Maomé”
.

(Paiva Raposo)

*

Alexandre Monteiro no seu blogue.


*

"A "blogosfera" já existia mesmo antes de haver blogs com esse nome.
Nesses tempos pré-históricos (já nem me lembro dos anos) também a Internet foi o veículo de reflexão, debate e acção. Houve certamente vários casos. Lembro-me pelo menos de dois onde estive directamente envolvido, embora na altura a difusão da Internet não atingisse a dimensão de agora.

O primeiro foi um debate sobre o Aborto na altura do referendo. Eu era o director de Informática da Católica do Porto e resolvi tentar um fórum de debate realmente sério, uma vez que as campanhas de ambos os lados pareciam usar todos os argumentos errados e intelectualmente desonestos... Apesar de algum receio inicial meu por estar numa instituição que à partida tinha uma posição definida, consegui que houvesse participações de todas as tendências (incluindo responsáveis do Sim pela Tolerância e do lado do Não que já não me lembro como se chamava), tendo-se tornado o fórum online mais bem sucedido a nível
nacional. :-) (Modéstia à parte...)

Um dia destes vou voltar a colocar online o arquivo que guardei. O fórum era moderado (havia moderadores quase 24 horas por dia, coordenados por mim) e, entre outras medidas para o tornar transparente, tinha um espaço de acesso público onde foram colocados _todos_ os comentários que chegaram, mesmo os recusados na zona principal.

O segundo caso foi na altura do desaparecimento da XFM, em que o site que eu geria com o meu irmão mais novo se tornou o centro das tentativas frustradas de recuperação da rádio.

Isto já parece há séculos... Mas mesmo nessa era a Internet já proporcionava resultados visíveis."


“Sozinho? Não faz mais do que a sua obrigação ;-)


(Tiago Azevedo Fernandes)

*
"Parece-me que o JPP (…), sente-se traído com algo, julgo que se sente traído por Durão Barroso e que o resto vem por acréscimo, mas, acima de tudo, julgo que se sente traído pelo PM."

(Luís Miguel Rocha)

*

"Rapidamente, alguém deve vir explicar ao cidadão comum o que é que se está a passar. As pessoas começam a desconfiar e a sentirem-se desrespeitadas. Eu ando na rua todos os dias e sei o que é que preocupa as pessoas, E nem todos andam embriagados com a bola do Euro. Há gente preocupada e que não tem meios para perceber o que é que se está a passar. O povo tem casa para pagar, os filhos para criar, vê o emprego a fugir. Por favor! Alguém nos oiça e nos explique o que se passa com o nosso governo e os nossos governantes."

(André Ferreira)

*

"Mesmo assim, confesso que ao ler o Abrupto ainda não percebi contra exactamente o quê que JPP se está a manifestar: Se contra Santana Lopes por achar, comos achamos muitos de nós, que é uma figura que tem um perfil populista e demasiado irresponsável para ser primeiro-ministro, ou contra a legitimidade, ( já que, ao que parece a legalidade, não se põe em causa ), de quem quer seja de assumir o cargo, não tendo sido o líder que foi, ainda que indirectamente, a votos.

Na minha opinião, mesmo Manuela Ferreira Leite, Marques Mendes ou outro qualquer não tem legitimidade para governar se não for a votos como líder partidário. Sobretudo tendo em conta o clima de contestação social que se vive, a derrota nas eleições europeias, que não foi, obviamente, uma derrota de Deus Pinheiro e sim da coligação governativa, e atrevo-me a dizer, depois do padrão ético que se estabeleceu com a demissão de António
Guterres."


(S. Joffre Gouveia)

*

"O que mais me arrepia nesta história (ou estória?) é a inquietante sensação de que muita gente ficará a pensar que não vale a pena termos a maçada de ir votar nas eleições. António Guterres foi-se embora porque teve um resultado desfavorável numas eleições, Durão Barroso vai-se embora porque, dizem, é importante para a Europa (????) e para Portugal (????) a sua ida para a Presidência da Comissão Europeia. Então para quê ir votar? Para que, a meio do mandato e inopinadamente, aquele que elegemos se ponha a andar por conveniências impossíveis de explicar e entender? Realmente talvez seja melhor nas próximas eleições irmos para a praia do que arriscarmo-nos a ver o nosso voto desprezado e adulterado."

(Dionísio Leitão)

*

No suprises

A heart that´s full up up like a land fill.
A job that slowly kills you. Bruises that won´t heal.

You look so tired and happy.
Bring down the government, they don´t, they don´t speak for us.

I´ll take a quiet life, a handshake, some carbon monoxide.
No alarms and no suprises,
No alarms and no surprises.
Silent,
silent.

This is my final fit, my final bellyache with no alarms and no surprises.
Such a pretty house, such a pretty garden.

No alarms and no surprises.


Thom York – Radiohead (enviado por Paulo Raimundo)

*

"Peço-lhe apenas que não ridicularize este exacerbado apoio do nosso povo à selecção de futebol, bem sei que talvez pareça exagerado, no entanto, não me parece que seja sinónimo de ignorância, insensatez e/ou falta de interesse pelos verdadeiros desígnios nacionais. Penso que nunca como hoje o povo português teve um sentido crítico tão apurado e conhecedor. Há apenas que admitir que o euro 2004 e a nossa selecção são um bom “balão de oxigénio” para a nossa sociedade e até para o nosso Governo, queira este aproveitar a aglutinação de optimismo e de moral."

(Rui Alvim Pinheiro)

*

"O problema, o malfadado nó cego, é que o golo, o resultado, o grito do jogador que vence, tem impacto imediato. Não é a prazo. Existe, pode-se ver e constatar sem o auxilio de estatísticas. A retoma está aí? É possível. Mas viu-a? Acotovelou-a ao balcão durante o rito do café? Pois é, o ingrato lusitano urra desmamado pelo golo do seu ídolo, extensão concisa do seu clube de bola (esse sim o partido que importa à maioria dos nacionais), apenas e só por ser o gesto que de si depende. Senão, veja um pai desempregado. O ministro e o comentador prometem-lhe tempos risonhos. Está aí a viragem, falta pouco. Por sua vez, os da tal oposição, que não, que ainda não é desta, que eles é que sabem, que um dia, que quando forem eles... E o coitado, sem fonte de rendimento, sem as notas no bolso, sem a vontade e com a vergonha de confessar ao filho que até talvez tenha passado honrosamente o ano lectivo e merece a tal bola para chutar nas férias, sente na explosão da bola dentro da baliza o bálsamo que o resto da vida teima em recusar. Porque o problema, o verdadeiro problema é que o comum dos portugueses vive no dia a dia. E nesse palmilhanço rotineiro há que sentir a satisfação mínima e o doping que impele a manhã seguinte."

(José Barata)


*

"Para ter orgulho no nosso país é necessário ter ídolos, mas onde eles estão?!! Já não os há como houve outrora.Os ídolos, noutros tempos , eram valorizados e compreendidos pelas suas qualidades,pelo seu carisma, pelo valor, pela honestidade, não pela imagem, não pelo protagonismo, não por nada. Agora, para ser ídolo basta ser famoso , ou seja,ser pela imagem que transmite e nada mais,porque não é preciso!!

Sem ídolos, não há referências,não há rumo, não há sacríficios....
Nos últimos anos, só o futebol nos tem dado ídolos....

No entanto, os ídolos do futebol transmitem valores como disciplina, concentração,respeito, (o árbitro tem mais poder num campo de futebol do que um juíz tem num julgamento), organização.Defendem o nome de Portugal no mundo.Canta-se o hino nacional onde não se canta em mais lado nenhum.
"

(Gonçalo Pacheco Pereira)

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EARLY MORNING BLOGS 237

Ce qui doit m'étonner excite mon courage


Ce qui doit m'étonner excite mon courage,
Et ma témérité me conduit au cercueil ;
Je sers une beauté plus dure qu'un écueil,
Et l'amour se conserve où l'espoir fait naufrage.

Aveugle passion, fureur, manie et rage,
Vous faites que j'adore un insensible orgueil.
Le plus cruel abord est comme un doux accueil,
Et j'appelle un mépris un agréable outrage.

J'ai pour toute faveur, et pour rigueur du sort,
Une peine charmante, une amoureuse mort,
Et je fonde la vie en ce qu'elle a de pire.

Mon astre me réduit à la nécessité
De ne respirer point, alors que je soupire,
Et ma seule douleur est ma félicité.


(Jean Ogier de Gombauld)

*

Bom dia! Está sol.

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27.6.04


CORREIO 3

Entre o correio que está a chegar vem , enviado por Maria José Silva, este poema de Maiakovski

"Na primeira noite
Eles aproximam-se
E colhem uma Flor
Do nosso jardim
E não dizemos nada.

Na segunda noite,
Já não se escondem:
Pisam as flores
Matam o nosso cão,
E não dizemos nada.

Até que um dia
O mais frágil deles
Entra sozinho em nossa casa,
Rouba-nos a lua e,
Conhecendo nosso medo,
Arranca-nos a voz da garganta
E porque não dissemos nada,
Já não podemos dizer nada."



*
"O poema que publicou como sendo de Maiakovski - "Na primeira noite/ Eles aproximam-se..." - não é de Maiakovski, mas sim do brasileiro Eduardo Alves da Costa. Trata-se de um dos mais interessantes equívocos literários que eu conheço. O poema foi editado em 1936 e é muito mais longo do que a versão que publicou no Abrupto. Pode encontrá-lo numa antologia relativamente recente (2001) organizada por José Nêumanne Pinto e intitulada Os Cem Melhores Poetas Brasileiros do Século. Já tínhamos feito uma referência sobre este interessantíssimo caso aqui."

(Rui Amaral)



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O ABRUPTO OBRA DE NÓS TODOS

O Abrupto não foi feito para servir as minhas opiniões políticas. Não me faltam meios para o fazer e aqui pretendi (e pretendo) falar de outras coisas que me interessam. Mas o Abrupto é também parte da minha voz e, em momentos especiais, de emergência, também aqui falo de política. É o caso dos últimos dias. As centenas de mensagens e os muitos milhares de visitas ontem e hoje traduzem essa sensação de emergência partilhada com os seus leitores. E está a ter resultados, numa situação inédita na blogosfera nacional. Vamos ver, pode ser que se consiga mudar alguma coisa. O principal factor é o tempo real, e isso dá uma força especial aos blogues nestes momentos de interesse colectivo.


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SÓ HÁ UMA MANEIRA



e vai ter resultados.

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SÓ HÁ UMA MANEIRA

Só há uma maneira de impedir o que parece um curso inexorável: que quem deve falar, fale. Que diga, alto e bom som, o que pensa e o que diz em privado. Que quem tem autoridade para falar, e muita gente a tem, fale. Que haja debate e controvérsia. Que se perceba que não há nenhuma unanimidade, bem longe disso. Nem maioria. Eu estou um pouco farto de o fazer sozinho e de arcar com as consequências. Mas fá-lo-ei, sozinho que seja. Porque, nestes dias, quem cala consente.

E o país é mais importante que o partido, não é? Não era Sá Carneiro que o dizia?

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CORREIO 2

Em todo o correio recebido, registo esta frase de John Lydon dos Sex Pistols, enviada por João Santos Lima: "Have you ever had the feeling you've been cheated?"

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CORREIO

Muito correio, como se imagina, dados os eventos. Com uma excepção, as largas dezenas de mensagens têm todas o mesmo sentido. Bom senso, respeito por nós próprios, respeito pelo país que somos. Nalguns casos, quase desespero, impotência, perplexidade, revolta, indignação.

Como compreendem, dificilmente poderei responder a todas, mas obrigado por todas.


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POBRE PAÍS

o nosso,
que padece de Acédia. Acédia?
O pecado que a gente aprende como sendo a “preguiça”, para facilitar a compreensão dos jovens catequistas e catequisados. Mas o pecado mortal não é evidentemente o que chamamos “preguiça”, venial predisposição do corpo e da alma. A Acédia é outra coisa muito mais importante: é a apatia, ou a indiferença perante a prática da virtude, ou o espectáculo do mal. Sabemos que está mal, mesmo muito mal, e ficamos calados. Acédia. Vai-se para o Inferno por isso.

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Maria Sibylla Merian

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POBRE PAÍS

o nosso.
Sem oposição.

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EARLY MORNING BLOGS 236

Rima IX


Besa el aura que gime blandamente
las leves ondas que jugando riza;
el sol besa a la nube en occidente
y de púrpura y oro la matiza;
la llama en derredor del tronco ardiente
por besar a otra llama se desliza;
y hasta el sauce, inclinándose a su peso,
al río que le besa, vuelve un beso.


(Gustavo Adolfo Bécquer)

*

Bom dia!

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POBRE PAÍS

o nosso.
Será que se faz ideia, em particular nos órgãos de comunicação social, da enorme confusão que as pessoas comuns, menos politizadas, sentem face a notícias que estão a ouvir nos intervalos do futebol? Notícias que se precipitam, com pequena clareza e explicação, feitas por gente que acompanha ao detalhe a luta política exclusivamente para gente literata na nossa política, sem cuidar da insegurança que geram?

As pessoas intuem que alguma coisa de importante se está a passar, mas não sabem o que é. Imaginam os comentários perplexos que, numa pequena aldeia, traduzem essa impotência pela falta de informação, ou pela informação apressada? O que é que se está a passar? O nosso PM morreu? Os comunistas vão ganhar? Vai mudar tudo? Quem vai governar é a Europa?

Todos estas perguntas me foram feitas. Esta é a realidade da percepção pública de uma crise inesperada, que surge com a máxima estranheza porque fora do quadro eleitoral normal.

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26.6.04


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES

"Constituição Europeia

Dizem os jornais que o Presidente da República, no referendo sobre a Constituição Europeia, tomará partido e fará campanha pelo “sim”. Ainda não li/ouvi críticas. Será que há neste caso unanimidade? Eu, pessoalmente e independentemente da minha posição sobre a CE, não estou de acordo com a tomada de posição do PR.
"

(Joana)

*

"Saiba mais sobre a vida e a obra da grande violoncelista GUILHERMINA SUGGIA. Pretendemos reunir o máximo de documentos e testemunhos possíveis acerca de uma das mais importantes figuras da música no seu tempo. Ajude-nos. Leia. Comente. Divulgue. Comunique-nos tudo o que souber sobre Suggia."

(Virgílio Marques)

*

"Permito-me recomendar: Final Freedom: The Civil War, the Abolition of Slavery, and the Thirteenth Amendment, de Michael Vorenberg, da Brown University, 2001 Cambridge U.P. Comprei-o na altura por causa dos meus estudos sobre os antecedentes da Lei Seca, que no plano político se cruzam com com o problema da escravatura: os republicanos eram maioritáriamente anit-esclavagistas e anti-proibicionistas, os democratas eram permeáveis à influência de evangelistas, quakers e demais puritanos. O livro é muito bom."

(Filipe Nunes Vicente)


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MANIFESTAÇÃO



Circula para aí a convocatória de uma manifestação. Sei bem quem agradece a amabilidade, porque é difícil fazer melhor para obter os resultados exactamente contrários aos pretendidos.

Menosprezem o populismo, menosprezem ...

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POBRE PAÍS

o nosso.
Onde é vital, hoje, que não se confunda silêncio com consenso, silêncio com apatia, silêncio com ambiguidade. Está na altura de falar e falar claro, antes que seja tarde de mais. O que está em jogo é grave. É aquilo a que uma noção antiga chamava “bom governo”, a que nos dedicamos por gosto pelo nosso país, gosto pela nossa comunidade antiga, que é a única coisa que dá sentido à política.


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CONGRESSO

Se houver um Congresso extraordinário do PSD, deve ser prévio a qualquer escolha para Primeiro-ministro, para não colocar os congressistas sob a chantagem do derrube do governo do seu próprio partido. A objecção de que isso significaria um governo quase de gestão não colhe, porque o PR, em boa prática institucional, também não deixaria um Primeiro-ministro que está a prazo até à realização do Congresso tomar medidas de fundo. As coisas seriam assim mais limpas e politicamente legitimadas. E o governo de gestão só pode ser dirigido por quem tem legitimidade na orgânica governamental: o número dois do governo.

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POBRE PAÍS

o nosso.

Para o qual eu quero um governo que pense em Portugal em primeiro lugar, que não se importe de perder as eleições, se estiver convicto que políticas difíceis são vitalmente necessárias. Não quero uma comissão eleitoral uninominal (ou binominal) que fará tudo apenas com um fito: ganhar as próximas eleições. Porque esse será o seu programa não escrito.

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POBRE PAÍS

o nosso.
Em plena Futebolândia, com os noticiários da televisão a despachar à pressa as notícias sobre Portugal, pedindo desculpa por interromperem o Euro.

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POBRE PAÍS

o nosso.
Lá vamos desperdiçar de novo o que penosamente adquirimos.
Lá vamos ter que começar tudo de novo.

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Roy Lichtenstein

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EARLY MORNING BLOGS 235

Sale mi blanca aurora...


Sale mi blanca aurora, y en saliendo
coge a la obscura noche el negro manto;
mas yo, que sin dormir en tierno llanto
lo más de ella pasé triste y muriendo,

en viéndola salir blanca y riendo,
dejando el lloro, torno alegre al canto
y el verla tan hermosa puede tanto
que a rienda suelta torno al bien corriendo.

"¡Ay blanca y amorosa aurora -digo-
y cuánto puede en mí tu alegre vista!
y cuánto el verte tal y tan hermosa!

El bien que siento en verte es buen testigo,
que vuelve el fiero mal no siendo vista
tu clara luz en noche tenebrosa"
.

(Francisco de Figueroa)

*

Bom dia! Se forem capazes...

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25.6.04



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POBRE PAÍS

o nosso.

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24.6.04


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: A VERDADEIRA FORMA



Isto é todos os dias sem descanso. Pela manhã, finalmente as formas certas de Febe, lá para as bandas de Saturno. Cuidado com ela, uma das titãs originais, filha de Urano e Gaea, senhora da Lua, senhora da Lua brilhante. Casou com um irmão, Coeus, a Inteligência. Não se pode dizer que casou mal. A sua filha Leto seguiu-lhe a tradição lunar, e teve como descendência o par de gémeos sublimes, Artemisia e Apolo. Estamos de novo entre os grandes. O pai? O segundo pai universal: Zeus, seguindo Hesíodo. Como de costume, Hera, a legítima de Zeus, perseguiu-a tentando impedir que alguma vez pousasse na terra para que Zeus não pudesse… Como de costume, não resultou. Complicado, não é? Hoje é mais.

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Gerrit van Vucht

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EARLY MORNING BLOGS 234

A mis soledades voy...


A mis soledades voy,
de mis soledades vengo,
porque para andar conmigo
me bastan mis pensamientos.

¡No sé qué tiene la aldea
donde vivo y donde muero,
que con venir de mí mismo
no puedo venir más lejos!

Ni estoy bien ni mal conmigo;
mas dice mi entendimiento
que un hombre que todo es alma
está cautivo en su cuerpo.

Entiendo lo que me basta,
y solamente no entiendo
cómo se sufre a sí mismo
un ignorante soberbio.

De cuantas cosas me cansan,
fácimente me defiendo;
pero no puedo guardarme
de los peligros de un necio.

El dirá que yo lo soy,
pero con falso argumento,
que humildad y necedad
no caben en un sujeto.

La diferencia conozco,
porque en él y en mí contemplo,
su locura en su arrogancia,
mi humildad en su desprecio.

O sabe naturaleza
más que supo en otro tiempo,
o tantos que nacen sabios
es porque lo dicen ellos.

Sólo sé que no sé nada,
dixo un filósofo, haciendo
la cuenta con su humildad,
adonde lo más es menos.

No me precio de entendido,
de desdichado me precio,
que los que no son dichosos,
¿cómo pueden ser discretos?

No puede durar el mundo,
porque dicen, y lo creo,
que suena a vidrio quebrado
y que ha de romperse presto.

Señales son del jüicio
ver que todos le perdemos,
unos por carta de más
otros por cartas de menos.

Dijeron que antiguamente
se fue la verdad al cielo;
tal la pusieron los hombres
que desde entonces no ha vuelto.

En dos edades vivimos
los propios y los ajenos:
la de plata los extraños
y la de cobre los nuestros.

¿A quién no dará cuidado,
si es español verdadero,
ver los hombres a lo antiguo
y el valor a lo moderno?

Dixo Dios que comería
su pan el hombre primero
con el sudor de su cara
por quebrar su mandamiento,

y algunos inobedientes
a la vergüenza y al miedo,
con las prendas de su honor
han trocado los efectos.

Virtud y filosofía
peregrina como ciegos;
el uno se lleva al otro,
llorando van y pidiendo.

Dos polos tiene la tierra,
universal movimiento;
la mejor vida el favor,
la mejor sangre el dinero.

Oigo tañer las campanas,
y no me espanto, aunque puedo,
que en lugar de tantas cruces
haya tantos hombres muertos.

Mirando estoy los sepulcros
cuyos mármoles eternos
están diciendo sin lengua
que no lo fueron sus dueños.

¡Oh, bien haya quien los hizo,
porque solamente en ellos
de los poderosos grandes
se vengaron los pequeños!

Fea pintan a la envidia,
yo confieso que la tengo
de unos hombres que no saben
quién vive pared en medio.

Sin libros y sin papeles,
sin tratos, cuentas ni cuentos,
cuando quieren escribir
piden prestado el tintero.

Sin ser pobres ni ser ricos,
tienen chimenea y huerto;
no los despiertan cuidados,
ni pretensiones, ni pleitos.

Ni muemuraron del grande,
ni ofendieron al pequeño;
nunca, como yo, afirmaron
parabién, ni pascua dieron.

Con esta envidia que digo
y lo que paso en silencio,
a mis soledades voy,
de mis soledades vengo.


(Lope de Vega)

*

Bom dia!

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23.6.04


FALTA DE CORAGEM

foi a minha hoje de manhã ao não ter colocado este poema de e.e. cummings no Abrupto. Faz pensar e necessita de imaginação verbal, mas depois é a descoberta. Roeu-me o dia todo e aqui está ele, na sua glória, como agradecimento ao Causa Nossa pelo prémio ao Abrupto.

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PORQUE RAZÃO

numa Europa sem fronteiras, os bilhetes de futebol são vendidos por nacionalidades e por quotas nacionais? Para comprar bilhetes para um espectáculo desportivo tem que se ter passaporte? Então os "cidadãos europeus", a que se dirige a Constituição, ficam à porta dos estádios? Ninguém acha isto estranho...

*

"Compreendo a sua consternação, mas existem razões de ordem pública que justificam esta "discriminação". Não vá um solitário português ficar na claque inglesa no jogo de hoje à noite!"

(Sofia)

*

"Em relação aos bilhetes do jogo Portugal - Inglaterra, o que aconteceria e quais seriam os comentários na horrível imprensa britânica se num Europeu de Futebol disputado em Inglaterra e num jogo dos quartos-de-final com as mesmas equipas 60% da assistência fosse lusa ?"

(Pedro Andrade)

*

"Respeitando a sua opinião permita-me que dela discorde uma vez que, tratando-se o Campeonato da Europa de uma competição entre nações, julgo fazer todo o sentido que a venda de bilhetes para os jogos se proceda atribuindo quotas a cada um dos países em causa. Se quiser uma analogia, também nos jogos de futebol dos diversos campeonatos nacionais a venda dos bilhetes para os mesmos é precedida da atribuição de quotas dos ingressos aos clubes participantes, independentemente da nacionalidade destes ser a mesma. Aliás o seu raciocínio levado ao extremo implicaria, no limite, a dissolução do actual modelo competitivo dos campeonatos entre nações a partir da substituição das diversas selecções nacionais dos países da UE por uma única representante da União à semelhança do que sucede por exemplo com os EUA. Óptimo argumento para os anti-federalistas digo eu..."

(Pedro Martins)

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ANDAR COM A CABEÇA NO AR 2 - NUMA GALÁXIA PRÓXIMA

está um planeta que visto de cima tem destas "vistas":



Na Via Láctea. No Sistema Solar. O Terceiro. No continente negro. No deserto grande. Na terra dos mouros. Na Mauritânia. A estrutura de Richat. Vista por um dos meus olhos: o do NASA/National Geospatial-Intelligence Agency Shuttle Radar Topography Mission.

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ANDAR COM A CABEÇA NO AR

Leio o Público em linha; “early morning” já tinha lido o Diário de Notícias (que me deixa sempre insatisfeito porque falta qualquer coisa naquele jornal); depois vou aqui saber das sondas marcianas (boa saúde na meia idade, nos sítios certos, olhando), depois vou aqui ver como está a Cassini-Huygens (há novas fotografias de Iapetus , o planeta Yin-Yang diz o texto do Jet Propulsion Laboratory), depois vou aqui ver como é que está a Stardust (recomenda-se) e salto para trás e para a frente aqui. Depois, volto à humilde condição de humano, não vão os “men in black” dar pelos meus vinte olhos e desligo.


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EARLY MORNING BLOGS 233

'Tis Sunrise—Little Maid—Hast Thou

'Tis Sunrise—Little Maid—Hast Thou
No Station in the Day?
'Twas not thy wont, to hinder so—
Retrieve thine industry—

'Tis Noon—My little Maid—
Alas—and art thou sleeping yet?
The Lily—waiting to be Wed—
The Bee—Hast thou forgot?

My little Maid—'Tis Night—Alas
That Night should be to thee
Instead of Morning—Had'st thou broached
Thy little Plan to Die—
Dissuade thee, if I could not, Sweet,
I might have aided—thee—


(Emily Dickinson)

*

Bom dia!

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22.6.04


A MELHOR LIVRARIA DE PORTUGAL

continua a ser a Leitura, no Porto. Excepcionalmente organizada, com um número significativo de livros estrangeiros, ingleses e franceses, acabo sempre por lá encontrar dezenas de livros que nunca vi em mais lado nenhum. A Leitura ajuda a combater o carácter cada vez mais caótico da distribuição livreira. É a melhor livraria, de longe.

*

"Quanto ao que escreveu sobre a Leitura, devo dizer que embora, racionalmente, concorde com os seus comentários, não deixo de ter uma nítida preferência pela Lello. E embora seja uma livraria mais previsível, menos dada a surpreender os seus clientes, aquele ambiente é único e incomparável. Para além de ser, provavelmente, a mais bela livraria do mundo."

(José Carlos Santos)

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James Ensor

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AMERICANA : JAZZ, DE KEN BURNS

Depois do documentário sobre a guerra civil americana, comprei o que pude de Ken Burns. Consegui comprar o Jazz e a série sobre a América, mas somente vi o Jazz. À primeira vista, tudo o que Burns já tinha feito nos filmes sobre a guerra também aqui aparece: uma predilecção da imagem fotográfica sobre o filme – o que é estranho num documentário de televisão – do preto e branco sobre a cor, uma utilização muito cuidada do texto, que acaba por ter um papel não somente narrativo, mas também estético. A meio da série, nos anos do swing, o resultado parecia-me mais frouxo do que na história da guerra. Havia qualquer coisa que não resultava, as palavras pareciam demasiado repetidas, caracterizando épocas e autores com frases muito semelhantes.

Se tivesse parado por aí, teria uma certa desilusão, mesmo que a série documental continuasse a ser de grande qualidade. No entanto, como muitas vezes acontece, é a empatia do autor que o trai. Quando começa a retratar a história do jazz dos anos do pós-guerra e a defrontar personagens como Charlie Parker, Miles Davis, John Coltrane, o filme ganha uma outra força. A estranha intensidade criativa do jazz e o modo como consumia / destruía os que se lhe dedicavam era patente num círculo que ia da música para as vidas. A entrada das drogas no mundo do jazz, potenciando o papel que já o álcool tinha, aparece como símbolo desse comportamento autodestrutivo. A solidão de uma música que assenta no solo aparece iniludível numa das raras filmagens: Dexter Gordon, solitário, num quarto acima do clube onde vai tocar em Copenhaga, e depois solitário em palco. O pathos da liberdade, da liberdade criativa levada até aos limites, é muito bem retratado em Charlie Parker, assim como a associação dessa procura de liberdade com a condição do negro americano.

No último episódio, curiosamente terminado um pouco à pressa com a cacofonia de músicas e músicos do início dos anos setenta, quase trinta anos antes da série ser feita, sugere-se de forma indirecta que o jazz, como forma de expressão criativa, pode estar morto. A ideia, que Ken Burns enuncia mas não aceita, de que uma forma de linguagem criativa possa atingir os seus limites, possa esgotar-se, é muito interessante e pode lançar uma luz, que psicologicamente não desejamos, sobre a “morte da arte”. E se morreu mesmo e nós ainda não demos por isso?

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21.6.04



Alsloot

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EARLY MORNING BLOGS 232

Liberté


Le vent impur des étables
Vient d'ouest, d'est, du sud, du nord.
On ne s'assied plus aux tables
Des heureux, puisqu'on est mort.

Les princesses aux beaux râbles
Offrent leurs plus doux trésors.
Mais on s'en va dans les sables
Oublié, méprisé, fort.

On peut regarder la lune
Tranquille dans le ciel noir.
Et quelle morale ?... aucune.

Je me console à vous voir,
A vous étreindre ce soir
Amie éclatante et brune.


(Charles Cros)

*

Bom dia!

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TRAIDORA NOITE

Estava magnífica para montar o telescópio. Pitch dark, com uma lua em D, finíssima. Depois distraí-me uma hora e, quando regresso, uma miserável névoa tapa-me metade do céu.

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20.6.04


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: BOA VIAGEM



Já falta pouco.

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Antoine Mortier

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EARLY MORNING BLOGS 231

«Para tudo há um momento e um tempo para tudo o que se deseja debaixo do céu:

Tempo de nascer e tempo de morrer,
tempo de plantar e tempo de arrancar plantas,
tempo de matar e tempo de curar,
tempo de destruir e tempo de edificar,
tempo de chorar e tempo de rir,
tempo de lamentar e tempo de dançar,
tempo de atirar pedras, e tempo de as ajuntar,
tempo de abraçar e tempo de evitar o abraço,
tempo de procurar e tempo de perder,
tempo de guardar e tempo de atirar fora,
tempo de rasgar e tempo de coser,
tempo de calar e tempo de falar,
tempo de amar e tempo de odiar,
tempo de guerra e tempo de paz.

Que proveito tira das suas fadigas aquele que trabalha?

Eu vi a tarefa que Deus impôs aos filhos dos homens para que dela se ocupem.

Todas as coisas que Deus fez, são boas a seu tempo. Até a eternidade colocou no coração deles, sem que nenhum ser humano possa compreender a obra divina do princípio ao fim.

Eu concluí que nada é melhor para o homem do que folgar e procurar a felicidade durante a sua vida. Todo o homem que come e bebe e encontra felicidade no seu trabalho, tem aí um dom de Deus.
»

(Eclesiastes 3, 1-8)

*

Bom dia!

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19.6.04


A COLIGAÇÃO NA QUADRATURA DO CÍRCULO

Por mérito do António Lobo Xavier, a discussão de hoje na Quadratura sobre as eleições e o futuro da coligação vale a pena ser ouvida. É uma discussão livre, aberta, comprometida, franca, de política portuguesa que me deu muito prazer ter.

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HISTÓRIAS DA GERAÇÃO DO COPIÓGRAFO

(Em breve.)

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PORQUE RAZÃO NOS EUA O MUNDO ANDA MAIS DEPRESSA

Apesar de todas as críticas, a NASA.

Um exemplo trivial, fora do brilho das sondas espaciais: o empréstimo dos restos da destruída nave Columbia à indústria para investigação e aperfeiçoamento de novos materiais. Aqui.

*






Já que estamos a falar disto , estas são as últimas sobre a Stardust "part of NASA's Discovery Program of low-cost, highly focused science missions, was built by Lockheed Martin Space Systems and is managed by JPL for NASA." - o cometa Wild 2 na sua glória. Como no Armageddon de Bruce Willis.Tudo aqui e aqui.

*

"Tenho para mim que neste caso como em muitos outros, o que está na génese do gosto pela astronomia e suas descobertas é a poesia. Quem gosta de poesia gosta das estrelas, e tem “sede de infinito”. Juntando-lhe curiosidade e racionalidade aproximamo-nos da astronomia. Este é o caminho que as pessoas de “artes e humanidades” percorrem para chegar à astronomia.
(...) Qual mapa do genoma humano! Qual vacina para a malária! Qual método para fazer os pandas procriarem! Qual teoria sobre o sobreaquecimento da terra! Ciência para os poetas é a astronomia! O espaço, o infinito.
"

(JPC)

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Henri de Braekeleer

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O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES

"Acabo de ler no seu Blogue uma referência a Neca Rafael e isso despertou em mim uma certa nostalgia. Vivo na Amadora desde que me conheço, mas nasci no Porto e passei, até aos meus 15 anos, todas as minhas longas férias escolares no Porto, no velho Porto – lá a minha casa era na rua da Vitória, entre os Clérigos e a Ribeira, junto às escadinhas e à “Calçada”, “Bataria” – muita miséria, muita canalha de pé descalço… Neca Rafael, Conjunto Maria Albertina e Conjunto de António Mafra, assim como alguns sons de velhos anúncios dos “Emissores do Norte Reunidos” ficarão para sempre na minha memória, do mesmo modo que algumas figuras típicas: o “Carlinhos da Sé”, o “Chona”, a Maria Zé Bidão da Casa Grande, etc… De Neca Rafael lembro-me, aí por 1964, tinha eu uns 7 anos, no Palácio, cantando exactamente esse “Já estás com os copos…” Onde se meteu esse tempo e essa gente digna de filme italiano, num registo algures entre Totó e Fellini?"

(Edmundo Moreira Tavares)

*

"Creio pertencer a uma geração, ou a um grupo dentro de uma geração, que nunca ligou nada à noção de Pátria. Lembro-me de ouvir quando era criança falar dos homens que, no Ultramar, davam a vida pela Pátria e achava isso muito vago, bizarro e sem sentido. Já adulta sempre achei que dei mais à Pátria do que ela a mim e dizia que a Pátria nunca nada tinha feito por mim, mostrando algum desprezo por essa noção abstracta e pelos seus símbolos: a bandeira e o hino.

A vida (uma das minhas noções abstractas preferidas) encarrega-se, com a sua infinita sabedoria, de nos mostrar o que às vezes não sabemos ou não queremos ver.

Agora o futebol: não resisto a algum clima de mundial, europeu ou de importante jogo ou final internacional de clubes e lembro-me do sentimento de frustração quando há precisamente 4 anos Portugal perdia as meias-finais para França, naquele mal fadado penalty. Mas o que não consegui nunca esquecer, e ainda guardo na memória as imagens que as televisões nos mostraram, foi a tremenda desilusão, tristeza e impotência estampadas nas caras dos portugueses que, nos ecrãs gigantes das praças de Paris e de outras cidades francesas, seguiam o jogo. O facto de Portugal ter perdido o jogo tornou-se irrelevante face àquela tristeza e foi comovida que vi aquelas imagens e me senti um deles. Sempre que a selecção ou um clube português jogam no estrangeiro é com algum espanto e quase inveja que vejo o entusiasmo e entrega (por vezes tão irracional) com que os portugueses que lá vivem apoiam o lado Luso. Quarta-feira (antes do Portugal-Rússia), no trânsito da Praça de Espanha, passou por mim um carro cheio de rapazes vestidos a rigor de adeptos da selecção nacional que, com janelas abertas, bandeiras nacionais e ruído, saudavam os demais “companheiros” de trânsito. Sorri, respondi à saudação e quando arrancaram vi que era um carro de matrícula francesa. Num arrepio revi as imagens de há quatro anos e outras tantas tornaram-se vivas e senti uma emoção quase incómoda e que não passou de imediato…

…é a Pátria, estúpida! Tem sussurrado uma voz ultimamente.

Deve ser. Só pode ser! Andava eu a tentar entendê-la noutros lados: nas contabilidades do deve e do haver, nos índices do desenvolvimento e do crescimento económico, nas opções estéticas das cores e símbolos da bandeira nacional, na pertinência da letra do Hino Nacional, nas boas ou más governações. Sem saber, ela estava aí e sem a entender, senti-a."


(JPC)

*

"Tantas memorias!!Tantas noites no Técnico e em Ciências à volta dos malditos "stencis", com aquele pincel das emendas(era com uma especie de verniz que se faziam as emendas, não era?), os copiografos sempre a avariar,pois trabalhavam horas a fio impiedosamente,apesar da solidariedade dos técnicos da "Gestetner"(soa-me assim,já não me lembro se era assim que se escrevia), que vinham logo que podiam,a qualquer hora!!
E ficava aqui o resto da manhã...
"

(A.Pina Cabral)

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EARLY MORNING BLOGS 230

Bon chevalier masqué qui chevauche en silence


Bon chevalier masqué qui chevauche en silence,
Le Malheur a percé mon vieux coeur de sa lance.

Le sang de mon vieux coeur n'a fait qu'un jet vermeil,
Puis s'est évaporé sur les fleurs, au soleil.

L'ombre éteignit mes yeux, un cri vint à ma bouche
Et mon vieux coeur est mort dans un frisson farouche.

Alors le chevalier Malheur s'est rapproché,
Il a mis pied à terre et sa main m'a touché.

Son doigt ganté de fer entra dans ma blessure
Tandis qu'il attestait sa loi d'une voix dure.

Et voici qu'au contact glacé du doigt de fer
Un coeur me renaissait, tout un coeur pur et fier

Et voici que, fervent d'une candeur divine,
Tout un coeur jeune et bon battit dans ma poitrine !

Or je restais tremblant, ivre, incrédule un peu,
Comme un homme qui voit des visions de Dieu.

Mais le bon chevalier, remonté sur sa bête,
En s'éloignant, me fit un signe de la tête

Et me cria (j'entends encore cette voix) :
" Au moins, prudence ! Car c'est bon pour une fois. "


(Paul Verlaine)

*

Bom dia!

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OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: TODOS OS DIAS ESPANTO



Como este Wild 2, um cometa fotografado pela “poeira das estrelas”, Stardust, mais uma sonda da NASA. Nunca se viu assim um cometa. Debaixo dos nossos olhos, de Marte a Febe, de Saturno aos viajantes cometas, do olhar do Hubble, lá longe entre o espaço mais longínquo e o tempo mais distante e velho, está-se a dar uma revolução no nosso conhecimento. São de facto os novos descobrimentos.

Notícias aqui.

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18.6.04



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EARLY MORNING BLOGS 229

Odysseus to Telemachus

My dear Telemachus,
The Trojan War
is over now; I don't recall who won it.
The Greeks, no doubt, for only they would leave
so many dead so far from their own homeland.
But still, my homeward way has proved too long.
While we were wasting time there, old Poseidon,
it almost seems, stretched and extended space.

I don't know where I am or what this place
can be. It would appear some filthy island,
with bushes, buildings, and great grunting pigs.
A garden choked with weeds; some queen or other.
Grass and huge stones . . . Telemachus, my son!
To a wanderer the faces of all islands
resemble one another. And the mind
trips, numbering waves; eyes, sore from sea horizons,
run; and the flesh of water stuffs the ears.
I can't remember how the war came out;
even how old you are--I can't remember.

Grow up, then, my Telemachus, grow strong.
Only the gods know if we'll see each other
again. You've long since ceased to be that babe
before whom I reined in the plowing bullocks.
Had it not been for Palamedes' trick
we two would still be living in one household.
But maybe he was right; away from me
you are quite safe from all Oedipal passions,
and your dreams, my Telemachus, are blameless.


(Joseph Brodsky)

*

Bom dia!



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17.6.04


FADOS

De repente, apeteceu-me ouvir os CDs do Público sobre a história do fado. Apetites. Estranheza, porque sou pouco do mundo do fado, embora goste de muitas canções. Talvez porque estou a ver a série de Ken Burns sobre o Jazz, de que falarei depois. Chega de justificações. Ouço o Marceneiro gabar-se de ser marceneiro e o orgulho de ser conhecido com esse nome. Do mundo dos touros e marialvas, não sei nada, mas o mundo do Marceneiro conheço-o dos trabalhos sobre a Lisboa operária e estimo esse orgulho pela profissão, pela “arte”, hoje já arqueológico.

Recordei-me do equivalente ao Marceneiro no Porto, cidade quase sem fadistas, Neca Rafael, ou melhor, o senhor Neca Rafael, que havia mais respeito. Depois de um dia de agitação estudantil endémica e a meio de uma noite, farto de remendar os miseráveis “stencis” que se rasgavam com os sublinhados (*), ia com os meus companheiros comer um mini-prato de tripas ao “Luso”, que custavam 7$50. O local, às três ou quatro da amanhã, de uma cidade que fechava à meia-noite no máximo, era frequentado pela mais bizarra das faunas. E lá estava, sentado numa mesa, muito direito e silencioso, acompanhado por uma senhora. Os empregados, que se chamavam criados, tratavam-no com muita deferência. E Neca Rafael, já com muita idade, lá acabava por sair com a sua senhora na noite brumosa da cidade. O seu fado mais popular era “Já estás c'os copos”, com esta letra de outro mundo:

Quando vou de grão na asa
e nem dou conta de mim
abro a porta entro em casa
e a mulher canta assim

já estás c'os copos
já estás c'os copos
já estás c'os copos

Ponho-me a fazer teatro
que é para a coisa disfarçar
cruzo a perna, faço um quatro
e ela põe-se a cantar

já estás c'os copos
(canta... canta que logo bebes)
já estás c'os copos
já estás c'os copos

ó mulher ou tu te calas
ou eu ponho-te na rua
vai pr'os teus e leva as malas
e a tipa continua

já estás c'os copos
(vai.. vai dar recomendações à maezinha)
já estás c'os copos
já estás c'os copos

Vou p'ra cama e reconheço
que bebi mais um copinho
sabem que eu que adormeço
com ela a cantar baixinho

já estás c'os copos
já estás c'os copos
já estás c'os copos


(*) Nota para os tempos de hoje: o meio mais acessível para publicar comunicados era o copiógrafo que permitia, quando era de qualidade, o que raras vezes acontecia com aparelhos que eram sobre usados e estavam a desfazer-se, fazer tiragens de 1000-2000 panfletos. O elo fraco, entre muitos, era que a matriz para a reprodução era escrita à máquina numas folhas especiais, os “stencis”, plural popular de stencil, que tinham um papel especial em que a máquina de escrever furava as letras. Se se fazia um sublinhado, o stencil acabava por romper por aí e tinha que ser recolado com muito cuidado. Era uma trabalheira.

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Sebastian Stosskopf

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EARLY MORNING BLOGS 228

Ah bed, the field where joy's peace some do see,
The field where all my thought to war be train'd,
How is thy grace by my strange fortune stain'd!
How thy lee shores by my sighs stormed be!

With sweet soft shades thou oft invitest me
To steal some rest, but wretch I am constrain'd
(Spurr'd with Love's spur, though gall'd and shortly rein'd
With Care's hand) to turn and toss in thee.

While the black horrors of the silent night
Paint woe's black face so lively to my sight,
That tedious leisure marks each wrinkled line:

But when Aurora leads out Phoebus' dance
Mine eyes then only wink, for spite perchance,
That worms should have their Sun, and I want mine.


(Sir Philip Sidney)

*

Bom dia!

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16.6.04


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: UMA PEDRA DE PEDRA E GELO ALGURES PERTO DE SATURNO

A verdadeira natureza de Febe tem sido revelada com uma claridade surpreendente nas últimas imagens tiradas pela sonda Cassini. As imagens mostram um corpo coberto de crateras muito provavelmente feito à base de gelo e com uma camada fina de material escuro. O pormenor é fantástico. Como são um pouco pesadas, aconselho a sua visualização aqui. Estamos a entrar numa época muito interessante da exploração de Saturno.

(José Matos)

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POEIRA DE 16 DE JUNHO

Hoje, há cento e quarenta e nove anos, uma jovem cristã, que sofria de curvatura da espinha, Catherine, foi levada a casa por William Booth, um impulsivo pregador local que ouvia vozes. Era a primeira vez que se encontravam e ela escreveu: “Antes de chegarmos a casa, ambos sentíamos que tínhamos sido feitos um para o outro”. Uma história de amor à primeira vista. Casaram e uma das vozes que ele ouvia intimou-o a uma missão extrema – converter os “ wife-beaters, cheats and bullies, prostitutes, boys who had stolen the family money, unfaithful husbands, burglars, and teamsters who had been cruel to their horses", talvez por esta ordem. Não sei. Catherine e William fundaram então um exército de novo tipo, o da Salvação.

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EARLY MORNING BLOGS 227

L'Astrologue qui se laisse tomber dans un puits


Un Astrologue un jour se laissa choir
Au fond d'un puits. On lui dit : "Pauvre bête,
Tandis qu'à peine à tes pieds tu peux voir,
Penses-tu lire au-dessus de ta tête ? "
Cette aventure en soi, sans aller plus avant,
Peut servir de leçon à la plupart des hommes.
Parmi ce que de gens sur la terre nous sommes,
Il en est peu qui fort souvent
Ne se plaisent d'entendre dire
Qu'au livre du Destin les mortels peuvent lire.
Mais ce livre, qu'Homère et les siens ont chanté,
Qu'est-ce, que le Hasard parmi l'Antiquité,
Et parmi nous la Providence ?
Or du Hasard il n'est point de science :
S'il en était, on aurait tort
De l'appeler hasard, ni fortune, ni sort,
Toutes choses très incertaines.
Quant aux volontés souveraines
De Celui qui fait tout, et rien qu'avec dessein,
Qui les sait, que lui seul ? Comment lire en son sein ?
Aurait-il imprimé sur le front des étoiles
Ce que la nuit des temps enferme dans ses voiles ?
A quelle utilité ? Pour exercer l'esprit
De ceux qui de la Sphère et du Globe ont écrit ?
Pour nous faire éviter des maux inévitables ?
Nous rendre, dans les biens, de plaisir incapables ?
Et causant du dégoût pour ces biens prévenus,
Les convertir en maux devant qu'ils soient venus ?
C'est erreur, ou plutôt c'est crime de le croire.
Le Firmament se meut ; les Astres font leur cours,
Le Soleil nous luit tous les jours,
Tous les jours sa clarté succède à l'ombre noire,
Sans que nous en puissions autre chose inférer
Que la nécessité de luire et d'éclairer,
D'amener les saisons, de mûrir les semences,
De verser sur les corps certaines influences.
Du reste, en quoi répond au sort toujours divers
Ce train toujours égal dont marche l'Univers ?
Charlatans, faiseurs d'horoscope,
Quittez les cours des Princes de l'Europe ;
Emmenez avec vous les souffleurs tout d'un temps :
Vous ne méritez pas plus de foi que ces gens.
Je m'emporte un peu trop : revenons à l'histoire
De ce Spéculateur qui fut contraint de boire.
Outre la vanité de son art mensonger,
C'est l'image de ceux qui bâillent aux chimères,
Cependant qu'ils sont en danger,
Soit pour eux, soit pour leurs affaires.


(Jean de la Fontaine)

*

Et pour cause ... Bom dia !


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15.6.04



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AGRADECIMENTO

Agradeço a todos os que me têm felicitado pela nomeação para a Missão permanente na UNESCO. É um lugar de responsabilidade que aceitei com muito gosto e que me vou esforçar por cumprir o melhor que sei e posso. Como é óbvio, depois de tomar posse, e dada a natureza do cargo, não tem qualquer sentido continuar a ter um papel activo no comentário político. Já de há algum tempo tenho estado a preparar essa situação nos órgãos de comunicação social onde colaboro. Escreverei sobre outras coisas, sempre que tenha oportunidade, e continuarei o Abrupto dentro desses condicionalismos.

É um silêncio que desejei e escolhi, após anos e anos de voz muitas vezes solitária. Haverá outros caminhos e certamente outros tempos.

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NOTAS EUROPEIAS

que estão lá para baixo, no limbo do blogue, foram actualizadas. Vão na versão 2.0.

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Isidore Verheyden

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EARLY MORNING BLOGS 226

Libro de buen amor
Las ranas que demandaban un rey


Las ranas en un lago cantaban et jugaban,
cosa non las nucía, bien solteras andaban,
creyeron al diablo que de mal se pagaban,
pidieron Rey a Don Júpiter, mucho gelo rogaban.

Envióles Don Júpiter una viga de lagar,
la mayor quel pudo, cayó en ese lugar:
el grand golpe del fuste fizo las ranas callar,
mas vieron que no era Rey para las castigar.

Suben sobre la viga cuantas podían subir,
digeron: non es este Rey para lo nos servir:
pidieron Rey a Don Júpiter como lo solían pedir,
Don Júpiter con saña hóbolas de oír.

Envióles por su Rey cigueña mansillera,
cercaba todo el lago, ansí fas la ribera,
andando pico abierta como era venternera
de dos en dos las ranas comía bien ligera.

Querellando a Don Júpiter, dieron voces las ranas:
señor, señor, acórrenos, tú que matas et sanas,
el Rey que tú nos diste por nuestras voces vanas
danos muy malas tardes et peores mañanas.

Su vientre nos sotierra, su pico nos estraga,
de dos en dos nos come, nos abarca et nos traga:
señor, tú nos defiende, señor, tú ya nos paga,
danos la tu ayuda, tira de nos tu plaga.

Respondióles Don Júpiter: tened lo que pedistes
el Rey tan demandado por cuantas voces distes:
vengué vuestra locura, ca en poco tuvistes
ser libres et sin premia: reñid, pues lo quisistes.

Quien tiene lo quel' cumple, con ello sea pagado,
quien puede ser suyo, non sea enagenado,
el que non toviere premia non quiera ser premiado,
libertad e soltura non es por oro comprado.


(Juan Ruiz, Arcipreste de Hita)

*

Bom dia!

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James Ensor

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NOTAS EUROPEIAS v. 2.0

Sem ordem, nem sistema, nem pretensão de cobrir todos os aspectos das eleições. Serão acrescentadas à medida que forem escritas, pelo que o texto será continuamente alterado.

*

A linha melhor para interpretar as eleições é a linha do bom senso. Aqui o bom senso é considerar que tudo o que parece, é. Não é preciso nenhuma sofisticação especial: o PS, o BE e o PCP ganharam, por esta ordem. O PSD e o PP perderam, por esta ordem.

*

Os partidos que ganharam sobreviveram melhor à abstenção, o PS porque os seus eleitores queriam penalizar o governo, o PCP e o BE porque dispõem de um voto militante. O voto militante no PCP é defensivo, no BE é ofensivo. Um tem sucesso porque está a crescer, o outro porque resiste a diminuir.

*

Na maioria dos países europeus, os partidos coligados no governo concorrem separados nas eleições europeias, sem que isso ponha em causa os entendimentos governamentais.É um sinal de fraqueza e não de força que se tenha entendido projectar a coligação governamental, – unida por um lógica de poder executivo –, para as eleições europeias

*

O PSD elegeu sete deputados, o PP dois. O PSD tinha nove deputados, o PP dois. O grande perdedor da coligação é o PSD. Esta contabilidade política real funciona como um ácido no PSD.

*

A coligação ajudou a enfraquecer o Partido Popular Europeu, partido em que os deputados do PSD se integram. Sendo agora menos no PPE (sete em vez de nove) dificilmente conseguirão quer através do método de Hondt, quer de negociações, obter cargos relevantes para os portugueses, mesmo apesar da maioria PPE do próximo Parlamento Europeu (PE) . Pelo contrário, os dois deputados do PP que se integram noutro grupo político europeu ( o PP foi expulso do PPE) , a União para a Europa das Nações, mantêm a mesma força política, mas, como seu grupo conta menos no PE, isso é irrelevante. No seu conjunto, a representação nacional onde mais conta, no PPE, está mais fraca.

*

Tenho de há muito a opinião que não é normal não existirem partidos eurocépticos fora das margens do sistema político. Mais ou menos eurocépticos, eurocépticos totais, como o partido inglês da “independência do Reino Unido”, e eurocépticos quanto ao curso político da UE , sem pôr em causa a sua existência. Não é natural que, por exemplo, a recusa da Constituição europeia, símbolo de uma certo processo de upgrade político europeísta, seja marginal ao mainstream do sistema político. Esta disfunção é tanto mais grave quanto se houver, como é exigível que haja, um referendo sobre a Constituição, se verá que há um número muito significativo de cidadãos que a recusam. Esses cidadãos não estão certamente representados em Portugal pela Nova Democracia. Esta é uma razão do desinteresse pela Europa: a disfunção na representação política do debate europeu, falso consenso a mais.

*

Em Portugal, como aliás em quase toda a Europa, com a excepção ambígua do Reino Unido, a questão da guerra do Iraque não parece ter sido directamente relevante para os resultados eleitorais. Em Portugal, certamente não foi. Não é possível qualquer teoria explicativa consistente para explicar pelo Iraque os votos espanhois, franceses, alemães ou polacos.

(Continua)

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14.6.04


NOTAS EUROPEIAS

serão publicadas em breve. Sobre as eleições em Portugal, na Europa, Constituição, etc.

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13.6.04


ELEIÇÕES EUROPEIAS

Há muitas coisas que podiam ser ditas sobre estas interessantes eleições , com resultados a exigir análise detalhada.

Mas há uma coisa que de imediato deve ser discutida: como é que daqui a dias os governos europeus vão aprovar uma Constituição cujo sentido político é fortemente deslegitimado pelos resultados eleitorais e pela abstenção?

(Escrevo em más condições, depois desenvolverei.)

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James Ensor, Marine au nuage blanc

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EARLY MORNING BLOGS 225

Me dijo un alba de la primavera:
Yo florecí en tu corazón sombrío
ha muchos años, caminante viejo
que no cortas las flores del camino.

Tu corazón de sombra, ¿acaso guarda
el viejo aroma de mis viejos lirios?
¿Perfuman aún mis rosas la alba frente
del hada de tu sueño adamantino?

Respondí a la mañana:
Sólo tienen cristal los sueños míos.
Yo no conozco el hada de mis sueños;
ni sé si está mi corazón florido.

Pero si aguardas la mañana pura
que ha de romper el vaso cristalino,
quizás el hada te dará tus rosas,
mi corazón tus lirios.


(Antonio Machado)

*

Bom dia!

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12.6.04


NOTICIÁRIO DA RTP NA FUTEBOLÂNDIA

Uma hora de futebol de “serviço público”, entre as 20 horas e as 21. Às 21 horas, as notícias apressadas sobre Portugal e o resto do mundo, quase a pedirem desculpa de existirem fora da futebolândia. Depois outra vez futebol. Até a TVI teve mais variedade.

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SIM, SR. PRIMEIRO MINISTRO

Na versão que se vende cá tem uma tradução tão miserável que os DVDs deviam ser proibidos por qualquer controle de qualidade. “Security”, diz o PM, falando do MI5, passa a “segurança social”, “primeiro ministro” passa a “ministro”, “Special Branch” a “ramo especial”, é toda uma série de asneiras tão ridículas e graves, de inglês, de ignorância, que funciona como um insulto a quem compra. Será que se pode devolver e pedir indemnização vultuosa ou envergonhar quem isto traduz, quem isto põe à venda?

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Paul Delvaux

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EARLY MORNING BLOGS 224

Effroyables deserts, pleins d'ombre, et de silence

Effroyables deserts, pleins d'ombre, et de silence,
Où la peur, et l'hyver, sont éternellement ;
Rochers affreux, et nus, où l'on voit seulement
Le tonnerre, et les vents montrer leur insolence.

En quelque part des Cieux que le Soleil s'élance,
Vous estes tousjours pleins d'un froid aveuglement,
Et vos petits ruisseaux malgré leur element
Font monter jusqu'aux airs leur foible violence.

Lieu où jamais l'amour ne vint tendre ses rets,
Torrents, cavernes, troncs, si parmy ces forests
Je me tiens si content, et je vous ayme encore

Ce n'est pas qu'en efect vous ayez des appas,
Mais puisque vous avez la Beauté que j'adore,
Puis-je avoir ce Bon-heur, et ne vous aymer pas ?


(Marin Le Roy de Gomberville)

*

Bom dia!

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11.6.04


CONHECER ALGUÉM NUM ENCONTRO IMEDIATO DO TERCEIRO GRAU 2

Lino de Carvalho apareceu no Congresso da Oposição Democrática como “presidente” da secção dedicada à educação e juventude, num daqueles processos de auto-nomeação em que o PCP era fértil. Quem o nomeara, desconhecia-se; qual a legitimidade da escolha, desconfiava-se. Na sala em que se ia fazer a reunião dessa secção, a maioria, ou pelo menos um número muito significativo dos presentes, inscritos no Congresso, eram estudantes esquerdistas de variadas cores e feitios, desunidos em tudo, unidos contra os “reformistas” (a versão legal dos “revisisonistas”, dos estudantes da UEC, do PCP). Em 1973, na maioria das universidades e liceus, a UEC tinha perdido não só a hegemonia que os comunistas sempre tinham tido sobre o movimento estudantil, como tinham passado, em muitas escolas, a uma pequena minoria acossada. Num ambiente que não favorecia a democracia – era difícil fazer votações em urna em muitas escolas – sucediam-se os golpes e contra-golpes nas assembleias e reuniões, comunistas e esquerdistas usando uma grande panóplia de truques, num ambiente de crescente violência.

O Lino de Carvalho, que eu não conhecia de parte nenhuma, nem sequer sabia que se chamava assim, apareceu na sala do cine-teatro de Aveiro, com mais duas pessoas, e sentou-se na mesa para “dirigir” a reunião. Começaram os protestos e exigências de que a mesa fosse escolhida pelos presentes. A coisa começou a azedar e os estudantes da UEC perceberam que, se houvesse votação, perdiam, e fizeram então um golpe habitual e já conhecido de outras reuniões: desataram a gritar a favor dos presos políticos, e já não me lembro se apresentaram out of the blue uma moção de solidariedade para tentar bloquear a escolha da mesa. Lembro-me de uma coisa semelhante feita num plenário do Porto que eu estava a dirigir e do qual resultou também uma enorme confusão.

De repente, sem perceber como, desatou tudo à pancada. Eu estava na primeira ou na segunda fila, logo calhou-me defrontar a mesa, logo o Lino de Carvalho que não era para brincadeiras. Daí o murro (dele) e a cadeirada (minha). Depois, de um momento para o outro, tudo acabou, sem também se perceber como. Se demorou trinta segundos, foi muito. A reunião, que me lembre, acabou ali. Muitos anos depois, quando conheci o Lino de Carvalho na Assembleia, recordámos essa cena, com o olhar mais pacífico que a vida e a liberdade entretanto nos dera.

No dia seguinte, estávamos todos na avenida principal de Aveiro, diante da polícia de choque, na garagem, nos telhados e nos quintais da rua paralela. Quem lá esteve conhece este trajecto.


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L. Spilliaert

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CONHECER ALGUÉM NUM ENCONTRO IMEDIATO DO TERCEIRO GRAU

Porque foi assim que conheci Lino de Carvalho, à pancada. Preciso: numa breve cena colectiva de pancadaria, daquelas que não se sabe bem como começam e como acabam, numa divisão de um andar superior da sala de cinema de Aveiro, onde decorria o Congresso da Oposição Democrática, em 1973. No dia seguinte, levámos todos pancada da polícia na manifestação que “encerrou” a reunião. A cena era típica do ambiente que se vivia entre os comunistas e os esquerdistas nesses anos de fim de ditadura e, durante o dia de hoje, contá-la-ei aqui no Abrupto. Falámos algumas vezes, eu e ele, com bonomia, sobre essa cena e trocávamos algumas pequenas provocações sobre o murro que ele me deu e a cadeirada que eu tentei dar-lhe. A tecnologia do murro é mais simples do que a da cadeirada, portanto penso que ele teve vantagem, mas não me lembro bem, nem interessa. É um mundo que está a acabar.

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PERGUNTA AOS NOSSOS AMIGOS JURISTAS (Actualizado)

Os blogues também têm que se calar sobre matérias eleitorais no dia de reflexão? Ou mais uma vez se demonstra o arcaísmo das leis face às novas realidades comunicacionais? Ou o que é lei lá fora, é lei cá dentro?

*

Sei que dirigiu a pergunta aos «amigos juristas», mas, ainda assim, tomo a liberdade de lhe responder. À sua pergunta responderia que sim: os «blogs» também estão obrigados a respeitar o período de reflexão. O n.º 1 do art. 10.º da Lei n.º 14/87, de 29 de Abril (na redacção que lhe foi conferida por legislação posterior) – e que rege a eleição dos deputados ao Parlamento Europeu eleitos em Portugal – remete para a legislação aplicável à eleição de deputados à Assembleia da República a disciplina da campanha eleitoral de deputados ao Parlamento Europeu.

Ora, dispõe o n.º 1 do artigo 141º da Lei n.º 14/79, de 16 de Maio (na redacção que lhe foi conferida por legislação sucessiva), que a propaganda eleitoral, por «qualquer meio», levada a cabo no dia da eleição ou no anterior é punível. Sublinho o «por qualquer meio», que torna desnecessário o aprofundamento da questão (embora houvesse, neste ponto, algumas pontos interessantes a discutir)

Este artigo deve ser lido à luz do art. 53.º (que limita temporalmente o período de campanha eleitoral) e do art. 54.º (promoção, realização e âmbito da campanha eleitoral) da mesma Lei.
A título de curiosidade acrescento que a acção penal é pública, devendo o MP promovê-la em caso de denúncia, seja ela feita por quem for.


(Inês do My Moleskine)

*

Não sou jurista mas não percebo sequer a lógica da pergunta.

1) Existe alguma lei que me proiba _a_mim_, como simples cidadão, de escrever ou falar o que quiser onde quiser no dia de reflexão? Eu não sou um partido, nem um meio de comunicação social, nem estou a organizar nenhum evento público. Se eu estiver a conversar na praça pública com os meus amigos e permitir que estranhos ouçam a conversa, isso é equivalente a uma manifestação ou um comício? Dificilmente o blog de uma pessoa singular pode ser considerado como um meio de comunicação social, até porque nem sequer cumpre os requisitos legais para tal.

2) Mas vamos imaginar que o blog era equivalente a um jornal. O seu blog está alojado na Blogspot, ou seja, nos USA. Há alguma lei portuguesa que proiba um cidadão português de escrever o que quiser nesse dia na edição estrangeira de um jornal (eventualmente até português)? E alguém pode proibir um eleitor português de ler esse jornal, seja por que meio for?

3) Sugiro que escreva o que lhe apetecer no dia de reflexão, é um bom teste. Se quiser eu copio o que escrever para o meu blog em solidariedade. Assim vamos presos os dois, já temos conversa sobre blogues... ;-)

4) Esta lei do dia de reflexão de facto não faz sentido nenhum nestes dias. Mas de qualquer modo não a estaria a violar, na minha modesta opinião.


(Tiago Azevedo Fernandes)

*

"O ter respondido antes implica que venha sumariamente justificar o que escrevi diante das considerações tecidas por TAF.

Segundo o art. 54.º que referi, a promoção e realização da campanha eleitoral cabe aos candidatos e aos partidos políticos, «sem prejuízo da participação activa dos cidadãos.»

Por sua vez, o art. 61.º define propaganda eleitoral como «toda a actividade que vise directa ou indirectamente promover candidaturas, seja dos candidatos, dos partidos políticos, dos titulares dos seus órgãos ou seus agentes ou de quaisquer outras pessoas, nomeadamente a publicação de textos ou imagens que exprimam ou reproduzam o conteúdo dessa actividade.»

O que está, pois, em causa é a actividade («que vise directa ou indirectamente promover candidaturas»), e não tanto o meio utilizado. Por outro lado, não tenho dúvidas de que «quaisquer outras pessoas» remete, em parte, para a «participação activa dos cidadãos» prevista no art. 54.º. Logo aqui começam as dificuldades: o que é isso de uma actividade que visa promover candidaturas?

O facto de o “blog” estar alojado na Blogspot é, creio, irrelevante. O Código Penal – subsidiariamente aplicável – acautela, nos seus arts. 4.º e 5.º, a aplicação da lei penal portuguesa a factos praticados em território português e a factos praticados contra portugueses por portugueses que vivam habitualmente em Portugal ao tempo da sua prática e aqui sejam encontrados.
Aqui poderíamos entrar em grandes discussões sobre a Internet, a lei aplicável e o bem jurídico em causa. Não vale a pena, seria um poço sem fundo. Assim como não vale a pena determo-nos sobre, entre outros aspectos, a possibilidade de manipular as horas de publicação dos “posts”.

Acrescento, por fim, que o que é ilícito é a actividade de promoção das candidaturas. Ninguém está, obviamente, impedido de consultar os “sites” dos partidos políticos, ler os jornais da semana anterior ou rever os tempos de antena televisivos que tenha gravado.

Terminaria com uma resposta pouco jurídica: recomendam a prudência, o bom-senso e o respeito pelo acto eleitoral que o dia de reflexão seja seguido por todos e que essa reflexão não seja feita em voz muito alta.
"

(Inês do My Moleskine)


*

"Respondendo à primeira pergunta de Tiago Azevedo Fernandes, reproduzo o art. 61.º da Lei Eleitoral para a Assembleia da República, a qual é aplicável às eleições para o Parlamento Europeu: «Entende-se por propaganda eleitoral toda a actividade que vise directa ou indirectamente promover candidaturas, seja dos candidatos, dos partidos políticos, dos titulares dos seus órgãos ou seus agentes ou de quaisquer outras pessoas, nomeadamente a publicação de textos ou imagens que exprimam ou reproduzam o conteúdo dessa actividade».

Assim, só será propaganda a actividade que vise a promoção de uma candidatura - ainda que, aparentemente, essa actividade apenas se traduza no denegrir de uma candidatura adversária -, e já não uma actividade que vise, por exemplo, promover a abstenção geral ou uma força partidária que não tenha apresentado qualquer candidatura.

Todavia, toda a actividade enquadrável no conceito de “propaganda eleitoral”, quando praticada no dia das eleições ou no dia anterior, é punível, independentemente do sujeito que a pratica - podendo, pois, o “cidadão da rua” incorrer na prática deste crime.

Quanto à segunda questão, afigura-se ser irrelevante o lugar onde o blog está alojado. Em Portugal vigora a chamada teoria da ubiquidade - art. 7.º do Código Penal. De acordo com esta teoria, o crime considera-se praticado em Portugal desde que no nosso território ocorra - ou também ocorra - um dos seus momentos relevantes.
Se a publicidade do texto propagandístico ocorre em Portugal - isto é, ocorre em todo o mundo ligado à Internet e, por conseguinte, em Portugal -, considera-se que o crime teve lugar no nosso país, para efeitos de aplicabilidade da Lei Penal portuguesa e da competência dos tribunais portugueses - o mesmo sucede se a emissão do texto partir de Portugal. No entanto, é sempre necessário que tenha havido dolo, isto é, que tenha havido intenção do agente de tornar público junto dos eleitores portugueses um texto propagandístico no dia das eleições ou no dia anterior - ainda que faça através de um blog ou de um órgão de comunicação social com sede no estrangeiro."


(P.)

*

"A sua pergunta :Os blogues também têm que se calar sobre matérias eleitorais no dia de reflexão?

O dia é de reflexão e os blogs servem para isso mesmo. Para expôr ideias. E como é o dia da reflexão e depois segue-se o dia eleição é perfeitamente natural que os blogs abordem esse assunto e exponham uma lei ao seu ridículo.

Eu não sei como é que o dia da reflexão apareceu mas percebo em certa medida o aparecimento de certas restrições, mas acho que deixaram de fazer sentido neste momento.

Em relação ao meu blog acho que a lei portuguesa não é aplicável dado o facto de estar alojado numa máquina fora de território português
."

( Ricardo Figueira)


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10.6.04


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES

"Ninguém dirá o óbvio sobre o Professor Sousa Franco: viveu uma linda história de amor. Bastava olhar para eles…"

(JPC)

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ESTUDOS SOBRE COMUNISMO

Actualizados com uma primeira nota de uma série sobre cifras, pseudónimos, abreviaturas, siglas, utilizadas pelo PCP na clandestinidade.

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OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: INVERNO


Sol 135, agora está noite em Meridiani. O Inverno chega a Marte e com ele menos luz e menos energia para as sondas. A Oportunidade está a ter a aventura da sua segunda vida. A primeira foi lá chegar e estar bem, a segunda descer a cratera Endurance e poder ficar lá presa, morrendo aí. Façam figas. Figas? Acho que nunca escrevi esta palavra…

Sobre as dificuldades da Oportunidade veja-se aqui.

*

Achei que gostaria de saber que a Opportunity "decidiu" arriscar e entrar na "Endurance". O sítio oficial está algo desactualizado mas o fluxo de imagens continua e a fotografia traseira do SOL 133 não engana."

(Pedro)

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François Clouet

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EARLY MORNING BLOGS 223

The Window


She looks out in the blue morning
and sees a whole wonderful world
she looks out in the morning
and sees a whole world

she leans out of the window
and this is what she sees
a wet rose singing to the sun
with a chorus of red bees

she leans out of the window
and laughs for the window is high
she is in it like a bird on a perch
and they scoop the blue sky

she and the window scooping
the morning as if it were air
scooping a green wave of leaves
above a stone stair

and an urn hung with leaden garlands
and girls holding hands in a ring
and raindrops on an iron railing
shining like a harp string

an old man draws with his ferrule
in wet sand a map of Spain
the marble soldier on his pedestal
draws a stiff diagram of pain

but the walls around her tremble
with the speed of the earth the floor
curves to the terrestrial center
and behind her the door

opens darkly down to the beginning
far down to the first simple cry
and the animal waking in water
and the opening of the eye

she looks out in the blue morning
and sees a whole wonderful world
she looks out in the morning
and sees a whole world.


(Conrad Aiken)

*

Bom dia!

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9.6.04


SOBRE A MORTE DE SOUSA FRANCO

Escrevo amanhã no Público um artigo cujo título talvez diga alguma coisa: “Morto pela Morte inexorável e morto pela campanha evitável”. O último artigo da série sobre as democracias e a guerra só sairá na semana seguinte.

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EARLY MORNING BLOGS 222

Le matin


Moriturus moriturae !

Le voile du matin sur les monts se déploie.
Vois, un rayon naissant blanchit la vieille tour ;
Et déjà dans les cieux s'unit avec amour,
Ainsi que la gloire à la joie,
Le premier chant des bois aux premiers feux du jour.

Oui, souris à l'éclat dont le ciel se décore ! -
Tu verras, si demain le cercueil me dévore,
Un soleil aussi beau luire à ton désespoir,
Et les mêmes oiseaux chanter la même aurore,
Sur mon tombeau muet et noir !

Mais dans l'autre horizon l'âme alors est ravie.
L'avenir sans fin s'ouvre à l'être illimité.
Au matin de l'éternité
On se réveille de la vie,
Comme d'une nuit sombre ou d'un rêve agité.


(Victor Hugo, cortesia de João Costa)

*

Bom dia!

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8.6.04


A FONTE DA ABSTENÇÃO EUROPEIA

é, do meu ponto de vista, primeiro que tudo, a falta de democracia do processo europeu. Como governos nacionais e burocratas de Bruxelas não desejam envolver os cidadãos, evitam a todo o custo um escrutínio real dos parlamentos nacionais e dos cidadãos. Forçando uma realidade virtual e imaginária que é o “cidadão europeu”, o qual tem o mérito de não existir e, por isso, não controlar o que fazem, evitam a todo o custo o “cidadão nacional-europeu”. Esta é, nos últimos anos e cada vez mais (veja-se o processo da Convenção e o seu fruto, a Constituição), um elemento determinante das suas políticas. Depois admiram-se da elevada abstenção nas eleições europeias ou dos votos “não” nos referendos, como o irlandês ou o sueco.

O processo europeu é hoje essencialmente vanguardista, elitista e burocrático, e tornou-se falsamente consensual. O único país da Europa onde há um verdadeiro debate europeu é o Reino Unido. Excessivo, muitas vezes desequilibrado e chauvinista? É verdade, mas é um facto que a questão europeia está inscrita no centro da agenda partidária, no centro do que divide os dois partidos dominantes e dentro dos dois partidos. Em política, só o que divide é vivo, e, salvo circunstâncias de emergência nacional e internacional, o falso consenso normalmente esconde alguma coisa que interessa esconder e afasta o cidadão comum. Depois não se espere que ele se sinta comprometido e vote.

*

Um crítica de Vital Moreira (de que discordo, mas que vale a pena ler) a esta posição em Causa Nossa.

*

"Não me sinto menos informado do que a maioria. Sou, talvez, o eleitor médio, com esperança que a média não seja muito ignorante. E devo dizer que, ao contrário das motivações do voto em eleições nacionais (legislaivas, regionais, e presidenciais, por ordem de interesse) não me sinto confiante para decidir quanto às eleições europeias. Acabarei, estou certo, por votar no meu «clube», no meu lado, com o sentido do voto útil. Mas fico preplexo com as declarações do Primeiro Ministro, por exemplo, quando afirma que votar na lista da coligação é confiar na lealdade dos deputados europeus para com este governo, da sua côr. Levanta-se o duplo problema: por um lado, espera-se que os deputados portugueses defendam os interesses nacionais; por outro espera-se que sejam «de direita», ou «de esquerda», da «coligação», ou da «oposição». Há ainda a falta de entusiasmo na verdadeira importância desta (minha) escolha: que diferença fará? Não consigo identificar, cá no meu canto português, o impacto que cada grupo parlamentar europeu teve. Eu sei que me poderia informar, mas a sensação que fica, para este eleitor médio, é a de indiferença, ou impotência. E isso não contribui para uma adesão à «Europa».

(Lourenço Ataíde Cordeiro)

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DE NOVO SEM MANCHA


K. Bogayevsky

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BEM DITO

AINDA ACABAM A PROIBIR ( NOVAMENTE) O PÉ-DESCALÇO: É de uma estupidez e de um provincianismo total pretender que as greves durante o Euro-2004 perturbam a hospitalidade portuguesa que é devida aos bárbaros que aí vêm. Se querem conhecer Portugal, pois que conheçam os Jerónimos, os Estádios, a sardinha assada, mas também as dificuldades das pessoas, as lutas laborais, o jogo político. E que conheçam também como um país com tantas carências - saúde, educação, ordenados - constrói tanto palácio de betão. Pois que tudo conheçam e tudo contem, quando retornarem às suas casas.

FNV no Mar Salgado

Acrescento: quem conheça o "mundo", a parte do mundo onde pode haver greves em legalidade, ainda está para descobrir o sítio em que os sindicatos não aproveitem o acréscimo do poder de negociação que têm nestas alturas. Veja-se a França, cujas greves de transportes, ou do tráfego aéreo, são cíclicas e nos "bons" momentos. Se não houver violações da lei que protege os serviços mínimos, as greves fazem parte da respiração de uma sociedade democrática.

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EARLY MORNING BLOGS 221

Incerteza


Toda, toda a noite fria
O rouxinol cantou.

Mas ao raiar do dia
Logo se cala triste,

Uns dizem que fugiu
Outros que não existe.


(Pedro Homem de Mello, cortesia da Joana)

*

Bom dia! Já viram Vénus obediente a passar diante do grande Sol? COM CUIDADO porque o Sol não é para brincadeiras, não se olha de frente.

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7.6.04



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O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES

"Ao ler o seu comentário sobre os Jornalistas e a cobertura da campanha eleitoral recordei-me de um pequeno ensaio de Kierkgaard que li há anos. Só o tenho em tradução inglesa, publicado em Soren Kierkegaard, The Present Age and of the Difference Between a Genius and an Apostle, New York, Harper Torchbooks, 1962. Escrito em 1846, intitula-se The Present Age e segue um pequeno extracto, mais precisamente o final do ensaio:

"The Media is an abstraction (because a newspaper is not concrete and only in an abstract sense can be considered an individual), which in association with the passionlessness and reflection of the times creates that abstract phantom, the public, which is the actual leveler. . . . More and more individuals will, because of their indolent bloodlessness,aspire to become nothing, in order to become the public, this abstract whole, which forms in this ridiculous manner: the public comes into existence because all its participants become third parties. This lazy mass, which understands nothing and does nothing, this public gallery seeks some distraction, and soon gives itself over to the idea that everything which someone does, or achieves, has been done to provide the public something to gossip about. . . . The public has a dog for its amusement. That dog is the Media. If there is someone better than the public, someone who distinguishes himself, the public sets the dog on him and all the amusement begins. This biting dog tears up his coat-tails, and takes all sort of vulgar liberties with his leg--until the public bores of it all and calls the dog off. That is how the public levels."


Actualmente já ninguém lê Kierkegaard mas é pena pois ele tem muito para nos ensinar."


(João Costa)

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NOTAS CHEKOVIANAS

Ivan Bounine, Tchékhov, Editions du Rocher, 2004

Bunine, um grande escritor russo esquecido apesar de ter recebido o Prémio Nobel, foi amigo de Chekov nos últimos anos da sua vida. Anotou ditos, situações e comentários sobre o escritor seu amigo e, quase cinquenta anos depois da morte de Chekov, publicou este livro que só agora, cinquenta anos depois, está disponível em francês. Chekov quando o viu tirar notas disse-lhe: “Nunca fales de mim como um “gentil talento” ou como uma “boa alma”. Bunine cumpriu metade. Falou de Chekov como um génio e … como uma “boa alma”.

Citando opiniões de Kurdiumov sobre Chekov, Bunine escolhe esta : “Depois do sangrento cataclismo russo, lê-se Chekov com muita atenção, porque longe de estar ultrapassado, ele parece-nos agora mais próximo, mais compreensível e infinitamente mais importante do que antes.” Serve para os dias de hoje.

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EARLY MORNING BLOGS 220

Corazón, ayer sonoro,
¿ya no suena
tu monedilla de oro?
Tu alcancía,
antes que el tiempo la rompa,
¿se irá quedando vacía?
Confiemos
en que no será verdad
nada de lo que sabemos.


(Antonio Machado)

*

Bom dia!

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6.6.04


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: UMA OLHA PARA CIMA, OUTRA PARA BAIXO



Opportunity on the Edge é o título que a NASA dá à situação da Oportunidade, pendurada numa encosta, olhando para a cratera Endurance. O Espírito olha para cima, para as Columbia Hills, a Oportunidade olha para baixo – boa metáfora, dirão os cínicos. Mas quando a Oportunidade fala com o Espírito, diz-lhe que aquela cova perfeita foi cavada por um gigante que ali se deitou.

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© José Pacheco Pereira
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