ABRUPTO

4.9.04


PRIMEIRO NOS SELOS, DEPOIS NA VIDA



Os primeiros selos checoslovacos de 1919, com o “castelo”, o Hradcany, uma série para amadores da filatelia com a sua multiplicidade de variedades, papel, cor, denteado, datas de emissão, em suma, história. Depois, a ele subi várias vezes, primeiro lendo o Castelo de Kafka, que , três anos antes destes selos aparecerem, vivia lá perto no 22 Zlata ulicka. Depois, subi lá, nos anos do fim do comunismo, trazido nos tanques soviéticos, pisando o mesmo chão que Hitler tinha pisado e que os comunistas tinham tornado no verdadeiro castelo de Kafka. Tudo estava impregnado do característico cheiro a carvão que, naqueles anos, só existia nos países comunistas. Ficou como um dos meus cheiros do estrangeiro, como a Coca Cola ainda hoje me sabe a estrangeiro. E mais tarde lá fui, durante a “revolução de veludo”, com a alegria e a tensão das ruas por baixo. Primeiro nos selos, depois na vida.

(url)


APRENDENDO COM O PADRE ANTÓNIO VIEIRA:"LEMBRAI-VOS HOMENS, DO FEL, QUE VOS ESQUECE"

"Não assim Cristo. Porque quando disse Sitio, sabia mui bem que, acabados já todos os outros tormentos, faltava só por cumprir a profecia do fel: Sciens quia omnia consummata sunt, ut consummaretur scriptura, dixit: Sitio. E assim aquelas tibiezas que considerávamos, parecia que não eram amor, e eram as maiores finezas; parecia que eram um desejo natural, e eram o mais amoroso e requintado afecto. Se Cristo dissera: – Tenho sede, – cuidando que lhe haviam de dar água, era pedir alívio; mas dizer: – Tenho sede, – sabendo que lhe haviam de dar fel, era pedir novo tormento. E não pode chegar a mais um amor ambicioso de padecer, que pedir os tormentos por alívios, e para remediar uma pena, dizer que lhe acudam com outra. Dizer Cristo que tinha sede, não foi solicitar remédio à necessidade própria; foi fazer lembrança à crueldade alheia. Como se dissera: Lembrai-vos, homens. do fel, que vos esquece: Sitio. Tão diferente era a sede de Cristo do que parecia: parecia desejo de alívios, e era hidropisia de tormentos. De sorte que a ciência com que obrava Cristo e a ignorância com que obrava Pedro, trocaram estes dois afectos de maneira que o que em Pedro parecia fineza, por ser fundado em ignorância, não era amor: e o que em Cristo não parecia amor, por ser fundado em ciência, era fineza. E como a ciência ou a ignorância é a que dá ou tira o ser, e a que diminui ou acrescenta a perfeição do amor, por isso o Evangelista S. João se funda todo em mostrar o que Cristo sabia, para provar o que amava: Sciens quiu venit hora ejus, in finem dilexit eos."

(url)


BIBLIOFILIA



Dois livros acompanharão alguns textos próximos no Abrupto: Fatih Cimok, Biblical Anatolia From Genesis to the Councils, 2002 , e Nick Rennison (Ed,), Bloomsbury Reading Guide, Londres , Bloomsbury, 2001. Um sobre sítios de ver, outro sobre sítios de ler. Ambos um retrato de uma coisa que escrevi no princípio do Abrupto, numa fase de morte de blogues por depressão umbiguista: o que interessa está lá fora. E está.

Só um exemplo do Bloomsbury, voltando à conversa ouvida ontem sobre a “história da merda da baleia”, ou seja, do Moby Dick. Quer o leitor ler mais alguma coisa sobre peixes, mar e obsessões, pois o Bloomsbury aconselha o Nigger of the Narcissus de Conrad e os Travailleurs da la Mer de Victor Hugo. Ecléctico. Querem os amadores dos comboios, que leram o soneto do Vasco Graça Moura e viram o quadro de Delvaux, mais comboios? Pois o Bloomsbury recomenda o óbvio Crime no Expresso do Oriente da Agatha Christie, o Stamboul Train de Greene (e por ele podemos chegar à Anatólia), e um menos óbvio Bom Soldado Sejk de Hasek. Ou seja, uma coisa leva à outra e depois à outra e depois à outra. Acaba? Acaba é connosco, ou acabamos primeiro. Por isso, pode haver tudo, miséria, sofrimento, doença, alegria, poder ou morte, mas aborrecimento certamente não há. Nunca percebi as pessoas que se dão ao luxo de estar aborrecidas.

(url)


APRENDENDO COM O PADRE ANTÓNIO VIEIRA: "TENHO SEDE"

"Em todas as cousas que Cristo obrou neste Mundo, manifestou sempre o muito que amava os homens; contudo, uma palavra disse na cruz, em que parece se não mostrou muito amante: Sitio: «Tenho sede.» Padecer Cristo aquela rigorosa sede, amor foi grande; mas dizer que a padecia e significar que lhe dessem remédio, parece que não foi amor. Afecto natural, sim; afecto amoroso, não. Quem diz a vozes o que padece, ou busca o alívio na comunicação ou espera o remédio no socorro; e é certo que não ama muito a sua dor, quem a deseja diminuída ou aliviada. Quem pede remédio ao que padece, não quer padecer; não querer padecer, não é amar: logo, não foi acto de amor em Cristo dizer: Sitio: «Tenho sede.» Contraponhamos agora esta acção de Cristo na cruz e a de S. Pedro no Tabor. A de S. Pedro, parece que tem muito de fineza; a de Cristo, parece que não tem nada de amor. Será isto assim?"

(Continua)


(url)


AR PURO


Arkhip Kuindji

(url)


EARLY MORNING BLOGS 301

The Naming Of Cats


The Naming of Cats is a difficult matter,
It isn't just one of your holiday games;
You may think at first I'm as mad as a hatter
When I tell you, a cat must have THREE DIFFERENT NAMES.
First of all, there's the name that the family use daily,
Such as Peter, Augustus, Alonzo or James,
Such as Victor or Jonathan, George or Bill Bailey--
All of them sensible everyday names.
There are fancier names if you think they sound sweeter,
Some for the gentlemen, some for the dames:
Such as Plato, Admetus, Electra, Demeter--
But all of them sensible everyday names.
But I tell you, a cat needs a name that's particular,
A name that's peculiar, and more dignified,
Else how can he keep up his tail perpendicular,
Or spread out his whiskers, or cherish his pride?
Of names of this kind, I can give you a quorum,
Such as Munkustrap, Quaxo, or Coricopat,
Such as Bombalurina, or else Jellylorum-
Names that never belong to more than one cat.
But above and beyond there's still one name left over,
And that is the name that you never will guess;
The name that no human research can discover--
But THE CAT HIMSELF KNOWS, and will never confess.
When you notice a cat in profound meditation,
The reason, I tell you, is always the same:
His mind is engaged in a rapt contemplation
Of the thought, of the thought, of the thought of his name:
His ineffable effable
Effanineffable
Deep and inscrutable singular Name.


(T.S. Eliot)

*

Bom dia!

(url)

3.9.04


O OUTRO LADO DOS SANTOS: PARA CONTRAPOR AO BOM PADRE VIEIRA QUE FALA LÁ EM BAIXO NA PARTE JÁ ESQUECIDA DO BLOGUE

San António bendito,
dáde-me un home,
anque me mate,
anque me esfole.

Meu Santo António,
daime un homiño
anque o tamaño tenã
dun gran de millo.

Daimo, meu santo,
anque os pés teña coxos,
mancos os brazos.

Unha muller sin home…
!santo bendito!
é corpiño sin alma,
festa sin trigo.

Pau viradoiro,
que onda queira que vaia
troncho que troncho.

Mais en tendo un homiño
!Virxe do Carme!
non hai mundo que chegue para un folgarse.

Que zambo ou trenco,
sempre é bo ter un home
para un remédio.

Eu sei dun que cobisa
causa mirarlo,
lanzaliño de corpo,
roxo e encarnado.

Carniñas de manteiga,
e palabras tan doces
cal mentireiras.

Por el peno de dia,
de noite peno,
pensando nos seus ollos
color do ceo.

Mais el xa doito,
de amoriños entende,
de casar pouco.


Face meu San António
que onda min veña,
para casar conmigo,
nena solteira,

Que levo en dote
unha culler de ferro
catro de boxe,

In irmancito novo
que xa ten dentes,
una vaquiña vella
que non dá leite...

¡Ai! Meu santiño,
facé que tal suceda,
cal volo pido.

San António bendito,
dáde-me un home,
anque me mate,
anque me esfole.

Que zambo ou trenco,
sempre é bo ter un home
para un remédio.


(Rosalia de Castro)

(url)


POEIRA DE 3 DE SETEMBRO

Hoje, há 59 anos, Noel Coward começava a convencer-se de que poderia haver paz, pelo menos uma “officialy declared peace”, com o mundo “num caos físico e espiritual”. Escreveu no seu diário: “History in the making can be most exhausting”. Tinha razão.


(url)


INTENDÊNCIA

Actualizado BIBLIOFILIA: LIVROS E CAPITALISMO .

(url)


PRIMEIRO NOS SELOS, DEPOIS NO TRIBUNAL DE HAIA







Primeiro, nos selos do Estado croata, criado pelos alemães e apoiado pelo Vaticano, durante a II Guerra, e depois aqui:
"Milosevic acusou o Vaticano, também vítima do «declínio moral» das grandes potências, de querer «destruir a Sérvia para assegurar a sua expansão em direcção ao Leste». Palavras igualmente duras reservou para a Alemanha, país que, nas suas palavras, «durante anos, fez tudo para destruir a Jugoslávia».



(url)


CONVERSA OUVIDA

- Ele punha lá aquilo no blogue. Aquilo. A história da merda da baleia...”

- O Moby Dick, não é?



(url)


APRENDENDO COM O PADRE ANTÓNIO VIEIRA: "SÓ CRISTO AMOU, PORQUE AMOU SABENDO"

"Primeiramente só Cristo amou, porque amou sabendo: Sciens. Para inteligência desta amorosa verdade, havemos de supor outra não menos certa, e é que, no Mundo e entre os homens, isto que vulgarmente se chama amor, não é amor, é ignorância. Pintaram os Antigos ao amor menino; e a razão, dizia eu o ano passado, que era porque nenhum amor dura tanto que chegue a ser velho. Mas esta interpretação tem contra si o exemplo de Jacob com Raquel, o de Jónatas com David, e outros grandes, ainda que poucos. Pois se há também amor que dure muitos anos, porque no-lo pintam os sábios sempre menino? Desta vez cuido que hei-de acertar a causa. Pinta-se o amor sempre menino, porque ainda que passe dos sete anos, como o de Jacob, nunca chega à idade de uso da razão. Usar de razão e amar, são duas cousas que não se juntam. A alma de um menino que vem a ser? Uma vontade com afectos e um entendimento sem uso. Tal é o amor vulgar. Tudo conquista o amor, quando conquista uma alma; porém o primeiro rendido é o entendimento. Ninguém teve a vontade febricitante, que não tivesse o entendimento frenético. O amor deixará de variar, se for firme, mas não deixará de tresvariar se é amor. Nunca o fogo abrasou a vontade, que o fumo não cegasse o entendimento. Nunca houve enfermidade no coração. que não houvesse fraqueza no juízo. Por isso os mesmos pintores do amor lhe vendaram os olhos. E como o primeiro efeito ou a última disposição do amor, é cegar o entendimento, daqui vem que isto que vulgarmente se chama amor. tem mais partes de ignorância; e quantas partes tem de ignorância, tantas lhe faltam de amor. Quem ama porque conhece, é amante; quem ama porque ignora é néscio. Assim como a ignorância na ofensa diminui o delito, assim no amor diminui o merecimento. Quem, ignorando, ofendeu, em rigor não é delinquente; quem, ignorando, amou, em rigor não é amante."

(url)


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: FRIO, FRIO, ESTÁ A COMEÇAR A FICAR QUENTE, QUENTE



É como estes anéis nas suas falsas cores. Quentes, vermelho, mais frios, azul e verde. Se jogássemos entre eles, procurando o objecto escondido, o Graal de Saturno, teríamos que ir assim, medindo a temperatura, de frio em frio, até encontrarmos o lugar quente, afinal apenas o menos frio. O anel vermelho está a 110 K, muito, muito abaixo da temperatura em que a água gela.

(url)


SINAIS: DE "ABORTO-EXCITADOS" A "ABORTO-CALMOS"

Sinais que o PP, Paulo Portas e o seu grupo em particular, estão a “evoluir” em matéria de aborto como aconteceu com a questão europeia: para se manterem no governo vão moldando a sua “política de princípios”. Estão a passar de “aborto-excitados” para “aborto-calmos”.

(url)


SINAIS DE CAOS

Sinais de condução política caótica por parte do governo em toda a questão do “barco do aborto”. (Ou interpretação alternativa: sinais de que o Primeiro-ministro faz governação por cabotagem, sempre à vista da costa que, neste caso, é a comunicação social. Os resultados são os mesmos: caos e confusão de mensagens.)

(url)


A LER

No Bloguitica GOOD COP, BAD COP e A ETERNA VÍTIMA E A TEMPESTADE NUM COPO DE ÁGUA.

(url)


VULCÃO CUMPRE O TEU DEVER



E o meu preferido, o Piton de la Fournaise, lá o cumpre galhardamente como se vê nesta foto de ontem. Como de costume, não estou lá para ver, porque este tem o mau hábito de entrar em erupção quando eu viro as costas.

(url)


EARLY MORNING BLOGS 300

Dove Sta Amore


Dove sta amore
Where lies love
Dove sta amore
Here lies love
The ring dove love
In lyrical delight
Hear love's hillsong
Love's true willsong
Love's low plainsong
Too sweet painsong
In passages of night
Dove sta amore
Here lies love
The ring dove love
Dove sta amore
Here lies love


(Lawrence Ferlinghetti)

*

Trezentas vezes. Bom dia!

(url)

2.9.04


BIBLIOFILIA PURA



Pedro Homem de Mello, e ninguém me conhecia. 60 Poemas escolhidos e apresentados por Manuel Alegre e Paulo Sucena, Porto, Poiesis, 2004

Este homem escrevia assim:

CIDADE GRANDE

Onde é que há sombras como as destas casas?
Onde é que há noites como as destas luas?

Onde é que as águias abrem mais as asas
Do que este vento, apunhalando as ruas?

(url)


BIBLIOFILIA: LIVROS E CAPITALISMO



Os Penguin Books revolucionaram a edição inglesa e depois a mundial (uma história dos Penguin Books está aqui). A ideia original era fazer livros ao preço de um maço de cigarros. Nos anos mais difíceis da guerra, os livros tinham reclames nas capas e contracapas como este de Maurice Collins de 1943. Os Norvic Shoes, o chocolate Mars e o Jif Shaving Stick , que são os reclames neste livro, não envergonhavam ninguém e ajudavam o livro a permanecer barato.

*

"A propósito do seu post dedicado à Penguin e à maneira como revolucinou a edição, vale a pena acompanhar a sua mais recente acção de promoção dos seus livros. Parece que a originalidade da Penguin não se esgotou no século passado. Aqui."

(Rui Amaral)

(url)


CORREIO

Sofreu de novo um atraso maior. Com pedido de desculpas, vou tentando responder mesmo com atraso.

(url)


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: "LOOK MOM NO PEBBLE!"

não é uma frase desta série do Abrupto, mas o título da nota da NASA sobre a pedrinha que estava a encravar a broca da Opportunity.

(url)


A PROPÓSITO DO QUADRO DE DELVAUX

soneto pardacento


estou em bruxelas de segunda a quinta:
há livrarias. não se come mal.
dos aviões, talvez eu me ressinta:
voos por ano faço cento e tal.

na europeia babel, rios de tinta
correm em cada língua oficial.
um dia, quando os quinze forem trinta,
deixa de haver europa ocidental.

das vénus que delvaux pintou, nenhuma
entre os espelhos e a melancolia
das gares e das luas, quando a cinza

do dia a dia as almas desarruma
em flamenga e francófona rezinza.
burguês. à chuva. adeus. sem maresia.

(Vasco Graça Moura)

(url)

1.9.04


EM MOVIMENTO


Paul Delvaux

(url)


EARLY MORNING BLOGS 299

HORSES AND MEN IN RAIN


LET us sit by a hissing steam radiator a winter's day, gray wind pattering frozen raindrops on the window,
And let us talk about milk wagon drivers and grocery delivery boys.

Let us keep our feet in wool slippers and mix hot punches--and talk about mail carriers and
messenger boys slipping along the icy sidewalks.
Let us write of olden, golden days and hunters of the
Holy Grail and men called "knights" riding horses in the rain, in the cold frozen rain for ladies they loved.

A roustabout hunched on a coal wagon goes by, icicles drip on his hat rim, sheets of ice wrapping
the hunks of coal, the caravanserai a gray blur in slant of rain.
Let us nudge the steam radiator with our wool slippers and write poems of Launcelot, the hero, and
Roland, the hero, and all the olden golden men who rode horses in the rain.

(Carl Sandburg)

*

Bom dia!

(url)

31.8.04


APRENDENDO COM O PADRE ANTÓNIO VIEIRA: "SE PERGUNTA A SABEDORIA DIVINA, PORQUE NÃO PERGUNTARÁ A IGNORÂNCIA HUMANA?"

"Vos autem quem me esse dicitis?" (S. Mateus, XVI.)

"Mui seguro está do seu valor quem tira a sua opinião ao campo. E se é temeridade tomar-se com muitos, com todo o mundo se tomou quem desafiou sua fama. Na ocasião de que fala S. Mateus (cujo é o Evangelho que hoje nos propõe a Igreja) diz que perguntou Cristo, Senhor nosso, que diziam dele os homens: "Quem dicunt homines esse Filium hominis?"

Perguntou o Senhor, para que os senhores que mandam o Mundo se não desprezem de perguntar. Se pergunta a sabedoria divina, porque não perguntará a ignorância humana? Mas esse é o maior argumento de ser ignorância. Quem não pergunta, não quer saber; quem não quer saber, quer errar. Há porém ignorantes tão altivos, que se desprezam de perguntar, ou porque presumem que tudo sabem, ou porque se não presuma que lhes falta alguma cousa por saber. Deus guie a nau onde estes forem os pilotos.

Não perguntou o Senhor o que era, senão o que se dizia: "Quem dicunt?" Antes de se fazerem as cousas, há-se de temer o que dirão; depois de feitas, há-se de examinar o que dizem. Uma cousa é o acerto, outra o aplauso. A boa opinião de que tanto depende o bom governo, não se forma do que é, senão do que se cuida; e tanto se devem observar as obras próprias, como respeitar os pensamentos e línguas alheias. A providência com que Deus permite a murmuração, é porque talvez de tão má raiz se colhe o fruto da emenda. E se eu de murmurado me posso fazer aplaudido, porque me não informarei do que se diz?"


(url)



Monet

(url)


EARLY MORNING BLOGS 298

Memory


My mind lets go a thousand things,
Like dates of wars and deaths of kings,
And yet recalls the very hour--
'Twas noon by yonder village tower,
And on the last blue noon in May--
The wind came briskly up this way,
Crisping the brook beside the road;
Then, pausing here, set down its load
Of pine-scents, and shook listlessly
Two petals from that wild-rose tree.


(Thomas Bailey Aldrich)

*

Bom dia!

(url)

30.8.04


PRIMEIRO NOS SELOS, DEPOIS NOS LIVROS



Os coleccionadores de selos são uma forma especial de doidos mansos, em particular os que, contrariamente a todas as recomendações, coleccionam tudo. Sobre o Oceano Pacífico alemão, aprendi com os selos coloniais alemães, antes de reencontrar o “Grosse Stiller Ozean”no Corto Maltese da Balada do Mar Salgado.


Sobre as batalhas desesperadas dos exércitos e guerrilhas, deixados perdidos no extremo oriente pela derrota alemã e pela revolução bolchevique, conhecia-as da selva dos selos russos dos anos 1918-1924, antes de ler a história em Hopkirk, num magnifico livro onde também andam personagens que Hugo Pratt usou para o Corto Maltese.

(url)


ESPELHO UM DO OUTRO

Que os radicais “fracturantes” das organizações do Bloco de Esquerda trouxessem cá o barco para organizarem uma operação de propaganda usando a “causa” do aborto, vá que não vá, estão no seu papel. (Dois caveat. O primeiro é que se violarem a lei devem sofrer as consequências, tanto mais que se trata de uma iniciativa claramente política, não um trágico aborto às escondidas em estado de necessidade de uma infeliz mulher. Não é a mesma coisa. Numa democracia é assim, mesmo quando não se concorda com a lei. O segundo é que, ao transformar a questão do aborto numa guerrilha radical, fazem estragos consideráveis no esforço moderado e necessário para acabar com a criminalização do aborto. Convém não esquecer que, seja qual for a evolução da situação, deverá haver um referendo, e no referendo os excessos pagam-se.)

Agora que o governo português resolva actuar como um espelho do Bloco, como um grupo radical de sentido contrário, com todos os tiques do radicalismo ideológico, com a agravante de abusar dos meios do Estado, é que coloca uma questão muito mais grave do que o folclore do barco. Se o barco foi uma provocação, este governo respondeu-lhe ao mesmo nível.

(url)


UMA PERIGOSA ESTUPIDEZ

As revistas feitas pela Polícia Marítima a um barco português só se justificam caso haja séria suspeita de que este esteja envolvido numa actividade criminosa. Não se fazem revistas a um barco (ou a um carro, ou seja lá o que for) para intimidar as pessoas que lá vão. As forças armadas portuguesas não podem ser usadas para acções de intimidação contra cidadãos que não estão a violar nenhuma lei, mesmo que não se concorde com as suas acções e opiniões. As forças armadas portuguesas não podem ser usadas para servir de cobertura a encenações políticas. O Presidente da República é posto directamente em causa se não fizer ou disser nada.

(url)


UMA CARA ESTUPIDEZ

Mas que cara estupidez é essa de ter dois barcos de guerra a controlar um pequeno barco, só para fazer figura? Não estou aqui a discutir a decisão de impedir o barco de atracar, que é uma outra questão. Só pergunto se não há outros meios mais baratos e discretos de controlar um barco nas águas internacionais. É que este espavento, (caro, insisto), é uma marca de água do ocupante da Defesa, que envergonha os militares sob sua alçada. Show off.

(url)


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: UMA PERGUNTA

"Gostaria de fazer uma pergunta relativa ao «barco do aborto»: o que se passaria se o «barco do aborto» fosse o «barco da excisão feminina»?"

(José Carlos Santos)

*

"A técnica de discussão de arrastar para o campo oposto ideias ou situações indefensáveis é velha e funciona bem. São no entanto situações incomparáveis, que se saiba as mulheres que desejem, proceder a uma interrupção voluntária da gravidez não vão ser arrastadas à força para a embarcação da Woman on Waves. Já no caso da excisão feminina não sei se seria esse o caso."

(João Figueiredo)



(url)


A LER E A VER

todos os Jogos Olímpicos no bomba inteligente. (Este nome encanita-me, como diz o Vasco PV).

Claro que há perfeição. Os gregos descobriram-na há quase três mil anos. Ao mesmo tempo descobriram a imperfeição.

(url)


SOBRE A MINHA INVICTA TERRA

o Avenida dos Aliados.

De que roubo a fotografia da ponte D. Maria abandonada.

Quantas vezes a atravessei de comboio, vendo o medo dos lisboetas que acreditavam numa lenda urbana , a de que a ponte estava para cair? Muitas e algumas a pé. Faltava-se às aulas no Alexandre Herculano, um pouco lá para trás, e das Fontainhas passava-se por aquele sinistro colégio e depois pela escarpa abaixo passando as linhas-férreas e atravessando os túneis, sempre a olhar para as reentrâncias cavadas na rocha, não viesse um comboio. Era uma verdadeira aventura porque, quando chovia, a água que se infiltrava nos túneis escorria do tecto, misturada com a fuligem do carvão das máquinas e sujava a roupa, indício seguro de asneira. Depois passava-se por uma cerca de arame, meia derrubada e chegava-se ao tabuleiro. Então corria-se para atravessar a ponte, não fosse aparecer um comboio num dos lados. A ponte era de via única e havia um “testemunho” que os maquinistas recebiam nas Devezas e entregavam em Campanhã. Sem “testemunho” não se podia atravessar a ponte. Correr na ponte era perigoso porque a ponte era exclusivamente ferroviária e não era suposto ser atravessada por peões. O pequeno passeio lateral para manutenção era coberto por tábuas pequenas, muitas das quais já tinham desaparecido ou estavam partidas e podres e pelos buracos via-se o Douro a correr lá muito abaixo. Muito abaixo. Depois chegava-se ao lado de Gaia e era voltar pelo mesmo caminho. Não se esquece.


*

"Mais interessante ainda era estar no pequeno passeio lateral quando de facto o comboio passava! Não se imagina, indo lá dentro, o que a ponte abana cá fora. Só me aventurei uma vez... Se já metia medo só de olhar lá para baixo sem nada a passar, quando a máquina avançava lentamente parecia que a trepidação nos ia inevitavelmente projectar para o Douro. Agarrei-me ao ferro da ponte e decidi rapidamente que haveria de certeza outros locais muito interessantes para fotografar noutro lado qualquer..."

(Tiago Azevedo Fernandes)

*

"Recordo os momentos mais próximos que tive com o meu Pai. Sair de casa (do lado de Gaia), procurar a entrada para a ponte algures nos terrenos adjacentes ao campo de tiro do regimento de artilharia da Serra do Pilar, e lançarmo-nos á aventura! De tantos em tantos metros (pareciam-me muitos, era bem pequeno), havia refúgios, que permitiam ficar protegido do efeito de sucção do comboio. A ponte vibrava, mas sentia-se maior protecção... Inexistente, todavia, a sucção, porque os comboios reduziam a sua velocidade a 30 ou 40 km, já não me lembro bem. Depois, chegar a campanhã, apanhar o autocarro de volta ao centro, e o 'trólei' de volta para Gaia, já em segurança, na ponte D. Luís. E lembro-me, claro da viagem de despedida: vindo de Lisboa, propositadamente saímos em Campanhã, para espreitar da janela o rio e sentir a vertigem que tanto assustava os viajantes do resto do País.

As pontes do Porto têm um brilho especial. E disto fazem parte também os túneis para S.Bento e para a Alfândega. Há tempos li um projecto de reaproveitamento deste circuito. Porquê ser megalómano? Mais fácil seria abrir a ponte para percursos pedestres... aliás, é desta ponte que se tem a mais bonita vista doPorto: a Escarpa de Gaia, as Fontanhias, o colégio. E olhando para o outro lado, ver (será que ainda se vê?), o Monte Castro, o Areinho, o Palácio do Freixo.

Memórias doces... Mas aqui fica a sugestão! Em vez de comboios antigos, porque não, pura e simplesmente, abrir a ponte á travessia de pessoas?"

(Daniel Rodrigues)

(url)


AR PURO: VEM OUTONO


Isaak Levitan

*

"Não fora uns ramos de um abeto no lado esquerdo do quadro, e eu diria que Levitan se tinha sentado ali na "alverca", na estrada entre a Golegã e a Azinhaga, e tinha decidido pintar um cenário que me é bem familiar. Uma das coisas boas da vida é ter memória e memórias. Li aqui há tempos alguém que dizia que somos só memória. O que faz imenso sentido. Tudo o que somos já foi, acabou de ser. Não se trata de nostalgias ou saudades. É termos uma história. É vida. Não é querer voltar a viver o que já se viveu ou querer voltar para trás, nem sequer é usar as memórias para ocupar o presente. É sermos o que somos, com o que já fomos.

Venha o Outono! (Com Inverno, Primavera e Verão já incorporados…)
"

(RM)

(url)


EARLY MORNING BLOGS 297

ROMANCE DEL JURAMENTO QUE TOMÓ EL CID AL REY DON ALONSO

En santa Gadea de Burgos, do juran los hijosdalgo,
allí le toma la jura el Cid al rey castellano.

Las juras eran tan fuertes que al buen rey ponen espanto;
sobre un cerrojo de hierro y una ballesta de palo:

—Villanos te maten, Alonso, villanos, que no hidalgos,
de las Asturias de Oviedo, que no sean Castellanos;
mátente con aguijadas, no con lanzas ni con dardos;
con cuchillos cachicuernos, no con puñales dorados;
abarcas traigan calzadas, que no zapatos con lazo;
capas traigan aguaderas, no de contray ni frisado;
con camisones de estopa, no de holanda ni labrados;
caballeros vengan en burras, que no en mulas ni en caballos;
frenos traigan de cordel, que no cueros fogueados.
Mátente por las aradas, que no en villas ni en poblado;
sáquente el corazón por el siniestro costado;
si no dijeres la verdad de lo que te fuere preguntando,
si fuiste ni consentiste en la muerte de tu hermano.—

Jurado había el rey que en tal nunca se ha hallado,
pero allí hablara el rey malamente y enojado:
—Muy mal me conjuras, Cid, Cid, muy mal me has conjurado;
mas hoy me tomas la jura, mañana me besarás la mano.
—Por besar mano de rey no me tengo por honrado,
porque la besó mi padre me tengo por afrentado.
—Vete de mis tierras, Cid, mal caballero probado,
y no vengas más a ellas dende este día en un año.
—Pláceme, dijo el buen Cid, pláceme, dijo, de grado,
tú me destierras por uno, yo me destierro por cuatro.—

Ya se parte el buen Cid, sin al rey besar la mano,
con trescientos caballeros, todos eran hijosdalgo,
todos son hombres mancebos, ninguno no había cano;
todos llevan lanza en puño y el hierro acicalado,
y llevan sendas adargas, con borlas de colorado;
mas no le faltó al buen Cid adonde asentar su campo.


(Anónimo)

*

Bom dia!

(url)


A LUA

de novo. O ar tem a humidade do Outono, a melhor das estações. A caminho.

(url)

29.8.04

(url)


A VER E A LER

o Companhia de Moçambique e o Ma-Schamba que estão a publicar um album de fotografias de Moçambique, feito pelo comerciante José dos Santos Rufino, nos anos vinte. Os textos da Companhia de Moçambique são um muito interessante retrato da nossa história colonial e das pessoas que a fizeram.

(url)



G. H. Davis, Closing Up

(url)


EARLY MORNING BLOGS 296

Artificial Horizon


Thirty-five hundred feet above the earth, I said goodbye
to the heartland with its musk of animals and alfalfa,

to the Coralville Reservoir and its wounded
peregrine falcon with the dusky blue feathers,

to the lattice of pastures interlaced like Celtic spirals,
full of pink-snouted spotted pigs and overflowing corncribs,

to the cemetery with its black angel and tombstones
engraved with contemporary memento mori--

Garfield the cat, a pack of Marlboros, a Corvette--
instead of death's heads and winged cherubs.

We flew farther--saw the golden dome of the Maharishi
levitating and the barges on the Mississippi marking twain.

And hard by my hip, my pilot star, your long fingers
controlled the ailerons, practicing skid and slip,

Touch and go, bank and stall, keeping a steady hand
as we flew beyond the bounds of the artificial horizon.


(Sue Standing )

*

Bom dia!

(url)


VER A NOITE

Hoje a Lua cumpriu o seu dever. De manhã muito cedo, os amadores da "early morning", podem, nos próximos meses, ver as "luzes do Zodíaco", um falso nascer do Sol resultado da poeira dos céus. Mas primeiro esperem que a Lua encolha de novo.

(url)

© José Pacheco Pereira
Site Meter [Powered by Blogger]