Desde há larguíssimas décadas, para não dizer séculos, há em português um conjunto de palavras que querem dizer «default», «by default», etc. Infelizmente, é terminologia dessa gente horrorosa que são os juristas, mas, com tanto termo jurídico que se generalizou a outros usos («usufruir», «ónus da prova», «presunção», «posse»...) , talvez não fizesse mal generalizar mais um. Aliás, este já é usado, por exemplo, na linguística e na gramática (por exemplo, «florescer» é verbo supletivo de «florir», dada a defectividade deste).
Um comando, regra, disposição, solução, comportamento, etc., supletivo é aquele que se segue se nada se estabelecer em contrário. Quando uma coisa está estabelecida by default, está estabelecida supletivamente. Se, abusando do inglês, quisermos falar do «default» para falar de todas as coisas determinadas à partida mas alteráveis, estaremos a falar das «supletividades» (sublinho a tradução do singular para o plural), embora isto, de facto, já seja abusar do inglês. Arranja-se advogado para tantas coisas, não sei por que é que não arranjaram um para resolver esta... :-)
Pedro Múrias (jurista)
*
Deveras interessante os diversos comentários de leitores sobre traduções rascas. E interessante também o "sub-debate", digamos assim, sobre a tradução de 'by default'. Nenhuma das propostas apresentada me convence. A expressão é frequente na informática. Mas, na tradução é por vezes útil reflectir sobre a forma como o mesmo termo é traduzido noutras circunstâncias, por vezes em situações bem diferentes.
Quando duas pessoas se casam devem escolher o regime de casamento: separação de bens, comunhão geral de bens, comunhão de adquiridos, ou uma outra convenção antenupcial. Se nada for estipulado, o regime 'by default' que se aplica é o de comunhão de adquiridos. Em linguajar de direito civil dir-se-ia que a comunhão de adquiridos é o regime supletivo, ou seja, o que se aplica se de outra forma não se estabelecer. As especificações 'by default' na informática são também as que se aplicam se não se estabelecer de outro modo. Ou seja, em português decente, as especificações 'by default' não são mais que especificações supletivas. E é claro que se deve dizer também a impressora supletiva (que não supre a ausência de outras, mas que supre a ausência de outras indicações específicas) -- possivelmente o caso de uso mais frequente do termo.
Agora traduzir "by default" por "por defeito", só mesmo em traduções com defeito.
(PKS)
*
Verdadeira pérola é a tradução efectuada pela versão do video clube ( na altura em voga) do filme do filme Música no coração. Não é que Edlweiss aparecia como "pequeno vício"? ( little vice!!!)
Perante isto....
(Filipe Covas)
*
Diz o senhor Hélder Nascimento o seguinte:
Para quem se ache mais avançado na arte da tradução, pode sempre aventurar-se a criar a legenda "original" em inglês (os episódios quando são transmitidos, na esmagadora maioria, não têm legendas "formais" em inglês, seria como os programas falados em português fossem legendados... em português). Essa "matrix" com o inglês original pode depois servir para outros "tradutores", inclusivamente de outros países, o que sublinha ainda mais o carácter comunitário de toda esta "operação".
É evidente que o senhor Nascimento tem uma audição perfeita.
Permito-me chamar a atenção para este site. Nele se diz que há mais de 9 milhões de pessoas com deficiências auditivas no Reino Unido.
There are over 9 million people in the UK with a hearing difficulty who may be dependent on subtitles in order to enjoy DVDs. This translates into enormous amounts of lost profits for the DVD studios who do not fully subtitle their DVDs, and are missing out on a huge potential market. One of the primary aims of this website is to promote subtitled DVDs by ensuring that subtitle users are able to find subtitled DVDs that they want, and encouraging studios to release more subtitled DVDs.
E em Portugal quantas haverá? Eu conheço várias. Por isso, não consigo entender a frase "seria como os programas falados em português fossem legendados... em português).
(Fernando Correia)
P.S. A propósito de traduções. Na edição portuguesa do livro de Robert Wilson "The vanished hands" (As mãos desaparecidas) diz-se, a determinada altura O Arson era suspeito quando o que está em inglês é Arson was suspected.