ABRUPTO

7.4.06


AGUSTINA BESSA-LUÍS
FAMA E SEGREDO NA HISTÓRIA DE PORTUGAL



Aos catorze anos D. Sebastião era vaidoso como o pote da leiteira de Gil Vicente. Era inteligente, vivo, confuso, como toda a criança malcriada mas recebida com tolerância porque responde pela sobrevivência dum povo. É difícil, para quem não foi nascido e criado na integridade cavalheiresca da monarquia, avaliar desse acatamento solene perante a majestade dum soberano. D. Sebastião era o rei, reconhecido e sagrado. Há um sabor de traição num simples desacordo até de etiqueta. Um fidalgo morre sem acusar de injustiça o seu rei. Morre inocente mas não vence o escrúpulo de deixar nome de inimigo do rei.

Hoje, com o manual da psiquiatria muito conferenciado num século de debates entre o normal e o patológico, é mais fácil percorrer os caminhos da História e trazer à luz os seus personagens. D. Sebastião foi tratado como um enfezado capitão de delírios e de toscas ambições; ou então como o seu oposto, um rei em tudo distinto, arrebatado pelos ideais colhidos nas memórias doutros Césares. Não faltou quem o equiparasse aos grandes de Roma e lhe pusesse na mão o ceptro duma rainha destinada a ser garantia da civilização. Nem uma coisa nem outra. D. Sebastião foi vítima do que se chama uma situação vital mal suportada com origem possivelmente num facto que se interiorizou até ao delírio, por exemplo, o afastamento da mãe aos quatro meses de idade e que ele nunca mais viu. D. Joana era de feitio seco e mal encarado, isso nós sabemos. A sua ambição diminuía os sentimentos de família para dar prioridade aos interesses do Império. Isso é comum nos clãs que se tornam poderosos, ainda mais pela força tentaculosa do dinheiro e da religião.

Mas, sobretudo, a compleição genética de D. Sebastião é importante e vai além de todas as condições emocionais desde a infância até à puberdade. Ele é um maníaco destinado a uma ensombração de ideias que resultarão na perda do reino. A sua incapacidade de atenção faz dele um aluno que pode ter um período brilhante em que a linguagem é rápida e imaginativa, seguida de prolixidade na desorganização do pensamento com propósitos desordenados. A expansão do humor com a convicção de tudo conseguir, pode alternar com uma agressividade exasperada. Como a que D. Sebastião manifesta a sua avó D. Catarina, dando aso a que ela se sinta mal e perca os sentidos. Um sintoma advertido pelos médicos é o da regulação térmica. D. Sebastião é acometido de frio intenso, é preciso cobri-lo e aquecê-lo, o que dá origem a ditos irónicos, como o de tratarem o seu casamento com frieza.

Esta é uma obsessão da família carnal e política. A saúde do príncipe parece não dar cuidados de maior, com excepção das perdas nocturnas e uretrite crónica cuja causa pode muito bem ser mais secreta do que se aventura. O estado de frustração do rei é manifesto e Alcácer-Quibir regista o seu clima mais alto. A crise pode manifestar-se na criança de alguns meses separada de sua mãe durante um largo período. A sua avidez afectiva pode tomar um carácter agressivo em relação ao meio envolvente. Não é de afastar em D. Sebastião um conteúdo homossexual, o que constituiria uma perturbação profunda vinculada ao ideal do eu narcísico. O esforço que D. Sebastião faz para corresponder às expectativas do reino, esforço físico e moral que o leva a usar da caça e dos exercícios de campanha desmesuradamente, chega a ser comovente. É um jovem bem constituído mas cujo conflito interior está na base duma tristeza que iria ser-lhe fatal. Nada há que o possa salvar; e ao país, com ele.
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Eu sempre disse que os grandes mestres não são próprios para educar. Porque o seu exemplo acabrunha quem não tem ânimo ainda para entender a grandeza. D. Sebastião lia as proezas de Carlos V com tal despeito que se tomou da obsessão de lhe merecer o parentesco e o destino. A impressão que dá é a dum bom aluno de artes que não lhe competiam, como a da guerra. O facto é que se prepara para a batalha e procede na mesma batalha duma maneira desordenada; sobressai o tipo neurótico, e, apesar da extravagância do seu comportamento, apesar da sua técnica do imaginário e de fingimento, ele não deixa de se adaptar à realidade. O rei compreende que a morte está presente e que não lhe pode escapar. A famosa frase “morrer, mas devagar” que, a ser autêntica é uma das mais belas que se podem proferir num momento em que o delírio atinge o seu auge, o delírio da morte, pode pertencer ao plano do célebre conto do rei vai nu. Gracián conta a história com muita fantasia e redobrado malabarismo de palavras. Parece D. Sebastião aquele caso de tecedores de maravilhas que se propuseram bordar um pano com que ele um dia se cobrisse. Ao longo das jornadas do trabalho, que na verdade não era nenhum, o rei mandou o criado, o aio e o mordomo, ver como corria a tarefa. E todos, com medo de o desiludir ou de alguma maneira o desenganar, contavam maravilha do trabalho dos burlões. E o próprio rei quando lhe mostraram o trabalho feito, admirou-se do que não via. E vestiu-se de nada e o povo de nada o aplaudiu. Até que um rapaz, de poucas artes e menos educação, gritou dentre a multidão: “O rei vai nu!”. Pois D. Sebastião, é como o dito rei, vestido de tela invisível; adornado de coisa nenhuma, aparecido sem nada se ver.

Depois de tudo, entre muitas exéquias e rituais da cristandade, não havia grande fé em Portugal. O duque de Alba faz uma advertência sobre a jornada de Alcácer-Quibir e parece que tece no tear o tal pano invisível: “Como se pode persuadir o que já é, e deve ser visto, e como pode ser visto o que não foi, nem é visto, e muito menos por razão, e com razão entendido, e alcançado”. É uma resposta enigmática mas suficientemente clara para se perceber que ele não tem esperança, nem no rei, nem na batalha, nem nos favores do Céu. Para ele, D. Sebastião é inteligente para louco e não cuida em pôr o ânimo abaixo da razão, como o cristão à europeia deve fazer. Entretanto, D. Sebastião endivida-se, compra biscoito, pólvora e tudo o que possa dar-lhe garantia de vencer a guerra. Recruta um contingente fornecido pelo príncipe de Orange, composto por alemães, holandeses, e valões, e que trazem com eles as mulheres, os filhos e as amantes, o que causa espanto em Lisboa ao saber-se que eram calvinistas e luteranos. “Ponderei serem hereges tão bons cristãos, que ajudem à guerra contra os mouros, mais que os cristãos, a quem convinha mais o bom efeito desta guerra, que aos hereges”, escreve o rei a Cristóvão de Moura, um português da confiança de Filipe II e que foi o testamenteiro de D. Joana, a mãe de D. Sebastião. Filipe II não gostou da heresia do sobrinho, mas um reino vale bem uma falha de catecismo. Não deixava de dar boas palavras a D. Sebastião, mas não se distrai em dificultar a aventura feita a peso de ouro e com promessas impossíveis de cumprir. O rei está tão obstinado que trata sem respeito os velhos fidalgos e só se fia dos jovens da sua idade, os do seu bando. A vaidade, a sua mania de merecer todo o aplauso e todo o prémio do mérito que os aduladores lhe conferiam, faz com que ande arredio de Lisboa ou começa a ser menos estimado. Num torneio a pé, na Primavera de 1570, combateu com o alferes-mor D. Luís de Menezes; saltou-lhe a espada da mão mas foi-lhe dado o prémio pela graça com que levantou a espada do chão. As pessoas avisadas e prudentes, e com qualquer direito hereditário a resistir ao olho cobiçoso de Filipe II, estavam perplexas e varadas de desgosto. D. Duarte, filho do infante D. Duarte e presumível pretendente ao trono por morte de D. Sebastião, morreu com trinta e cinco anos, dizia-se que minado pelas ofensas que o rei lhe tinha infligido. D. Duarte fora um dos presumíveis maridos da infanta D. Maria mas, tendo ela recusado melhores partidos, não era de crer que aceitasse tal casamento. O ânimo que até ali mostrara, de entranhado orgulho, não fazia prever isso.

O que se verifica na dinastia de Avis, é esse assomo de pedantaria, traço mais burguês do que fidalgo e que vem de longe, com o espírito negociante de D. João II.

“Tem os impérios seus altos e baixos; crescem com o valor no seu auge, conservam-se numa mediania que basta para não decaírem, ainda que mais monarquias perecessem por falta de valor do que por excesso.” Este pensamento de Gracián podia ser dedicado a todos os grandes do mundo. Aquilo de “oponho um rei a todos os passados; proponho um rei a todos os futuros”, parece convir a D. Sebastião. Só que ele não foi um rei do passado nem um rei do futuro.

© Guerra &Paz editores, Agustina Bessa-Luís. Reprodução Interdita.

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6.4.06


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: TÉTIS DE MUITO PERTO


A cratera central chama-se Penélope. Que mantos tecerá ao frio? Ou olhará para Saturno, o pai universal, e interpretará as cores?

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FAZER OPOSIÇÃO (1)



Haver uma oposição eficaz é o melhor sintoma da boa saúde democrática e um dos factores cruciais para assegurar uma boa governação. É mais importante do que o consenso ou os "pactos de regime", que uma boa oposição não põe em causa, mas integra numa política alternativa, não na morte do contraditório. Esta é uma realidade que, nos palácios de Belém e de S. Bento, não pode ser meramente tolerada, como se tolera uma irritação que nunca desaparece, ou uma inevitabilidade incómoda, mas deve ser percebida como fundamental, tanto mais que há uma maioria absoluta a controlar.

Fazer uma boa oposição é em primeiro lugar... tarefa da oposição. Ora confunde-se cada vez mais a dificuldade que esta tem em fazer oposição eficaz, fruto de muitos factores, nos quais se inclui também a sua própria incompetência, com a impossibilidade de haver oposição eficaz nos próximos três anos. Engano puro - não faltam oportunidades, nem exigência de vigilância e crítica ao Governo PS. Não faltam - bem pelo contrário, abundam as razões, o que é preciso é que a oposição mude nos seus métodos, processos e objectivos para ser eficaz.

Comecemos pelo método para chegar à substância. Hoje há uma condição prévia, fundamental, urgente: o PSD e o CDS precisam desesperadamente de estudar. Corrijo a frase: o PSD e o CDS precisam desesperadamente de estudar para produzir políticas. Políticas sérias, informadas, consistentes e diferentes, em vez do lastro de posições, semiposições, posições na oposição e práticas governativas em contradição, afirmações demagógicas, pragmatismos necessários e oportunismos absolutos, que fazem o reportório partidário. O rastro que têm atrás de si os partidos que se alternam no poder, e que transformou o pragmatismo inevitável da governação num oportunismo puramente táctico, é péssimo. Já era de há muito desadequado e criticável - hoje, é um sintoma gritante da crise dos partidos em Portugal, que tem como efeitos o puro linguarejar táctico que se ouve todos os dias no Parlamento e nas declarações, que nada acrescenta, só introduz ruído. E só faz ruído porque esse linguarejar revela na sua essência apenas uma vontade de contraditório, do contra, sem coerência, sem consistência, sem interesse. E, para além do cansaço do "politiquês", para qualquer observador distanciado revela uma muito grande ignorância sobre o Portugal de hoje, os seus problemas, a sua realidade económica e social

Como o "politiquês" é um código árido de comunicação entre políticos de segunda, tende a ser muito conservador e a manter fórmulas que remetem para uma concepção do país que já tem pouco que ver com a realidade. O "politiquês" é uma corruptela de um Portugal "conhecido" apenas dos artigos de jornais, de reuniões partidárias e jantares-comícios, de graçolas e bocas de conversa de café e de corredor, por gente que não lê e não estuda. A única coisa que actualiza os praticantes do "politiquês é verem o professor Marcelo todas as semanas, que lhes dá uma certa lubrificação discursiva e argumentativa, que sozinhos nunca teriam.

Contrariamente ao que pensam os próceres da direita do dr. Portas e da esquerda do dr. Louçã, a questão não é ideológica, ou pelo menos, não é essencialmente ideológica, nem sequer de "centrão" versus dicotomia esquerda/direita. O mundo puro das ideologias soçobrou quando a sociedade moldada pela Revolução Francesa e pela Revolução Industrial, que lhes tinha dado origem, se defrontou com pequenos problemas como a revolução da informação, a bomba termonuclear, o terrorismo apocalíptico, a crise do Estado-providência, a mediatização do espaço público, a "cultura de massas", o consumismo, etc. Hoje, ideologias globais, que ofereçam interpretações globais e coerentes para todos os problemas, leituras sistémicas baseadas em tradições do passado (como é a esquerda e a direita), não servem a não ser para os órfãos identitários, uma forma típica de conservadorismo. O problema é para já regressar a formas de piecemeal reformism, no sentido popperiano, de uma política mais modesta, mais experimental, menos de engenharia social e mais de pequenas intervenções numa realidade que tem outras leis e outras regras que é suposto conhecer a fundo. Ora uma condição fundamental para fazer este tipo de políticas é estudar, discutir, confrontar e produzir orientações, linhas de acção que se avaliem pela prática e não pela obsessão pela abstracção. E, durante ou depois, medir essas políticas com os interesses, as ideias, as "partes" que dividem numa democracia as pessoas.

Os partidos portugueses dão pouca importância ao estudo da realidade, e à formulação de orientações conhecidas, escritas, programáticas, porque isso contraria o tacticismo pragmático. Os partidos precisam de fazer uma considerável reconversão de recursos internos, abandonando ou reduzindo as tarefas partidárias de aparelho antigas, sobrevivências do tempo em que os partidos faziam o seu próprio marketing, publicidade, previsões eleitorais, etc., para outro tipo de organização mais voltada para a criação de think tanks, produção de documentos de orientação, todo um esforço de estudo, análise e produção de política que a complexidade dos problemas exige.

Os partidos precisam de virar uma parte importante da sua actividade interna das funções burocráticas, elas próprias tão cheias de funcionários recrutados por protecções e amiguismo, para um novo tipo de voluntariado político, a quem o partido deve dar meios, gastando aí recursos que hoje esbanja mantendo um número de funcionários excessivo, empregues em tarefas quase fictícias.

Não estou a dizer que os partidos devam ser dirigidos por académicos e professores, na sequência de uma tendência nefasta que já existe no sistema político e comunicacional de achar que as opiniões académicas de "peritos", de "sábios", estão à margem e acima da política. Precisamos é de políticas que incorporem a maior quantidade de saber possível, que sejam produzidas por cidadãos que usem os seus conhecimentos a favor de uma ideia de "bem público", que conheçam melhor o seu país, estudem os problemas e sejam capazes de ouvir e de pensar sem ser com o "politiquês" pavloviano que se usa hoje em Portugal.

Comece a oposição por fazer este trabalho de casa, logo a seguir verá como é fácil avançar com um programa próprio e autónomo, que nenhum exercício de "ocupação do espaço político", como se diz que o eng. Sócrates está a fazer, pode diminuir.

(Continua)

(No Público.)

*
Também me parece óbvio que só através de uma análise com um mínimo de profundidade dos problemas do país e de uma subsequente definição de políticas pode a oposição começar a ganhar credibilidade e legitimidade – e, sobretudo, evitar erros e abusos por parte de um governo de maioria absoluta.

Parece-me que isto ainda não aconteceu em Portugal devido a uma combinação de dois factores. O primeiro é que preparar políticas com alguma seriedade é um trabalho árduo e de médio/longo-prazo, o que muitas vezes não é compatível com a natureza imediatista das agendas políticas e da comunicação social. O segundo factor, talvez mais importante, é que se presume que quaisquer políticas que venham a ser preparadas e anunciadas serão inevitavelmente “impopulares” junto de alguns sectores da opinião pública, algo que seria imediatamente explorado pelos outros partidos. Daqui resulta que fazer um trabalho de casa com algum rigor tenha, pelo menos no curto-prazo, muitos mais custos que benefícios.

Claro que, por outro lado, querer governar sem se saber que políticas devem ser prosseguidas e como devem ser implementadas é algo difícil de explicar, a não ser à luz da procura do poder pelo poder. No entanto, nem a opinião pública nem a comunicação social se insurgem contra a pobreza do debate de políticas, até nas alturas críticas das campanhas eleitorais. E, assim sendo, parece ser dificil romper este equilíbrio de superficialidade na condução dos assuntos públicos que leva a tanto desperdício para Portugal.

(Pedro Silva Martins)

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O partido que deve ser a face mais visível da oposição em Portugal é o PSD. Mas basta ver ou ouvir os debates da Assembleia da República e, percebe-se nitidamente que quem sobressai mais no papel de oposição são os extremos, Bloco de Esquerda e CDS-PP. Será que o PSD não estará refém deste "centrão", que o acabou por absorver? Poderão partidos tão carreiristas, estatistas e aparelhistas como são o PS e o PSD, colocar em prática uma oposição com menos de politica de merceeiro, antes de profundidade e de estudo da nova realidade social emergente? E preocupada com novas causas... terrorismo, alterações climáticas, ecologia, trabalho ou emprego, reformas ou fundos de reforma, escolaridade ou literacia, etc.

O facto de termos uma classe politica tão presa à herança de Abril, não constituirá também um constrangimento, para uma verdadeira revolução do modo de fazer politica, não olhando a realidade, a partir da velha dicotomia esquerda-direita, desta perspectiva tão ideologicamente maniqueísta, mas tão substancialmente desadequada ao mundo contemporâneo. Pelo que vejo da classe política, tão cedo, não auguro coragem para empreender essa viragem sócio-cultural (...)

E os jornalistas, comentadores políticos, analistas políticos, estarão preparados para viver e trabalhar sem esta almofada, consubstanciada, nesta divisão simplista da sociedade actual, esquerda-direita, preto-branco... não será predominante uma grande faixa cinzenta (o "centrão")! Nas noites de eleições só ouço falar nas vitórias ou derrotas, da esquerda e da direita. Será que isto é sério por parte daqueles que deveriam ser estudiosos do fenómeno político, ou será apenas cómodo e simplista?

Esperemos, no entanto, que seja possível uma politica com mais substância e com muitos menos jogos florais!

(Helder Barros)
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Concordo em absoluto com as ideias expressas, mas surge uma questão: como estudar dossiês e apresentar políticas alternativas credíveis, fruto de muito estudo e reflexão, se os partidos, nomeadamente o PSD e o PS, têm afastado intencionalmente as pessoas qualificadas?

(Carlos Manuel Serra)

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(...) há cerca de cinco anos que vivo no Reino Unido e que tenho tido oportunidade de acompanhar a maneira como se preparam políticas por aqui. Como sabe, o contraste com Portugal é absoluto: entre muitos outros exemplos, os partidos apresentam claramente as suas prioridades (educação, saúde, impostos, burocracia, Europa, etc); caso queiram gastar mais numa área, explicam de onde vem esse dinheiro (impostos, divida, cortes em outras áreas). Quaisquer incoerências são imediatamente apontadas pelos jornalistas ou pelos vários “think tanks” que existem espalhados pelo país.

Ao mesmo tempo, a “evidence-based policy” é o método por excelência para o desenvolvimento de melhorias incrementais nos serviços públicos: conhecer as experiências de outros países, adaptá-las ao Reino Unido, desenvolver projectos piloto, avaliá-los com rigor, disseminar os resultados com transparência, e alargar os projectos ou discontinuá-los, dependendo do seu sucesso. É todo um pragmatismo na condução dos assuntos públicos que infelizmente ainda nem sequer se vislumbra em Portugal.

(Pedro Silva Martins)

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RETRATOS DO TRABALHO NO GERÊS, PORTUGAL


Guardar vacas, Serra do Gerês, 2006.

(António Ferreira de Sousa)

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NUNCA É TARDE PARA APRENDER: HOMENS, NAVIOS E SOCIEDADE

In Which we Serve (Sangue Suor e Lágrimas, que existe numa colecção de DVD portuguesa, os "Clássicos do Cinema") de David Lean e Noel Coward é um típico filme de propaganda de guerra. Feito a partir da história do HMS Torrin, um contratorpedeiro inglês afundado ao largo de Creta pela aviação alemã, é uma apologia da Marinha de Guerra, com os tripulantes a brindarem ao navio na ceia de Natal, a gritarem do salva vidas "Hip, hip hurrah!!" quando ele se afunda, terminando na cena final com um "God bless our ships and all who sail on them". Numa ilha, admiram-se os marinheiros, e numa ilha sitiada, como estava Inglaterra em 1942, a Marinha era então o único ramo das forças armadas em que a supremacia inglesa face aos alemães era incontestável. Até aqui, o que se espera.

Film stillMas quando se vê o filme hoje, para além dos anacronismos, como um encarregado dos estaleiros a dirigir os operários de colete e gravata, o que é mais interessante é o retrato não intencional da rígida estratificação social inglesa. Mostrando as famílias do comandante, dos oficiais e dos marinheiros, entra-se em mundos totalmente diferentes, estratificados e estanques, e isso é a marca típica de Noel Coward que escreveu o guião e interpreta o comandante. Vivem diferente, em sítios diferentes, falam de forma diferente e cada um sabe as suas distâncias. Não se misturam. Quando o comandante e um marinheiro, cada um com as suas mulheres, se encontram num comboio (que, como o navio, força um terreno comum), o marinheiro levanta-se para o cumprimentar numa carruagem de terceira classe, enquanto na cena imediatamente a seguir, o comandante aparece na carruagem-restaurante, numa mesa servida com porcelana e talheres de prata. Sempre dois mundos. Um stiff upper lip, outro moldado pelas paixões humanas, os marinheiros riem-se, embebedam-se, choram. Noel Coward nada.

Em plena guerra e num momento muito difícil, o cimento que une os ingleses é o combate, personificado no filme pelo navio, metáfora do presente, mas também do passado, metáfora da Grã-Bretanha. Mas dentro do navio e fora dele o sistema de convenções permanece intacto. O comandante sabe de cor todos os nomes da sua tripulação, de que tem que cuidar até ao limite da sua vida, mas entre ele e os seus marinheiros há deferência e respeito, há hierarquia (e não só a da patente), e ordem, militar e social. A classe dirigente inglesa sente solitária o peso de todas as responsabilidades, e nisso é inexcedível. É capaz de colocar, de um dia para o outro, meninos estragados pela vida e que pouco mais sabem do que disparar aos faisões na Escócia, a mostrar a mais absoluta coragem atirados de paraquedas para as montanhas dos Balcãs, ou a dar o exemplo na primeira linha de um assalto de infantaria na Flandres. Mas o mundo deles vai junto, como acontecia com os oficiais que levavam o mordomo atrás com as malas.

Nenhum americano ou francês poderia fazer este filme sem que aparecessem dois sentimentos que estragariam completamente a fleuma de Coward: os americanos não deixariam de retratar a pulsão democrática para cima, a escada das "oportunidades" e os franceses não deixariam de ridicularizar os seus nobres, ambas atitudes comuns nos filmes da década de trinta.

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Não se "dispara" aos faisões, "atira-se" aos faisões (ou caça-se faisões, sem "aos"). E não na Escócia: faisões e perdizes é mais no Sul. Na Escócia, a caça de penas por excelência (em oposição à caça de pêlo e grossa, lebres, coelhos, veados) é o grouse (em rigor, red grouse, Lagopus Lagopus Scoticus), o supra-sumo da caça porque exclusivo da Escócia e impossível de criar em cativeiro, portanto exclusivamente bravo.

Não que isto faça qualquer diferença aos seus comentários sobre o filme, mas, aprender por aprender ...

(Frederico Pinheiro de Melo)

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Outro belo exemplo que os britânicos nos dão é a maneira como são recordados e homenageados aqueles que lutaram pelo seu país. Na mais pequena vila ou aldeia há um monumento aos mortos em combate. Erigidos, na sua maioria, após a I Grande Guerra (1914-18) continuam ainda hoje, quase 100 anos depois, a ter flores frescas que associações e cidadãos anónimos lá vão depositar.

(José Machado)

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A PROVA DOS BLOGUES: AGUSTINA LIDA PELOS LEITORES DO ABRUPTO




Devo confessar, antes de mais, que nunca fui particular apreciadora de Agustina Bessa Luís, mas o que acho formidável neste projecto de "blogopublicação" é o facto de permitir (suscitar, até) a interactividade com os leitores "comuns". Claro que os leitores do suporte tradicional, em papel, também podem escrever à editora e ao autor, e apresentar os seus comentários. Mas há, necessariamente, um grande desfasamento temporal, e esses comentários ficarão, na maior parte dos casos, entre o seu autor e o destinatário.

Com esta "blogopublicação" o livro fica com uma dimensão muito mais ampla, em benefício dos leitores. Mas também, creio eu, em benefício da autora, que pode ir vendo, "em directo", as reacções à sua obra (e até aproveitar as correcções de lapsos feitas por leitores mais atentos...)

(Madalena Ferreira Åhman, Gotemburgo)

*

Este tipo de histórias fazem com que gerações de historiadores tenham que lutar a pulso contra mitos. Conversa corrida, estilo leve e ligeiro, erros atrás de erros alternando com mitificações que não têm maneira nenhuma de ser provadas. O Fernando que casou em segundas núpcias com D. Teresa era Transtâmara?... Tinha ideia que era Fernão Peres de Trava, e foi isso que li em toda a parte. O retrato mais conhecido do Infante D. Henrique é de Grão Vasco?...Não tinha nada essa ideia.

Vou esperar para ver. Como ainda sofro com os mitos criados por Oliveira Martins, tremo com estas experiências que se anunciam sempre despretensiosas. E esta coisa de querer desvendar segredos piora tudo.

(Henrique Jorge)

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RETRATOS DO TRABALHO EM GUIMARÃES, PORTUGAL


Barba e cabelo, Guimarães, Abril 2006.

(António Ferreira de Sousa)

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EARLY MORNING BLOGS 749

"Never Apologize, Never Explain"


On the contrary, always apologize and explain,
in the terror-white veracity, down to the essence bone,
tenaciously follow the long road. Be
capable and Voltairean, discreet of form and substance, tell it
like it is, don't gloss over
in silent splendor.

Give the unattractive facts. But they won't be
that insipid (arrears of heavenly bodies).
And if you have to polish up
the contemptible gaff, give it all you've got—seriously,
don't swindle and pretend the sky
didn't fall in.

But dole out the mathematics, saviors of the gut.
Inching without propaganda the longhand
of dream. Even insult the host who
just wanted to play the game. Apologize in sample color,
if you loved something, say it. If kept
under your hat,

let the fallacies represent you.
From whatever Acropolis of stress, bat with
that genuine non-expurgation, the angel of bottomless pits.
Versatility and science; right the wrongs you know,
and do it with wholeheartedness. In fundamentals
so brash, or like a glass


of water.


(Jane Mayhall )

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Bom dia!

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AGUSTINA BESSA-LUÍS
FAMA E SEGREDO NA HISTÓRIA DE PORTUGAL



Não é do meu entendimento e obrigação adiantar alguma coisa à História de Portugal, já escrita e comentada por pessoas doutoradas para isso. No que me aparento com os cronistas é na tentação de romancear e meter diálogos fictícios onde só se ajustam secos relatos. A História faz-se com as vozes do povo e conveniências de cortesãos. Estes muitas vezes ignoram o que se passa fora das paredes do paço, tão entretidos andam a compor e descompor os factos para seu proveito e não para sua erudição.

Elevado ao trono de Portugal, mais pelos rogos da plebe do que por sua vontade, o Mestre de Avis (que tinha boa índole, e isto faz bons parceiros) desistiu de ir para Inglaterra onde tinha aliados, mais notoriamente João de Gaunt, duque de Lencastre, quarto filho de Eduardo III. Tendo feito um segundo casamento com Constança, filha de D. Pedro de Castela, cultivou a ilusão de ser rei de Espanha, e era tratado por Monseigneur d’Espagne. A língua oficial era o francês, ou seja, o anglo-normando que depois se fixou no idioma próprio consagrado pela escrita.

D. João I tinha trinta e seis anos e o lugar assegurado no reino. Iam ficando longe as suas indecisas cogitações dos vinte e cinco anos, quando o casamento com D. Leonor parecia ser solução para as incertezas da sucessão e da paz com os castelhanos. As pretensões do duque de Lencastre ao trono de Espanha contavam com as diligências diplomáticas de Portugal, o que era demorado. Os tratados comerciais entre os dois países firmavam-se desde o reinado de D. Fernando que, segundo os ingleses, não era muito persistente na sua aliança.

Em 1386 João de Gaunt decidiu-se a ir reclamar a coroa de Castela, com o seu exército e levando com ele a família em toda a pompa: Constança, a filha de D. Pedro o Cruel, assassinado pelo irmão Henrique, Filipa já com vinte e seis anos e prestável para ser moeda de troca num casamento vantajoso; Catarina, sua meia-irmã, as bastardas Blanche e Joana e Catarina Swinford, aia e amante “en titre”. Era uma comitiva imponente que alegrou a piedosa Santiago, fazendo ressoar os sinos compostelanos.

O rei D. João trocava presentes com o duque de Lencastre e a mulher; além de oferecer belas hacaneias e panos de rás. O tratado que se seguiu, depois de três meses de preliminares, era o de combaterem juntos o rei de Castela, pelo que D. João receberia D. Filipa como esposa. Os preparativos da guerra eram bem conduzidos pelos estrategas, o duque de Lencastre estava satisfeito com o que diziam do futuro genro (o melhor rei que Portugal tivera em cem anos), mas quanto ao compromisso de casamento não se adiantava nada.

É verdade que o Mestre esperava de Roma a dispensa das ordens religiosas que recebera, para assim poder casar. No entanto, não mostrava entusiasmo pela noiva, a tranquila e paciente Filipa.

Era uma rapariga alta, de olhos azuis e modos aristocráticos, decerto empenhada numa severidade que fosse em contradição com a corte pouco moral do seu pai. As humilhações que sofrera ao ter de suportar a amante do duque e depois a madrasta espanhola, deram como resultado um comportamento puritano e uma experiência de sensibilidade ofendida. Tinha já um passado de desilusões, prometida a vários príncipes estrangeiros mas cujo casamento com ela tinha sido gorado. Estava no limiar da desgraça da mulher da corte, que era a obscuridade pela falta de preço, de herança e de manipulações políticas. E, de súbito, aparecia-lhe aquele rei de bom feitio, tanto físico como moral, que a tirava do convento e do anonimato e que lhe daria filhos. Filipa devia gostar dos filhos antes de os ver gerados. É a única notícia que temos na História duma mulher cuja gravidez é desaconselhada pelos médicos que aconselham o aborto; e ela recusa-se, levando a termo a prenhez e nascendo D. Fernando, chamado o Santo, dessa escolha amorável. Como não havia de ser ele destinado ao sofrimento de cativo?

Foi D. Filipa uma mãe de grandiosas virtudes; uma dessas pérolas que não se encontram senão num raro momento de triunfo do coração sobre a bestialidade humana. E também D. João, se bem que não fosse apaixonado, foi decerto um marido amável. Sem dúvida que ele estava grato a Inglaterra, onde pensara refugiar-se depois que o duque de Cambridge influíra para o tirar da prisão. Os projectos da guerra com Espanha não eram aprovados pelo Parlamento e o duque de Lencastre, em 1382, era tão pouco respeitável que não pôde sequer conseguir um empréstimo reembolsável para pagar o seu corpo expedicionário. Os mercadores de Londres não acharam interesse em serem seus fiadores e o projecto do duque ficou suspenso. Numa época em que a lentidão das comunicações faz supor que tudo fosse conforme a esse vagar, surpreendem-nos as rápidas mudanças na História. D. Leonor dá à luz um filho que, ao que se propala, é sufocado nos braços da ama porque suposto adulterino. Mas não vinha essa criança trazer mais desacordos no já tão dilacerado corpo do país? D. Leonor, acusada de traição, é encerrada no mosteiro de Tordesilhas, donde saiu para ir viver em Valladolid, cidade principal e capital do reino. Atribuiu-se-lhe um derradeiro amante, Zoilo Iñiquez, e uma filha. A história deixa-a tranquila, decerto gozando uma fortuna quantiosa, e não tão pobre como se quer brindar o insucesso. O que acontecia num ano, nesse tempo, dava para encher uma biblioteca.

E, com a família, João Gaunt trouxe uma aura de prestígio e de festa que deu ao Porto o gosto de cerimonial com consequências populares. O arcebispo de Braga já tinha casado os noivos por procuração, em Compostela. Mas foi no Porto que se celebraram as núpcias religiosas. D. Filipa estava hospedada no paço episcopal e decerto esperava com curiosidade e esperança, que é uma forma de submissão, a chegada do Mestre de Avis, agora rei jurado de Portugal. D. João, sem pressa, apresentou-se num cavalo branco, como os noivos da lenda. Pegou-lhe na mão, beijou-a, e beijou as outras damas, e despediu-se, partindo para o teatro da guerra que se estendia por terra e mar. A vitória de Aljubarrota não favorecia a aliança do duque de Lencastre com D. João I. Os planos políticos eram substituídos por acordos matrimoniais. João de Gaunt cede das suas aspirações a rei de Espanha, em troca do casamento da filha Catarina com o príncipe herdeiro de Castela. João de Avis cai gravemente doente e receia-se pela sua morte. A campanha bélica da Inglaterra não trouxera senão desaires e prejuízos e, quando as negociações começaram, Portugal ficava de parte. Quando o duque de Lencastre desembarca na Gasconha, a aliança com Portugal estava ameaçada. Contudo, um novo elo foi forjado, o casamento de D. João com D. Filipa. Feitas as contas, ninguém ganhava, e quatro anos de guerras, de empréstimos, de ruína mal encoberta por festejos e exultação falsa, deixavam o caminho aberto para a paz. A paz, “mãe de todos os vícios, comadre de todas as corrupções”, como diziam os pregadores mais audaciosos, franciscanos, ao que julgo.

A corte de D. Filipa era na sua maioria inglesa. O chanceler era um padre inglês; o mordomo-mor era também inglês. As damas tinham a carnação leitosa que tanto contrastava com a beleza morena das portuguesas. Foi este tipo ibérico que herdou a única filha de D. Filipa, Isabel, a que foi mulher do duque de Borgonha e mãe de Carlos o Temerário. Pode-se dizer que com a sua glória começa aqui a índole depressiva dos Avis e tantos mistérios encobre na História que patrocinam e fazem brilhar. Aqueles a quem Camões chamou a Ínclita Geração, os filhos de D. Filipa de Lencastre e o rei D. João I, pode-se dizer que deram ao país o significado da civilização em curso. Com eles, a Idade Média ficava convertida a um mau sonho de atrocidades trazidas pelos ventos da guerra. Na verdade, eles são filhos da rainha e ela educou-os para outros deveres que não eram os da intriga, da vingança, do desejo de poder. Outras luzes vinham com D. Filipa. A corte tornou-se discreta, instruída, dedicada a objectivos grandiosos mas nem por isso aventureiros.

No entanto, nessa família culta e criada para altos valores, pairava uma sombra que nenhum cronista descobriu; que só talvez um preceptor arguto descreve no mais íntimo do seu pensamento. Era uma gente estranha.

Os homens, quatro rapazes, eram altos, apurados no vestir, leitores assíduos de obras extremadas da vulgaridade. A única filha, D. Isabel, era mais do tipo meridional. Baixa, ou mediana, de cor trigueira. A escritora Rose Macaulay, ainda que sem a cristalização nos códigos e vestígios históricos existentes nos arquivos, foi uma observadora fiável nas suas pesquisas. Não se demora em dar provas do que diz, mas nem por isso a consideramos ligeira nos seus estudos. Os ingleses têm um sentido de humor que alterna com o sentido prático. “Henrique, a julgar pelos seus retratos, podia ser um fidalgo inglês da província”, diz. Justamente Henrique não tem ar de provinciano, a julgar pelo retrato mais famoso que lhe é atribuído, o de Grão Vasco. Talvez seja ele, talvez não. O que nós vemos é um homem coberto com um grande chapéu donde pende um véu e que o distingue dos outros personagens. Foi uma escolha dele próprio, pois era bastante preocupado no vestir. Trata-se dum chapéu de corte. Quanto a ser loiro e alto, isso não eram apenas características inglesas. Pedro I de Castela era alto e loiro, enérgico e com vocação marinheira. Mesmo ajoelhado, na estátua que está no Museu Arqueológico Nacional de Madrid, vê-se que tem um porte majestoso e que era formoso. Pedro I era primo de D. Pedro, o da Dona Inês de Castro e teve uma história amorosa quase tão acidentada como o seu parente português. Foi ele quem primeiro em Espanha deu um sentido marítimo ao seu reinado. Alto, loiro e marinheiro podiam ser atributos peninsulares.

No entanto, parece haver na Ínclita Geração um elemento furtivo que lhes determina a vocação e um certo movimento interior para o êxtase.

© Guerra &Paz editores, Agustina Bessa-Luís. Reprodução Interdita.

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5.4.06


O QUE É QUE SABEMOS SOBRE ANGOLA?
Angola / Republica de Angola - flag / bandeira

Agora que o Primeiro-ministro mais a sua comitiva estão em Angola, e o país aparece nos telejornais, o que é que verdadeiramente sabemos sobre a situação angolana no pós-guerra? A pergunta tem sentido porque, pelo menos os órgãos de comunicação social públicos, têm correspondentes permanentes em Angola. Que reportagens de fundo, sobre a política, a sociedade, a economia angolana, foram feitas para aproveitar a viagem governamental, fornecendo-nos informação independente, crítica, distanciada dos interesses que geram todos os silêncios sobre Angola? Não vi nenhuma. Esperava, na tradição da independência dos órgãos de comunicação, que nos dissessem porque razão não há eleições em Angola, como é que está a UNITA e o MPLA, o que se passa com a corrupção, o que é que aconteceu na recente tentativa de "golpe de estado"... tanta coisa para saber sobre Angola e nada. Nada, apenas uns comentários sobre as empresas portuguesas, sobre a crescente importância dos chineses, e pouco mais.

Existe auto-censura quanto a Angola e uma interiorização pela comunicação social da agenda dos interesses e dos negócios, com considerável indiferença quanto ao resto: situação social, miséria, corrupção da classe dirigente, riqueza e ostentação, democracia, violência. Angola é um caso típico de uma coligação de silêncios, da fragilidade do nosso jornalismo.

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Ver Adufe.


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A PROVA DOS BLOGUES: AGUSTINA LIDA PELOS LEITORES DO ABRUPTO



Confesso que hesito entre considerar o texto de Agustina Bessa Luis como um exercício literário de base histórica, ou um texto histórico com aspirações literárias. Em todo o caso, lidos alguns comentários de leitores atentos do Abrupto (...), julgo conveniente esclarecer algo relacionado com a seguinte passagem:

«Em primeiro lugar, facto que não se pode desdizer nem ocultar, D. Afonso nasceu estropiado. Era uma criança formosa e bem constituída, mas sofria duma anomalia, hoje operável, mas que no tempo era absolutamente incurável. Tinha as pernas coladas a partir dos joelhos, o que o tornava incapaz para o exercício das armas e montar a cavalo. Chegado aos cinco anos, esgotados decerto todos os tratamentos, aquele que reivindicara o lugar do seu aio, Egas Moniz, teve como solução encomendar a criança à protecção do Céu. No que foi atendido de maneira miraculosa. O menino apareceu escorreito e disposto a uma vida de agitação e conquista. A criança raquítica, embora bela e prendada de muitas graças, deu lugar a um guerreiro como não houve outro na nossa História. Dá para pensar que Egas Moniz o fez substituir por um dos seus próprios filhos ou filho dalgum rico-homem de pendão e caldeira, como se dizia.»

Esta informação aparece, pela primeira vez, num texto do início do Século XV, a chamada "Crónica de Portugal de 1419", que há quem atribua a Fernão Lopes. Usando uma linguagem actual, tal crónica, como qualquer outra deste período, é mais «literária» do que «histórica», facto que, acrescentado à época tardia em que foi redigida, dissipa quaisquer dúvidas quanto à historicidade do milagre. De resto, nas crónicas mais antigas, o aio de Afonso Henriques é Soeiro Mendes (possivelmente o da Maia), e não Egas Moniz, o que, também por si, coloca entraves a algumas interpretações ou hipóteses de Agustina - hipóteses e interpretações, de resto, tradicionais.

(Filipe Alves Moreira)

*

Alertar a Sr.ª Dª Agustina Bessa Luís que o texto contém um erro:


… Data em que D. Afonso Henriques entra a fazer-lhe guerra, teria ele vinte e dois anos. E, se nascido em 1106, trinta e quatro anos, o que parece pouco de acreditar. D. Teresa parece apaixonada e decidida a casar com o conde D. Fernando de Trastâmara, o que precipita a discórdia entre mãe e filho…

De facto se nascido em 1106, 22 anos (em 1128). Se nascido em 1094, 34 anos…(em 1128).

(Francisco Marques)

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Parece-me criticável a utilização pela autora do termo "Espanha", associado por toda a gente ao actual estado politico espanhol, numa altura em que este estado ainda estava muito longe de existir. Poderá dizer-me que nessa altura era esse o nome dado à península ibérica, o que é verdade. Contudo, este texto foi escrito no século XXI para leitores do século XXI, a esmagadora maioria dos quais (eu diria 99%), quando ler "Espanha" vai achar que se está a referir ao estado espanhol que, julgaram eles, já então existiria.

(Henrique Oliveira)

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RETRATOS DO TRABALHO EM LISBOA, PORTUGAL


Dança Contemporânea. Ensaios preparatórios de um bailado.

(Telmo Martins)

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AGUSTINA BESSA-LUÍS
FAMA E SEGREDO NA HISTÓRIA DE PORTUGAL

Há quem afirme que Afonso Henriques era um bastardo de Egas Moniz, seu pai verdadeiro. As deduções em volta deste boato são bastante significativas, pondo de parte favores dos santos e dos cronistas. Já do conde D. Henrique, que foi pai presumido de D. Afonso, a naturalidade é controversa. Uns dizem-no neto do conde Roberto de Borgonha; outros fazem-no proceder do rei da Hungria que seria o pai do dito D. Henrique, vindo a Espanha decerto em busca de glória e de fortuna. Em 1080 já estavam em Espanha três príncipes franceses, ao que parece na escolta da rainha D. Mafalda, mulher do rei D. Afonso, o sexto. Quando o conde D. Henrique entrou em Espanha o Governo de Portugal estava repartido por vários senhores, ditos cônsules; e as terras entre Douro e Mondego, mais aproximadas a mouros e suas companhias, eram governadas por um capitão chamado Sisnando. Foi do próprio D. Fernando de Castela que recebeu o senhorio de Coimbra e de todos os castelos e cidades em volta: Lamego até ao mar, o Rio Douro até aos limites na posse dos cristãos. O rei D. Afonso, passando a reinar por morte de D. Fernando, veio a confirmar todos os poderes de Sisnando, mais militar do que religioso, embora fosse suposto bispo de Iria. Era muito estimado dos mouros em Sevilha, onde vivia antes da conquista de Coimbra. No foral que D. Afonso, o sexto, deu a Coimbra, louva o capitão Sisnando como povoador e engrandecedor da cidade. Mercê da sua boa aliança com os mouros e passado entendimento sevilhano, Sisnando fez um governo pacífico e justo. No ano de 1080 mandou fazer a igreja de S. Martinho e seria decerto o mais importante dos senhores do estado de Coimbra. Uma profusão de casas aparentadas entre si, com títulos e grandeza de fundadores de conventos e igrejas, estendia-se pelas terras de Braga e Coimbra e constituía o quadro senhorial que o conde D. Henrique encontrou quando da sua entrada em Portugal. Em 13 de Fevereiro de 1095 o conde estava já casado com D. Teresa, filha do Rei D. Afonso. Tudo o que se pode averiguar dos factos históricos desses tempos é-nos oferecido por datas de escrituras, doações, batalhas e casamentos. O que importa realçar são as contradições que vêm a lume na multiplicidade dos papéis escritos. Confrontando datas, pode-se concluir que antes do fim do ano de 1094 o Conde D. Henrique não tinha senhorio em Portugal nem era casado.

O primeiro obstáculo ao senhorio de Portugal pelo casal D. Henrique e D. Teresa (Portugal foi-lhe dado em dote, antes disso na posse do conde D. Raimundo) foi levantado pela data de nascimento de D. Afonso Henriques, apontada para o ano de 1106 e não de 1094. O conde D. Henrique, seu pai, seria então homem maduro e, segundo as leis da longevidade, entrado em decrepitude, pelo que a teoria de o príncipe não ser seu filho tomou alento na continuidade da História.

Em primeiro lugar, facto que não se pode desdizer nem ocultar, D. Afonso nasceu estropiado. Era uma criança formosa e bem constituída, mas sofria duma anomalia, hoje operável, mas que no tempo era absolutamente incurável. Tinha as pernas coladas a partir dos joelhos, o que o tornava incapaz para o exercício das armas e montar a cavalo. Chegado aos cinco anos, esgotados decerto todos os tratamentos, aquele que reivindicara o lugar do seu aio, Egas Moniz, teve como solução encomendar a criança à protecção do Céu. No que foi atendido de maneira miraculosa. O menino apareceu escorreito e disposto a uma vida de agitação e conquista. A criança raquítica, embora bela e prendada de muitas graças, deu lugar a um guerreiro como não houve outro na nossa História. Dá para pensar que Egas Moniz o fez substituir por um dos seus próprios filhos ou filho dalgum rico-homem de pendão e caldeira, como se dizia.

Egas Moniz, de apelido o Gasto, casou com D. Toda Alboazar, de nome algo suspeito de arábico. A alcunha de Gasto seria antes Gasco, porque este Egas Moniz era filho de Moninha Viegas, capitão da Gasconha. Na Foz do Douro, digamos que nos penhascos do Porto, teve este grandes batalhas com os mouros. Egas Moniz, o Gasco, foi bisavô de Egas Moniz, o redentor do triste príncipe ao seu cuidado.

Esteve D. Teresa como rainha de Portugal dezasseis anos, depois da morte do conde D. Henrique. Ela sim, foi soberana, por contratos com sua irmã e doações de terras que afiançavam a paz. A D. Henrique nunca se reconheceu o título de rei, mas sua mulher, tornada à solteiria e com idade para se ver coroada e protegida de novos amores, deu em ser majestade e não súbdita até ao ano de 1128. Data em que D. Afonso Henriques entra a fazer-lhe guerra, teria ele vinte e dois anos. E, se nascido em 1106, trinta e quatro anos, o que parece pouco de acreditar. D. Teresa parece apaixonada e decidida a casar com o conde D. Fernando de Trastâmara, o que precipita a discórdia entre mãe e filho. É uma guerra ao estilo troiano, arrebatada e sensual. Salazar perguntava o que se há-de fazer dum país que começou com um filho a pôr a ferros a própria mãe. Candura extrema, que é a de acreditar que as ambições humanas não devoram o horror, para o fazer parecer santo. Enfim, o Trastâmara era uma realidade que puxava para Castela; e quem não há muito dela ganhara a liberdade, opunha-se a voltar aos preitos de vassalagem. Fosse ou não filho de D. Teresa, D. Afonso, no testamento de Múnio Viegas, pai de Egas Moniz (outro, diverso do aio), consta que no ano de 1128 já D. Afonso Henriques era senhor de Portugal. Até ao princípio desse mesmo ano parecia haver harmonia, mas as coisas precipitaram-se com a ideia do casamento; casamento nunca constado mas de certo modo provado, por exemplo, numa escritura de 1121 em que a presença de ambos é declarada. Mas causas mais graves há, um conluio entre os dois, como no texto de concórdia entre o bispo de Coimbra e o do Porto, o célebre D. Hugo, celebrada a cinco de Abril de 1122. Ambos assinam no livro da Sé de Coimbra, seguindo-se a rubrica dos senhores, “in praesentia Regina Tarasiae et Comitis Donni Fernandi, et Baronum Portugallensium”. Isto basta para testemunhar o casamento.

Quando D. Afonso Henriques desfere o golpe da sua ira é possivelmente quando Fernando de Trastâmara se arroga direito sobre o reino e a sucessão. Em 1131 há já uma filha; “Ego Comes Ferdinandus Paes filius Comitis Petri una cum filia mea nata de Regina D. Tereixa conf.”.

Mas a ambiguidade da situação persiste, e são várias as provas e contraprovas dessa união. Para que a cólera de D. Afonso Henriques se levante tão devastadora, chegando a perseguir a mãe como uma ré de alta traição, é preciso que alguma coisa ameace o príncipe e ponha em causa o seu reinado.

Há portanto uma filha do segundo casamento. Que projectos se desenrolam na falsa harmonia do Paço? Se D. Afonso Henriques não é de facto o filho de D. Teresa, se há testemunhas duma cabala que vai até ao crime, é preciso tomar medidas, e medidas profundamente arriscadas, impetuosas e até brutais. Sabemos que D. Afonso Henriques é um líder e que um líder não é um cavalheiro. E D. Teresa também não é muito escrupulosa em coisas de lealdade, porque os tempos não aconselhavam o coração senão para servir a vontade. A vontade era reinar. O efeito duma grandeza que cria a subordinação e a lisonja é fatal para a sensibilidade. Além do mais, Dona Teresa, como bastarda dum soberano, devia conjugar a avidez do poder absoluto com o direito de corrigir a genealogia. Nada se sabe da sua fisionomia, mas há a cópia duma litografia de Guglielmi, no livro de F. Fonseca Benevides Rainhas de Portugal, Lisboa 1878, que a mostra de bom parecer, possivelmente alta, de olhos negros e sobrancelhas marcadas e longas, como era próprio dos povos mediterrânicos. Bela, morena e voluntariosa, do tipo que se diria mouro; o que sugere talvez um cruzamento com uma princesa dos arraiais dum desses aliados dos cristãos com quem estes tinham episodicamente contratos de campanhas. Mas isso, o senhor Guglielmi é que sabe e fazemos fé nele.

Há prova de que D. Teresa, depois da morte do marido que a ultrapassava em muito na idade, foi senhora de Portugal até ao ano de 1127. Depois disso tudo mudou. Como filha do rei de Leão, ela tinha apoio e respeito. D. Afonso Henriques demorava a pedir-lhe contas da sua herança porque a tinha por segura e não lhe convinha abrir a cortina sobre o caso da sua deformidade de nascença e a maneira como foi curada. O povo podia confundir-se com o milagre, mas os homens de conselho, entre os quais bispos e abades, podiam mostrar desengano quanto à santidade do acontecimento de Carcare, onde se dera o prodígio. Alguma coisa sucedeu para que as relações entre mãe e filho fossem quebradas.

Sabemos que tinha nascido uma criança, uma menina, do casamento de D. Teresa com o conde de Trastâmara. Essa sim, era do seu sangue e da sua carne. É de crer que, com o andar dos anos, dezasseis de reinado absoluto, D. Teresa e o marido se propusessem dar à filha o direito de sucessão. O negócio de família decorrera no maior segredo e o conde D. Fernando tinha por seu lado o Fernandes de Trava, seu pai e praticamente toda a nobreza da Galiza. Mas Portugal tinha em sua defesa toda uma ala de capitães e gente de guerra que já se manifestara com êxito e valor quando da vinda do rei mouro Brasimi disposto a chegar às portas de Coimbra e conquistar a cidade. Percebe-se que a contínua acometida dos mouros trouxesse em cuidado Egas Moniz e o afastasse da sua quinta de Resende onde decorria a vida do infante miraculado. Alexandre Herculano põe-nos de sobreaviso sobre “os fundadores de antigas monarquias cuja vida foi desde o berço povoada de maravilhas e milagres pela tradição popular”. Mas temos que considerar a intenção dos poderes a quem convinha instaurar uma tradição, para assim melhor iludir e governar. Também é Alexandre Herculano quem afirma: “o amor cego da rainha por um homem alheio à província”, e aqui demonstra mais índole de romancista do que prudência de historiador. Não se pode assegurar a inclinação de D. Teresa pelo conde Fernão Peres, quando o que estava em jogo era a independência de Portugal e a sua soberania absoluta como rainha. Com a morte de D. Urraca sua irmã, crescem as suas ambições quanto ao senhorio do Condado Portucalense que nada mais era até então senão um campo de recontros entre fronteiros e mouros. O sentimento da nacionalidade emergia duma revolta de sete séculos, e não é sem motivo que D. Afonso Henriques foi chamado o Viriato cristão. Em D. Teresa esse sentimento não deixou de estar presente num coração onde batia o amor da mulher, mas também o desejo de se afirmar como soberana. O certo é que, depois da morte de D. Teresa, expulsa pelo filho, senão que aprisionada, o conde D. Fernando Trastâmara (ou Peres, como diz Herculano) numa exaração de doação de terras que ele faz à sé de Coimbra, tem para com sua mulher, ou amante, palavras de respeito e de emoção profunda. D. Teresa morre no primeiro de Novembro de 1130. Dia de Finados, já por si carregado de solenidade. Não tendo um reino, tem uma coroa de flores no reino dos morto.

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Nos princípios de 1127, tendo D. Afonso ainda alguma boa paz com a sua mãe D. Teresa, lavrava já a conspiração contra o rei de Leão e mais directamente contra a influência do conde Fernão de Trastâmara. A corte do falecido D. Henrique era fiel ao seu herdeiro directo, pelo que a sucessão parecia assegurada. D. Afonso VII, primo de D. Afonso, decerto avisado dos conluios portugueses para proclamarem um rei próprio, invadiu Portugal, em princípio com sucesso. Pôs cerco a Guimarães e obteve, com as forças que superavam as dos portugueses, uma declaração de vassalagem da parte de D. Afonso. Egas Moniz deu de penhor a sua palavra de que se cumpriria o tratado. Afonso VII levantou o cerco e retirou-se, fiado na honra de fidalgo que era Egas Moniz. Mas as coisas desandaram em franca hostilidade entre mãe e filho e, no ano seguinte, rebentava a revolução que teve desfecho na batalha de S. Mamede. É de supor que a vinda de Afonso VII com intuitos de confirmar os seus direitos sobre o condado portucalense, se devesse a uma queixa de sua tia D. Teresa, a qual não estaria em Guimarães, mas refugiada na corte de Leão. Em Guimarães decorriam as conspirações, talvez não completamente votadas pelo fiel Egas Moniz porque receoso de ver debatida a legitimidade do seu pupilo infante. Devia ser esta carta com que jogava D. Teresa. Egas Moniz apressou-se a selar um pacto com Afonso VII, não por lealdade mas por prudência.

Todavia, D. Afonso Henriques, na verdura da mocidade e irado pela demora da sua nomeação como senhor do seu território, declarou guerra a D. Teresa, pouco interessado se o fazia ou não segundo as regras da cavalaria. D. Teresa devia estar fora das terras de Portugal e ele ocupava o castelo de Guimarães com os seus fiéis. A oportunidade era preciosa e ele lançou-se para S. Mamede onde teve, primeiro, fraco sucesso. Foi ao ver que ele saía derrotado que Egas Moniz, mandando ao ar o seu juramento, o foi ajudar, obtendo a vitória.

Não cabe, neste interregno entre a vinda de Afonso VII e a batalha de S. Mamede, pouco mais do que um recontro de forças rivais, o episódio de Egas Moniz com a corda ao pescoço e a família descalça, para resgatar a sua palavra perante Afonso VII. Decerto isto pertence à lenda que se formou logo a partir do milagre de Cárquere. A verdade é que, aio ou pai verdadeiro de D. Afonso Henriques, ele o tinha criado para rei nos lugares de Resende, junto com aqueles que seriam os validos mais próximos e os guerreiros mais esforçados na nova corte portuguesa. Uma nota arrepiante fica no rodapé da História. Que foi feito da criança aleijada que Egas Moniz levou nos braços, arrebatando-o à sua ama D. Ausenda? Ama de leite, dizem os papéis, o que parece contraditório com os costumes de criação dum príncipe. Lembramos o episódio da dama de França, a quem a aia dum filho seu deu de mamar porque ela tinha fome e a mãe estava ausente. A mãe fez com que o menino vomitasse o leite, porque, não sendo parte do sangue nobre, podia para sempre infectar o infante de vícios plebeus.

É de crer que a tal ama de leite de D. Afonso fosse Ausenda Dias, mulher de Gosendo Alves a quem D. Teresa, em 1116, fez a doação da vila de Góis. Ela estaria na posse de segredos que a História não pode remover dos seus escombros. Tendo nascido D. Afonso por volta de 1110, é possível que a doação registada em nome de Ausenda Dias e seu marido Gosendo Alves tivesse o intuito de pagar serviços prestados, entre os quais a criação da criança misteriosa que Egas Moniz levou do castelo de Guimarães poucos dias depois de nascer.

É altura de citar Alexandre Herculano na sua melhor interpretação de romancista: “Há muitas vezes na História, ao lado dos factos públicos, outros sucedidos nas trevas, os quais, frequentemente, são a causa verdadeira daqueles, e que os explicariam se fossem revelados”.

Pré-publicação de uma edição da “Guerra & Paz”

© Guerra &Paz editores, Agustina Bessa-Luís. Reprodução Interdita.


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4.4.06


RETRATOS DO TRABALHO EM LISBOA, PORTUGAL


A montar e ajustar a aparelhagem acústica para um apresentação de música da Eslovénia no C.C.Colombo.

(José Santos)

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O ÚLTIMO LIVRO DE AGUSTINA BESSA-LUÍS SERÁ PRÉ-PUBLICADO NO ABRUPTO

(Comunicado conjunto Abrupto / “Guerra & Paz Editores”)

Pela primeira vez em Portugal, um blogue, o Abrupto, de José Pacheco Pereira, vai fazer a pré-publicação de um livro – a última obra de Agustina Bessa-Luís, Fama e Segredo da História de Portugal, que será publicada integralmente em papel pela “Guerra & Paz Editores”.

A pré-publicação inicia-se amanhã, 4ª, dia 5. Diariamente, até 2ª, dia 10, o Abrupto publicará excertos de uma das 12 histórias da “Fama e Segredo”, de Agustina, acompanhada de imagens referentes a esse capítulo.

O acontecimento é seguramente inédito em Portugal, não se conhecendo ao nível da edição tradicional, registo de iniciativa semelhante noutros países europeus. Apenas sob a forma de acesso pago se realizaram experiências deste tipo, principalmente nos EUA.

Substituindo-se às tradicionais práticas de pré-publicação em jornais ou revistas, este evento inaugura um modelo de divulgação qualitativamente diferente que pode revolucionar a estratégia de comunicação das editoras portuguesas e reconhece aos blogues o papel acrescido no espaço público que hoje têm.

Para o Abrupto, de José Pacheco Pereira, é uma iniciativa coerente com a concepção que desde início o enformou: um blogue de autor, pessoal e intransmissível, aberto a curiosidades e interesses muito diversos. A publicação de um texto de uma grande escritora portuguesa, que os leitores do Abrupto vão poder conhecer numa parte significativa, sem qualquer custo, honra o blogue e é consistente com a sua orientação desde sempre.

Para a “Guerra & Paz”, esta iniciativa é um claro reconhecimento da importância que as novas formas de comunicação ganharam nas nossas sociedades de informação. Segundo Manuel S. Fonseca, “fascina-nos não só a grande liberdade e acessibilidade desta comunicação, mas também o grau de afectividade que ela exprime. A admiração de Pacheco Pereira por Agustina e o seu interesse pela iconografia do livro justificaram a nossa escolha. E o apoio do Abrupto ao livro vai ter um efeito mediático superior ao que obteríamos com outros meios. Para já não falar no prestígio e na audácia do gesto.”

A “Guerra & Paz” apresentará o livro na Fundação Gulbenkian, às 17:30 de 2ª, 10 de Abril, data em que o livro estará também à disposição nas livrarias.

O Abrupto e “Guerra & Paz Editores

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O primeiro texto de Agustina, intitulado AFONSO HENRIQUES E D. TERESA, sairá no Abrupto amanhã de manhã.

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RETRATOS DO TRABALHO EM LISBOA, PORTUGAL


Pintando o futuro HardRock Café.

(Jose Santos)

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EARLY MORNING BLOGS 748

MAÑANA LENTA


Mañana lenta,
cielo azul,
campo verde
tierra vinariega.
Y tú, mañana, que me llevas.
carreta
demasiado lenta,
carreta demasiado llena
de mi hierba nueva,
temblorosa y fresca,
que ha de llegar —sin darme cuenta—
seca.

(Dámaso Alonso)

*

Bom dia!

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3.4.06


A PATRULHA DA PRIMAVERA



chega, por rígida ordem. Andorinhas, flores, folhas, besouros, borboletas.

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RETRATOS DO TRABALHO EM LISBOA, PORTUGAL

Desenhar o chão. Lisboa, claro, na Rua Augusta, 1 de Abril.

(Mário Furtado)

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NUNCA É TARDE PARA APRENDER: PARA ENCERRAR, FACTÓIDES

Henry Hitchings, Defining the World (The Extraordinary Story of Dr. Johnson's Dictionary)

Henry Hitchings Defining the World (The Extraordinary Story of Dr. Johnson's Dictionary) Entre as palavras que Hitchings considera que mudaram completamente o seu sentido desde a sua inclusão no Dicionário no século XVIII, uma "calculus - the stone in the bladder", permanece com o mesmo sentido em português, "cálculo renal"; outra "paraphernalia - goods in the wife's disposal" ganhou sentido irónico; e "orgasm - sudden vehemence" não me parece tão mudada de sentido, mesmo tendo em conta que o Dr. Johnson era um homem púdico e excluiu do seu livro as palavras que considerava inconvenientes ("fuck" e "cunt" só entraram nos dicionários ingleses nos anos sessenta do século XX...).

O Dicionário ainda recentemente foi usado para interpretar o sentido da palavra "declaração" em "declaração de guerra" (a propósito dos ataques à Jugoslávia na Presidência Clinton), considerando-se que ele oferecia a melhor interpretação do léxico jurídico da Constituição Americana.

O Dicionário mostra o impacto de uma nova bebida, o café, referido trinta vezes. O hábito turco, importado de Veneza, devia fazer uma diferença com os milhares de tabernas londrinas onde corria a genebra. Johnson define "coffeehouse - " a house of entertainment where coffee is sold, and the guests are supplied with newspapers". "Entertainment", nota Hitchings, era conversa, conversa de café.

Johnson e os seus fantasmas: ensaio sobre "procrastination".

"X is a letter which, though found in Saxon words, begins no word in the English language" dizia Johnson, aliás erradamente. Mas os seus comentários sobre letras são interessantes: por exemplo, "R" era a "letra canina" como aqui .

Johnson era contra o uso de parêntesis. (FIM)

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(...) a palavra «calculus», tem grande importância em Matemática. A sua evolução nos países de língua inglesa, com ênfase no uso matemático, pode ser vista aqui.

(José Carlos Santos)

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NUNCA É TARDE PARA APRENDER: BIBLIA ABIBLIA

Henry Hitchings, Defining the World (The Extraordinary Story of Dr. Johnson's Dictionary)

itle page of  A dictionary of the English language



Charles Lamb chamava a livros como os Dicionários, biblia abiblia, livros que não são para ler. A expressão grega acabou por fazer caminho e ter dois sentidos: livros que contêm outros livros dentro, e livros que não vale a pena ler. O sentido pejorativo tem-se tornado dominante, embora o uso da expressão permaneça raro e obscuro. Quem é que lê Dicionários ou Enciclopédias? Um grupo muito especial de leitores, entre os quais Aldous Huxley, Malcolm X e Gabriel Garcia Márquez. Suspeito que também Jorge Luis Borges. Robert Browning que leu o Dicionário de Johnson para se preparar para a vida literária, como um trabalho de casa. Alguns autistas, alguns profissionais de concursos de perguntas e respostas. Não é uma actividade muito apreciada: Huxley era gozado pelos seus amigos que diziam que se sabia sempre que volume da Enciclopedia Britannica estava a ler.


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LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(2 de Abril de 2006)


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No Kontratempos de Tiago Barbosa Ribeiro, palavras sábias:
REDUCIONISMOS. A simplificação de um mundo complexo é um dos problemas do debate político que temos. As dicotomias paradigmáticas estruturam em demasia o pensamento, impedindo-o de pensar. Casos concretos. À esquerda, alguma esquerda reduz o CPE a direitos/não-direitos e a situação no Iraque a ocupação/não-ocupação. À direita, alguma direita reduz o aborto a vida/não-vida e a liberdade económica a Estado/não-Estado. Assim, é difícil.
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Paredes electrónicas de Nova Iorque:


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EARLY MORNING BLOGS 747

La Figlia Che Piange (The Weeping Girl)


Stand on the highest pavement of the stair -
Lean on a garden urn -
Weave, weave the sunlight in your hair -
Clasp your flowers to you with a pained suprise -
Fling them to the ground and turn
With a fugitive resentment in your eyes:
But weave, weave the sunlight in your hair.

So I would have had him leave,
So I would have had her stand and grieve,
So he would have left
As the soul leaves the body torn and bruised,
As the mind deserts the body it has used.
I should find
Some way incomparably light and deft,
Some way we both should understand,
Simple and faithless as a smile and a shake of the hand.

She turned away, but with the autumn weather
Compelled my imagination many days,
Many days and many hours:
Her hair over her arms and her arms full of flowers.
And I wonder how they should have been together!
I should have lost a gesture and a pose.
Sometimes these cogitations still amaze
The troubled midnight, and the noon's repose.


(T. S. Eliot)

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Bom dia!

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2.4.06


BIBLIOFILIA: LIVROS SOBRE LIVROS


Phyllis Dain, The New York Public Library (A Universe of Knowledge)

Lawrence Goldstone / Nancy Goldstone, Slightly Chipped: Footnotes in Booklore

A. J. Jacobs, The Know-It-All : One Man's Humble Quest to Become the Smartest Person in the World

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INTENDÊNCIA

Actualizada a nota O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:INTERIORIDADES.

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RETRATOS DO TRABALHO EM BAIKONUR, CAZAQUISTÃO


Baikonur, Cazaquistão, este é um dos muitos retratos do trabalho e da vida no então cosmódromo secreto.

(Rui C. Barbosa)

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NUNCA É TARDE PARA APRENDER: ERUDIÇÃO, MELANCOLIA E INDOLÊNCIA

Henry Hitchings, Defining the World (The Extraordinary Story of Dr. Johnson's Dictionary)

Henry Hitchings Defining the World (The Extraordinary Story of Dr. Johnson's Dictionary) Em pleno trabalho no seu Dicionário, já atrasado e apenas com as letras A-C prontas (e já tinha ido mais longe do que o nosso dicionário da Academia, o grande não o pequeno, que ficou só na letra A, de A a Azuverte) e com aquele fastio que às vezes dá a meio de uma obra complexa, Johnson deixou-se envolver por essa estranha condição, a melancolia. A melancolia teve no século XVII o seu grande clássico, Robert Burton, mas o Dr. Johnson foi um praticante desse "estado de alma" que, muito justamente, os seus contemporâneos consideravam uma doença, "a kind of madness in which the mind is always fixed in one subject". Um dos vários retratos que Reynolds fez de Johnson dá bem essa dimensão obsessiva, mostrando-o não como clássico e repousado leitor, em que a leitura é um lenitivo para o espírito, mas como um leitor compulsivo, devorando fisicamente o livro, sem distanciação. Conheço muito poucos retratos de leitura que sejam deste tipo e Reynolds só o pode ter feito porque Johnson era mesmo assim.

O Dr. Johnson também pensava que a sua melancolia era uma doença, uma forma de loucura: "I inherited a vile melancholy from my father, which has made me mad all my life, at least not sober." Mas há um aspecto da melancolia de Johnson muito próprio, o seu pavor pela indolência, o medo de ser preguiçoso no seu trabalho. É difícil que um homem como Johnson que, quer como leitor, quer como autor, e em particular como autor de uma obra como o Dicionário que lhe exigia um esforço e concentração enormes, pudesse ter dúvidas sobre a sua dedicação ao trabalho. É certo que ele fazia uma correlação entre a ocupação e o combate á melancolia, dizendo ao seu biografo que "employment, sir, and hardships, prevent melancholy", e escrevendo que "melancholy, indeed, should be diverted by every means but drinking", mas há mais do que parece à primeira vista nesta obsessão com a indolência. É exactamente pelo tipo de trabalho erudito a que ele se dedica, pelo facto do Dicionário ser uma obra que resulta directamente dum imenso volume de leituras, e que a sua "escrita" tem exigências de completude incontornáveis - não é suposto faltarem palavras básicas (como ao nosso pequeno dicionário da Academia falta "robalo" e "hipertexto", entre muitas outras) - que a dimensão do trabalho por fazer convoca o risco da indolência todos os dias. É que fazer um Dicionário é "a kind of madness in which the mind is always fixed in one subject".

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Mesmo nos dias de hoje em que a psiquiatria se afirma como uma disciplina científica os chamados "males da alma" continuam a ser olhados com apreensão e estão consistentemente "sob suspeita". Como tal considerá-los doenças é sempre conveniente: primeiro porque os torna excepção e desvio, e depois porque pressupõe tratamento e cura. Se hoje não se morre de amor como no século XIX, nem se sofre da melancolia do século XVIII, sofre-se por exemplo de depressão: uma conveniente etiqueta que se aplica a, e correndo o risco de generalizando nem sempre ser precisa, variados estados de alma que fujam à esperada felicidade que a nossa sociedade consumista e imediatista põe ao nosso dispor 24 horas por dia. Assim, um luto mais prolongado do que o velho ditado "a vida continua" prevê, uma mudança de nível de vida menos bem aceite, uma traição dolorosa que fere lá onde não se sabia que podia ferir, encontram rápida, discretamente e sob patrocínio de todos os bons amigos, alívio e promessa de dias melhores no Prozac e no Xanax. "... (It) should be diverted by every means but drinking". Como agora.

(J. )

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LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(2 de Abril de 2006)


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A ler "Valentes críticos" e textos adjacentes de Fernando Venâncio no Aspirina B.

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No Astronomy Picture of Today , a mensagem enviada, em 1999, aos nossos vizinhos cósmicos. Estamos ainda à espera da resposta, mas, mesmo à velocidade da luz, a casa deles é capaz de ser um pouco longe.

See Explanation.  Clicking on the picture will download  the highest resolution version available.

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Sursum corda!
Corações solitários, já existe um Google Romance onde podem "search for love"... Mas só no dia 1 de Abril.

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Foram ou não destruídos livros, feito um auto de fé, atiradas Bíblias antigas à cara dos polícias, queimados manuscritos, durante a ocupação da Sorbonne pelos manifestantes contra a lei do emprego juvenil? Discussão no Figaro, discutida por sua vez no La république des livres.

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Retratos do bairro de Chelsea, NY, onde as galerias de arte coexistem com garagens e oficinas de reparação de automóveis. As oficinas voltam-se para fora, as galerias para dentro. As galerias têm quase todas o mesmo modelo de arquitectura, muito aço e ferro pintado de cinzento, largas paredes brancas, padrões de design tão semelhantes que, vista uma, todas são iguais. Uma menina ou duas à entrada, sentada em frente a um laptop. Uma pequena pilha de postais anunciando a exposição, e no fundo, por detrás da menina, uma estante com alguns livros de arte e dossiers. Uma folha de plástico com os títulos das obras, e, raramente, os preços. Tudo tão estandardizado, como muitas das "obras" que são expostas. Pelo menos aqui a imaginação não abunda. As excepções ficam para depois.

Há, no entanto, uma diferença: os tectos. Comecemos pois pelos tectos:






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EARLY MORNING BLOGS 746

The Results Of Thought


Acquaintance; companion;
One dear brilliant woman;
The best-endowed, the elect,
All by their youth undone,
All, all, by that inhuman
Bitter glory wrecked.

But I have straightened out
Ruin, wreck and wrack;
I toiled long years and at length
Came to so deep a thought
I can summon back
All their wholesome strength.

What images are these
That turn dull-eyed away,
Or Shift Time's filthy load,
Straighten aged knees,
Hesitate or stay?
What heads shake or nod?


(William Butler Yeats)

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Bom dia!

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1.4.06


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: DIMENSÕES E FANTASIAS



Mais mil, menos mil...Mais um exemplo de rigor jornalístico à portuguesa. O Público tem uma notícia na sua edição online onde se pode ler : Seis mil iniciaram manifestação em Lisboa por melhores condições laborais. Neste momento em que decorre o comício no Rossio, observo da janela onde me encontro um magote de indívidos que escutam o discurso de Carvalho da Silva que dificilmente ultrapassá um milhar. Onde é que estão os outros 5000? Perderam-se no caminho entre a Praça do Chile e o Rossio, ou não passará tudo isto de uma singela mentira do primeiro de Abril?

(F. Caetano)

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LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(1 de Abril de 2006)


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Ruas americanas. Spring fever.



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A marcação da agenda mediática pelos blogues é cada vez mais importante, queira-se ou não. Começa a haver um claro mecanismo de sinergias entre os blogues e outros meios: jornais e revistas em papel, emissões de rádio, publicação de livros, programação cultural, colóquios e sessões de debate, iniciativas culturais e políticas. Este caminho não tem retorno, quem o segue anda em frente. É natural que essa agenda não se manifeste para já com a mesma importância em todas as áreas, mas, em áreas criticas do espaço público, começa a impor-se cada vez mais. Entre essas áreas tem relevo a própria comunicação social, que cada vez mais recruta nos blogues, e o “espaço cultural” mais mediatizado, incluindo a edição, a animação cultural, os eventos, como agora se diz.

Há dois exemplos actuais típicos: a polémica sobre a providência cautelar ao livro de João Pedro George, que ecoa o impacto de um seu texto no Esplanar; e, com origem no mesmo blogue e amplificado por um debate na blogosfera, a questão do amiguismo na crítica literária. O debate na Casa Fernando Pessoa (relatado no Público de hoje) é típico deste papel dos blogues. Organizado por Francisco José Viegas, que trouxe para a programação da Casa o mundo dos blogues de que ele próprio faz parte, o seu tema era o do debate de há dois meses na blogosfera, e os seus intervenientes eram identificados em linha pelos blogues que escreviam. Mais significativo ainda: o ambiente na sala, como refere o Público, “fez a temperatura ferver na Casa Fernando Pessoa”, o que também é típico dos blogues e já não se usava há muito no mundo da “cultura”.

ADENDA: outro aspecto interessante deste novo mundo é poder-se ler o relato do que aconteceu na Casa Fernando Pessoa a muitas vozes. Uma delas, a de Eduardo Pitta, que estava na mesa do debate, acrescenta esta muito interessante nota "social" que só confirma o que se diz acima:
"Numa sala a abarrotar, encontrei Isabel Coutinho, editora do Mil Folhas, Carla Hilário de Almeida Quevedo, do Bomba Inteligente, Gustavo Rubim, João Pereira Coutinho, Isabel Goulão, do Miss Pearls, Miguel Real, Luís Carmelo, do Miniscente, João Rodrigues, editor da Dom Quixote, Ana Madureira, do gabinete da ministra da Cultura, Maria do Rosário Pedreira e Ana Pereirinha, respectivamente editora e editora-adjunta da QuidNovi, o jornalista Rui Lagartinho (facção pró-Margarida), Ana Cláudia Vicente, do Quatro Caminhos, e se me esqueço de alguém é sem intenção. O Francisco, a Anick e o Ricardo, como sempre, anfitriões atentos. O vinho não sei se era bom, não provei."

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EARLY MORNING BLOGS 745

Le chat

Je souhaite dans ma maison :
Une femme ayant sa raison,
Un chat passant parmi les livres,
Des amis en toute saison
Sans lesquels je ne peux pas vivre.


(Guillaume Apollinaire)

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Bom dia!

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BIBLIOFILIA: AMERICANA

http://images-jp.amazon.com/images/P/0060566779.09.LZZZZZZZ.jpg [0-671-86742-3Lincoln at Gettysburg the Words That Remade Americaby Garry Wills]

Thomas Frank, What's The Matter With Kansas? How Conservatives Won The Heart Of America

Anthony Bianco, Ghosts Of 42nd Street: A History Of America's Most Infamous Block

Garry Wills, Lincoln at Gettysburg the Words That Remade America

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© José Pacheco Pereira
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