ABRUPTO

31.12.05


EARLY MORNING BLOGS 668



Late Autumn In Venice

(After Rilke)

The city floats no longer like a bait
To hook the nimble darting summer days.
The glazed and brittle palaces pulsate and radiate
And glitter. Summer’s garden sways,
A heap of marionettes hanging down and dangled,
Leaves tired, torn, turned upside down and strangled:
Until from forest depths, from bony leafless trees
A will wakens: the admiral, lolling long at ease,
Has been commanded, overnight—suddenly—:
In the first dawn, all galleys put to sea!
Waking then in autumn chill, amid the harbor medley,
The fragrance of pitch, pennants aloft, the butt
Of oars, all sails unfurled, the fleet
Awaits the great wind, radiant and deadly.

(Delmore Schwartz)

*

Bom dia!

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30.12.05


BOAS / PÉSSIMAS COISAS NA COMUNICAÇÃO SOCIAL PORTUGUESA EM 2005, VISTAS POR UM GRANDE (EM QUANTIDADE) CONSUMIDOR (alfa)

Actualizado com novas colaborações e referências. Em breve, publicarei a versão beta, com as sugestões que me parecem ser de acolher. A discussão e as sugestões continuarão em aberto.

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LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)



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No Público, mais notícias envolvendo António Vitorino no caso Eurominas, e Pina Moura nas grandes manobras energéticas em curso. O que está em causa, em ambos os casos, é a completa, flagrante, inequívoca, incompatibilidade substancial entre as suas funções privadas, na advocacia de negócios e na administração de empresas, com o exercício de funções públicas. Se, quer um quer outro, no que estão a fazer, não são abrangidos por nenhuma lei de incompatibilidades, então as leis de incompatibilidades não servem para nada. (Lembro, para registo da memória, que fui o único deputado que se pronunciou contra este "pacote" legislativo que incluia a legislação de incompatibilidades, demitindo-me por essa razão do cargo de Presidente do Grupo parlamentar.) Na prática, esta legislação ajudou a afastar da Assembleia bons deputados, como Rui Machete, que a tomou a sério, mas acaba por permitir situações completamente absurdas, que deviam em primeiro lugar ser do foro da mínima moral política, antes sequer de serem de legalidade. Infelizmente, os deputados do PS, em primeiro lugar, e depois os do PSD e do CDS, acham normal o que se passa, e a Comissão de Ética fecha os olhos, fazendo uma interpretação mole da lei e absurda da "ética" que lhe dá o nome.

O caso que me parece de verdadeiro escândalo é o de Pina Moura, mas este goza da protecção do PS, pelo que nada acontece. O editorial de Manuel Carvalho hoje no Público (que nem na versão em linha paga aparece) intitulado "Pina Moura" não deixa margem para dúvidas:
"Pouco parece interessar que a Iberdrola seja liderada por um ex-ministro que, para além de desenvolver os negócios que ele próprio iniciou quando estava no poder, continue ainda a ter cara para se exibir como deputado da nação."

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29.12.05


O CAMAURO

( Rafael, Retrato de Júlio II usando o camauro)

Quando Bento XVI apareceu este Natal com o camauro na cabeça, as fotografias circularam na Internet como sendo montagens digitais. O Papa vestido de Pai Natal? Tinha que ser montagem. Mas não era. Os nossos internetianos deviam ver mais quadros renascentistas, e reconheceriam o veludo e o arminho antigo que nenhum Papa usava desde os anos sessenta.

Mas o Papa não apareceu nestes dias nos jornais apenas como um surpreendente ícone da moda, mas surge com cada vez mais frequência em editoriais (o Público não é excepção) e, por estranho que pareça, em artigos e ensaios. Livros originais e antologias temáticas incluem textos de e sobre Ratzinger, com uma frequência rara para qualquer Papa recente, e ainda mais rara para um início do pontificado, quando não existe uma obra significativa própria como chefe da Igreja católica. Autores cujos interesses pela teologia, ou sequer pela religião, eram escassos manifestam curiosidade intelectual pelo novo Papa.

A solidez teórica de Ratzinger, solidez não apenas teológica, mas filosófica e cultural num sentido mais geral, o seu longo contacto com o meio dos intelectuais europeus, conhecendo as suas polémicas e quer as suas interrogações, quer as suas modas, está a dar frutos. Ratzinger está a colocar a reflexão cristã, gerada no cume do poder eclesial, que é por excelência o papado, no centro do debate público, de onde estava há muitos anos afastada. Ou, numa fórmula mais moderada, está a torná-la aceitável como objecto de discussão intelectual, o que é uma verdadeira mudança nos costumes europeus e americanos recentes. Este processo é interessante para a história do movimento cultural europeu e, penso, está apenas no seu início. O nome de Bento XVI, ou mais provavelmente para já de Ratzinger, vai-se tornar citado e citável, em círculos onde nunca o foi o de João Paulo II e dos seus predecessores desde o século XIX.

Claro que este movimento de influência não teria sucesso se viesse apenas de dentro da Igreja, mas está conjugado com o caminhar de uma série de intelectuais para novas formas de conservadorismo político, para um retorno a um sistema de valores políticos e societários tradicionais, ultrapassando a usura que estes tinham sofrido com o impacto da Revolução Francesa e a dominação ideológica do marxismo. Esta redescoberta nos dois lados do Atlântico associa, num caminho comum, trajectos muito díspares, desde o neoconservadorismo norte-americano à reflexão europeia sobre os fundamentos culturais da Europa, feita recentemente a propósito do Preâmbulo à Constituição Europeia. Um caso típico destes trajectos em Portugal é o de João Carlos Espada e da revista Nova Cidadania que anima. Como era inevitável, encontraram, na reflexão que estavam fazendo, o pensamento cristão, uma das mais antigas e consolidadas tradições europeias de reflexão, que, desde Tomás de Aquino até Karl Jaspers, mantém uma relação muito forte com a história cultural da Europa, aparentemente enfraquecida pelos últimos duzentos anos de "descrença" e pelas ideologias assentes na fé na história do século XIX e XX.

Há factores na própria história do cristianismo europeu que explicam esta reaproximação, mais significativa porque um revivalismo religioso, que há alguns anos atrás fazia parte de quase todas as previsões futurologistas, não parece estar à porta. De facto, o que se passa, mais do que um revivalismo religioso, é um sentimento de comunidade, de pertença a uma mesma tradição cultural, tornada urgente pela cintilação civilizacional gerada pelo conflito com o fundamentalismo islâmico.

O facto de este movimento se estar a dar mostra como as tradições religiosas, como factos culturais e civilizacionais, estão profundamente embrenhadas na identidade social, mesmo quando esta parece estar ameaçada pela globalização e pela massificação dos consumos mundiais. E mostra também como o cristianismo resiste à competição com outras religiões em sociedades muito abertas como são as do "Ocidente". Mesmo religiões e práticas orientais que estiveram e estão na moda, desde os anos sessenta, como o budismo zen, apelaram à sedução essencialmente na base de uma experiência estética que se pretendia mística, e popularizaram-se como "modos de vida alternativos", mas tiveram apenas um impacte marginal no centro do nosso pensamento.

Esta situação ainda é mais nítida quando tomamos em conta o dinamismo teológico do cristianismo, quer reformado, quer católico, em contraste com as dificuldades do islão em ter uma interpretação dinâmica, capaz de fazer a adaptação às mudanças da história e da sociedade. O islão, na ausência de autoridades interpretativas legitimadas, fixou-se no cânone da sua origem e não reflecte a modernidade, nem convive facilmente com a laicidade. Por aqui se percebe que o facto de o cristianismo ser uma religião que tem uma Igreja, como materialização na terra da presença de Deus e, dentro dessa Igreja, na versão católica, ter uma hierarquia que termina no Papa, lhe permite falar para tempos diferentes de modo diferente, mesmo quando é a mesma Voz.

O Papa Woytila reforçou os laços da Igreja com o catolicismo tradicional na Europa, fazendo pelo caminho uma revolução política a partir da Polónia para o Centro e Leste da Europa, e incentivou o catolicismo em terras de missão, na sua função de Papa viajante. Morrendo diante de nós como morreu, falou também a sociedades cada vez mais de velhos e doentes, como é a nossa. Valorizou na Igreja os factores de continuidade, o catolicismo popular, o culto mariano, o papel das comunidades tradicionais, da família, do ensino. Gerou assim uma aproximação da Igreja ao homem comum que fora iniciada por João XXIII no concílio Vaticano II.

Bento XVI parte deste legado e parece, num primeiro olhar, voltar-se para a Europa, para a terra onde Pedro e Paulo construíram a "sua" Igreja, e onde, as sociedades dos dias de hoje são sociedades assentes na "família terrestre" e não na "família celeste" e por isso dependem da felicidade terrestre e não da celeste. Aqui o "espírito de missão" e a evangelização encontram um tipo de dificuldades muito diferentes das de fora da Europa, ou das de outros tempos europeus. Mas a sensação da perigosidade do mundo "lá fora" criou um ambiente favorável ao retorno a uma identidade cultural, na qual a Igreja tem um papel histórico e quer ter um papel actual.

É verdade que o cardeal-patriarca de Lisboa preveniu, numa missa recente, que o "cristianismo não é uma doutrina", o que se compreende para os homens de fé. Mas, para os que não a têm, Ratzinger está a contribuir para que, pelo menos como "doutrina", ele entre nas nossas reflexões. É o sinal de um "assalto" aos intelectuais, como há muito tempo a Igreja não tinha conseguido fazer.

(No Público.)

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BOAS COISAS NA COMUNICAÇÃO SOCIAL PORTUGUESA EM 2005, VISTAS POR UM GRANDE (EM QUANTIDADE) CONSUMIDOR
(alfa - ACTUALIZADO)



NOTA (versão alfa) - Só o embrião das entradas, sem nenhuma ordem valorativa, esperando completá-las, acrescentá-las e corrigi-las, com as sugestões dos leitores. Como só cito o que "consumi", a rádio, que pouco ouvi, está em falta.

*

Documentários culturais (2:) entre outros sobre Luis Pacheco, Glicínia Quartim, João Vieira, Fernanda Botelho, etc.

Micro-causas (declaração de interesses: o Abrupto foi o iniciador, mas hoje pertencem a todos.) - A questão dos “estudos da OTA” que se tornou a segunda questão mais determinante do debate público sobre a OTA (a primeira foi e é “faz-se ou não se faz”), deveu-se à persistência dos blogues, e não da comunicação social fora da rede, que só a assumiu quando não a podia evitar. Depois, tornou-se parte integrante do “problema OTA”.

Blogues de jornalismo, sobre jornalismo (pela segunda vez na lista das “coisas boas”) – Os blogues especializados em “comunicação” em sentido lato são o melhor conjunto de blogues com um tema específico na blogosfera portuguesa. Exemplos: Engrenagem, Indústrias Culturais, Ponto Media, Atrium, Jornalismo e Comunicação, As Imagens e Nós, Blogouve-se, etc.

Clube dos Jornalistas (2:) - (pela segunda vez na lista das “coisas boas”).

Os documentários da SIC - o melhor exemplo foi o de Cândida Pinto sobre Snu Abecassis, mas ,durante todo o ano, foram sempre as melhores reportagens jornalísticas de tipo documental, de “grande informação” ou em anexo aos noticiários.

Mário Crespo e o par João Adelino de Faria / Ana Lourenço na SIC Noticias. (declaração de interesses: participo num programa da SICN.)

Repito pela segunda vez: “A informação / opinião económica na SIC Notícias é de grande qualidade. Perez Metelo na TVI é um divulgador especializado com grandes qualidades comunicativas."

Margens de Erro de Pedro Magalhães, o “nosso” explicador das sondagens e muito mais. Um exemplo de um blogue que acrescenta.

Blogosfera nas eleições autárquicas e presidenciais: pode ter todos os defeitos da "atmosfera", mas tem também qualidades que só há na blogosfera.

Livros sobre jornalismo (pela segunda vez na lista das “coisas boas”). Repito: “A edição de livros e revistas sobre comunicação está de vento em popa. Para além da Trajectos e Media e Jornalismo, as colecções "Media e Sociedade" da Editorial Notícias e "Comunicação" da Minerva tem dado origem a trabalhos interessantes que revelam como, à distância, os estudos académicos demonstram muito daquilo que os jornalistas não querem admitir mais em cima dos acontecimentos: bias, distorções e manipulações, militância política. O papel de alguns professores, como Mário Mesquita, é fundamental nesta reflexão.”
(Em breve referirei os que me pareceram mais importantes.)

*
Na sequência do convite que lançou aos leitores do Abrupto deixo aqui a minha sugestão ( considerando, naturalmente, uma declaração de interesses prévia - pertenço ao mesmo centro de investigação que os três citados):

Nas coisas boas - no sub-título "Livros sobre Jornalismo" - faltarão as colecções "Comunicação e Sociedade" (Campo das Letras/CECS-UMinho, dirigida por Moisés de Lemos Martins) e "Comunicação" (Porto Editora, dirigida por Manuel Pinto e Joaquim Fidalgo), ambas com vários títulos publicados em 2005.

(Luis António Santos do Atrium)
A ascensão da Sábado (pela segunda vez e com a mesma declaração de interesses). A Sábado é o órgão de comunicação social portuguesa mais subestimado, vítima das “sinergias” que lhe faltam: não tem quem puxe pelas suas notícias nos outros órgãos de comunicação social. Mas que tem notícias, isso tem.

A imprensa de distribuição gratuita como o Destak. Para muita gente significa mais notícias que nunca iriam encontrar, ou melhor, ler, noutro lado. Isto só pode ser considerado um acrescento na "comunicação", na cidadania.


PÉSSIMAS COISAS NA COMUNICAÇÃO SOCIAL PORTUGUESA EM 2005, VISTAS PELO MESMO



Descida de vendas da imprensa generalista – Entre o 24 Horas, que sobe, os jornais grátis, os blogues, e a informação em linha, a imprensa generalista cai. Para responder à queda molda-se ao que pensa dar sucesso, o “social”, o “económico”, e temo que as reestruturações em curso nos grandes jornais valorizem ainda mais a superficialidade do produto. Se for assim, é só uma questão de tempo para cair ainda mais, porque nesse terreno outros fazem melhor.

O fim da consulta grátis em linha, no Público. .

Os comentários de António Vitorino na RTP nunca acrescentam nada e são claramente limitados por uma vontade de ortodoxia, que é uma vontade de carreira política. Legítimo, mas não chega para comentar sob aquela forma e com aquele estatuto, quando não se tem mais nada para dar. Pode-se ter “mixed feelings” sobre os comentários de Marcelo, mas estes são um “facto comunicacional” impossível de passar ao lado. Podem ter (têm) agenda política, são superficiais e ligeiros, mas ultrapassam os defeitos do seu autor, pelas suas qualidades no meio. Marcelo é um Mensch comunicacional, Vitorino não é.

As primeiras páginas inventivas do Expresso (pela segunda vez.) – Agora que se sabe de quem é a responsabilidade, – de José António Saraiva, que as faz sozinho numa forma de meditação transcendental como nos disse em entrevista –, espera-se que Henrique Monteiro acabe com elas.

Tsunami – Mais um exemplo de “masturbação da dor” como sensacionalismo jornalístico, ao ritmo das grandiosas imagens das vagas do maremoto. Se não houvesse imagens tão poderosas, turistas estrangeiros e destinos de férias como Puket atingidos, o tratamento comunicacional seria o que foi dado ao terramoto paquistanês, ou seja quase nulo. Não é a dimensão da tragédia que conta, mas a sua espectacularidade.

Katrina – O contra-exemplo ao tratamento do tsunami: “inforopinião” politizada ao extremo, “masturbação da culpa” em vez de “masturbação da dor”. Números fantásticos, previsões apocalípticas, dedo apontado a Bush em cada segundo, e quase nula compaixão pelas vítimas. A cidade “destruída” lá está a funcionar, ferida, mas viva. As dezenas de milhares de mortos anunciados continuam por descobrir, mas ninguém entende que deva corrigir alguma coisa.

Arrastão – A pseudo-história mais fantástica da nossa comunicação social em 2005, que, desde o primeiro minuto, parecia a qualquer pessoa sensata, muito bizarra. Who cares? Passou do sensacionalismo, para a demonização política anti-emigrantes e racista, para depois, no backlash, se tornar demonização política anti-racista ao estilo do “SOS Racismo”, ou seja do Bloco de Esquerda. Como era uma história (falsa) que “favorecia a direita” anti-emigrantes foi desmontada e contrariada. Quantas, ao contrário, que “favorecem a esquerda”, e igualmente falsas nunca são desmontadas?

O fim da A Capital e de O Comércio do Porto.

A obscura política comunicacional governativa – O ano passado era a “central de comunicações” de Santana Lopes, este ano é a gestão mais profissionalizada, com maior colaboração silenciosa de muitos simpatizantes no meio da comunicação social, do controlo governativo. As grandes manobras da propriedade, que a montante ou a jusante, incluem sempre o beneplácito do poder político num país como o nosso tão dependente do estado, estão pouco esclarecidas. Mas quase tudo vai no mesmo sentido. Se houvesse um medidor não impressionista do “grau de incomodidade” da comunicação social face ao poder, ver-se-ia como ele baixou significativamente. Um exemplo: o modo como foi tratada a conflitualidade social, seguindo uma linha governamental, nunca nos dando a ideia da dimensão do que estava a acontecer e vista sempre numa luz hostil.

O jornalismo económico continua a depender de uma visão mais do “económico” do que do “jornalístico”. Com capacidade para produzir boa informação sobre o estado e o governo, revela-se incapaz de tratar as empresas como objecto jornalístico, mostrando pouca independência em relação aos sectores económicos e financeiros que a patrocinam. Não há verdadeiras reportagens ou notícias sobre o que corre mal.

A Antena 2 é demasiado loquaz. Muito se fala naquela rádio, num tom entre o pedante e o falsamente intímo, tirando limpidez à música.

*

Madalena Oliveira no Jornalismo e Comunicação:

"Nas coisas boas, eu acrescentaria a instituição dos provedores do ouvinte e do telespectador (embora não conheçamos ainda os nomes que vão ocupar estes cargos nem o modo como funcionarão exactamente).

Para as coisas más, escolheria também, por exemplo, a ausência de discussão sobre a renovação das licenças de televisão."
*

Algumas sugestões suplementares de Rodrigo Adão da Fonseca no Blue Lounge:
- Também às quartas-feiras, as colunas de Paulo Rangel no Público, leitura obrigatória mesmo para quem tem as agendas mais exigentes;

- As colunas de Vital Moreira no Público, descontando os dias em que lhe dá para ser mais Papista que o próprio PS;

- O Diário Económico, um oásis na (des)informação diária, um jornal que soube num contexto de dificuldade para a imprensa escrita ganhar o seu espaço com personalidade, afirmando um estilo próprio, em alguns aspectos inovador, resistindo ao jornalismo populista; um jornal que em 2005 conseguiu crescer e amadurecer-se, tornando uma dificuldade - a mudança de director - numa grande oportunidade para se consolidar (na minha humilde opinião, melhorando até a olhos vistos sob a alçada do Martim Avillez Figueiredo); neste momento, o meu primeiro jornal do dia (muitas vezes, quando o tempo é pouco, o único)."
*

João Pedro Pereira no Engrenagem:
"Numa altura em que a leitura de jornais generalistas está em queda, não podia deixar de concordar mais com Pacheco Pereira quanto aos diários gratuitos (...) São uma espécie de versão jornalística da literatura light: até podem não ser o melhor (embora isto dependa: o melhor para quem? e para quê?) e podem ser vistos com desdém pelos restantes elementos do meio, mas têm o grande mérito de pôr gente a ler

*
Sobre as coisas péssimas do jornalismo: não acredito que tenham ficado esquecidas as inúmeras peripécias jornalisticas sem rigor nem isenção nem sequer verdadeiro conhecimento do que verdadeiramente se passava e do que estava em causa, que chegavam até nós aquando dos acontecimentos urbanos em França. E a forma como Sarkozy foi cruxificado e Villepin poupado...

(J.)
*

Constança Cunha e Sá na Minha Rica Casinha:
"À lista de Pacheco Pereira sobre que houve de bom e de péssimo na Comunicação Social em 2005 e lidos os contributos de Rodrigo Adão da Fonseca no Blue Lounge tenho apenas a acrescentar duas coisas, uma péssima, outra apenas má:

- A ausência de programas de informação nas televisões generalistas
- O programa de Marcelo Rebello de Sousa com Ana Sousa Dias que serve de contraponto, na RTP, aos comentários de António Vitorino.

E, já agora, uma coisa boa, embora eu seja suspeitíssima, nesta matéria - mas até por isso:

- As crónicas de Vasco Pulido Valente no Público."

*
No Insurgente:
O melhor na comunicação social portuguesa em 2005: Diário Económico

De entre as várias notas positivas que o RAF acresenta à lista de coisas boas e más na comunicação social portuguesa em 2005 elaborada por JPP, não quero deixar de destacar o Diário Económico, que é de facto um verdadeiro oásis no panorama nacional. Faço votos de que 2006 seja um ano de ainda maior sucesso para o DE e de que o exemplo faça escola.

(André Azevedo Alves)

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EDP GRRRR....!!!!

Experimentem preparar tudo para um dia de trabalho, arrancado a ferros no meio das Festas, e de repente, começarem mini-rupturas de energia, tudo em baixo, logo a seguir tudo volta e, de novo, vai abaixo. E, depois de meia manhã nisto, o big bang, cinco horas sem luz, sem computador, sem internet, no início do século XXI, na Europa ocidental, a poucas dezenas de quilometros da capital de um país da gloriosa UE. Seis horas para resolver um problema, excelente! Ganhos de produtividade, excelente! Se não tivesse medo de parecer propor um golpe de estado constitucional, não seria possível colocar um Secretário de Estado a acompanhar o fornecimento de energia e o cumprimento dos contratos da EDP?

Vou colocar isto em linha depressa, antes que vá tudo abaixo outra vez!

P.S. e não é que faltou mesmo... e voltou outra vez...

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LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)

(29 de Dezembro)


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O blogue de Assouline La république des livres pode ser lido como uma longa lamentação sobre a excelência da edição francesa e as maldades superficiais da anglo-saxónica, um típico exercício do chauvinismo franco-gaulês. Assouline salta lá das suas letras todas as vezes que comenta os prémios literários ingleses e americanos, obviamente o resultado de tenebrosas manobras de marketing, mas percebe-se que o que ele não suporta é que o Booker tenha mais prestígio cultural do que o Goncourt. No dia de hoje, a queixa é com um estudo sobre os títulos feitos à medida (outro dia eram as capas):

"Conclusion : 1. ceux qui marchent le mieux sont plus métaphoriques que littéraux 2. Le premier mot est le plus souvent un pronom, un verbe ou un adjectif 3. La forme grammaticale est le plus souvent possessive avec un adjectif et un substantif ou les mots "The... of..."

O comentário seguinte é puro Assouline: "Mais comment leur faire comprendre que l'inconnu, l'insondable et l'improbable absolus au coeur de la création littéraire sont irréductibles à des statistiques ?". Parece um poema de Mallarmé: "l'inconnu, l'insondable et l'improbable absolus ". Assouline aproveita para dizer que, rebelde a estas normas, o título do seu próximo livro é Rosebud, o que , convenhamos, brilha de originalidade.

*

A muito esclarecedora estatística, que deve ser lida com um grão de sal, no Jornalismo e Comunicação:
"Jornalistas apoiantes de candidatos

Pode não ser especialmente relevante, mas a distribuição de apoiantes identificados como jornalistas nas diversas candidaturas à Presidência da República apresenta resultados bastante diversos. Assim:

* Cavaco Silva - 0
* Francisco Louçã - 0
* Jerónimo Sousa - 7
* Mário Soares - 26
* Manuel Alegre - 35."
*

Interessante a proliferação de pequenos truques nos blogues para aumentar as contagens dos medidores de audiências: colocação dos contadores logo à cabeça, até antes dos reclames (deve ser por razões puramente experimentais), aumento exponencial das autoreferências com ligações internas, por aí adiante. Espelho meu, espelho meu...

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AR PURO


Peter Brown, Rolling Plains, Bernhard Ranch, west of Pawhuska, Oklahoma, 1992

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EARLY MORNING BLOGS 667

SPEAK ROUGHLY TO YOUR LITTLE BOY


And with that she began nursing her child again, singing a sort of lullaby to it as she did so, and giving it a violent shake at the end of every line:

Speak roughly to your little boy,
And beat him when he sneezes;
He only does it to annoy,
Because he knows it teases."


CHORUS
(in which the cook and the baby joined): -- --

"Wow! wow! wow!"


While the Duchess sang the second verse of
the song, she kept tossing the baby violently up
and down, and the poor little thing howled so,
that Alice could hardly hear the words: -- --

"I speak severely to my boy,
I beat him when he sneezes;
For he can thoroughly enjoy
The pepper when he pleases!"


CHORUS

"Wow! wow! wow!"


(Lewis Carroll)

*

Bom dia!

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27.12.05


EARLY MORNING BLOGS 666

A list of some observation. In a corner, it's warm.
A glance leaves an imprint on anything it's dwelt on.
Water is glass's most public form.
Man is more frightening than its skeleton.
A nowhere winter evening with wine. A black
porch resists an osier's stiff assaults.
Fixed on an elbow, the body bulks
like a glacier's debris, a moraine of sorts.
A millennium hence, they'll no doubt expose
a fossil bivalve propped behind this gauze
cloth, with the print of lips under the print of fringe,
mumbling "Good night" to a window hinge.


(Joseph Brodsky)

*

Bom dia!

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26.12.05


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)

(26 de Dezembro)


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Ontem, como hoje, as capas dos livros são muito importantes. Hoje, parece que são decisivas:
"As we walk into any bookshop for an impulse purchase, we base our choice on the same superficial attractions as a Casanova walking into a singles bar. And all the new places where books are now sold — the internet, the bookshop’s three-for-two tables, the supermarket — are making us even more likely to judge a book by its cover."
*

Bibliofilia, livros, livros velhos.

Um livro de propaganda pró-URSS da Editorial Calvino. No fim da II Guerra, os livros da Calvino, uma editora do PC do Brasil, eram muito populares em Portugal nos meios da oposição. E um fabuloso livro do Dr. Brenner, Amor e Segurança. Processos Fáceis para Evitar a Procreação, sólido na sua 10ª edição, um manual popular de anti-concepção. Na capa, o mundo das rosas do planeamento familiar, e o dos espinhos, da filharada insegura. O livro é um tratado sobre "as novas aspirações do povo e do progresso, contra as tradições e interesse de uma sociedade velha e rotinaria, na luta do capital contra o pauperismo", na qual se insere esta "solução inesperada [que ] foi encontrada para o problema social." Obviamente, "o capital teve medo e perseguiu-a". Já havia causas "fracturantes".


*

Montras, montras de alfarrabista. A melhor que vi nestes dias foi a da livraria Chaminé da Mota, na Rua das Flores no Porto, aqui mal reproduzida numas fotos de telefone.


No meio, está um jornal com um artigo de Alves Redol com recomendações para quem passa o Natal solitário. À volta revistas, gravuras e livros sobre o Natal. O Diabrete com uns Reis Magos ao estilo dos anos trinta, uma página de Raúl Proença, com ilustrações de Bernardo Marques. O que faz a força desta livraria, - a atenção a materiais não-livro, efemera, revistas, folhetos, publicações que eram tidas como de interesse apenas para o coleccionista -, permitiu esta montra diferente e onde não se vê apenas, mas se descobre.

Em complemento, veja-se a lista de Os Melhores Alfarrabistas Portugueses de 2005 no Almocreve das Petas.

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EARLY MORNING BLOGS 665

Vem, vento, varre


A José Rodrigues Miguéis

Vem vento, varre
sonhos e mortos.
Vem vento, varre
medos e culpas.
Quer seja dia,
quer faça treva,
varre sem pena,
leva adiante
paz e sossego,
leva contigo
noturnas preces,
presságios fúnebres,
pávidos rostos
só cobardia.

Que fique apenas
erecto e duro
o tronco estreme
de raiz funda.

Leva a doçura,
se for preciso:
ao canto fundo
basta o que basta.

Vem vento, varre!


(Adolfo Casais Monteiro)

*

Bom dia!

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25.12.05


FIDELIDADE


Todos os anos volto aqui. Diante deste rio tão opaco de ser límpido. Límpido nas suas intenções. Rio de absolutas fidelidades. Sem escapes, nem desculpas, nem ilusões. Rio metálico, que nos diz simplesmente: chega-te a mim, abusa-me, mente-me, engana-me e eu mato-te. Eu não tenho uma foz segura, eu não dou porto seguro. Aqui está-se por sua conta e risco. É por isso que à minha volta as gaivotas estão sempre em terra. Tão simples como isso.

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24.12.05


SE FOREM FESTAS QUE SEJAM BOAS


(João, desenho)

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23.12.05


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)

(23 de Dezembro)


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Toda uma história de um "media morto" que afinal está mais vivo do que se pensa: o View-Master.


Alice no País das Maravilhas para View-Master.


*

The Probabilistic Age no The Long Tail. Começa assim:
Q: Why are people so uncomfortable with Wikipedia? And Google? And, well, that whole blog thing?

A: Because these systems operate on the alien logic of probabilistic statistics, which sacrifices perfection at the microscale for optimization at the macroscale.

Q: Huh?

A: Exactly. Our brains aren't wired to think in terms of statistics and probability. We want to know whether an encyclopedia entry is right or wrong. We want to know that there's a wise hand (ideally human) guiding Google's results. We want to trust what we read.
*

Mais um caótico Rocketboom com um Pai Natal saltitante e tudo.

*


Sairam as Ideias de Fernandez Armesto em português, reproduzindo na contracapa uma recomendação do Abrupto. Só tenho que confirmá-la: um dos melhores livros de divulgação cultural publicados nos últimos tempos.

*

Balanços no Da Literatura.

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22.12.05


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: MAIS ANÉIS E MAIS DEDOS EM URANO



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OS DIREITOS DO ESTADO E OS NOSSOS



Do mesmo modo que se verificaram abusos com as escutas telefónicas, está-se a verificar o mesmo tipo de abusos com o fisco e está toda a gente caladinha. Há medo nessa caladinha atitude, culpa e medo. A mim não me interessa a culpa, mas sim o medo.

Comecemos pelas escutas, porque são uma história exemplar. A sua facilitação data do ministro António Costa num anterior governo Guterres e foi aplaudida com um consenso generalizado. Quem é que não queria que polícias e magistrados tivessem as armas necessárias para combater a criminalidade organizada, o grande crime económico, a lavagem de dinheiros, a droga, a corrupção, as máfias e o terrorismo? Ninguém.

Depois aconteceu o que se podia prever, conhecendo melhor o país e as suas gentes. O que devia ser um método de excepção tornou-se a regra e depois um abuso da regra. Não se sabe ao certo quantos telefones estão a ser escutados, mas sabe-se que são muitos. O número indicado pelo procurador-geral da República de oito mil é preocupante. Depois, o que devia ter objectivos concretos de combate a determinados tipos de criminalidade, que precisa das escutas para a investigação e não se deixa apanhar por outros meios, tornou-se a primeira e mais fácil arma de investigação, abusada para vigiar mais do que os suspeitos do crime, os "suspeitos" de não gostarem do procurador-geral e dos magistrados.

A acusação grave que Miguel Sousa Tavares fez e que eu subscrevo é a da utilização das escutas como instrumento de defesa e ataque corporativo por parte de alguns juízes e magistrados. É uma acusação que não precisa de demonstração. As escutas divulgadas, puramente do âmbito político, mostram que alguém (e esse alguém só podem ter sido polícias, magistrados ou juízes) abusou de um instrumento especialmente delicado, desviando-o da sua finalidade exclusiva, sem cuidar da regra que impõe o seu uso apenas em casos de necessidade justificados. E esse "alguém" fê-lo não tanto através da violação do segredo de justiça (de que não sabemos quem tem responsabilidade), mas pela realização, transcrição e anexação de escutas indevidamente realizadas a processos em que era só uma questão de tempo até virem a público (e aqui sabemos quem tem responsabilidade). A intencionalidade das escutas - apanhando conversas de políticos sobre a magistratura e o procurador-geral da República - mostra a sua gravidade, porque não é crime nenhum ter dessas conversas, só é ilegal escutá-las e divulgá-las.

Mesmo que não houvesse uma intenção perversa, há certamente grave negligência. Dá trabalho e exige profissionalismo fazer investigação usando os recursos tradicionais, logo usam-se as escutas indiscriminadamente porque é mais fácil. A negligência que já existia na investigação tradicional emigra para as escutas. Estas, mesmo em processos em que seria legítimo serem usadas, são muitas vezes feitas de tal maneira descuidada que acabam por ser anuladas como meio de prova. Tudo vive do puro facilitismo - dá-se-lhes a bomba de neutrões e eles, em vez de usarem uma vulgar granada ofensiva, matam tudo à volta, usando a bomba e não a granada. É como matar os peixes a dinamite, para apanhar um, morre o rio ou o lago inteiro.

Há quem diga, talvez com alguma razão, que até agora não houve problemas porque não se tratava de escutas a figuras públicas e a políticos. É verdade, mas pode tornar-se mentira quando se trata não apenas de escutas, mas da combinação de escutas indevidas com violação de segredo de justiça. Ora isso não acontece com as pessoas comuns, porque aí ninguém está interessado em divulgar as escutas e aqui está. A combinação entre escutas de conversas, sem conteúdo criminal ou utilidade processual, e a sua divulgação para atingir os seus autores como figuras públicas lança uma luz tenebrosa sobre as duas coisas: as escutas e a violação do segredo de justiça.

Pode haver sempre a tese conspirativa de que as fugas se destinam a "queimar" as escutas e a abrir caminho contra a sua utilização legítima. Pode, de facto, ser verdade, porque a ingenuidade nunca fez bem a ninguém nestes casos. Mas se não fosse a real incompetência e abuso já verificados teria sido assim tão fácil "queimá-las"? Se magistrados, polícias e juízes não tivessem sido tão facilitistas e abusadores com o poderoso instrumento que tinham nas suas mãos, teria sido possível este backlash contra as escutas, que se arrisca a permitir que criminosos fiquem por punir, apenas porque se abusou de um meio de investigação e prova?

Mesmo que siga a explicação mais simples, a de que em Portugal tudo isto acontece por uma combinação de negligência, facilitismo, arrogância (e a arrogância corporativa é maior no seio da justiça do que em outras áreas profissionais), os sinais são perigosos quando vemos o mesmo tipo de mecanismo emergir na administração fiscal. No fisco está a caminhar-se no mesmo caminho que levou António Costa a abrir a porta a todas as escutas. Como no caso da legislação de Costa, a atitude expedita do fisco é saudada pela opinião pública, que aceita sem segundos pensamentos tudo o que pareça punição populista. A fraude e a evasão fiscal são muito importantes em Portugal, mas duvido que este tipo de métodos e processos apanhem mais do que os mais fracos e os que têm menos responsabilidade e meios, para deixarem impunes os mais poderosos e assessorados.

Para além do mais, e volto ao paralelo com as escutas, muito do que está a ser feito no fisco revela a real incapacidade dos serviços para investigar como deve ser, preferindo métodos universais e expeditos de suspeição, baseando-se numa desconfiança genérica do fisco para com os contribuintes, que trata como sendo sempre culpados salvo prova em contrário. A ideia ventilada entre outros pelo Presidente da República, e saudada pelo fisco que já a aplica, conduz à generalização da inversão do ónus da prova, ou seja, somos culpados e temos de provar que somos inocentes Este tipo de métodos protege a ineficácia da administração fiscal e diminui significativamente os direitos dos contribuintes honestos e cumpridores, amalgamados cada vez mais com os que o não são.

Já experimentaram tentar saber se devem alguma coisa ao fisco e nunca receber uma resposta clara, ou, recebendo-a, uma semana depois descobrir que afinal deviam alguma coisa, que afinal verdadeiramente não deviam? Já experimentaram, numa selva cada vez mais complicada de impressos, fórmulas e procedimentos, ter a sensação kafkiana de subirem uma espiral de culpa, de juros e sanções sem qualquer defesa? A escalada neste processo está em pleno curso, acompanhando um fisco que se torna cada vez mais complicado e burocrático, onde os erros são inevitáveis, crescentes e muito difíceis de corrigir. Não basta remeter para a Internet para desanuviar as repartições, é preciso ter em conta que a complexidade das declarações é enorme e os mecanismos hostis a quem queira ser honesto e fáceis de ludibriar por quem tenha dinheiro para pagar consultadorias fiscais.

O fisco anuncia agora, com aplauso generalizado, ir publicar uma lista dos devedores como sanção e opróbrio público. Pode-se admitir que ao fisco seja dada possibilidade de publicitação de "listas negras", só que tal não deve ser feito sem uma concomitante responsabilização. O fisco pode publicar as listas que entender, mas tem de garantir a sua fidedignidade e pagar pelos seus enganos. Publicam a lista, mas seria bem estarem obrigados por lei ou norma a rectificar com publicidade maior os seus enganos, pedindo desculpas aos contribuintes publicamente e indemnizando-os. Se for assim, acredito que qualquer lista vai ser feita com o máximo cuidado, se não for assim, vai lá parar tudo de modo atabalhoado e basta 5 por cento de erros para atingir milhares de pessoas.

Ninguém se pergunta por que razão a primeira lista a ser publicada não devia ser a dos autores de fraudes ao fisco ou dos grandes devedores. Se é verdade que essa lista tem 800 mil contribuintes em falta, algo de mal existe tanto no fisco como nos putativos devedores, que vão ser amalgamados numa lista em que coexistem situações muito distintas. O seu número anunciado revela muitos outros fenómenos sociais antes de revelar comportamentos censuráveis. E revela também a gigantesca incapacidade administrativa do fisco em lidar com as dívidas que deixou acumular.

Estes métodos expeditos de actuação, mexendo com a dignidade pública de cada um, que é a "sanção" da lista, podem agradar ao populismo fácil e encher os cofres do Estado momentaneamente, mas nunca impedirão a fraude fiscal, ao mesmo tempo que vão erodindo os nossos direitos e garantias. Porque, do mesmo modo que os cidadãos o são porque pagam impostos para a sua comunidade, não podem ver os seus direitos, a começar pela sua imagem pública, postos em causa por erros da administração, que deve saber que também tem de pagar por esses erros e com juros. No dia em que o Estado e os seus agentes pagarem pelos seus erros, como os cidadãos pagam, talvez se tornem mais eficazes e responsáveis e tenham mais respeito pelos direitos comuns, os direitos dos homens comuns.

(No Público de hoje.)

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EM PREPARAÇÃO: A VERSÃO 1.0 DE
"BOAS COISAS / PÉSSIMAS COISAS NO JORNALISMO PORTUGUÊS EM 2005, VISTAS POR UM GRANDE (EM QUANTIDADE) CONSUMIDOR"


A exemplo do que fiz no início de 2004, estou a preparar uma lista de boas e más coisas no jornalismo português no ano passado, do meu ponto de vista enquanto consumidor compulsivo. Aceitam-se sugestões.

A versão anterior, com os comentários, está no arquivo do Abrupto de Janeiro de 2005.

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OUVINDO "DEVIL GOT MY WOMAN" DE "SKIP" JAMES




I'd rather be the devil, to be that woman man
I'd rather be the devil, to be that woman man
Aw, nothin' but the devil, changed my baby's mind
Was nothin' but the devil, changed my baby's mind

I laid down last night, laid down last night
I laid down last night, tried to take my rest
My mind got to ramblin', like a wild geese
From the west, from the west

The woman I love, woman that I loved
Woman I loved, took her from my best friend
But he got lucky, stoled her back again
And he got lucky, stoled her back again

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INTENDÊNCIA

Em actualização os ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO.

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QUADROS DE UMA EXPOSIÇÃO:
9. NOITE DE LUAR NO DNEPER (KUINJI)


(Notas em breve.)

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LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)

(22 de Dezembro)


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Morreu a "cultura de massas"? Uma resposta no Los Angeles Times:
"The real story isn't so much the death of the old mass culture or the rise of a new, fragmented technoculture, but the empowerment of the American consumer — which isn't quite the same as the American citizen.

Beyond racing out to get the must-hear Mariah Carey single and see Hollywood's 10-ton gorillas, We, the People are poring over iTunes playlists of friends, celebrities and strangers to find music that matches our personal preferences. And tapping services like Pandora to stream customized "radio stations" into our PCs. And browsing the endless virtual shopping aisles of opinion and analysis in the blogosphere.

En masse, people not named Rupert Murdoch or Ted Turner are using increasingly accessible technology to wrest control of cultural production — creating, curating and critiquing their own output and nudging along its consumption. An enterprising anarchist-death metal band, say, can make a video, post it on MySpace, sell its home-pressed CD off the Web and develop a base of fans who chat, post reviews and forward the video link to friends."
*

Boa frase de blogue: "Aquele homem sofria de um caso de dupla personalidade. E quando começou a chocar com os móveis e as paredes, percebeu que estava a ser dominado pelo seu alter-cego."(No voo cego a nada).

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Nos artigos de Augusto M. Seabra, no "desligado" Público, têm vindo a ser publicados dados preciosos sobre a promiscuidade no sector da arte e da cultura, entre curadores de museus, comissários de exposições e responsáveis por fundos de investimento privado em arte, que raras vezes são sujeitos a escrutínio público. Há aí muito a fazer, rompendo um silêncio de grupos de amigos e de interesses, que afecta a imprensa especializada, que não se comporta com critérios jornalísticos, mas como extensão desses grupos. Aliás seria interessante também saber mais sobre as principais produtoras de programas "culturais" e recreativos para a televisão, e a natureza quase monopolista das suas relações, por exemplo, com a televisão pública. Há aí todo um mundo de interesses que vive na obscuridade, e que merecia uma parte da ainda bruxuleante luz que já existe para o mundo da política e dos negócios, e que se esboça muito timidamente no mundo das sociedades de advogados, e no jornalismo económico.

Exemplos retirados do artigo de hoje de Augusto M. Seabra, inserido numa polémica com a Ministra da Cultura:
"Sabem os leitores do PÚBLICO; e saberá a ministra da Cultura, que Pedro Lapa, director desse museu, declarou desempenhar "parcialmente funções de curador na Ellipse Foundation"; assim sendo, é também "parcialmente" que desempenha as funções no museu. Quem autorizou esta acumulação? Como se adequa ela, e ao abrigo de que excepção, com o regime de exclusividade de dirigentes da administração pública, ora consignado no artigo 14, nº2, da Lei nº51/2005? Que relação julga a tutela existir entre o desempenho "parcial" das funções públicas e a prossecução ou abandono de facto das actividades estatutárias do museu? Tem havido ou não, em consequência, uma quebra da frequência? Foram feitos "periodicamente estudos de público e de avaliação", de acordo com o artigo 57 da Lei nº47/2004, Lei-Quadro dos Museus? Que plano anual de actividades apresentou o director do museu à tutela nos termos do artigo 44 da mesma lei?
Como também é público, e verificável em www.ellipsefoundation.com, são curadores desse fundo de investimento em arte do Banco Privado Português Pedro Lapa e Alexandre Melo, assessor cultural do primeiro-ministro. Como é público, houve promiscuidade de interesses na exposição dedicada a James Coleman, e, acrescento eu, na de William Kentridge, ainda patente - pois que mesmo que as cópias em exibição provenham da galeria Marian Goodman, e podendo ser das destinadas a circular, outras cópias, e para todos os efeitos a mesma obra, foram adquiridas pela Ellipse. Um museu nacional foi transformado num usufruto privado, Chez Lapa ao Chiado."
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My Photo

A discussão sobre a A CAPA DA EDIÇÃO DE SEXTA-FEIRA DO PÚBLICO (a do King Kong) resumida e comentada no INDÚSTRIAS CULTURAIS. Já agora, voto em Rogério Santos para Pai Natal da blogosfera...

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Para melhorar a cobertura de debates e usar todas as potencialidades da rede, esta sugestão do Poynter Online com origem canadiana.

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21.12.05


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)

(21 de Dezembro)


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Há vários quadros de John Frederick Peto (como estes) que competem pelo lugar do Malhoa que está aqui em cima, quando finalmente escolher um novo nome para este "stream". O Malhoa é mais solar, e mais activo, mas as "letter racks" de Peto mostram melhor a diversidade do que cabe no LENDO / VENDO /OUVINDO. Em breve, colocarei aqui as muitas sugestões, entretanto recebidas, de nomes enviadas pelos leitores.


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Nesta campanha presidencial há uma estreia: é a primeira vez que aparecem genuínos blogues ligados a candidaturas, que participam de parte inteira na cultura e no estilo próprio da blogosfera e que não são transplantes artificiais feitos a martelo. É o caso do Pulo do Lobo e do Super Mário.

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Na SIC Notícias, Bocage é descrito como "cliente da noite". Não está mal.

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20.12.05


QUADROS DE UMA EXPOSIÇÃO:
8. RETRATO DE LEV TOLSTOY (REPIN)


(Notas em breve.)

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COISAS COMPLICADAS


John Frederick Peto

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LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)

(20 de Dezembro)


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A mais cega e por isso mais divertida nota de qualquer blogue nesta campanha eleitoral: no Super Mário:

"Terça-feira, Dezembro 20, 2005

RTP1, 20.45

Imaginem o Cavaco quando este Homem lhe aparecer pela frente.
Filipe 11:16 AM"
Fim de citação. Imagino, imagino...Cavaco e os portugueses no dia 22 de Janeiro.

*

Stephen Metcalf, "Lolita at 50. Is Nabokov's masterpiece still shocking?" no Slate:
"Lolita turns 50 this year, and having stayed so perverse, it remains fresh as ever. To fully appreciate its perversity, though, one must first appreciate that it is not obscene. Your run-of-the-mill obscene masterwork—Tropic of Cancer, say—demands that you, enlightened reader, work your way past the sex and excrement to recognize how beautiful it is. But with Lolita, you must work past its beauty to recognize how shocking it is. And for all its beauty, for all its immense ingenuity and humor, one easily forgets how shocking Lolita is. "
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No Independent, Now for some good news:
"Democracy returns to Afghanistan after 30 years... Chocolate helps reduce the risk of heart disease... House prices are on the rise again... Belfast hosts gay wedding... More trains are running on time... Dramatic fall in the fear of crime... The corncrake returns to Britain's shores... 60 per cent of tsunami victims find new jobs..."
*

O "nosso" Macau: "Macao "l'enfer du jeu" flambe toujours !" no Le Monde.

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Como se faz um modismo jornalístico: de há dias para cá, tornou-se habitual a designação "trabalhadores do sexo", que nunca era usada antes na comunicação social. Bastou uma conferência de imprensa muito anunciada, a propósito da constituição de um sindicato dos ditos "trabalhadores". Já houve outros modismos deste tipo que entretanto quase desapareceram, como o "Timor Lorosae".

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EARLY MORNING BLOGS 664

Algumas Proposições com Pássaros e Árvores que o Poeta Remata com uma Referência ao Coração


Os pássaros nascem na ponta das árvores
As árvores que eu vejo em vez de fruto dão pássaros
Os pássaros são o fruto mais vivo das árvores
Os pássaros começam onde as árvores acabam
Os pássaros fazem cantar as árvores
Ao chegar aos pássaros as árvores engrossam movimentam-se
deixam o reino vegetal para passar a pertencer ao reino animal
Como pássaros poisam as folhas na terra
quando o outono desce veladamente sobre os campos
Gostaria de dizer que os pássaros emanam das árvores
mas deixo essa forma de dizer ao romancista
é complicada e não se dá bem na poesia
não foi ainda isolada da filosofia
Eu amo as árvores principalmente as que dão pássaros
Quem é que lá os pendura nos ramos?
De quem é a mão a inúmera mão?
Eu passo e muda-se-me o coração


(Ruy Belo)

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Bom dia!

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18.12.05


QUADROS DE UMA EXPOSIÇÃO:
7. APOTEOSE DA GUERRA (VERESHCHAGIN)



Vasily Vereshchagin foi, quase toda a sua vida, pintor e militar. Conhecia bem os campos de batalha russos, os campos de batalha das fronteiras do leste e do sul, entre o Cáucaso e as velhas cidades que tinham sido de Tamerlão e Gengis Cão. Pintou como ninguém esses extremos de violência e exotismo, essas terras bravas onde governavam emires cruéis e onde ninguém entrava. Muita da história russa fez-se nesse confronto com fronteiras de outras religiões, outras raças e outras civilizações. Vereshchagin pintava a desolação e a crueldade da guerra, de tal maneira que foi considerado anti-patriota, ele que sempre se destacou pela coragem na frente de combate. Alguns dos seus quadros têm para os russos um valor icónico, e são conhecidos por todos.

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LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)

(18 de Dezembro)


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Ouvindo Tom Zé "Senhor Cidadão", no Almocreve das Petas.

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Pergunta a "Laurindinha" no Abrigo da Pastora:

"Laurindinha não é uma doutora da Igreja nem almeja sê-lo. Prefere conhecer pedras e riachos a dogmas. Por isso, surgem-lhe, às vezes, algumas dúvidas sobre a doutrina católica.

Por exemplo, nunca percebeu muito bem até quando se tem direito ao limbo. Será até ao primeiro choro interesseiro?

E agora? Se a hierarquia católica decreta o fim do limbo, para onde vai Alberto Caeiro?"

*

No Público "desligado", um artigo de João Bénard da Costa sobre o Padre Manuel Antunes:
"A primeira vez que o vi foi no fundo da "sala capitular" do claustro do velho Convento de Jesus, corria o ano de 1957. Eu tinha feito 21 anos, ele ia fazer 39. Eu estava a acabar o 3.º ano do curso de Ciências Histórico-Filosóficas na Faculdade de Letras, à época moradora nesse convento e dirigida por Vitorino Nemésio. Ele acabava de ser convidado pelo mesmo Nemésio - no gesto mais feliz de funções que exerceu com manifesto desconforto - para ensinar História da Cultura Clássica e História da Civilização Romana.

Ao padre Manuel Antunes - embora eu nada conheça da sua vida pessoal nem conheça quem conheça - poderá talvez aplicar-se o que ele próprio disse um dia de Kierkegaard: "Um ser que nunca foi criança, nunca foi adolescente, nunca foi jovem, mas adulto, sempre adulto." Aos 39 anos, parecia ter 50. Como recordarão os que o conheceram, o físico não o ajudava. De meã estatura, magríssimo, lívido, com um fio de voz, parecia, nos hábitos talares que, nesses tempos, nenhum sacerdote dispensava e muito menos um servo de Jesus, a própria encarnação do beato asceta, que o secular anticlericalismo português investiu no padre, quando o não investia com a malícia e os prazeres da mesa, na imagem caricatural dos abades do Minho."

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EARLY MORNING BLOGS 663

Owed to New York


Vulgar of manner, overfed,
Overdressed and underbred,
Heartless, Godless, hell's delight,
Rude by day and lewd by night;
Bedwarfed the man, o'ergrown the brute,
Ruled by boss and prostitute:
Purple-robed and pauper-clad,
Raving, rotting, money-mad;
A squirming herd in Mammon's mesh,
A wilderness of human flesh;
Crazed by avarice, lust and rum,
New York, thy name's "Delirium."


(Byron Rufus Newton)

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Bom dia!, à hora do brunch...

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17.12.05


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)

(17 de Dezembro)


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"The music group of greater kalamazoo" no Rocketboom.

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Nulla dies sine linea, num Moleskine perto de mim.
O provérbio referido, nulla dies sine linea (“nem um dia sem uma linha”) tem origem em Plínio. Mas não se refere à escrita. Refere-se ao desenho.

Refere-se ao pintor ateniense Apeles, que nos ensinou que a Verdade se pinta nua. Como mais tarde nos veio recordar Sandro Filipepi (alcunhado de Botticelli) ao tentar reproduzir o diálogo de Luciano de Samosata De Calumnia. Veja-se a passagem de Plínio na História Natural (35, 24): Apelli fuit alioqui perpetua consuetudo numquam tam occupatum diem agendi, ut non lineam ducendo exerceret artem, quod ab eo in proverbium venit.

(F.)
*








O DVD Shostakovich Against Stalin - The War Symphonies, mostra a máquina trituradora do "Pai dos Povos", contra o mais genial dos "seus" músicos. Mesmo assim, a música defendeu Shostakovich. A música e não os músicos.

*

Mais um artigo que é pena que não se possa ler em linha, mas que vale o jornal em papel: Helena Matos, "Um pequeno ponto no nariz", no Público. Uma amostra:
"Não sei se Mário Soares se pergunta porquê mas os comentários, as dúvidas e as acusações daqueles que por ele falam remetem para um perplexo: "Porquê? Porque é que desta vez não acontece o tal ponto de viragem?" A resposta encontra-se não tanto nos manuais de propaganda política, mas sim num livro sobre o discurso amoroso: "Ao mesmo tempo que se interroga obcecadamente por que motivo não é amado, o sujeito apaixonado vive com a convicção de que, na verdade, o objecto amado o ama mas não diz. (...) A verdade é que - exorbitante paradoxo - não deixo de acreditar que sou amado. Alucino o que desejo. Toda a dor resulta menos de uma dúvida do que de uma traição." O livro de Roland Barthes Fragmentos de Um Discurso Amoroso torna-se num dos mais fascinantes guias de leitura do que está a acontecer na campanha de Mário Soares."

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EARLY MORNING BLOGS 662


a.k.a BREAK OF DAY


'TIS true, 'tis day ; what though it be?
O, wilt thou therefore rise from me?
Why should we rise because 'tis light?
Did we lie down because 'twas night?
Love, which in spite of darkness brought us hither,
Should in despite of light keep us together.

Light hath no tongue, but is all eye ;
If it could speak as well as spy,
This were the worst that it could say,
That being well I fain would stay,
And that I loved my heart and honour so
That I would not from him, that had them, go.

Must business thee from hence remove?
O ! that's the worst disease of love,
The poor, the foul, the false, love can
Admit, but not the busied man.
He which hath business, and makes love, doth do
Such wrong, as when a married man doth woo.

(John Donne)

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Bom dia!

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15.12.05


SABEM O QUE É OPORTUNISMO?



A má fé no debate com Jerónimo de Sousa por parte de Louçã foi exemplar. Depois de passar todo o debate a falar do que era comum na "esquerda" com o PCP, aproveitou o minuto final, em que não há resposta, para elogiar João Amaral e Lino de Carvalho, dois críticos da direcção do PCP. Se o tivesse feito no início, o debate teria sido bem diferente, mas aqui há pura má fé e oportunismo político.

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TEMAS PRESIDENCIAIS: LOUÇÃ E OS DEBATES



1.Embora os debates ainda não tenham terminado e faltem dois importantes (decisivos? não sei) à data em que escrevo, penso que a candidatura que mais favorecida tem sido é a de Francisco Louçã. Todos os debates lhe correram bem, em particular o que teve com Cavaco.

2. Saliente-se, logo à cabeça, que não penso que esta candidatura tenha alguma coisa a ver com as eleições presidenciais. Louçã aproveita o tempo de antena presidencial para promover a sua organização política e a si próprio, o que é aliás legítimo em candidaturas de carácter tribunício, como também é a de Jerónimo de Sousa. E nessa função, após um arranque débil, a participação nos debates presidenciais tem-no favorecido. O modelo dos debates começa por colocar todos os candidatos que os jornalistas escolhem (e não todos os candidatos) no mesmo nível de importância. Logo à partida essa posição de relevo igualizadora é-lhe favorável, coloca-o como Grande entre os Grandes, o primeiro objectivo de um Pequeno. Louçã não tem desmerecido dessa condição.

3. Ainda mais favorável é o facto de Louçã poder usar de toda a liberdade discursiva, e tratar, como aliás justificou, de tudo. Um candidato presidencial pode tratar de tudo, só que nem a todos se lhe admite a liberdade de tratar de tudo sem ter que teorizar sobre os poderes presidenciais, ou sem que se lhe suspeitem intenções de subversão da Constituição e do regime. Esta liberdade é-lhe concedida pelos jornalistas e pelos seus adversários, que ainda não o confrontaram com os limites dos poderes presidenciais, porque pura e simplesmente não o tomam como candidato presidencial, mas como o líder do BE.

4. O que Louçã tem conseguido é seu mérito e demérito alheio. Ele é um dos políticos portugueses mais experientes e mais velhos na função. Fazendo política profissional desde a adolescência, antes do 25 de Abril, tem mais experiência do que Jerónimo de Sousa e Cavaco Silva, ombreando com Soares e Alegre, que, no entanto, têm a desvantagem de parecer muito mais "velhos" do que ele. Mais: Louçã fez toda a sua vida política em grupos radicais nos quais o debate e a discussão, oral e por escrito, é sistemática e permanente. Como quadro trotsquista, actuando nos grupos trotsquistas portugueses e na Quarta Internacional, Louçã participou de parte inteira em grupos que não só são internacionalistas e cosmopolitas, como incluem gente muito brilhante e capaz, de que ele faz parte de pleno direito. Mais do que qualquer outro dos seus companheiros de corrida presidencial, Louçã tem milhares e milhares de horas de discussão por detrás, discussões muitas vezes duras, escolásticas, doutrinais, sobre nuances políticas exploradas até à exaustão. Se a isso somarmos a sua experiência académica, os seus hábitos de estudo e leitura, e a sua inteligência, temos a chave das suas capacidades.

5. O problema com Louçã não são as suas capacidades, é o facto de elas ofuscarem, na nossa mediania comunicacional, o escrutínio do seu radicalismo, das inverdades da sua propaganda, e da essência demagógica e populista do seu discurso arrogante e moralista. Louçã é o único que fala como escreve, inclui os sublinhados, as aspas, as vírgulas e os pontos finais. É um discurso fechado e cerrado a qualquer interpretação, ou porque ele próprio fornece o quadro da sua interpretação, como se uma mão invisível fosse sublinhando a marcador amarelo e vermelho as frases que temos que ver, ou porque nos acena de imediato com o pecado moral em que estamos a cair se com ele não concordamos. Quando fala da guerra do Iraque, o ouvinte que com ele não concorda já está de imediato na posição de réu moral de qualquer crime. Nisso ele e Paulo Portas são quase iguais.

6. A sua vantagem nos debates não vem só das suas capacidades retóricas e argumentativas (menos aliás do que do seu saber, porque Louçã deturpa os dados de uma forma pouco académica para servirem para a propaganda), mas também do facto de ele ter um dos discursos políticos com menos baias que se fazem em Portugal. Ele tem baias, enormes e rígidas baias, só que é preciso percebê-lo política e ideologicamente muito bem, para as revelar. É preciso conhecer muito bem as novas formas de "língua de pau" do radicalismo, que mudou de madeira quando a anterior se esboroou.

7. Na prática, Louçã fala do que quer, como quer, dizendo o que quer, porque não tem que prestar contas, não tem responsabilidades por nada, nem tem memória, nem actua em função dos cargos a que concorre, nem das leis, nem da democracia, nem da economia de mercado. Louçã é um socialista colectivista, uma forma peculiar de comunista, se o termo não estivesse tão abastardado, um revolucionário de raiz leninista, aceitando o princípio do direito à violência para derrubar o "capitalismo", defensor de um regime político-social autoritário, sempre presente como pano de fundo na lógica da sua argumentação. Ele nunca o dirá, porque somente faz a crítica ao existente. É na crítica que ele brilha, mas não tem que pagar o preço de falar das alternativas, a não ser através de uma retórica de ocultação, porque as alternativas com que ele concorda lhe estragariam a imagem e a propaganda.

8. Que país se aproxima, no seu regime político-económico, do que Louçã pretende para Portugal? Aqui está uma pergunta a que ele não responde facilmente, em particular se quem lha colocar souber evitar as fugas que a sua habilidade fará aparecer. O albanês, o da Nicarágua sandinista, o de Cuba, o sueco, o argelino, o do Brasil de Lula, o holandês, a Venezuela de Chávez? Ele tenderá a sugerir, sem o dizer, que é o sueco na segurança social e o holandês nos costumes, mas sugestio falsi, diria um jesuíta ilustrado. Em que partidos e movimentos, fora e dentro da Europa, Louçã se revê? Nos zapatistas de Chiapa, nos trotsquistas franceses (quais?), nos peronistas, no PT de Lula, ou na ala esquerda do PT? Prudente silêncio nas grandes intervenções, e só levantando a ponta do véu nos círculos partidários. Que política externa devemos ter face à Europa, à OTAN e aos EUA? Aqui Louçã é mais transparente, mas convinha perceber que, na prática, a política que ele nos sugere é muito parecida com a da Venezuela, ou a da Líbia, excluídos os respectivos particularismos regionais.

9. O mundo de Louçã, que é transparente para quem conheça as suas posições, é obscuro para quem apenas o ouça a fazer grandes debates e para a maioria das audiências que o conhece apenas da televisão e da propaganda. O que é que ele realmente pensa da economia de mercado? Como é que ele entende as empresas no seu país ideal, como vê a propriedade privada, até onde é que ele pensa que devem ir os impostos para financiar o país providencial que sugere ser o alfa e ómega do seu programa político.

Não basta só falar do desemprego e da segurança social, dos impostos, e enunciar um programa meio sindicalista, assistencial e de fiscalidade punitiva dos "ricos", completamente irrealista. Esse programa levaria a uma forte conflituosidade social, ao encerramento de muitas empresas, à fuga de capitais, ao fim do investimento e seria ineficaz sem repressão. O programa de Louçã nunca aparece nos debates, mas é a uma espécie de PREC que conduz. Ouvi-lo pode ser mavioso, moderno e desempoeirado, mas tomá-lo à letra é sinistro.

(No Público de hoje.)

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LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)

(15 de Dezembro)


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"Confiança", a palavra-chave desta campanha presidencial
. O que diz quase tudo.

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Olhar para mesma Lua. A que Ansel Adams fotografou um dia no Glacier Point:

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Enquanto escrevo, ouço. VivaLaVoce.

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O Top 10 das máquinas-humanas, dos robots. Ganha o par R2-D2 e C-3P0, como se esperaria, mas Der Maschinian-Mensch do Metropolis de Lang está em boa posição.

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Na Nature uma comparação que favorece a Wikipedia (ou desfavorece a Britannica, como se quiser):

"Nature's investigation suggests that Britannica's advantage may not be great, at least when it comes to science entries. In the study, entries were chosen from the websites of Wikipedia and Encyclopaedia Britannica on a broad range of scientific disciplines and sent to a relevant expert for peer review. Each reviewer examined the entry on a single subject from the two encyclopaedias; they were not told which article came from which encyclopaedia. A total of 42 usable reviews were returned out of 50 sent out, and were then examined by Nature's news team.

Only eight serious errors, such as misinterpretations of important concepts, were detected in the pairs of articles reviewed, four from each encyclopaedia. But reviewers also found many factual errors, omissions or misleading statements: 162 and 123 in Wikipedia and Britannica, respectively."

Resposta da Britannica:

"Editors at Britannica would not discuss the findings, but say their own studies of Wikipedia have uncovered numerous flaws. "We have nothing against Wikipedia," says Tom Panelas, director of corporate communications at the company's headquarters in Chicago. "But it is not the case that errors creep in on an occasional basis or that a couple of articles are poorly written. There are lots of articles in that condition. They need a good editor."


*

É verdade que este debate sobre a história, que mais uma vez atravessa a França intelectual, é a melhor ilustração da tese do eterno retorno. Os franceses lidam mal com uma história que, ou os culpa, ou os culpa de os absolver da culpa. Alemães e austríacos lidam mal com o Holocausto, entre a vergonha transformada em agressividade penal, ou o esquecimento incomodado. Por todo o lado, os velhos comunistas não conseguem ultrapassar a sucessão de testemunhos heróicos e de falsidades propagandísticas, pelos factos e pelos documentos (por cá também não). Por isso fica aqui o manifesto (ele também tão francês...) de Jean-Pierre Azéma, Elisabeth Badinter, Jean-Jacques Becker, Françoise Chandernagor, Alain Decaux, Marc Ferro, Jacques Julliard, Jean Leclant, Pierre Milza, Pierre Nora, Mona Ozouf, Jean-Claude Perrot, Antoine Prost, René Rémond, Maurice Vaïsse, Jean-Pierre Vernant, Paul Veyne, Pierre Vidal-Naquet e Michel Winock:
"Emus par les interventions politiques de plus en plus fréquentes dans l'appréciation des événements du passé et par les procédures judiciaires touchant des historiens et des penseurs, nous tenons à rappeler les principes suivants :

L'histoire n'est pas une religion. L'historien n'accepte aucun dogme, ne respecte aucun interdit, ne connaît pas de tabous. Il peut être dérangeant.

L'histoire n'est pas la morale. L'historien n'a pas pour rôle d'exalter ou de condamner, il explique.

L'histoire n'est pas l'esclave de l'actualité. L'historien ne plaque pas sur le passé des schémas idéologiques contemporains et n'introduit pas dans les événements d'autrefois la sensibilité d'aujourd'hui.

L'histoire n'est pas la mémoire. L'historien, dans une démarche scientifique, recueille les souvenirs des hommes, les compare entre eux, les confronte aux documents, aux objets, aux traces, et établit les faits. L'histoire tient compte de la mémoire, elle ne s'y réduit pas.

L'histoire n'est pas un objet juridique. Dans un Etat libre, il n'appartient ni au Parlement ni à l'autorité judiciaire de définir la vérité historique. La politique de l'Etat, même animée des meilleures intentions, n'est pas la politique de l'histoire.

C'est en violation de ces principes que des articles de lois successives ­ notamment lois du 13 juillet 1990, du 29 janvier 2001, du 21 mai 2001, du 23 février 2005 ­ ont restreint la liberté de l'historien, lui ont dit, sous peine de sanctions, ce qu'il doit chercher et ce qu'il doit trouver, lui ont prescrit des méthodes et posé des limites.

Nous demandons l'abrogation de ces dispositions législatives indignes d'un régime démocratique. "
*

Uma pergunta certeira, citada do Bloguitica:
«A pergunta sem resposta», por Sérgio Figueiredo. Destaco apenas um parágrafo e que não dispensa a leitura do artigo: «A pergunta do Governo deveria ser colocada ao contrário: será que um investimento de quase 8 mil milhões não eterniza a crise orçamental do Estado? e, por conseguinte, não implicará um agravamento sucessivo da carga fiscal que, essa sim, compromete a competitividade da economia?», (Jornal de Negócios, 14.12.2005: 3).

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EARLY MORNING BLOGS 661

È ridicolo credere


È ridicolo credere
che gli uomini di domani
possano essere uomini,
ridicolo pensare
che la scimmia sperasse
di camminare un giorno
su due zampe

é ridicolo
ipotecare il tempo
e lo é altrettanto
immaginare un tempo
suddiviso in piú tempi

e piú che mai
supporre che qualcosa
esista
fuori dall'esistibile,
il solo che si guarda
dall'esistere.



(Eugenio Montale)

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Bom dia!

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12.12.05


QUADROS DE UMA EXPOSIÇÃO:
6. ELES NÃO O ESPERAVAM (REPIN)



Este é um dos quadros que perde com a reprodução, embora não seja o tamanho que aqui conte, mas a intensidade dramática das faces, a complexidade visual da cena. O viajante inesperado é um deportado que regressa de surpresa. Lembrei-me do Frei Luís de Sousa, embora aqui se saiba que ele está vivo, só não se sabe quando volta ou se volta.

A referência religiosa a Cristo está patente na face do recém-chegado, pai, filho, neto, menino, que suscita todas as reacções: alegria, emoção, espanto, curiosidade. Naquela sala está a casa toda, do rapaz e da rapariga que estudam, ao cozinheiro que espreita. Percebe-se que é uma casa burguesa, simples. O Cristo impresso na face do deportado é o mesmo do quadro de Kramskoy (o terceiro desta série). É Cristo, símbolo do sofrimento do povo russo.
Na parede estão os retratos de dois poetas narodnik, Chevtchenko e Nekrassov, pelo que podemos perceber as simpatias políticas da família, ligada aos populistas, o grande movimento revolucionário anterior aos socialistas-revolucionários e aos bolchevistas.

Repin nunca ficou satisfeito com este quadro.

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© José Pacheco Pereira
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