ABRUPTO

12.1.08


NUNCA É TARDE PARA APRENDER: MABRUK AL-IRAQ AL-JEDEED

Rajiv Chandrasekaran, Imperial Life in the Emerald City: Inside Iraq's Green Zone, 2006.

Nos EUA as universidades, os centros de investigação, as editoras, não tem nenhum problema em encomendar um livro a um jornalista que teve uma experiência excepcional, viver na "Green Zone" de Bagdad. Chandrasekaran trabalhava no Washington Post e nunca tinha escrito um livro, mas viveu em Bagdad o tempo bastante para nos dar um relato único sobre os anos da Coalition Provisional Authority, o governo de facto do Iraque dirigido por Paul Bremer, que só compartilhava o poder, também de facto, com o ayatollah Sistani e os revoltosos sunitas. É uma história que ainda precisa de mais tempo para assentar, mas que Chandrasekaran descreve como sendo o resultado de um misto de total ingenuidade, convicção, dedicação, coragem pessoal, da equipa da CPA, associada a uma grande ignorância sobre o Médio Oriente, o Iraque, e, muitas vezes, falta absoluta de bom senso, erros e oportunidades perdidas. O melhor e o pior da democracia americana estão aqui retratados, na mistura entre o esforço genuíno de querer fazer uma democracia jeffersoniana no Iraque e o absoluto irrealismo de muitas propostas.

Um exemplo é a história da elaboração do "código da estrada" iraquiano, copiado das regras de trânsito de um estado americano, escrito para acabar com os regulamentos locais que tornavam a polícia prepotente e corrupta, com possibilidades de prisão imediata e de receber multas em acto, sem qualquer procedimento legal. (Recordo-me de ver no Iraque a polícia a regular o trânsito aos pontapés aos carros...) O bom do americano queria introduzir regras que protegessem os cidadãos dos abusos da polícia, criando tribunais de trânsito, regras burocráticas de procedimento seguro, no meio de uma Bagdad a ferro e fogo, em que o sistema judicial colapsara e em que a polícia recém criada tinha certamente muito mais coisas para fazer do que estar a preencher formulários no meio do caos. Idêntica mistura de idealismo e irrealismo ocorreram em áreas como a da bolsa (sim, existe bolsa em Bagdad e funciona na base de notas manuscritas, quadros negros e giz), da privatização das empresas do estado, do sistema financeiro, etc., etc.



A isto se somava o desespero para fazer funcionar os serviços essenciais, em particular o fornecimento da electricidade (aqui há um retrato desses esforços), no meio de uma situação calamitosa gerada pela degradação dos últimos anos de Saddam, os estragos das várias guerras e por fim, dos saques. Os homens (e algumas mulheres, poucas) que trabalhavam para a CPA tinham o know how necessário, muita experiência não só nos EUA como na reconstrução de países em crise ou em situações pós-calamidade, no Kosovo, na zona curda do Iraque, mas defrontavam-se com uma tarefa impossível no meio do caos, da insegurança, com pouca gente a falar árabe e sem escoltas militares suficientes. A isso se somavam problemas políticos por resolver que tinham implicações nos serviços essenciais, como saber se a distribuição da escassa electricidade deveria privilegiar Bagdad, distribuir-se por todo país, ou ser resolvida província a província, com prioridade ao sul .

A descrição da "Green Zone" e dos seus habitantes trabalhando para a CPA, para a Halliburton e para as empresas de segurança, mostra-nos a estranha vida numa redoma, inconfortável, com poucos luxos e muitas privações, vivendo em contentores ou camaratas nos antigos palácios de Saddam, comendo fast food em cantinas ou nos dois ou três restaurantes, um chinês, uma pizzaria, que tinham ficado dentro do perímetro de segurança. Os seus habitantes eram especialistas, muitos dos quais voluntários, gente que abandonou o conforto americano, lugares na universidade, nas empresas, para fazerem aquilo que muitos pensavam ser uma utopia de engenharia política a favor do bem: um Iraque democrático, com livre mercado e prosperidade. Quando se verificam os seus curricula vê-se a importância das forças armadas na sociedade americana, onde muitos dos universitários, dos chefes de bombeiros, dos policias reformados, dos empresários, mesmo dos burocratas, que vieram para o Iraque tinham sido marines, pilotos, soldados e oficiais. Havia também gente nova, recrutada entre os apoiantes do Partido Republicano nas campanhas eleitorais, que davam o tom esmagadoramente republicano, conservador e liberal à CPA.

Ver entrevista de Chandrasekaran.

Hoje, anos depois do fim da CPA e da entrega de muitas responsabilidades governativas aos iraquianos, o legado da CPA a favor de um Iraque democrático, unido, laico, e com um mercado livre e aberto, está muito enfraquecido, mas não desapareceu. As eleições iraquianas foram um sucesso, muito do impulso para o entendimento entre grupos, tecido no texto constitucional, permanecerá. Muitas das pretensões de grandes reformas ideais ficaram no papel, e em muitos acasos significaram desvios a tarefas muito mais urgentes e a práticas mais realistas que dariam melhores resultados. Mas a perplexidade desta história permanece: o que é que se esperava que os americanos fizessem? Que mantivessem o Iraque pós-Saddam com as suas práticas de brutalidade e corrupção intactas? Que entregassem o poder aos religiosos xiitas radicais como Muqtada al-Sadr ou aos exilados que trouxeram no bolso?

Há quem dê uma resposta: não invadissem. Mas isso é toda uma outra história a que voltaremos.

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EARLY MORNING BLOGS


1200

Monsieur vient sans doute attendre la malle-poste de Paris? lui dit le maître d'une auberge où il s'arrêta pour déjeuner.

- Celle d'aujourd'hui ou celle de demain, peu m'importe, dit Julien.

La malle-poste arriva comme il faisait l'indifférent. Il y avait deux places libres.

- Quoi! c'est toi, mon pauvre Falcoz, dit le voyageur qui arrivait du côté de Genève à celui qui montait en voiture en même temps que Julien.

- Je te croyais établi aux environs de Lyon, dit Falcoz, dans une délicieuse vallée près du Rhône.

- Joliment établi. Je fuis.

- Comment! tu fuis? toi, Saint-Giraud! avec cette mine sage, tu as commis quelque crime? dit Falcoz en riant.

- Ma foi, autant vaudrait. Je fuis l'abominable vie que l'on mène en province. J'aime la fraîcheur des bois et la tranquillité champêtre, comme tu sais; tu m'as souvent accusé d'être romanesque. Je ne voulais de la vie entendre parler politique, et la politique me chasse.

- Mais de quel parti es-tu?

- D'aucun, et c'est ce qui me perd. Voici toute ma politique: J'aime la musique, la peinture; un bon livre est un événement pour moi; je vais avoir quarante-quatre ans. Que me reste-t-il à vivre? Quinze, vingt, trente ans tout au plus? Eh bien! je tiens que dans trente ans, les ministres seront un peu plus adroits, mais tout aussi honnêtes gens que ceux d'aujourd'hui. L'histoire d'Angleterre me sert de miroir pour notre avenir. Toujours il se trouvera un roi qui voudra augmenter sa prérogative; toujours l'ambition de devenir député, la gloire et les centaines de mille francs gagnés par Mirabeau empêcheront de dormir les gens riches de la province: ils appelleront cela être libéral et aimer le peuple. Toujours l'envie de devenir pair ou gentilhomme de la chambre galopera les ultras. Sur le vaisseau de l'Etat, tout le monde voudra s'occuper de la manoeuvre, car elle est bien payée. N'y aura-t-il donc jamais une pauvre petite place pour le simple passager?

(Stendhal, Rouge et le Noir)

*

Bom dia!

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11.1.08


LENDO
VENDO
OUVINDO

ÁTOMOS E BITS

de 11 de Janeiro de 2008


Mais uma história estranha que não pode ficar sem esclarecimento: no Expresso da Meia Noite na SICN, que está a ser emitido, vários dos especialistas e engenheiros que contestaram a Ota, e deram a cara a críticas duras à decisão governamental, disseram preto no branco que sofreram retaliações na sua actividade profissional por causa destas tomadas de posição. E insistiram de novo que vários dos financiadores do estudo da CIP tinham "fundadas razões para temerem retaliações". Foi pena que os jornalistas não tivessem ido mais longe para esclarecer o assunto, no fundo, para a nossa democracia, bem mais importante do que fazer um aeroporto.

*

Se houvesse em Portugal uma cultura de rigor cívico, as declarações do actual Presidente da UE, o esloveno Janez Jansa (reproduzidas no Diário Económico de 10 de Janeiro), que diz que "já sabíamos disso [que Sócrates não ia fazer o referendo] há muito tempo", levantariam um clamor para que se soubesse quem diz verdade. Cá, nada. Mas há mais: a versão actual dada pelo gabinete do Primeiro-ministro sobre os célebres telefonemas Merkel-Sarkozy-Brown, é que estes tinham como objectivo informar Sócrates de "como iriam ratificar o Tratado de Lisboa nos seus países", que, como é óbvio, nem ele, nem ninguém sabia.

Toda a gente acha normal ser enganada.

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MOMENTOS EM TEMPO REAL: EXTERIORES

Hoje.
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(Susan Sontag, On Photography)



Fim do dia no Algarve (Praia da Marinha – Lagoa, Algarve). (José Nascimento)

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COISAS DA SÁBADO: HÁ QUEM GOSTE



de ter pousado na sua televisão o senhor Primeiro-ministro, de ter em cima do seu livro de cheques os gestores modelo do PS, de sentar à mesa vários tutores do seu comportamento, de ser codificado, normalizado, legislado, registado, filmado, gravado, “numerificado” como único, estandardizado, policiado pelas várias polícias de costumes, controlado em todos os seus actos, e ainda por cima ficar imensamente agradecido ao Estado, ao Governo, à Racionalidade da República e à Polícia do Pensamento Politicamente Correcto. Há quem goste. Eu não, porque sou antiquado, li umas coisas e tenho boa memória.

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O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
A SAGA AEROPORTUÁRIA DOS TEMPOS MODERNOS


Talvez tenha interesse em notar esta diferença de tratamento jornalístico de uma mesma fonte. Lendo e ouvindo e vendo na net...

site da RTP

Associação ambientalista Quercus viabiliza Alcochete

A associação ambientalista Quercus dá, para já, o seu aval à construção do novo aeroporto de Lisboa em Alcochete. Francisco Ferreira considera mesmo a localização escolhida "bastante viável".

(ver o vídeo para perceber o tom geral e as reservas)

Site da TSF

Quercus admite apresentar queixa em Bruxelas

A Quercus ameaça apresentar uma queixa no Ministério Público e em Bruxelas contra a decisão do Governo de construir o novo aeroporto em Alcochete, e não na Ota como estava previsto inicialmente. A associação ambiental argumenta que o novo projecto ainda não tem um estudo de impacto ambiental.

Francisco Ferreira, da Quercus, não percebe como é que o Governo anuncia uma decisão destas sem saber se estão salvaguardadas todas as implicações governamentais.

Cheguei a pensar que houvesse problema de dupla personalidade... não é que ele diga coisas diferentes parecem é ser ouvidas e trabalhadas de forma diferente

(JMB)

*

Já desapareceu a referência “oficial” à OTA no banner da página da NAER, com um dia, aliás, com oito anos, de atraso.

(Rui Esperança)

*

Não passa tudo de uma má pronúncia de língua francesa. Afinal o que o Ministro disse deve ter sido:

- Um Aeroporto na Margem Sul? J'aimais...

Se calhar, lembrou-se da música do Jacques Brel com o mesmo título, que termina:

Les fleuves profonds m'appelant au lit
Tu vois je vous oubliais déjà

Será que os "rios profundos" são os aquíferos de Alcochete? E quem foi esquecida? A Ota?

(PM)

*

Uma, (entre muitas outras) coisa que me surpreende de cada vez que se fala no novo aeroporto de Lisboa, é a total falta de consideração pelos funcionários e respectivas famílias. Deslocar o local de trabalho de quase 20.000 pessoas, afectando por isso umas 50.000 ou 60.000 (cônjuges e filhos, outros empregos e escolas) não merece atenção a quem faz os estudos? E a quem faz as notícias? Que impacto tem a nova localização do aeroporto na vida destas pessoas?

(Samuel Freire)

*

Está dado o mote: Entrevistas a pessoas chorosas por terem de andar mais quilómetros, por terem de mudar dos subúrbios (cheios de qualidade de vida) a norte de Lisboa para um subúrbio ao sul desta cidade. Nesta perspectiva, nada muda porque ninguem se quer mudar. O trabalho tem vir que ao nosso encontro, não se vai ao encontro do trablho.

(Monika Kietzmann Lopes)

*

O que me preocupa é que a questão da necessidade de um novo aeroporto já nem se coloca. Andamos todos entretidos com a localização, mas já nos "venderam" a ideia de que um novo aeroporto é essencial.

Por outro lado, já nos esquecemos da questão do tratado constitucional europeu!

Esta questão da Ota é mais um exemplo de péssimos gastos do nosso dinheiro, pelos que, entre nós, têm a responsabilidade de o gastar bem: O Novo estádio de Aveiro foi encerrado pela Liga de Clubes por ser impossível nele jogar futebol, dado o estado do relvado...Beira Mar tem que jogar em Águeda...Por mim, devia nem jogar!

Gastaram milhões a construir um campo de futebol que não serve para o efeito. Não existe dinheiro para o manter, pelo que está degradado...é que a manutenção custa milhões de euros por ano à CMA, que se endividou por mais de 40 anos para o construir...

3º mundo? Quem controla estas decisões políticas que nos custam a triplicar? (1º o custo da construção; 2º o custo da manutenção e 3º o custo da não adequação aos fins, já para não falar do custo dos atrasos, derrapagens, tachos, o que fica por fazer com o dinheiro assim mal gasto...!)

(Miguel Direito)

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MOMENTOS EM TEMPO REAL: EXTERIORES

Hoje.
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(Susan Sontag, On Photography)



O Porto, hoje de manhã. (José Carlos Santos)

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EARLY MORNING BLOGS


1199 - L'âge d'or de l'avenir

Le rideau s'est levé devant mes yeux débiles,
La lumière s'est faite et j'ai vu ses splendeurs ;
J'ai compris nos destins par ces ombres mobiles
Qui se peignaient en noir sur de vives couleurs.
Ces feux, de ta pensée étaient les lueurs pures,
Ces ombres, du passé les magiques figures,
J'ai tressailli de joie en voyant nos grandeurs.

Il est donc vrai que l'homme est monté par lui-même
Jusqu'aux sommets glacés de sa vaste raison,
Qu'il y peut vivre en paix sans plainte et sans blasphème,
Et mesurer le monde et sonder l'horizon.
Il sait que l'univers l'écrase et le dévore ;
Plus grand que l'univers qu'il juge et qui l'ignore,
Le Berger a lui-même éclairé sa maison.

(Alfred de Vigny)

*

Bom dia!

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10.1.08


LENDO
VENDO
OUVINDO

ÁTOMOS E BITS

de 10 de Janeiro de 2008 (2)


A página da NAER que agora está em linha (compare-se com esta) é um verdadeiro retrato da política deste governo. Apagou-se a história incomodativa (e os traços do seu preço de milhões de euros de estudos), mostra-se a realidade de hoje: nada. Tudo para fazer de novo, tudo para começar, apenas por uma razão: negligência do governo. Quanto nos custou?

*


Será assim tão difícil corrigir o erro de ortografia que está logo na PRIMEIRA palavra da página da NAER?! Ou (como a escrevem das duas maneiras...) ainda andam a fazer tentativas?!

(C. Medina Ribeiro)

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MOMENTOS EM TEMPO REAL: EXTERIORES

Hoje.
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(Susan Sontag, On Photography)



Douro na Régua. (Gil Regueiro)





Estrada para o Algarve. (Ochoa)



Serra da Estrela. (João Almeida)



Rua Jau.



Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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LENDO
VENDO
OUVINDO

ÁTOMOS E BITS

de 10 de Janeiro de 2008


É de facto muito difícil ter um ambiente de rigor, de controlo e responsabilização da coisa pública quando nem sequer a comunicação social se apercebe até que ponto a força do establishment se manifesta em tão triviais coisas como seja a de escolher ouvir o próprio governo, a solo, num período crítico de uma decisão que teve o processo que esta teve, as consequências que esta tem, a começar pelos seus enormes custos. Permitir-lhe uma fácil operação de controle dos danos, sem controvérsia, sem contraditório.

Esta é que é a grande diferença entre televisões como a RTP e as suas congéneres estrangeiras, mesmo as de "serviço público", é a de respirar no poder, dentro do poder, e nessa ecologia nem sequer lhe passar pela cabeça que o tratamento editorial de uma decisão governamental como a de hoje não pode ser feita essencialmente com a voz do poder e dos interessados governamentais, sem distanciação editorial. Não lhe passa pela cabeça que era vital, como tratamento jornalístico, editorial, ouvir os críticos, ouvir os que tinham razão contra a teimosia do governo, confrontar o ministro com algo mais do que brandas palavras. Não são as declarações formais da oposição que fazem esse papel. Ninguém por exemplo pergunta aos responsáveis do governo quanto custou esta teimosia ao país, quanto vai custar o programa de reparações para a Ota, um só dos muitos custos que este governo nos vai fazer pagar por pura negligência. Ninguém se dá ao trabalho de ir aos arquivos buscar mais que o óbvio ( o jamais) quando qualquer arquivo de televisão, rádio e jornais está cheio de afirmações muito mais comprometedoras do Primeiro-ministro e do Ministro das Obras Públicas, que só por preguiça - porque se sabia o suficiente para ter as peças preparadas - ou pior por favorecimento político.

Quando andamos para trás, também é por isto.

*

Mais uma história mal contada, obscura, cheia de coisas por esclarecer, como se está a tornar um hábito neste governo - a do aeroporto. É verdade que os "governos e os políticos mentem", mas quando a política se torna uma gestão da mentira, apresentada como infalibilidade e arrogância, o problema torna-se mais grave. Não é verdade que o governo estivesse sempre aberto a estudar todas as possibilidades de localização do aeroporto. É falso, o governo já tinha decidido pela Ota, e o governo nem sequer se deu ao trabalho de estudar a sério as variantes Portela+1. Não é verdade que tenha sido por sua livre vontade que estudou a hipótese de Alcochete. É falso, foi obrigado pelo Presidente e pela opinião pública, num processo que está de todo por esclarecer à volta do célebre estudo da CIP. Não é verdade que o Ministro e o Primeiro-ministro não tivessem fechado a porta liminarmente a qualquer dúvida, reflexão, crítica. É falso, fecharam-na com fragor em dezenas de declarações terminantes, definitivas, tão agressivas nas suas certezas que até faziam doer os ouvidos. Durante mais de um ano deixaram atrás de si declarações, discursos, resoluções, sessões públicas, power-points, filmes de computador com os aviõezinhos a subir e a descer e milhões de euros em estudos que vão para o lixo junto com a NAER, agora que tem que se começar tudo de novo.

De facto, isto estava a precisar de uma grande volta, mas não será certamente com declarações patéticas como a do PSD de que o governo mudou de posição a “reboque de posições tomadas apropriadamente pelo PSD em Outubro, quanto ao referendo, e em relação à OTA, nas últimas semanas”, uma declaração absurda na sua auto-congratulação. A ideia de um governo assustado pelas declarações de Luís Filipe Menezes, que apoiou a Ota quando Marques Mendes a atacava (daí o "nas últimas semanas”) e só quando se suspeitou que o estudos iriam apontar para Alcochete é que mudou mais uma vez de posição (e para uma variante de Alcochete+Portela que nem sequer é a que tomou o governo), não ilude ninguém, presumo que nem sequer o próprio, e é mais uma cavadela na cova funda da credibilidade do PSD.

*

Por motivos facilmente compreensíveis, a página da NAER está, neste momento, inacessível. Esperemos que, quando corrigirem "o que a gente sabe", aproveitem para acertar a ortografia.



(Anexo: imagem de arquivo)

(C. Medina Ribeiro)

*

Pode ver que na página principal da NAER já é publicitada a divulgação do estudo do LNEC. Mas se for à área de estudos é decepcionante verificar que no fundo da lista está texto com o nome do ficheiro mas sem qualquer ligação ao ficheiro que contém o estudo. Alguém falou em choque tecnológico?

(Miguel Borges)

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MOMENTOS EM TEMPO REAL: EXTERIORES

Hoje.
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(Susan Sontag, On Photography)



Lagoa de Óbidos hoje, às 8.25 e às 10.52. (António Leal)

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EARLY MORNING BLOGS


1197 - Law

Laws, as we read in ancient sages,
Have been like cobwebs in all ages.
Cobwebs for little flies are spread,
And laws for little folks are made;
But if an insect of renown,
Hornet or beetle, wasp or drone,
Be caught in quest of sport or plunder,
The flimsy fetter flies in sunder.

(James Beattie)

*

Bom dia!

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INTENDÊNCIA



Para além das minhas tradicionais dificuldades em lidar com a vastidão do correio, verifiquei agora que o Gmail teve um excesso de zelo e mandou uma série de mensagens, fotos, comentários, para o limbo do spam. Estou a tentar recuperar tudo o que seja possível, mas ficam desde já as minhas desculpas.

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9.1.08


LENDO
VENDO
OUVINDO

ÁTOMOS E BITS

de 9 de Janeiro de 2008


Estamos em plena, dura, completa desfaçatez do Primeiro-ministro, tratando-nos como tontos que acreditam em tudo que ele manda dizer-nos. É verdade que alguns jornalistas acreditam, mas bastava ser sensato, parar para pensar, para não se embarcar na operação de desinformação em curso nos últimos dias.

Por exemplo: andam a contar-nos a lenda urbana que o Primeiro-ministro só decidiu sobre o referendo entre anteontem e ontem, o que é do domínio das histórias da carochinha. Reparem no vaivém que o Público descreve (sublinhados meus):

2ª feira:
A possibilidade de haver referendo em Portugal, tida na segunda-feira como a mais forte inclinação do primeiro-ministro, gerou uma onda de preocupação e de estranheza nas principais capitais europeias, levando algumas delas a reagir.
3ª feira de manhã:
Ao fim da manhã de ontem, já depois dos alertas de Cavaco Silva (...), vários colaboradores de José Sócrates garantiam de novo ao PÚBLICO que a decisão sobre a realização ou não de referendo ainda não estava tomada. Tal como ao longo de toda a segunda-feira, diziam, ambos os cenários (ratificação ou referendo) estariam ainda em aberto.
3ª feira às 16.00
Por volta das 16h00, começaram a chegar ao PÚBLICO informações seguras de que Sócrates já tinha tomado a decisão: o Tratado de Lisboa teria ratificação parlamentar.
Teatro puro. Alguém acredita que até ontem o Primeiro-ministro ainda não tinha tomado a decisão? Seria não só um absurdo como completamente implausível como decision making. Aliás, se fosse assim como é descrito, a leviandade seria absoluta, tudo feito em cima dos joelhos. Mas não foi, porque esta é uma matéria sobre a qual o Primeiro-ministro tem certamente, de há muito, tomada uma decisão. O que o jornal relata é teatro, desinformação, uma lenda urbana criada a partir do gabinete do Primeiro-ministro para nos passar a mensagem de que o pobre Sócrates queria muito cumprir a sua promessa eleitoral, só que o Presidente e os seus colegas europeus não o deixaram, agarraram-no à última hora, in extremis e ele, pelos mais nobres motivos, lá teve que violentar a sua vontade.

A manobra era tão evidente que ontem aqui eu comparava o Primeiro-ministro àqueles que gritam "agarrem-me senão eu mato" e, quando são agarrados, se verifica que não fazem força nenhuma. Quando o escrevi, a notícia dominante era a de que afinal ia haver referendo...

Há perguntas a fazer ao Primeiro-ministro, como há responsabilidades a pedir aos jornais. O Público, por exemplo, escreve:
Depois de ter ouvido as preocupações que lhe foram directamente transmitidas por alguns dos mais importantes líderes europeus, entre os quais o primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, e o Presidente francês, Sarkozy, Sócrates telefonou à chanceler alemã Angela Merkel, que também se manifestou contra a convocação de um referendo, tendo acabado por tomar ontem à tarde a "decisão final" e optado pela ratificação parlamentar.
Muito bem. Agora gostaria de saber em que datas o Primeiro-ministro telefonou a Gordon Brown, Sarkozy e Merkel, (a acreditar-se no jornal deveria ter sido nos últimos dois dias), ou vice-versa, e se estes dirigentes europeus tinham sido informados, e por quem, que em Portugal ia haver referendo, de modo suficientemente seguro para se sentirem alarmados e contactarem Sócrates. É que na vida real dos governos e da diplomacia, as coisas não se fazem na base de impressões, nem das leituras pelas embaixadas dos jornais. A ideia que nos querem transmitir, e que pelo menos alguns jornais acreditam, é que tudo corre entre governos e Primeiro-ministros como Sócrates, Sarkozy e Merkel ao estilo das conversas de café, estados de alma, decisões e contra-decisões, - no mesmo dia duas diferentes -, pressões e conselhos de última hora. Insisto, pensar que as coisas correm assim é do domínio das histórias da carochinha.

Tudo isto suscita uma ainda maior preocupação: que homem é este que nos governa que não hesita em enganar-nos de forma tão deliberada, com tanta desfaçatez, e desprezo pelos outros? É sem dúvida um homem perigoso.

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MOMENTOS EM TEMPO REAL: EXTERIORES

Hoje.
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(Susan Sontag, On Photography)



O ocaso visto da Pinède de Juan les Pins. (J. Rego)



Hoje à tarde. (Fernando Caetano)



Flamingos na baía do Seixal. (José Borges)



Rebocadores em Setúbal. (António Cabral)

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8.1.08


LENDO
VENDO
OUVINDO

ÁTOMOS E BITS

de 8 de Janeiro de 2008


Começou a gigantesca máquina do consenso para negar o referendo.

*

Hoje é o dia de uma grande operação de desinformação sobre o referendo. Do género, agarrem-me senão eu faço e aconteço... Claro que correram logo muitos braços a agarrar o homem, não vá ele fazê-lo e acontecê-lo...Teatro puro.

*

Hoje vários jornais em linha (Correio da Manhã, Diário de Notícias) estão ilegíveis porque uma espécie de publicidade sob a forma de uma mancha de óleo movente interfere na sua leitura acompanhando o rato, um truque de software pouco sofisticado. Os jornais deviam ter mais respeito pelos seus leitores na Rede e os publicitários compreender que o efeito irritante deste tipo de publicidade é contraproducente e intrusivo. Parece uma maré negra.

*

Não há crise! O país respira bem! Os telejornais de domingo (RTP, SIC, TVI), da hora do almoço, abriram, simultânea e desenvolvidamente, com um episódio de “troca de mimos” protagonizado por dois jogadores do Benfica no relvado do Vitória de Setúbal. A paciência tem limites…

(Aníbal Caldas)

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EARLY MORNING BLOGS


1196

Ama siempre soledad
Huyendo la multitud,
Y ternás gran quietud.

(Trezientos proverbios, consejos y avisos muy provechosos para el discurso de nuestra humana vida. Compuestos por muy breve estillo por el noble don Pedro Luys Sanz, Doctor en derechos, advogado de la insigne ciudad de Valencia, etc.)

*

Bom dia!

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7.1.08


AGORA QUE VOLTOU O TEMPO DAS CONSPIRAÇÕES


só tenho uma coisa a sugerir: vale mais falar em público, dizer o que se pensa, deixar-se de fontes anónimas, deixar-se de recados, dar entrevistas com o rosto todo, assinar com o nome, fazer o esforço de discutir, escrever artigos, explicar alternativas políticas, criticar com C grande no espaço público, para todos verem tudo, saberem quem e porquê e assim estabelecer-se um contínuo entre os debates intra-partidários e o debate público sobre Portugal e os portugueses. Sempre é mais saudável do que andar a conspirar para depois colocar nos jornais, o que não é boa política e é péssima conspiração.

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NUNCA É TARDE PARA APRENDER: A LIDERANÇA AMERICANA NA GUERRA DO IRAQUE (5)

Forças e fraquezas do livro:

- Woodward narra os acontecimentos com quase completa ausência do papel dos iraquianos no processo de decisão, quando se sabe que em determinados momentos, fosse por via dos seus protectores americanos, fosse pela sua força própria, a tiveram. É o caso do grupo de Chalabi, no qual se personificaram as divisões da administração americana, com altos responsáveis a querem entregar-lhe o controlo do Iraque e outros a oporem-se terminantemente, considerando-o uma fraude. É o caso também, noutro sentido, do ayatollah Sistani, figura crucial do xiismo iraquiano e cujas fatwa condicionaram o processo político. Esta omissão torna pouco credíveis alguns relatos de decisões que aparecem no livro como exclusivamente americanas.

- Woodward parece estabelecer a menorização da CIA e do Vice-Presidente em todo o processo, o que, para o caso deste último, é uma relativa novidade. Cheney parecia ter mais poder do que realmente transparece neste livro. Quanto à CIA, é sem dúvida uma das vítimas do processo iraquiano, pelas sucessivas hesitações na questão das armas de destruição massiva.

- No relato de Woodward mostra-se o esforço frenético para encontrar as armas químicas, biológicas e nucleares que era suposto Saddam ter, o que mostra como os principais responsáveis americanos (e não só) estavam plenamente convencidos da sua existência.

- Uma das mais interessantes descrições do livro é a noite eleitoral de 2004 em que Bush é reeleito, com o seu drama à partida (as sondagens à boca das urnas eram-lhe francamente desfavoráveis) e à chegada (a hesitação em proclamar a vitória com receio que Kerry suscitasse a questão dos votos do Ohio, abrindo uma polémica sobre as votações, embora neste caso a diferença não pudesse alterar os resultados finais como acontecera na Florida na eleição anterior).

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NUNCA É TARDE PARA APRENDER: A LIDERANÇA AMERICANA NA GUERRA DO IRAQUE (4)

O mais devastador do retrato que Woodward faz da administração americana em tempos de guerra é o do contínuo conflito de competências e autoridade entre os principais responsáveis e as suas equipas. Aqui, pesem embora as claras simpatias e antipatias do autor (e das suas fontes), não há volta a dar: Rumsfeld, Condoleezza Rice e Colin Powell, nunca foram capazes de fornecer uma orientação consistente e coordenada à política externa americana, com graves implicações no terreno iraquiano e, por implicação, o Presidente Bush foi igualmente incapaz de se aperceber da situação e tomar medidas adequadas. Este é o cerne da crise de liderança que afectou os anos cruciais da guerra, em particular depois da vitória militar.

O secretário da Defesa Rumsfeld foi o principal responsável pela condução militar das operações que decorreram com grande eficácia e garantiram uma vitória rápida e sem grandes baixas. Mas as suas opções sobre a utilização dos militares no terreno, em particular quanto ao número de tropas e a recusa em participar em operações de manutenção de ordem quando começaram os saques, revelaram desde logo uma enorme insensibilidade política aos problemas resultantes da ocupação do Iraque. Era só uma questão de tempo até que os erros políticos começassem a ter efeitos militares, alimentando a insurreição sunita e impedindo operações tidas como fundamentais para combater os grupos terroristas e insurrectos, como foi o caso da "limpeza" de Faluja, bloqueada politicamente pelas pressões árabes que iam em crescendo com o agravamento da situação de segurança.

Rumsfeld comportou-se como não fazendo nem deixando fazer, bloqueando a participação do Departamento de Estado e mesmo do Conselho Nacional de Segurança, a quem incumbia a responsabilidade da condução política do processo. Colin Powell aparece como estando sempre marginalizado, à cabeça de uma diplomacia suspeita de não ter muito entusiasmo pelas teses democratizadoras dos think tanks neo-conservadores, e Rice como oscilando entre a sua fidelidade pessoal ao Presidente, que apoia Rumsfeld sem hesitação, e a consciência que claramente tem de que as coisas estão a correr mal. Este conflito no topo acaba por estender-se às equipas respectivas e inquinar a capacidade da administração para responder aos múltiplos avisos que faziam vários enviados especiais ao Iraque, em particular os que Rice mandava para uma apreciação independente do que estava a acontecer.

(Continua.)

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