ABRUPTO

6.11.04


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: OS CÍRCULOS

"Escreve-se hoje no Abrupto:
"Tenho repetido à saciedade que existe um efeito de Big Brother nas políticas em democracia: tudo o que é importante não se vê, ao mesmo tempo que as pessoas têm a ilusão que sabem de tudo, em directo e a cores".
Concordo plenamente com o facto e sobretudo com as ilações. Mas (...) dentro da compulsão quase natural do sistema político essas coisas não se podem dizer, pelo menos desse modo, pois não? Existe uma margem de reflexão que escapa, ou que se contém irremediavelmente, quando o exercício do poder atravessa a enunciação dos mundos de quem escreve. Existe, de facto, um estar fora do círculo e um estar por dentro desse mesmo círculo. Que é o do poder, directo, real, exercido. O poder não é uma ferramenta pejorativa ou artificiosa, mas acaba sempre por ditar ou condicionar a medida e o momento em que a palavra é materializada em discurso.(...) . A dissimulação entretece o dizer da política, enquanto a discrição - e tão-só a discrição - entretece o poder autónomo e corrosivamente livre da palavra."

(Luis Carmelo)

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INTENDÊNCIA

Colocado no VERITAS FILIA TEMPORIS a LAGARTIXA E O JACARÉ 10 sobre porque razão a oposição do PS é débil, o "mar cão" que mata, o ruído e Weber e a selvajaria do futebol.

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OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: NADA DE NOVO SOBRE A TERRA, TUDO DE NOVO NOS CÉUS






Chão de Titã, em falsas cores. Chão de Marte, a preto e branco, como os fotógrafos gostam. Chão novo, onde se olha pela primeira vez, com a mesma frescura, curiosidade, emoção e algum medo, com que os nossos portuguesinhos de antigamente chegavam a novas terras. Será que haverá ali unicórnios, homens de duas cabeças, monstros de rabo de peixe, a borda do mundo? Adamastores haverá certamente, nalguma esquina do espaço, perto de nós. Riquezas também. Saberes, muitos.

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AGIR COMO MILITANTES, RECEBER COMO PROFISSIONAIS

(Nota breve: tudo o que se diz abaixo aplica-se ao PSD e ao PS.)

O texto do Público de hoje, assim como uma reportagem da Sábado sobre as “agências de comunicação”, são leitura obrigatória para perceber a linha para onde hoje o poder se recolhe, para fugir à falsa transparência do escrutínio em tempo real. Tenho repetido à saciedade que existe um efeito de Big Brother nas políticas em democracia: tudo o que é importante não se vê, ao mesmo tempo que as pessoas têm a ilusão que sabem de tudo, em directo e a cores. O que é importante está do lado de trás da câmara ( a célebre “produção" do Big Brother, os vidros negros e os espelhos que ocultavam as filmagens) ao mesmo tempo que as personagens estão a nu para o “voto” dos “portugueses”. Falsa transparência, real obscuridade.

Uma parte do mundo de “negócios” que circula ao lado e dentro dos partidos é constituída por empresas que vivem das encomendas dos partidos (nas campanhas eleitorais) e dos governos. Muitas dessas empresas são formadas por antigos militantes e, nalguns casos, funcionários partidários, que começaram por prestar voluntariamente ou profissionalmente, dentro dos partidos, os serviços que agora vendem. São empresas de todo o tipo de dimensão, que existem a nível local, regional e nacional (neste caso quase só lisboeta), ligadas quer aos aparelhos dos partidos, quer das juventudes. Têm todas em comum serem constituídas por “pessoas de confiança” política, baseadas em amizades pessoais e políticas e conhecedoras dos mecanismos de decisão interna partidária. Fornecem tudo, desde serviços de tipografia, canetas made in China, construção de sites na Internet, “brindes”, marketing, “relações públicas” e “comunicação”. São uma das razões porque as campanhas eleitorais têm muita dificuldade em escapar aos modelos tradicionais, baseados em elevadíssimas despesas de propaganda, que são um excelente negócio que ninguém quer perder.

Nos partidos, há toda uma série de intermediários para este tipo de serviços e de “negócios” e existe uma competição entre os fornecedores de serviços, que passa também pelos conflitos internos dentro dos partidos. A promiscuidade é total e uma parte do que se chama habitualmente “aparelho” é exterior às estruturas partidárias. Como em todas as coisas há aqui diferenças significativas de dimensão e sofisticação entre as “encomendas” de uma campanha autárquica no interior e as “encomendas” nacionais, envolvendo fundos muito significativos. Aí o que está em jogo é muito importante, e as paradas são muito altas.

Com a sua obsessão pela propaganda, o marketing, a publicidade, e a “imagem” , o grupo à volta do actual Primeiro-ministro tem profundas relações com estes meios, com jornalistas, profissionais de “relações públicas” e de “comunicação”. Este é o outro lado complementar da tentativa directa de controlo da comunicação, ou seja, parte do mesmo processo. Em todos os sítios por onde passou, as despesas deste tipo elevaram-se exponencialmente, dando emprego e “negócios” a toda uma série de próximos que lhe manifestam, como é de esperar, fortes fidelidades pessoais e de grupo.

Acontece que este grupo não é constituído por necessariamente as mesmas pessoas e empresas que “já lá estavam” com os anteriores dirigentes do partido, portanto há toda uma partilha a fazer, com gente a ganhar e outra a perder. Isto ajuda a explicar o significado da denúncia do antigo director do Diário de Notícias, que levanta o véu sobre uma realidade política, insisto política, que até agora não tinha sido realmente escrutinada, porque está por detrás das paredes da casa do Big Brother.

(Continua)

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EARLY MORNING BLOGS 354

Eros e Psique



... E assim vedes, meu Irmão,
que as verdades que nos foram
dadas no Grau de Neófito, e aquelas
que vos foram dadas no Grau de
Adepto Menor, são, ainda que opos-
tas, a mesma verdade.

DO RITUAL DO GRAU DE
MESTRE DO ÁTRIO NA ORDEM
TEMPLÁRIA DE PORTUGAL.

Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.

Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.

A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera.
Sonha em morte a sua vida.
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.

Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado.
Ele dela é ignorado.
Ela para ele é ninguém.

Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.

E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E, vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora.

E, ainda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.


(Fernando Pessoa)

*

Bom dia!

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5.11.04


COISAS SIMPLES


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EARLY MORNING BLOGS 353

silence...


silence

.is
a
looking

bird:the

turn
ing;edge,of
life

(inquiry before snow


(e.e. cummings)

*

Bom dia!

(url)

4.11.04


MAIS DO MESMO - TRÊS NOTAS SOBRE COMUNICAÇÃO SOCIAL



1.Sócrates disse que nunca passou pela cabeça de ninguém que a compra da Lusomundo pela PT poderia levar à instrumentalização dos órgãos de informação do grupo. Tretas. Passou, pelo menos, pela minha cabeça. Escrevi isto em Dezembro de 2000, imediatamente a seguir à operação:

"A compra da Lusomundo pela PT e a hipótese de se concretizar idêntica compra da Media Capital, junta na PT um dos grupos mais poderosos de comunicação social em Portugal. Com um mesmo dono ficarão entre outros o Diário de Notícias, o Jornal de Notícias, a TSF, portais do Internet e eventualmente a TVI, o Diário Económico, e vários outros jornais regionais e rádios. A justificação oficial dessa compra está na necessidade de unir "conteúdos" com plataformas de telecomunicações, uma tendência característica dos "negócios" na área estratégica da nova economia. Tudo isto parece idêntico ao que se passa nos outros países e o "negócio" fundamentado em tendências correntes da economia. Mas esta inocente análise, tão conveniente ao poder, esconde uma perigosa consequência para a qualidade da nossa democracia.
O que se passa na realidade é a re nacionalização da comunicação social em Portugal pelo estado, feita por um governo socialista que tem uma longa tradição de defender uma comunicação social do estado, e com idêntico historial de se opor à privatização. Nenhuma privatização de qualquer órgão de comunicação social do estado foi de iniciativa do PS, (…) Hoje tal desejo estatizante foi conseguido por detrás da capa dos novos "negócios" e será provavelmente esta a via que condicionará a evolução da RTP, que será parcialmente (e falsamente) "privatizada", colocando nas mãos disfarçadas do Governo, através das mãos descobertas dos gestores por ele escolhidos, decisões fundamentais para a liberdade de expressão e o debate contraditório em Portugal. Todo este processo está a desenvolver se no meio da habitual indiferença da opinião pública e incompreensíveis hesitações da oposição.
Alguns directores de órgãos de comunicação social do grupo Lusomundo, entenderam escrever editoriais ou dizerem que o "negócio" não impedia a liberdade editorial que eles próprios garantiam nos órgãos de comunicação. Não contesto a genuinidade das suas convicções de que assim seja, mas acho que, estão a ser pouco cautelosos e a desprevenir os seus leitores e ouvintes, e em geral os portugueses quanto às consequências do que se está a passar. De facto, como jornalistas, com responsabilidades de direcção, eles devem ser os primeiros a saber que justificar o que se passou como se fosse "apenas" um "bom negócio" nestes tempos de nova economia ilude o essencial: o papel do governo no "negócio" e a dependência do governo da PT através da chamada "golden share". Eles vieram garantir com grande ingenuidade, que nenhum comando político será possível, visto que as opções do "negócio" não terão reflexos editoriais e, que se tratava por parte da PT, apenas de comprar "conteúdos", para potenciar a sua plataforma de distribuição. A própria justificação deste "negócio", feita desta forma acrítica, é já preocupante.
O que se passa é que nesta aquisição da PT há questões políticas incontornáveis e que devem ser descritas com toda a clareza para se perceber bem: quem manda na PT é o governo, e dificilmente alguém imagina a decisão da compra da Lusomundo (e eventualmente de outras compras a haver) sem que tal passasse por uma decisão do governo. Tem sido política do tandem, Primeiro Ministro Guterres, Ministro Pina Moura, privatizar na aparência, e reforçar o controle do governo através de golden shares, do exercício da tutela e da nomeação de gestores de confiança política, e da interferência directa do governo em actos normais de gestão. Isto coloca a decisão da PT numa luz diversa da de um mero "negócio". A PT não é uma empresa privada qualquer é um instrumento "estratégico" do governo e do poder socialista e já não é de agora que é assim.
Dito com a brutalidade das grandes verdades, a cadeia de comando vai do Ministro Jorge Coelho, para o Presidente do Conselho de Administração Murteira Nabo e, quer um quer outro, não são pessoas vulgares mas socialistas com funções politizadas: o Ministro Coelho é o que se sabe e o Eng. Murteira Nabo só não foi ministro, pela razão que também se sabe. Com a golden share do estado, as decisões últimas sobre qualquer grande negócio da PT vão a Conselho de Ministros, formal ou informal, e é por isso que quando eles estão a mexer nos "conteúdos", mesmo que em nome dos "negócios", se possa suscitar necessariamente uma questão política séria de liberdade e pluralismo. E se não se suscita, então a coisa é ainda mais séria, porque se está a jogar ou no amorfismo ou, pior ainda, em obscuros compromissos de que muitas vezes a própria oposição não está isenta, em empresas geridas pelo método do "bloco central".
Na verdade, o que se está a passar é que sob a autoridade última do governo socialista, se encontra hoje o mais poderoso grupo da comunicação social existente em Portugal e a acrescer exponencialmente, somando se aos canais da televisão e da rádio pública eles também cada vez mais governamentalizados. Este grupo, que tem aliás todos os tiques de um monopólio de estado, agora possui "conteúdos". A palavra "conteúdos", é um eufemismo enganador, que também tem sido usado com uma displicência inadmissível pelos defensores do "negócio". Esses "conteúdos" são o jornal que nós lemos, a televisão que vemos, a rádio que ouvimos. Antes era jornalismo, agora é um "conteúdo".
Já ninguém é suficientemente ingénuo para pensar que a interferência do governo na comunicação social se faz por telefonemas directos dos ministros, embora ainda os haja. As formas são mais sofisticadas, uma das quais são as "reestruturações" em nome da eficácia dos "negócios" que condicionam carreiras, postos, compromissos e o destino de jornais e rádios. Também aí há alguém a premiar quem se porta bem e quem se porta mal e esse alguém está no governo, ou depende do governo."


A verdade é que na altura, PS, PSD, PP e PCP, e os jornalistas não ligaram nada ao que estava acontecer.

2. As declarações de Fernando Lima na AACS são das mais importantes lá proferidas, porque acrescentaram factos (sobre a sua demissão) e uma interpretação que chama a atenção para um aspecto que tem permanecido obscuro em todo este processo: o papel das empresas de comunicação e relações públicas, constituídas por jornalistas, e que competem entre si pelos negócios que a “central de informação”, muitos ministérios e gabinetes se preparam para fazer (ou já fizeram). É uma área obscura onde promiscuidades de todo o tipo abundam.

3. Os noticiários da TVI com Manuela Moura Guedes são um insuportável comício pessoal, ao melhor estilo do ressentimento de café e do populismo invejoso, a perfeita sobrevivência pública do estilo do PP de Monteiro-Portas, de que a locutora foi (e é?) membro. O mundo é simples: Manuela Moura Guedes é um poço de virtudes, e, a partir de um metro da sua figura, são todos ladrões, crápulas, corruptos e incompetentes.

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APRENDENDO COM PHILIP ROTH

"You fight your superficiality, your shallowness, so as to try to come at people without unreal expectations, without an overload of bias or hope or arrogance, as untanklinke as you can be, sans cannon and machine guns and steel plating half a foot thick; you come at them unmenacingly on your own ten toes instead of tearing up the turf with your caterpillar treads, take them on with an open mind, as equals, man to man, as we used to say, and yet you never fail to get them wrong. You might as well have the brain of a tank. You get them wrong before you meet them, while you're anticipating meeting them; you get them wrong while you're with them; and then you go home to tell somebody else about the meeting and you get them all wrong again. Since the same generally goes for them with you, the whole thing is really a dazzling illusion empty of all perception, an astonishing farce of misperception. And yet what are we to do about this terribly significant business of other people, which gets bled of the significance we think it has and takes on instead a significance that is ludicrous, so ill-equipped are we all to envision one another's interior workings and invisible aims? Is everyone to go off and lock the door and sit secluded like the lonely writers do, in a soundproof cell, summoning people out of words and then proposing that these word people are closer to the real thing than the real people that we mangle with our ignorance every day? The fact remains that getting people right is not what living is all about anyway. It's getting them wrong that is living, getting them wrong and wrong and wrong and then, on careful reconsideration, getting them wrong again. That's how we know we're alive: we're wrong. Maybe the best thing would be to forget being right or wrong about people and just go along for the ride.
But if you can do that - well, lucky you.
"

(Philip Roth, American Pastoral)

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COISAS SIMPLES


William Gillies

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EARLY MORNING BLOGS 352

)when what hugs stopping earth than silent is... (16)


)when what hugs stopping earth than silent is
more silent than more than much more is or
total sun oceaning than any this
tear jumping from each most least eye of star

and without was if minus and shall be
immeasurable happenless unnow
shuts more than open could that every tree
or than all life more death begins to grow

end's ending then these dolls of joy and grief
these recent memories of future dream
these perhaps who have lost their shadows if
which did not do the losing spectres mime

until out of merely not nothing comes
only one snowflake(and we speak our names


(e.e. cummings)

*

Bom dia!

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2.11.04


DO DIÁRIO DE NOTÍCIAS PARA OS BLOGUES

José António Barreiros iniciou hoje A Revolta das Palavras.

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O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: QUANDO NÓS SOMOS OS OUTROS 3

"A propósito das entradas recentes "Quando nós somos os outros", é curioso observar como os discursos orientalistas se constituiram tantas vezes como uma espécie de galeria de espelhos, onde, munidos de toda a espécie de essencializações culturais, procuramos e encontramos imagens distorcidas de nós próprios e dos "outros". E os "outros", por seu turno, fazem o mesmo... O orientalista - e o ocidentalista - um eterno Narciso ? Ou estaremos antes perante um encontro de Narcisos? Discutível, sem dúvida, mas Ernest Fenollosa parece não ter tido grandes dúvidas quando, em 1892, escreveu os versos:


Let us forget like a chanted tune
Shadowy types of the dying races.
History nods to her ancient rune.
Ages lapse with their tidal traces,
Blend in the vision of future faces.

Fold like the wing of a new-born creature,
East and West in a Janus trance!
Tear off the mask of the twofold feature;
Kiss in the mirror with eyes askance,
Love, Narcissus, thine own sweet glance.



Ernest Fenollosa, East and West (Upper Saddle River, N.J.: Literature House, 1970)"

(Daniela Kato)

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PORQUE É QUE O DIÁRIO DE NOTÍCIAS TEM UM PROBLEMA DE CREDIBILIDADE?

Por coisas como estas. Acabou esta semana de colaborar no jornal José António Barreiros escrevendo isto:
"Circunstâncias de alinhamento gráfico fazem com que eu compartilhe esta página com dois membros da Administração deste jornal.

Ambos convergiram numa decisão: afastar o director. Um deles anunciou-o ao País através de uma televisão, da qual é comentador.

Entretanto, uma senhora que, afinal, eles já haviam convidado para ser a próxima directora, veio publicamente dizer que não existiam condições para fazer deste jornal um diário «de referência, isenção e aceitação pública. Chegadas as coisas a este ponto, compreendam os leitores que eu saia deste lugar.

É patente o que está actualmente em causa na comunicação social portuguesa: o domínio dos media pelo grande capital, a entente cordiale entre esse grande capital e o actual Governo.»

Desapareceu Barreiros, apareceu José Francisco Gandarez, que uma pesquisa no Google revela ser “advogado” da “Rui Gomes da Silva e Associados – Sociedade de Advogados”, e cujos artigos, de pura propaganda do governo, nenhum jornal que se tomasse a sério aceitaria. Não é pelo conteúdo - é perfeitamente legítimo ser a favor do governo; é por não terem qualquer qualidade como artigos de opinião e serem apenas propaganda. Completamente ineficaz, diga-se de passagem.

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PARA QUE FIQUE CLARO

Se fosse americano, votaria Bush. Fica dito, até porque é muito possível que ganhe Kerry. Não vale a pena somar muitas explicações ao que tenho vindo a dizer nos últimos anos. Kerry trará confusão e hesitação numa política de guerra que não sobrevive sem determinação. No dia seguinte, os assassinos da Al Qaida e do Baas começarão a retirar as lições e a jogar tudo por tudo no terror. Bush trará excessos e erros, como no passado, mas manterá o rumo numa política que é a única que hoje defronta o terrorismo apocalíptico na sua essência.

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COISAS COMPLICADAS: S. JORGE COMBATENDO O DRAGÃO


Albrecht Altdorfer

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O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: QUANDO NÓS SOMOS OS OUTROS 2

"Nós e os outros:
CHAPITRE XIV- De certaines choses diverses et extraordinaires qu'on ne peut réduire aux chapitres précédents.

1. Nous tenons la pierre à feu dans la main gauche et la frappons pour allumer de la main droite; eux font le contraire.
2. Nous montrons notre émotion devant la perte de nos biens ou l'incendie de notre maison; les Japonais semblent considérer tout cela avec beaucoup de légèreté.
13. Chez nous, hommes, femmes et enfants ont peur de la nuit; au Japon, au contraire, ni les grands ni les petits n'en ont la moindre crainte.
21. Nous mettons l'honneur dans les substantifs; les Japonais dans les verbes.
27. Pour nous, offrir plusieurs choses est un signe d'affection; au Japon, moins elles sont nombreuses, plus l'hommage est grand.
56. Par amitié, en Europe, nous offrons un bouquet de roses; les Japonais offrent seulement une rose ou um oeillet
58. Nous succombons souvent à la colère et ne dominons que rarement notre impatience; eux, de manière étrange, restent toujours en cela très modérés et réservés.
Traité de Luís Fróis, S.J. (1585) sur les contradictions de moeurs entre Européens et Japonais, Paris, Éditions Chandeigne, 1994, p.111"


(Ana da Palma)

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A LER

Muito atentamente este artigo, porque o problema que Sarsfield Cabral levanta, o da “cartelização” do PSD, é nos nossos dias bem mais importante do que a pulsão psicótica pela popularidade, que lhe serve apenas de instrumento. Não é por acaso que Marcelo lembrou, há dias, o seu artigo antigo contra os partidos-cartel, publicado no Expresso. Aparentemente foi um estranho artigo para ser escrito por um dirigente partidário, mas cujas circunstâncias conheço bem, bem demais. Quando foi escrito, Marcelo sabia o tipo de pressões de dentro e de fora que estavam a ser feitas sobre o PSD, e as dificuldades que encontrou, numa altura em que o “mundo dos negócios” (um eufemismo) namorava Guterres e não admitia que, na oposição a este, fossem contestadas as suas amizades e acordos com o poder socialista. Como os “negócios” são pela sua natureza do “bloco central”, eles admitem tudo no plano da política, todas as alternâncias, menos a ruptura dos interesses instalados.

É também porque altos interesses se levantam e encontram fácil caminho na acefalia populista, que há uma enorme radicalização contra os opositores do actual governo, antes de tudo no PSD porque, como se vê, o PS aqui não faz oposição. Marcelo pagou o preço com a expulsão da TVI. Outros pagarão se falarem, porque vale tudo neste jogo, bem mais perigoso e a sério que tudo o resto. A comunicação social terá nesse jogo um papel central, daí as grandes manobras posicionais.

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EARLY MORNING BLOGS 351

Tattoo


The light is like a spider.
It crawls over the water.
It crawls over the edges of the snow.
It crawls under your eyelids
And spreads its webs there--
Its two webs.

The webs of your eyes
Are fastened
To the flesh and bones of you
As to rafters or grass.

There are filaments of your eyes
On the surface of the water
And in the edges of the snow.


(Wallace Stevens)

*

Bom dia!

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VER O DIA

Onde é que está o dia? Uma muralha de cinzento à minha frente, entrecortada por um loureiro, com a dignidade que têm os loureiros, em que cada folha brilha da humidade.

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1.11.04


COISAS SIMPLES


Mário Augusto

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APRENDENDO SOBRE A MENTIRA NUM POEMA DE PEG BOYERS

(O poema é longo, tirado do livro Hard Bread, e a voz ficcional é a de Natalia Ginzburg, a escritora italiana morta em 1991.)

Coat

At eleven I learned to lie.
Disobedience and its partner,
deception, became my constant companions.

How enormous then that first transgression,
against Father's command, a sin damning as Adam's:
walking to school alone.

We all lied, mother explained,
it was. . .necessario.
How else to survive

Father's rages,
his sweeping interdicts
and condemning opinions?

Oh sweet allegiance of lies:
siblings and mother bound
together in a cozy tie!

My brothers' lies
were manly,
obdurate, built to last.

Mother's were infirm little things,
infected from birth by her obstinate grace,
fated to die as soon as they hit the air.

But this lie, the lie about me, was sturdy,
knit, as it was, from the fiber of maternal love
and a wife's defiance.

Go ahead; it's right.
Walk alone. Grow up.
Each assurance a coercion, each coercion a shame.

The lie was a coat of mail
I'd don each day, threading my arms
through its leaden sleeves,

pulling its weight over my head,
steeling myself
for my father's wrath.

In it I was strong and getting stronger,
but tired, always tired.
Oh to rest, shuck the lie and confess!

Father forgive me, I knew not what I did!
At night I'd rehearse the lines
and pray for his cleansing fury.

In the morning I'd meet him in the hall,
already crabby in his gray lab coat,
barking his harsh observations

about my robe (pink: ridiculous)
about my face (vacant)
about my voice (inaudible).

Mother, how did we produce such an insect!

I was used to this.

Exasperated, he would stuff his red frizz into a beret,
hurl himself into his loden cape
and bolt out the gate--too rushed for truths.

Silenced again, I would resume my solitary mission,
lugging my books, wearing my lie to school
and back again, through the maze of city streets.

One day the mist briefly lifted and I saw
the winter sun pulsing silver and pale
through a hole in the sky--a quiet disk

hopeful as the moon.
A face emerged, white whiskers smiling,
familiar, professorial--an angel perhaps,

or a friend of the family--
here to guide me safely
across the river to school.

He took my bag and my arm,
allaying my fears with talk
calculated to soothe, flatter, amuse.

Gentile, cosí gentile.
Ever faithful, he met me at my gate
morning after sweet morning.

We chatted carelessly the whole way,
intimate as lovers,
never a snag

or worry to hold us up--
I, grateful and happy,
he gently leading the way.

My trust deepened daily with his purpose
and burrowed
in the snug darkness of short days

where the new lie took root.
From deep in the loam, the probing
stem pushed to the surface.

Meanwhile, the first lie grew light with practice.
And my coat assumed
the comfort of a uniform.

His purpose, obscured from the start by fear,
suppressed tenaciously
by innocence--canny innocence--

flared up in a question,
betraying an ignorance
both clear and obscene:

"Little Girl, would you touch me--here?"

Suddenly my hand, sweetly warming
in his flannel pocket, was pushed
to the hard, oozing center.

My hand recoiled.
But the ooze stuck.
In that minute my childhood ended.

I ran home as fast as my legs would carry me
to hide my shame in the place
where secrets were made and kept,

willful little liar, disobedient
sinner trying to find my way alone
through fog, through lies.

My life was filling up with secrets
and deceit's secretions,
loneliness and melancholy.

I hugged my coat tight against my body
so that the lies and I were one.

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O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: QUANDO NÓS SOMOS OS OUTROS

"Em Londres , Encounters: The meeting of Asia and Europe, 1500-1800, no Victoria & Albert Museum até 5 de Dezembro

O link é este.

No International Herald Tribune de 30-31 Outubro pode ler-se, a propósito desta exposição:

" In the Far East, the search for exoticism took an outright turn toward the burlesque. In her essay "Visual Responses:Depicting Europeans in East Asia", Jackson quotes some lines written in 1639 by an anonymous Japanese wag:

A southern Barbarian trading vessel came to our shores. From this ship emerged an unnamable creature, somewhat similar in shape to a human creature but looking more like a long-nosed goblin

Japanese artists transcribed with alacrity this vision of long-nosed goblins. On a 17th century lacquer box, beaming Portuguese men with enormous noses and exaggeratedly baggy trousers smile vaguely , like clowns in a pantomine.
"

(João Costa)

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SOBRE O PORTO - REPETIÇÕES

O Porto é a minha cidade "moral". Nem eu sei bem o que isso é, mas sei que é. Para complementar a "geografia", aqui ficam dois textos antigos sobre o Porto:

"O Porto não é a cidade dos anjos, nem a cidade da luz, nem a cidade branca. É feito de uma pedra onde todas as partes brilham - e no entanto é escura, sólida, tensa, pesada.

É feito de mica que é um pequeno espelho mineral, de quartzo que pode ser absolutamente transparente, ou de feldspato, de cor sedosa, vagamente rosa. Mas, a pedra do Porto, feita de tanta luz, é escura e a cidade é assim uma cidade do Norte, iluminada por essa luz que ninguém melhor do que os pintores dinamarqueses de Skagen conheciam. É na Foz do Douro que esta luz começa e depois sobe pelas colinas cobertas de casas, pelas ruelas, até onde termina a cidade novecentista, as avenidas que a transportam até uma periferia de onde partiam as "estradas". Para Amarante, para Guimarães, para Braga, para Entre-os-Rios, para um interior que está profundamente ligado com a cidade cujo nome diz que nunca ninguém a venceu.

O olhar do Porto é por isso um olhar grave como o granito. É um olhar que já vem de muito longe e foi sempre o mesmo. É um olhar burguês, dos que vivem e trabalham no burgo e que na cidade encontram um refúgio e as liberdades. As liberdades e não a democracia, porque o Porto é mais liberal do que democrata.

Este olhar burguês é contrário à dissipação, ao desperdício. É também por isso que no Porto nem os yuppies, nem as rapariguinhas do shopping esconderam as centenas de milhares de vidas de trabalho antigas que estão pregadas em todas as fachadas da cidade. Vidas de estivadores, de caldeireiros, de tipógrafos, de tabaqueiros, de carvoeiros, de comerciantes, de carrejonas, de merceeiros e marçanos, de alfaiates, de cobradores, de ourives, de criadas de servir, de taberneiros, de talhantes, de armazenistas. São estas vidas que fizeram o Porto e que olham por dentro do olhar das pessoas do Porto."


*

"O Porto fez-me gostar de uma qualidade sem grandes elogios nos dias de hoje e também sem grande reconhecimento social, por muita retórica que à sua volta se ouça, a integridade. Muita da vida pública portuguesa não seria o que é se houvesse um pouco mais de reconhecimento social da integridade. Se os íntegros não parecessem personalidades obstinadas, com mau feitio, “pouco maleáveis”, como agora se diz.

O Porto fez-me gostar das pessoas simples, integras, ainda não tocadas pela inutilidade das palavras, ainda não ecléticas, ainda não dominadas pelo amor-próprio destrutivo, ainda não obcecadas pelas suas virtudes e pela sua facilidade, ainda não acumulando superfícies como quem acha que a vida é um longo espelho, ainda não distraídas, ainda não impacientes, ainda querendo mais alguma coisa com uma tenacidade de absoluta dedicação. Como o Porto é feito de granito em vez de calcário, selecciona a dureza, a persistência, o trabalho, as boas contas, as “contas à moda do Porto”.

Nunca mostrei a minha cidade, mostrar de mostrar, a quem eu não ache integro."


*

"Diz Alexandre Dumas que "quando se mostra a um amigo uma cidade já conhecida, põe-se nisso a mesma presunção que se usa para mostrar uma mulher de quem se foi amante."

Mas foi por partilhar consigo essa cidade “moral” e não por ociosa prova de erudição – que não tenho! – a espontaneidade do comentário. Talvez a inflexibilidade do granito, que ao Porto enobrece frontarias, tenha limitado o inchar dos egos balofos e que de si próprios, ou de quem lhes é útil, se alimentam. E depois, quem sabe, talvez o brilho da mica que reluz na mancha cinzenta granítica seja o reduto da autenticidade a fazer mais que diferença."

(Tati)

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A MINHA GEOGRAFIA


(Original em Avenida dos Aliados)

Vista do céu, a minha mais próxima geografia (vê-se mal, mas eu vejo-a totalmente, pouco importa, estão lá as casas e os sítios):

Biblioteca Pública Municipal do Porto em S. Lázaro, o segundo sítio onde me fiz.

Largo do Padrão e café do Padrão, onde me preparava para ir para a Biblioteca.

Jardim de S. Lázaro, um jardim romântico único, com as suas grades fechadas, as estátuas e as grandes árvores.

Café S. Lázaro.

Escola Superior de Belas-Artes.

A casa do Eugénio no andar de cima, a da Rosa no andar de baixo.

Nos limites da fotografia, o Campo 24 de Agosto, o Liceu Alexandre Herculano, a sede da PIDE no Porto, as Fontaínhas, o lugar do antigo edíficio da fábrica de tabacos, a Rua Santos Pousada, a loja do alfarrabista Marinho, a minha casa.

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AR PURO


N. Astrup

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EARLY MORNING BLOGS 350

And You Thought You Were the Only One


Someone waits at my door. Because he is
dead he has time but I have my secrets--

this is what separates us from the dead.
See, I could order take-out or climb down

the fire escape, so it's not as though he
is keeping me from anything I need.

While this may sound like something I made up,
it is not; I have forgotten how to

lie, despite all my capable teachers.
Lies are, in this way, I think, like music

and all is the same without them as with.
The fluid sky retains regret, then bursts.

He is still there, standing in the hall, insisting
he is someone I once knew and wanted,

come laden with gifts he cannot return.
If I open the door he'll flash and fade

like heat lightning behind a bank of clouds
one summer night at the edge of the world.


(Mark Bibbins)

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O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES; O SERVIÇO PÚBLICO VISTO DO REINO UNIDO

"(...) No Reino Unido, o serviço público está a sofrer uma revisão. Ao longo deste ano, a agência das comunicações OFCOM realiza vários processos de consulta com académicos, a indústria, os profissionais, organizações várias e, muito importante, o público. Estive na semana passada numa dessas sessões, divulgadas e abertas a qualquer um, onde todos são encorajados a colocar questões, enviar pareceres e fazer com que os seus interesses sejam ouvidos. A prova de que o serviço público funciona e satisfaz foi expressa pela maioria da população britânica inquirida pela OFCOM, que revelou estar disposta a pagar o mesmo ou um pouco mais para manter a BBC e outras derivações de serviço público (a presente taxa de rádio e televisão custa cerca de 170 euros por ano e é obrigatória).

Na mesma sessão, um senhor que tinha garantidamente mais de oitenta anos – “eu lembro-me de ouvir a minha primeira emissão de rádio da BBC, em 1924” – fez ouvir a sua voz. O facto de o serviço público ter uma história longa e respeitada por aqui, faz com que os britânicos tenham um sentimento de pertença relativamente aos destinos dos seus espaços mediados de comunicação.

No ano passado, a BBC Scotland fez uma revisão da sua grelha informativa. Para isso, o director da estação regional passou dois meses a viajar pelo país para melhor sondar as necessidades informativas do escoceses. Isso implicou passar pelos sítios mais remotos – as ilhas do norte, as highlands, as comunidades urbanas e rurais – e promover debates locais. Isto é serviço público. Não é complicado, nem elitista, nem pretencioso. É apenas o garante de um espaço que se procura aproximar de um nível equilibrado e representativo do debate público, onde a audiência não é reduzida ao lugar de consumidor mas também tratada como um centro de cidadania. O espaço audiovisual português deteriorou-se a uma velocidade galopamente. Os governos que recusam conduzir um debate sério sobre o assunto estão a negar aos portugueses o seu desenvolvimento democrático."


(Claudia Monteiro)

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WILLIAM HAMILTON E DUGALD STEWART VISTOS POR WILLIAM JAMES

(Ambos citados no poema de Edgar Lee Masters da Spoon River Anthology de hoje de manhã. James começa assim as conferências que deram origem à The Varieties Of Religious Experience - A Study In Human Nature :)

"IT is with no small amount of trepidation that I take my place behind this desk, and face this learned audience. To us Americans, the experience of receiving instruction from the living voice, as well as from the books, of European scholars, is very familiar. At my own University of Harvard, not a winter passes without its harvest, large or small, of lectures from Scottish, English, French, or German representatives of the science or literature of their respective countries whom we have either induced to cross the ocean to address us, or captured on the wing as they were visiting our land. It seems the natural thing for us to listen whilst the Europeans talk. The contrary habit, of talking whilst the Europeans listen, we have not yet acquired; and in him who first makes the adventure it begets a certain sense of apology being due for so presumptuous an act. Particularly must this be the case on a soil as sacred to the American imagination as that of Edinburgh. The glories of the philosophic chair of this university were deeply impressed on my imagination in boyhood. Professor Fraser's Essays in Philosophy, then just published, was the first philosophic book I ever looked into, and I well remember the awe-struck feeling I received from the account of Sir William Hamilton's class-room therein contained. Hamilton's own lectures were the first philosophic writings I ever forced myself to study, and after that I was immersed in Dugald Stewart and Thomas Brown. Such juvenile emotions of reverence never get outgrown; and I confess that to find my humble self promoted from my native wilderness to be actually for the time an official here, and transmuted into a colleague of these illustrious names, carries with it a sense of dreamland quite as much as of reality."

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DIA DOS MORTOS / SCRITTI VENETI

Na ilha de San Michele há um pequeno convento franciscano. É uma obra histórica da arquitectura renascentista, com a primeira fachada neo-clássica, um edifício belíssimo, com a porta voltada para a laguna, com as ondas a tocarem os degraus num embarcadouro de mármore. Ao lado uma lápide lembra outro habitante dos Piombi, Sílvio Pellico , o das “minhas prisões”. Um dos habitantes do convento, Fra Luciano Neri, viveu toda a sua vida no cemitério, tornou-se “il frate del cimiterio”. Uma humilde brochura que não deve existir em nenhum sítio senão aqui, pousada a um canto da igreja com uma caixa de esmolas ao lado, lembra-o, num testemunho de uma vida entre os mortos por dedicação aos vivos. Na capa, uma fotografia de um velho com um sorriso bondoso mas relutante, com uma reserva que se pode reconhecer na sua mais antiga fotografia, um jovem frade diante da Madonnina dell”orto. Um dos capítulos fala da “sapenza della semplicitá”, noutro, o cardeal patriarca escreve: “Nel paradiso possa continuar ela sua opera, che era grande dono per chi cercava uno sprazzo di speranza.” A sua campa está lá, a foto a esmalte e um rosário, e as datas dos seus quase noventa anos de vida (1909-1998).

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31.10.04


APRENDENDO COM JOHN MUIR SOBRE O VENTO NAS FOLHAS


(John Muir citado no poema da Spoon River Anthology)

"A few minutes ago every tree was excited, bowing to the roaring storm, waving, swirling, tossing their branches in glorious enthusiasm like worship. But though to the outer ear these trees are now silent, their songs never cease. Every hidden cell is throbbing with music and life, every fiber thrilling like harp strings, while incense is ever flowing from the balsam bells and leaves. No wonder the hills and groves were God's first temples, and the more they are cut down and hewn into cathedrals and churches, the farther off and dimmer seems the Lord himself."

(Em breve mais sobre Muir.)

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COLOCAR FACES NOS POEMAS


Este é Galba, do poema matinal de Cavafy, o dos setenta e três anos, de que o oráculo falava. Nero entendeu mal a frase délfica e pensou apenas na sua velhice longínqua. Não. Havia outro, já velho, que o veio a ajudar a suicidar-se. Era um velho duro e imprudente, mas chegou a imperador. Prometeu o que não podia dar e acabou esquartejado pelas tropas. Um soldado da 15ª Legião acabou com ele com um golpe final no pescoço. Um tal Fabius Fabulus cortou-lhe a cabeça, mas teve que a colocar no seu saiote porque Galba era calvo e não havia cabelo para a segurar com as mãos. Pequeno detalhe de um tempo em que transportar uma cabeça ainda era habitual.

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COISAS SIMPLES


Albert Anker

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EARLY MORNING BLOGS 349

indecisos. Entre este poema da Spoon River Anthology

IMMANUEL EHRENHARDT

I began with Sir William Hamilton's lectures.
Then studied Dugald Stewart;
And then John Locke on the Understanding,
And then Descartes, Fichte and Schelling,
Kant and then Schopenhauer --
Books I borrowed from old Judge Somers.
All read with rapturous industry
Hoping it was reserved to me
To grasp the tail of the ultimate secret,
And drag it out of its hole.
My soul flew up ten thousand miles
And only the moon looked a little bigger.
Then I fell back, how glad of the earth!
All through the soul of William Jones
Who showed me a letter of John Muir.


(Edgar Lee Masters)

e este de Cavafy

O PRAZO DE NERO

Não se inquietou Nero quando ouviu
a profecia do Oráculo de Delfos.
"Teme os setenta e três anos."
Tinha tempo ainda para gozar.
Tem trinta anos. Mais do que suficiente
é o prazo que o deus lhe dá
para cuidar dos perigos futuros.

Agora voltará a Roma um pouco cansado,
mas maravilhosamente cansado desta viagem,
que era toda dias de gozo –
nos teatros, nos jardins, nas palestras...
Tardes das cidades da Acaia...
Ah sobretudo o prazer dos corpos nus...

Isto Nero. E na Espanha Galba
furtivamente articula e exercita suas tropas,
o velho de setenta e três anos.


traduzido por R. M. Sulis, M. P. V. Jolkesky, e A. T. Nicolacópulos.

Uma boa solução para o indeciso é ficarem os dois e, durante o dia, aproveitando a hora roubada ao Tempo, deles falarei.

*

Bom dia, com a hora roubada!

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INTENDÊNCIA

Actualizada a nota PATETICES EM QUE SE GASTA O NOSSO DINHEIRO: DIÁRIO DA REPÚBLICA VERDE

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© José Pacheco Pereira
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