ABRUPTO

7.3.04


POEIRA DE 7 DE MARÇO - 2

Hoje , há oitenta e nove anos, Nicolau II deixou o seu palácio de Tsarskoe Selo para Mogilyov, perto da frente de combate. Dias antes, o general Gurko tinha-o avisado de que, a continuar assim, aéreo, distante, alheio ao que se passava à sua volta, “era melhor preparar-se para o cadafalso”. E acrescentara “ a multidão não fará cerimónia”.

Não sei se o czar lançou um último olhar às estátuas do jardim, aos lagos, às grutas, aos pavilhões que os seus predecessores tinham construído, à sala de âmbar, aos estuques azuis e brancos do palácio italiano. Devia haver neve, fazendo absurdos chapéus às divindades das estátuas que Catarina mandou fazer (e que mais tarde o olhar de Akhmatova também amou).

O czar partia e as portas das fábricas metalúrgicas Putilov em Petrogrado, a meia dúzia de quilómetros do palácio, encerravam. A “revolução de Fevereiro” (Fevereiro no calendário juliano, Março no actual) começará amanhã.

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POEIRA DE 7 DE MARÇO

Hoje, há setenta e um anos, Elizabeth Smart passeava num parque. Olhava as pessoas: "Why do people when they go for a walk look at each other?”. Não sabia, mas incomodava-a. Fugiu do olhar, encontrava pares de namorados. Incomodavam-na. Os pardais “were making so much spring noise”. Incomodavam-na. Mais namorados, que pensavam estar sozinhos, debaixo de uma grande árvore, e deparavam com Elizabeth:

"I had to walk all across that long bare path trying to think of other directions to look in besides theirs. Even painful things pass and that did. It was not that they embarrassed me - I was afraid of embarrassing them and having them send unpleasant thought waves after me. `Why did she have to come along them?' `Why can't she get a lover of her own?' Very disconcerting.”

De facto.

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POUCO A POUCO

voltam os sons da Provença: as abelhas primeiro.

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POEIRA DE 7 DE MARÇO

Em breve: outra vez Elizabeth Smart, o czar, e o mais que adiante se verá.

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LUEGO VUELVE EN SI EL ENGAÑADO / ÁNIMO


Hans Thoma

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O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES

Sobre POEIRA de 6 de Março

(...) Isto a propósito do Texas, a bandeira do estado do Texas é a única das 50 bandeiras dos estados que constituem a União (Estados Unidos) que pode figurar ao mesmo nível que a bandeira dos Estados Unidos. Assim num mastro podemos ver no topo a bandeiras do país e a bandeira do Texas, e a um nível inferior a bandeira do estado da California por exemplo.

Foi uma das condições que os texanos impuseram para que o país independente Texas (o único) se integrasse nos Estados Unidos. e os texanos gostam de cultivar este espírito de diferença.

Por cá é comum a bandeira da empresa e do concelho estar ao mesmo nível, ou acima da do país.


(Carlos Pereira da Cruz)

Sobre AS FORMAS ANTIGAS DE SENSIBILIDADE

(...) Ligada a este aspecto mais consumista da cultura está uma mentalidade consumista em relação à própria Vida. Faz parte da cultura popular e atinge transversalmente toda a nossa sociedade ocidental. Antes de continuar, quero só deixar claro que sou uma feroz defensora dos Direitos Humanos e dos princípios da igualdade de oportunidades, mas não é isso que aqui estará em causa.
No entanto, creio que, a esta Declaração de Direitos Humanos que sustenta ideologicamente as democracias actuais, seguem atrelados toda uma série de “direitos” reivindicados por todas as pessoas de todos os quadrantes da nossa sociedade moderna. Um dos direitos que eu acho mais interessante, extraordinário e o mais abrangente é o “Direito à Felicidade” que, sem nunca se saber exactamente o que é, se invoca com uma frequência atordoante. Mas ainda há outros, muitos, sem conta: o direito a viver, o direito a morrer, o direito a ter filhos, o direito à contracepção, o direito a abortar, o direito a ser amado, o direito à educação, o direito à saúde, o direito a ser informado, o direito a ser diferente, o direito a ser famoso e, para não tornar a lista cansativa, termino aqui sem deixar de referir o meu preferido neste caso: o direito à opinião (!).
Todos estes “direitos” têm servido de justificação a diferentes e por vezes bizarros comportamentos, porque nos tempos actuais tudo pode ser esperado e nos é devido, e são eles muitas vezes reveladores daquilo a que JPP tem chamado de sensibilidade moderna que está centrada no indivíduo, na sua realização e satisfação pessoais e, de preferência, de imediato. Esta atitude consumista e urgente face à Vida, é essencialmente egocêntrica e egoísta, perdendo-se o seu carácter transcendental e sagrado que se dilui na correria ao “Direito à Felicidade” (que contém em si todos os outros direitos). Se para a sensibilidade antiga a Vida era parte integrante de um cosmos e fonte de mistério, graça, admiração, revolta, resignação, mas também humildade, pois era sensível às limitações humanas que respeitava, e às que a natureza impunha, hoje, humildade é um conceito em desuso e o que não é dominado, tem que ser alterado, procurando ultrapassar sem questionar, qualquer limite, no frenesim consumista que parece ter-se apoderado da sociedade.
Não imagino Churchil ou Estaline a reivindicarem o “Direito à Felicidade”. Parece-me pois ser uma noção relativamente recente, dos finais do século XX (será que o existencialismo teve alguma coisa a ver com isto?). Creio que é, no entanto, um dos grandes motores da sensibilidade popular moderna tal como a sentimos nos dias de hoje.


(Joana Pereira de Castro)

Sobre POEIRA de 2 de Março

“Tall, bronzed by the Sun, wearing Khaki shorts and tunic, marvellously good-looking… I stood and watched him, spellbound”.

Imaginem o resto.

Não consigo! A vida dos snobs ingleses é um mistério para mim. Será que eles tem orgasmos? Não serão os orgasmos vistos como uma coisa de falta de disciplina, uma concessão aos instintos? Olhando para a Margaret Thatcher não se consegue imaginar coisas eróticas, posições implausíveis, corpos suados, etc., pois não? Ou sou só eu? E a rainha, com aqueles sapatos que parecem uns cacilheiros...


(Filipe Vieira de Castro)

Sobre VER A NOITE

Em Abril/Maio talvez tenhamos direito a um espectáculo único de dois cometas em simultâneo, embora ainda seja cedo para determinar se o brilho dos mesmos será suficiente para tamanho show. Esta é a fonte.

(Albano Ferreira)

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EARLY MORNING BLOGS 154

Desde que viene la rosada Aurora
hasta que el viejo Atlante esconde el día,
lloran mis ojos con igual porfía
su claro sol que otras montañas dora;

y desde que del caos adonde mora
sale la noche perezosa y fría,
hasta que a Venus otra vez envía,
vuelvo a llorar vuestro rigor, señora.

Así que ni la noche me socorre,
ni el día me sosiega y entretiene,
ni hallo medio en extremos tan extraños.

Mi vida va volando, el tiempo corre,
y mientras mi esperanza con vos viene,
callando pasan los ligeros años.


(Lope de Vega)

*

Bom dia!

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Egon Schiele, Nu deitado

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NOTAS SOBRE AS FORMAS ANTIGAS DE SENSIBILIDADE: A TRAIÇÃO

Para uma antologia de textos antigos sobre a traição:

As Aves e o Morcego

Havia guerra travada entre as Aves e outros animais, que, como eram fortes, andavam as Aves maltratadas e vencidas. Temeroso disto, o Morcego passou-se do bando contrário e voava por cima dos animais de quatro pés, posto já de sua parte. Sobreveio a Águia em favor das Aves, e alcançaram vitória. E tomando o Morcego, em castigo de traição, lhe mandaram que andasse sempre pelado e às escuras.

(Esopo, tradução de Manuel Mendes)

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NOVOS DESCOBRIMENTOS: TEMPOS

Olho para Marte. Nesta altura, crepúsculo em Gusev, madrugada em Meridiani.

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6.3.04


VER A NOITE

Se puderem vão lá fora e vejam a Lua magnífica com um planeta em cima. Vale a pena. Agora.

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POEIRA 3 / "I SHALL NEVER SURRENDER OR RETREAT"

Hoje, há cento e sessenta e oito anos, 187 texanos e americanos, morreram na missão fortificada de Alamo em San António, Texas, após terem morto cerca de 1500 mexicanos das forças de Santa Anna. Não escapou ninguém que estivesse dentro da missão a não ser uma mulher, uma criança e um escravo negro. Não foi um combate foi um massacre, mas não foi um massacre foi mesmo um combate. Morreram a combater. Anunciaram que iam morrer a combater. Travis, o comandante, enviou esta última mensagem:

To the People of Texas and all Americans in the World-- Fellow Citizens and Compatriots
I am besieged by a thousand or more of the Mexicans under Santa Anna--I have sustained a continual Bombardment and cannonade for 24 hours and have not lost a man--The enemy has demanded a surrender at discretion, otherwise the garrison are to be put to the sword, if the fort is taken--I have answered the demand with a cannon shot, and our flag still waves proudly from the walls--I shall never surrender or retreat. Then, I call on you in the name of Liberty, of patriotism and everything dear to the American character, to come to our aid with all despatch--The enemy is receiving reinforcements daily and will no doubt increase to three or four thousand in four or five days. If this call is neglected, I am determined to sustain myself as long as possible and die like a soldier who never forgets what is due to his own honor and that of his country--Victory or Death.”


Dentro do forte, na lista dos mortos, está toda a América das fronteiras. Estava Davy Crockett, estavam os aventureiros que viviam da caça, das peles, de guiar os comboios de pioneiros. Estavam os pais dos soldados da guerra civil, dos sulistas de Lee, dos yankees de Grant. Estava a América.

A poeira que caiu, caiu também sobre mim. O fio dessa história foi obviamente o filme de John Wayne, com a ajuda discreta de John Ford. Eu queria ser como eles, como Davy Crockett e os seus Tennessee Mounted Volunteers, queria ser Jim Bowie, queria ser todos os personagens do filme. Também queria ter morrido com um sorriso nos lábios em Álamo, grande como aquelas figuras da épica. Não sei se depois cresci. É suposto.

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POEIRA 2

A propósito da sua "POEIRA" de 6/03, referente a Mendeleïev e à tabela periódica, veio-me à memória uma passagem de um livro do químico Peter Atkins , Galileo's Finger: The Ten Great Ideas of Science, da Oxford University Press, que li recentemente e que transcrevo: "... the periodic table is a portrayal of the solutions of Schrödinger's equation.", pág. 161. É esta a melhor síntese do significado da tabela. No entanto, não deixa de curioso (tanto como recorrente na história da ciência?), o facto da descoberta do "retrato" ter precedido, em mais de meio século, a descoberta do objecto retratado.



Página do Jornal de Química (Zeitschrift für Chemie) onde em 1869 Mendeleïev publicou a sua tabela.

(Filipe Medeiros Rosas)

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POEIRA

Hoje, há cento e trinta e cinco anos, Dimitri Ivanovich Mendeleïev, então com trinta e cinco anos, fez uma conferência na Sociedade Química russa. Redigida numa letra firme e com os arabescos da caligrafia do século, apresentou uma bela imagem da ordem possível do mundo. Mais tarde percebeu que a ordem tinha hiatos e silêncios, lugares vazios na arquitectura das coisas. Refez a sua tabela com esses lugares. Mesmo com alguns desses lugares hoje ocupados, esta é uma das maravilhas do nosso escasso conhecimento das coisas.



Hoje, há cinquenta e nove anos, um inglês de mau feitio, Evelyn Waugh, anotava no seu diário, a propósito de uma carta “ofensiva” escrita por uma mulher católica americana:

I returned it to her husband with the note; `I shall be grateful if you will use whatever disciplinary means are customary in your country to restrain your wife from writing impertinent letters to men she does not know.'

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Tradução do Cântico dos Cãnticos de Renan, edição F.L. Schmied, 1925

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FIM DA LUNA, 106.2 FM, MONTIJO

As coisas que fazemos bem , mesmo quando são simples, escassas de meios, mas no bom sentido, têm uma elevada mortalidade. A rádio Luna, a “rádio calma”, que trazia a Lisboa, à volta de Lisboa, o som mais puro da música clássica, vai acabar. Tantas vezes alternativa à excessiva loquacidade da Antena 2 – tanto se fala naquela rádio! – desaparece sem se perceber com que proveito ou vantagem, a não ser para o negócio das frequências.

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EARLY MORNING BLOGS 153

Agora con la aurora se levanta
mi Luz; agora coge en rico nudo
el hermoso cabello; agora el crudo
pecho ciñe con oro, y la garganta;

agora vuelta al cielo, pura y santa,
las manos y ojos bellos alza, y pudo
dolerse agora de mi mal agudo;
agora incomparable tañe y canta.

Ansí digo y, del dulce error llevado,
presente ante mis ojos la imagino,
y lleno de humildad y amor la adoro;

mas luego vuelve en sí el engañado
ánimo, y conociendo el desatino,
la rienda suelta largamente al lloro.


(Atribuído a Frei Luis de León)

*

Bom dia!

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VER A NOITE

A Lua brilha com uma luz ameaçadora de néon. De repente, sem prevenir, o damasqueiro está coberto de flores brancas. Vai começar a feira das vaidades da natureza. Os tempos perturbantes.

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5.3.04


POEIRA

Hoje, há cento e sessenta e cinco anos, Charlotte Brontë escreveu ao Reverendo Henry Nussey, informando-o de que não aceitava casar com ele. Na carta dizia ao Reverendo que

"I am not the serious, grave, cool-hearted individual you suppose; you would think me romantic and eccentric."

Ou seja, não servia para o Reverendo. Na verdade, achava-o muito aborrecido.

Aborrecida não era certamente Anaïs Nin. Hoje, há setenta e dois anos, Henry Miller escrevia a Anaïs Nin, de uma mesa do Café Chez les Vikings: "I love you....I am in a fever." Acabara de a conhecer.

Hoje, há cinquenta e oito anos, um antigo primeiro-ministro inglês, que ganhara a guerra e perdera as eleições, faz um discurso no Westminster College em Fulton. O velho político, Winston Churchill, partiu uma loiça que ninguém queria então partir. Depois de ter elogiado o “valente povo russo” e afirmado a sua “admiração” pelo “seu camarada da guerra Marechal Staline”, afirmou que iria falar por dever ("It is my duty, however, to place before you certain facts about the present position in Europe.”). Que factos eram esses? Que

de Stettin no Báltico a Trieste no Adriático uma cortina de ferro desceu sobre o continente”.

Atrás dela tinha ficado Varsóvia, Berlim, Praga, Viena, Budapeste, Belgrado, Bucareste e Sofia.

As reacções ao discurso foram frias. Churchill voltava a ser visto, à semelhança de 1939, como um belicista incorrigível.

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John Henry Twachtman, Arques-la-Bataille

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4.3.04


EARLY MORNING BLOGS 152

Apressados, mas dedicados.

École de guerre

Que la vie est ennuyeuse
à cinq heures et demie
de ce petit matin en berne

Les dianes contagieuses
se propagent dans les casernes
comme une douce épidémie

Dieu que ce coq de cuivre est triste
l'ange cycliste
sort de la crèche
pour envoyer mille dépêches

La pauvre Diane s'enroue
dans cette énorme bâtiment
Réveillez-vous frileusement
voyageurs de la Grande Roue


(Jean Cocteau)

*

Bom dia!

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AVIÃO "EUSÉBIO" E AVIÃO "VIANA DA MOTTA"

Recebi muita correspondência sobre a troca dos nomes dos aviões, incluindo esclarecimentos da TAP sobre um novo avião, um A310 que voará nas linhas fora da Europa, que receberá o nome de "Viana da Motta". Estou a organizar esse grupo de correspondência, para o publicar.

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3.3.04


PEREGRINAÇÃO

Agora que começo de novo o que nunca acabo:

The Passionate Man's Pilgrimage

Give me my scallop-shell of quiet,
My staff of faith to walk upon,
My scrip of joy, immortal diet,
My bottle of salvation,
My gown of glory, hope's true gage,
And thus I'll make my pilgrimage.


(Walter Raleigh)

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CULTURA DA DESCULPA

O pior no episódio Ferreira Torres, repetindo o que se passou com uma agressão de João Pinto, com a destruição do balneário em França, e com mil e um incidentes deste género, nem é o que se passa nos campos, exemplos menores, amplificados por terem sido filmados, de uma violência habitual. São as desculpas, é a nuvem de desculpas vindas sempre da mesma gente, políticos, dirigentes desportivos e populares, que são socialmente mais perniciosas do que os actos. A justificação da violência dessas desculpas comunica com a aceitação de outras violências: a violência contra as mulheres, a violência racista, a violência familiar. Elas são parte do mesmo pacote de atitudes sociais.

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POEIRA

Hoje, há trezentos e quarenta e três anos, .Samuel Pepys depois de jantar resolveu ir ao teatro. Em Londres funcionavam vários, pelo que ele tinha escolha. Eram pouco mais que pardieiros, sujos, mal iluminados, e nalguns casos, era difícil sequer ver o que se passava no palco. O primeiro a que foi tinha pouca gente, e desistiu suspeitando que a peça não seria muito boa. O segundo, Salsbury Court, estava cheio. Representava-se “The Queen’s Maske”, uma comédia (?) sobre a guerra de Tróia. Pepys anotou no diário "a good jeer to the old story of the Siege of Troy, making it to be a common country tale." Mas o que verdadeiramente o espantou foi um rapazinho que fazia de Cupido e que era "muito novo". Quanto, não sabemos.

"Then home and to bed." Prazeres simples? Também não sabemos.

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2.3.04


BOA VIAGEM


Rosetta, para o teu cometa frio.

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POEIRA

Hoje, há sessenta e quatro anos, Hermione, Condessa de Ranfurly, uma típica aristocrata aventureira, estava na Palestina. A Condessa era uma recém-casada quando a guerra rebentou. Quando soube do início da guerra, estava a Condessa com o marido, Dan, e o mordomo-criado-cozinheiro Whitaker, e travaram este diálogo absolutamente inglês:

Whitaker - 'To the war my Lord?'

Dan - 'Yes'.

Whitaker - 'Very good, my Lord.”

Como se Dan tivesse pedido um café”, comentou a Condessa no seu diário.

Hermione seguiu o seu marido para a Palestina, o que não era muito comum para as mulheres de oficiais, e só se conseguia forçando as autoridades militares. A Condessa fez tudo para lá chegar, e hoje chegou. De repente, quando menos esperava, vê o marido e não poupa as palavras:

“Tall, bronzed by the Sun, wearing Khaki shorts and tunic, marvellously good-looking… I stood and watched him, spellbound”.

Imaginem o resto.

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CAMINANTE VIEJO / QUE NO CORTAS LAS FLORES DEL CAMINO


Hans Thoma

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EARLY MORNING BLOGS 151

Me dijo un alba de la primavera:
Yo florecí en tu corazón sombrío
ha muchos años, caminante viejo
que no cortas las flores del camino.

Tu corazón de sombra, ¿acaso guarda
el viejo aroma de mis viejos lirios?
¿Perfuman aún mis rosas la alba frente
del hada de tu sueño adamantino?

Respondí a la mañana:
Sólo tienen cristal los sueños míos.
Yo no conozco el hada de mis sueños;
ni sé si está mi corazón florido.

Pero si aguardas la mañana pura
que ha de romper el vaso cristalino,
quizás el hada te dará tus rosas,
mi corazón tus lirios.


(Antonio Machado)

*

Bom dia!

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ESTÁ TUDO DOIDO?

Não sabia, vim agora a saber por uma referência de Medeiros Ferreira, que o avião da TAP que tinha o nome de “Viana da Motta” foi rebaptizado “Eusébio”. Já não há vergonha nenhuma, ou está tudo doido? Eu bem sei que neste país de trituradora já ninguém sabe quem foi Viana da Motta, um dos últimos alunos de Liszt, grande pianista e razoável compositor, que marcou como “mestre” na sua arte toda uma geração de músicos portugueses. Como muitos grandes pianistas anteriores às técnicas modernas de gravação, a qualidade da sua execução só existe na memória dos testemunhos e relatos da época, mas o homem existiu, não existiu? A Luísa Todi também existiu, não existiu?
Pobre país que não se respeita a si próprio.

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VER A NOITE

Está uma noite muito fria, e o frio tem uma transparência essencial. A Lua já manda em tudo, com um brilho de néon. Contei cerca de 100 estrelas visíveis em três quartos de horizonte. Muito pouco. Alguns planetas muito brilhantes. Mas talvez o catálogo das constelações tenha sido feito num céu destes e não no esplendor dos milhares de luzes, porque as constelações estão reduzidas ao essencial, à sua forma, à sua simplicidade. Escorpião, Orionte, a Ursa Maior, rodam pouco a pouco na sua ficção de movimento. Por onde começo? Por onde acabo?

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1.3.04



Carl Spitzweg

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POEIRA

Muita poeira, muito gesto perdido, muita palavra completamente gasta, muita insensata convicção adâmica.

Tolstoy, por exemplo, hoje, há cento e cinquenta e três anos, escreveu no seu diário:

“Regra. Em circunstâncias difíceis, actuar sempre com base nas primeiras impressões.”

Nunca actuou. Era ingénuo e calculista, uma mistura complicada.

Melhor fez, hoje, há setenta e nove anos, em Paris, Anaïs Nin. Anaïs passeava com Hugh Guiller no Bois. Começou a chover. Mães, criancinhas, criadas, amas, namorados, tudo fugiu. Hugh disse-lhe: “I’m Scottish, I love to walk in the rain”. Anaïs disse: “Também eu.” Continuou a chover e parou de chover, caiu uma neblina. Alugaram um barco e foram ao pequeno restaurante da ilha, que está no meio do lago. Pediram chocolate e bolos. “Before us stretched brilliant wet grass and mist-enveloped trees, from which come the cooing and twittering of birds.” Choveu outra vez, a água do lago ficou negra, atravessada apenas pela brancura dos cisnes. “We dreamed together”.

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CADERNOS DE CAMUS

Em actualização.

ESTUDOS SOBRE COMUNISMO

A actualizar em breve.

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AS LEIS QUE NÃO SÃO PARA TODOS

Porque é que um arruaceiro e um hooligan que faz as coisas que Ferreira Torres, presidente da CM do Marco e membro do Senado do PP (o órgão apresentado com pompa no último Congresso, para as autoridades “morais” do partido), fez diante de toda a gente, incluindo agressões físicas a pessoas, tentativa de destruição de bens, etc., em público, resistindo à autoridade, não foi imediatamente preso pelos guardas que o agarraram? Aqui está uma pergunta a fazer ao MAI. É um bom teste sobre a bondade da atitude dura do Governo face à violência no desporto.

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A HISTÓRIA CENSURADA DA TSF

Foi ainda com alguma surpresa – a gente mantém um resto de ingenuidade que se recusa a ir embora - que pude ver no disco comemorativo dos 16 anos da TSF, ontem distribuído pelo Diário de Notícias, que o Flashback, desaparecera do mapa. Há uma faixa 13 com o título “TSF: Cadeia Nacional, Flashback, Exame, Grande Júri, Fórum”, cujo título é enganador. A não ser que o meu disco esteja estragado, do Flashback há um excerto da introdução sonora sem uma palavra sequer acerca do que se trata, contrastando como o spot seguinte sobre Marcelo. A sistemática omissão da história da TSF de tudo o que de significativo diga respeito a Carlos Andrade é também reveladora duma infinita pequenez.

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EARLY MORNING BLOGS 150

Quando o mundo era simples, falava-se assim, pela manhã :


Al alba venid, buen amigo,
al alba venid.

Amigo el que yo más quería,
venid al alba del día.

Amigo el que yo más amaba,
venid a la luz del alba.

Venid a la luz del día,
non traigáis compañía.

Venid a la luz del alba,
non traigáis gran compaña.


*

Bom dia!

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© José Pacheco Pereira
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