ABRUPTO

31.3.09


ÍNDICE DO SITUACIONISMO (84): DOIS MUNDOS


A questão do situacionismo não é de conspiração, é de respiração.
E, nalguns casos, de respiração assistida.

Não posso deixar de chamar a sua atenção sobre a forma como os noticiários da noite abriram hoje. Veja : RTP / SIC . Nem parece que se estão a referir ao mesmo assunto, não é?

(Miguel)

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EARLY MORNING BLOGS

1523 - The Coming Of Wisdom With Time

Though leaves are many, the root is one;
Through all the lying days of my youth
I swayed my leaves and flowers in the sun;
Now I may wither into the truth.

(William Butler Yeats)

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30.3.09

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DIÁRIO DO BAIRRO SOCIAL SÃO JOÃO DE DEUS







(Sandra Bernardo)

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ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE



Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)



S. Lázaro em Amarante e arte no infantário "O Miúdo! (Helder Barros)



Nascentes do rio Anços, perto da Redinha, Pombal. (Vítor Xavier)

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ÍNDICE DO SITUACIONISMO (83):
EM MOMENTOS DE CRISE NEM SEQUER SE DISFARÇA, O QUE CONTA SÃO OS RESULTADOS DA PROPAGANDA


A questão do situacionismo não é de conspiração, é de respiração.
E, nalguns casos, de respiração assistida.

A RTP continua como sempre, mas é ainda mais "como sempre" quando as coisas apertam para o governo. O caso Freeport só entra nos noticiários quando não se pode de todo evitar, ou quando há alguma coisa favorável ao Primeiro-ministro. Então aí, todos os meios, grafismos, reportagens, entrevistas, tudo é mobilizado. Fora dessas alturas, mutismo completo. Os noticiários de ontem e hoje são puros exercícios de distracção. Toneladas de histórias de "interesse humano", doenças, trivialidades, tudo menos aquilo que está no centro da vida pública. Não é por desinteresse da política, bem pelo contrário, porque o julgamento de Isaltino de Morais mobiliza todos os meios, inclusive directos, e as "boas" medidas do Governo abrem os noticiários (hoje, por exemplo), mas sim porque o que há são "campanhas negras" que não convém ao "serviço público". Repito a pergunta de ontem: haverá na redacção da RTP um único jornalista a fazer o que os jornalistas devem fazer sobre o caso Freeport? A investigar? Se há, ou está no exílio ou é censurado.

E, de resto, o habitual: mais um "momento-Chávez" a propósito da "requalificação das escolas", o soundbite que o Primeiro-ministro escolheu para a sessão de propaganda do dia, e que, obediente, a RTP cobre com todo o respeito. Veja-se toda a peça porque vale a pena, com o jornalista a repetir, como se fossem seus, os slogans governamentais do dia, sem um átomo de distanciação, sem vergonha. Não vão por mim, verifiquem quando a RTP colocar em linha a peça, dia 30 de Março, aos 26 minutos do noticiário das 13 horas, a peça de propaganda.

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A SEIS ANOS DE FALIR, LÁ VAMOS CANTANDO E RINDO



Eu suspeito que os portuenses entendem melhor Lisboa do que os lisboetas o Porto. Mas devo estar errado. Eu, pelo menos, não entendo, entendo pouco. Lisboa parece-me demasiado distraída, demasiado normal, a pouco mais de cinco ou seis anos de o país entrar em bancarrota, se tudo continuar como está. Os economistas explicam - saber de economista, ou seja, matéria de muita prudência - que, por volta de 2014/2015, deixamos de ter dinheiro para pagar as nossas dívidas, e ninguém parece especialmente preocupado.
Só para que não se diga que tudo se explica pela "crise" de fora, como quer a propaganda do governo, cito o que escrevi debaixo deste mesmo Titanic e desta mesma evocação do hino da Mocidade, em Maio (despedimentos) e Julho de 2006:
(...) Lá por Outubro, com as primeiras chuvas, com os meninos a ir para a escola, os engarrafamentos, a insuportável banalidade do dia a dia, a bolsa a apertar, as dívidas para pagar, como acontece sempre estas euforias vão azedar-se em múltiplas irritações. E como é que podia deixar de ser assim? O que é que construímos para ser diferente? Onde é que trabalhámos para ter mais? Onde é que poupámos para os dias maus? O que é que aprendemos para nos melhorarmos? Para onde foi o tempo? A culpa será certamente dos "políticos", como é costume.

Volto à minha velha imagem: parece o Titanic, com a orquestra a tocar e a maioria dos viajantes convencida de que é mais um concerto, mais um jogo, mais um Rock in Rio, tudo está bem, curte-se esta cena boa, amanhã se verá. Mais uma cerveja, mais um cachecol, mais uma bandeira, mais um "às armas" que "nós até os comemos!". E a água gelada a subir no porão, atingindo primeiro os da "terceira classe", mas subindo sempre. Sempre.
Todos os dias parecem normais, no centro da cidade que só é branca vista de longe. O sol cumpre o seu dever português em vésperas do Avril au Portugal. Os dias estão já mais quentes do que tépidos. O trânsito parece ter crescido. Violando mesmo as regras que qualquer taxista explica sobre o "princípio" e o "fim do mês" enquanto explicação da relação entre o número de carros e o dinheiro no bolso. Pensando bem, por este indicador, deve haver muito dinheiro nos bolsos, só que não aparece nas estatísticas. As obras por todo o lado entopem a cidade, embora não se veja muita gente trabalhar nelas. Há tapumes, ruas meio cortadas, desvios. Mas as pessoas que passam, os carros que passam, tudo parece o mesmo. Devia haver algum traço invisível que mostrasse a crise, mas não aparece em lado nenhum. Ou então, o mais provável, eu não o vejo.

De onde vem esta agitação? As fábricas estão do lado de lá, ou na corda do Tejo. Aqui só há fábricas de papel, escritórios, repartições, Lisboa é uma cidade terciária, há muito funcionário público, e esses ainda escapam à crise. Não há fábricas, por isso não há desemprego visível. Não é Mangualde, ou o Vale do Ave. Não é o Porto, ou Braga. Não é Setúbal. Tem crise, mas vê-se menos. Escrevo, enquanto atravesso a Baixa, à procura, como David Attenborough, do animal da crise, um ilusivo animal na fauna urbana de Lisboa. Mas se a selva dele não é esta, deve estar mais longe. Em Telheiras, em Alcântara, em Xabregas, nos Olivais? Pode ser, mas deve descer à Baixa de vez em quando.

Nem sei bem se se pode falar de uma Baixa de Lisboa, o caminho que faço entre os Restauradores e o Chiado ou vice-versa. Não tem verdadeiras ruas sem carros, para peões, mas tem uma coisa mista que parece ter sido inventada para prejudicar a todos. Não serve nem os carros, nem os peões. Os parques de estacionamento não devem cumprir qualquer regra, porque os malabarismos que são necessários para entrar em alguns significam que, em caso de necessidade, quem entra não sai. Em particular, para os lados do Chiado e do Largo da Misericórdia, há parques que parecem uma demonstração concreta de que não há lei nem ordem na cidade há muito tempo. Como em muitos sítios do país, como é que se pode entender que haja locais destes a funcionar, violando todas as regras, sem que não se pense em grossa incompetência ou em corrupção? Bom, mas estamos na cidade, há aqui mais dinheiro, logo mais ganância, mais corrupção, marcada a traços de inúmeras tintas nas curvas apertadas dos parques.

Há agitação, agora que a Primavera soltou os seus cães de guerra. Os restaurantes parecem todos cheios ao almoço, a crise deve ser mais para a noite. Por razões que me fazem descrer da qualidade do nosso turismo, as personagens que falam línguas e estão nas esplanadas da Baixa, nem brasseries, nem cervejarias, nem cafés, mas uma espécie de restaurantes de quinta categoria, não se importam de coabitar com o lixo e com o fumo dos carros e autocarros que passam a um metro de distância. Tudo muito mau, mesmo muito mau, com as excepções para confirmar a regra. Estamos no Rossio, e eu suspeito de que mesmo no Martim Moniz deve ser melhor, só que sem turistas.

Claro que as razões porque "desço" à Baixa justificam a volta. O que eu procuro, há. Atrasadas, mas ainda chegando, vêm as revistas estrangeiras distribuídas nos quiosques. Há a Foreign Affairs, a Vanity Fair, a Esquire, a Atlantic, o Spectator, o PC Magazine, a Art in America. Mas será impressão minha ou a maioria das revistas de arte, arquitectura, moda, barcos e aviões, continuam lá no mesmo sítio, com os mesmos exemplares, à espera da devolução? Parecem ficar mais revistas na secção dos computadores, uma secção mais popular do que body building, há mais sobras nas revistas de alta fidelidade, há mais gente a ler sem comprar. Talvez seja a crise diante da bancada das Evasões, embora duvide que tenha chegado à Nova Gente. Pelo menos, o dr. Mário Soares deve continuar a comprar o Nouvel Observateur, pelo que ao menos um exemplar em Portugal deve vender-se. Mas ainda há quem compre o L'Express? Duvido. Ou o Le Point? Meia dúzia de velhos altermondialistas e os deputados "alegristas" devem ler o Le Monde Diplomatique. Mas essa é outra crise.

Livros? O alimento do meu monstro interior? Sim, continua a haver. A FNAC cumpre o seu dever de mostrar quilómetros de nulidades, mas a culpa é dos milhares de títulos nulos que se publicam. Nem paro nesta secção do papel pintado, os romances lusos e estrangeiros traduzidos, com capas cada vez mais iguais e conteúdos que não conto nunca ler. Pelo meio, a FNAC, tem umas idiossincrasias esquisitas. Muito Zizek, que está na moda entre os leitores do Le Monde Diplomatique, e uma tendência bizarra para fazer escaparates dedicados a uma personagem muito secundária da história do século XX, Che Guevara.

No sítio dos computadores o declínio dos desktops (os meus favoritos) atira-os para um canto, meia dúzia de modelos, sem renovação e inovação. Cada vez menos jogos decentes para computador em detrimento das consolas, efeito da pirataria. E cada vez menos software, resultado do mesmo efeito. O que há de menos nos computadores cresce nos vídeos de filmes, e, em particular, de séries televisivas.

Eu sei que os meus interesses são muito especializados e não ouso falar de lojas de tecidos, sapatarias, ourivesarias, cerâmica, ou mesmo a ocasional florista. Mas o café que George Clooney propagandeia, que não é para os pobres e que só se encontra em lojas exclusivas, está sempre cheio e tem que se tirar senhas como na Loja do Cidadão. Já o resto do pequeno comércio deve arrastar-se com todas as dificuldades, por detrás daquelas vitrinas intemporais. Só que a maioria das lojas da Baixa já parecem estar fora do mundo há muito tempo. Se há crise ela já chegou há muito tempo, com as grandes superfícies comerciais. Aquilo já é póstumo há muito tempo.

Na Baixa há mendigos sofisticados, punks nacionais, e literatos loucos que vendem poemas à peça ou tocam pandeiretas. Os mendigos habituais parecem os mendigos habituais, uma mistura dos velhos pedintes que sempre tivemos, à porta da igreja, num canto que ocupam há muitos anos. Depois há os romenos, ciganos romenos, profissionais da mendicidade que povoam todas as cidades europeias. Mas mesmo esses devem ser menos, cortesia do SEF. Não, não há mais mendicidade, nem, pensando bem, seria ali que ela se revelaria. Talvez para os lados do Intendente, ou pelos lados de Santa Apolónia, onde tudo continua na mesma.

É provável que o último sítio onde chegará a crise seja a Baixa de Lisboa, partindo do princípio de que aquilo que chega à Quinta da Marinha ou aos novos condomínios de luxo dificilmente se pode chamar crise. Mais ano menos ano, a continuar assim, um dia acordamos ainda mais pobres do que já somos, sem o saber. Nesse dia ficamos a saber como somos pobres e como, pelo facto de o sabermos, ainda mais pobres ficamos. Nesse dia chegará a crise à Baixa de Lisboa, e, na pior das hipóteses, sob forma ateniense. Não da Atenas de Péricles, mas da de 2008-9, a que arde.

(Versão do Público de 28 de Março de 2009.)

*
Fez, na versão mais completa que colocou hoje no Abrupto do seu último artigo do jornal Público, uma referência à orquestra do Titanic, que continuava a tocar enquanto o navio se afundava. É bastante corrente usar-se esta imagem como um paradigma de comportamento fútil e superficial no meio de uma catástrofe. Mas é um erro, pois é uma caricatura extremamente injusta de um dos maiores exemplos de coragem e de altruísmo de que tenho conhecimento.

Começo por corrigir um erro: não havia qualquer orquestra a bordo do Titanic. Havia, isso sim, dois agrupamentos musicais: o quinteto de Wallace Hartley e um trio de cordas. Nunca tocaram juntos a não ser na noite do desastre. E o que os levou a tocarem nessa ocasião, por sua própria iniciativa, foi o desejo de tentarem acalmar os passageiros enquanto estes tentavam arranjar lugar nos salva-vidas. Ao fazê-lo, perderam a possibilidade de eles próprios se salvarem. Com efeito, nenhum sobreviveu ao desastre. Um jornalista da época, ao descrever o naufrágio, escreveu que «o papel desempenhado pela orquestra a bordo do Titanic nos seus últimos e tenebrosos momentos ficará registado entre os maiores actos de heroísmo no mar».

O corpo de Wallace Hartley viria a ser encontrado mais tarde. Mais de trinta mil pessoas prestaram-lhe as últimas homenagens pelo seu acto heróico e, mais tarde, este monumento foi erigido em memória do que fizeram aqueles músicos.

(José Carlos Santos)

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EARLY MORNING BLOGS

1522 - The Power of Armies Is a Visible Thing

The power of Armies is a visible thing,
Formal, and circumscribed in time and space;
But who the limits of that power shall trace
Which a brave People into light can bring

Or hide, at will,--for freedom combating
By just revenge inflamed? No foot may chase,
No eye can follow, to a fatal place
That power, that spirit, whether on the wing

Like the strong wind, or sleeping like the wind
Within its awful caves.--From year to year
Springs this indigenous produce far and near;

No craft this subtle element can bind,
Rising like water from the soil, to find
In every nook a lip that it may cheer.

(William Wordsworth)

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29.3.09

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ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE



Santuário de Nª.Sra.dos Remédios, durante a Semana Santa, em Lamego. (Gil Regueiro)



S. Amaro e os seu fiéis pelas ruas.



Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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COISAS DA SÁBADO: O MUNDO DO HARRY POTTER



(Primeiro, segundo, terceiro, e quarto.)

Parece o Harry Potter? É o Harry Potter. O mundo do Parecer para Aparecer tem tanta correlação com o Mundo-do-Ser como a magia com a física. Enquanto andamos distraídos e iludidos, enganados ou acomodados, vai funcionando. No dia em que a varinha perde a mágica ou o Ser é tão duro e áspero que não há Aparecer que valha, as coisas caem como um castelo de cartas. Ou uma ilusão. Os mais velhos já conheceram um tempo assim, quando havia um mago simpático, que falava muito bem, especialista em “descomprimir” e um cardeal ex-comunista distribuindo dinheiro a rodos e que deixaram o país estragado para muitos e bons anos. Na altura era só loas.

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ÍNDICE DO SITUACIONISMO (82):
UM GRUPO DE INTERESSES QUE INTERESSA AOS JORNALISTAS



A questão do situacionismo não é de conspiração, é de respiração.
E, nalguns casos, de respiração assistida.


No Correio da Manhã a notícia é esta:
A presidente do PSD, Manuela Ferreira Leite, voltou ontem a insistir na criação de um fundo de emergência social para apoiar as instituições que estão a acudir às situações de carência originadas pela crise.
No Público a notícia é esta:
Ferreira Leite fala em sucessão de factos no caso Freeport e pede esclarecimento rápido.
No Diário de Notícias a "notícia" é esta:
Manuela Ferreira Leite queixou-se de não ser ouvida pelo País, num momento em que o corre de lés a lés em numerosas iniciativas. Os polítólogos consultados pelo DN dizem que ela continua a rejeitar as regras do espaço mediático e que concorre com uma hiperprofissional máquina de José Sócrates.
O artigo é mais um artigo de ego e eco, o enésimo vindo no Diário de Notícias, cuja conclusão só pode ser "contrate uma agência de comunicação", subordine-se às "regras do espaço mediático", porque sem isso não existe em política, nem nós a deixamos existir. Pague a portagem, se faz favor, torne-se igual aos outros, se faz favor.

(NOTA: jornais lidos apenas na Rede.)

ADENDA: Por gentileza de um leitor recebi a página em papel. Ainda é mais nítida a não-notícia:

Clicar para ampliar.


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EARLY MORNING BLOGS

1521 - The Conjuror

Arriving early at the cemetery
For 'the one o'clock, we looked around
At the last sparks of other people's grief,
The flowers fading back into the ground.

A card inscribed 'With reverent sympathy
From the Magicians' Club' was propped against
A top hat made of blossoms and a wand
Tied with a black velvet bow. We sensed

The rabbits and the ladies sawn in half
One blink away from being visible
Although the quick deceiving hand was changing
To flyaway dust under a ton of soil.

The funeral that we came for turned the corner.
They had been right to think the world of you,
Who conjured up for us, a hearse approaching,
An interest in life. Bravo. Bravo.

(Patricia Beer)

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28.3.09

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ÍNDICE DO SITUACIONISMO (81):
MENOS DE 4 MINUTOS PORQUE AS NOTÍCIAS QUE OS OUTROS DÃO NADA VALEM



A questão do situacionismo não é de conspiração, é de respiração.
E, nalguns casos, de respiração assistida.

Onde? Na RTP pois claro. Os telespectadores da televisão pública não têm direito a ver nenhuma parte significativa da gravação da TVI, apenas um excerto anódino, e têm apenas acesso a uma sucessão de peças com uma orientação evidente: nada aconteceu, nada se passa a não ser calúnias ao Primeiro-ministro, a gravação do DVD de nada "serve" porque a justiça portuguesa nem a quer ver (imagens da procuradora Cândida a dizer isso), e por aí adiante. Tudo em menos de 4 minutos. Será que a RTP tem na sua imensa redacção algum jornalista a investigar o caso Freeport, ou só se trata do caso por reacção? Seria muito estranho, dado que o interesse jornalístico é impossível de negar. Ou é proibido investigar o caso Freeport na RTP?

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COISAS DA SÁBADO: A AGENDA DO APARECER

(Primeiro, segundo e terceiro.)

O programa dos teóricos do Parecer é simples, trata-se todos os dias de garantir o Aparecer com a agenda preconcebida do Parecer. Na RTP não é difícil, nas outras já é mais complicado. Mas que jornalista terá a ousadia de ignorar a “agenda do Primeiro-ministro” , que todos dias vai a uma escola para prometer uma obra, vai ao Parlamento anunciar uma medida, vai a uma fábrica ver uma máquina maravilhosa, vai ao esplendor de um vale de rio póstumo erguer com os dedos uma barragem, passeia entre patrões e sindicalistas prometendo milhões? Os tenebrosos representantes do mal dizem que nove décimos disto são anúncios, promessas, promessas feitas pela segunda e terceira vez como se fossem novas, são enganos embrulhados em marketing, são técnicas de Parecer para Aparecer. E dizem que o que sobra, e poderia ser útil, é caótico, pouco coerente e feito sem cuidado.

(Continua.)

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ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE



Agora.

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A propósito da chamada "mega-operação" policial de ontem, dois dias depois dos graves números (parte deles, porque ainda não se sabem todos) do Relatório de Segurança Interna, lembro um padrão típico da "comunicação" deste governo: fazer muito show off para as câmaras da RTP a seguir a um evidente mau resultado da sua política. No dia 6 de Setembro de 2008, foi o mesmo:
Estava-se em pleno apogeu de notícias sobre a criminalidade violenta e o MAI tinha metido os pés pelas mãos nas entrevistas dos dias anteriores. Uma operação espectacular apresentada como sendo de resposta à criminalidade violenta, convenientemente acompanhada por tudo o que é jornalista (o que diz muito sobre a sua confidencialidade), punha na rua centenas de polícias, GNR, carros e helicópteros. Na verdade, o que se estava a passar tinha bem pouco a ver com a criminalidade violenta, era apenas uma gigantesca operação stop, dando os resultados que se esperam de uma operação stop: condução com excesso de álcool, doses de droga para consumo, meia dúzia de armas brancas. O puxar de todos os recursos para essa operação dava aliás uma excelente oportunidade ao crime, visto que o policiamento, já de si escasso, de muito do país, ficou ainda mais ausente. Mas era preciso fazer o show e o show foi feito. Não terá continuidade, porque não há recursos e a sua eficácia é limitada a crimes menores, mas passa bem na televisão.

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COISAS DA SÁBADO: O BEM CONTRA A “MALEDICÊNCIA”

(Primeiro e segundo.)

O nosso mago principal é especialista. Vejamos a sua ordem de trabalhos no Parecer para Aparecer. Parecer que se zela dia e noite pelo bem estar do Reino. Parecer que se está a fazer muita coisa boa e nenhuma má. Parecer que todas as “forças vivas” do Reino estão ordeiras atrás do Primeiro-ministro, e que, fora da luz radiosa que emana, só há trevas e danação. Parecer que tudo o que corre mal vem de lá de fora ou dos inimigos de dentro, sem nenhuma responsabilidade própria. Parecer que se o país não tivesse a “crise” que vem de fora, havia 150.000 empregos, crescimento fulgurante, finanças sadias, felicidade social ímpar. Parecer que tudo o que entrava este caminho glorioso é contra o Reino e o seu Povo. Fora de nós não há salvação. Fora de nós o caos. Fora de nós, apenas a intriga, a maledicência, a incompetência, a ignorância, a birra, os pequenos interesses, a confusão.

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ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE


Cerejeiras em flor na encosta da Serra da Gardunha (Fundão). (Eduardo Saraiva)



Vento. (ana)



Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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COISAS DA SÁBADO: PARECER PARA APARECER E APARECER PARA PARECER

(Primeiro)

O que conta é Aparecer para Parecer. Aí, não há joelho, trabalha-se a sério e a custos bem caros com os melhores especialistas na matéria. Discute-se o que se deve dizer, como se deve dizer, onde se deve dizer e quem o deve dizer, quase sempre o mago principal, outras vezes, o mago que tutela o Aparecer, outras vezes, o pequeno mago porta-voz da confraria que vive no castelo. E parte-se para o dia com uma frase assassina, ou uma acusação sem réplica, ou um inuendo, ou uma sugestão de falsidade, ou uma omissão de verdade.


Salazar tinha explicado isto há muito tempo, antes de haver marketing, - “em política o que parece é” - quando só havia propaganda e esta era considerada uma tarefa positiva para os governos. Havia até um Secretariado de Propaganda Nacional (SPN) que mudou o nome para Secretariado Nacional de Informação (SNI). Agora também se é salazarista nestas coisas, mas não se lhe dá o nome de propaganda, mas de “comunicação”.

(Continua.)

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EARLY MORNING BLOGS

1520 - Gus: The Theatre Cat (fragmento)

`I have played', so he says, `every possible part,
And I used to know seventy speeches by heart.
I'd extemporize back-chat, I knew how to gag,
And I know how to let the cat out of the bag.
I knew how to act with my back and my tail;
With an hour of rehearsal, I never could fail.
I'd a voice that would soften the hardest of hearts,
Whether I took the lead, or in character parts.
I have sat by the bedside of poor Little Nell;
When the Curfew was rung, then I swung on the bell.
In the Pantomime season I never fell flat
And I once understudied Dick Whittington's Cat.
But my grandest creation, as history will tell,
Was Firefrorefiddle, the Fiend of the Fell.'

(T. S. Eliot)

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27.3.09


COISAS DA SÁBADO: O MUNDO-QUE- PARECE E O MUNDO-QUE-APARECE

Vivemos no Mundo-que-Parece que mantém uma relação espelhar com o Mundo-que-Aparece. Ou seja, é porque Aparece que Parece. Se eu fosse filósofo alemão, haveria que encontrar aquelas magníficas palavras compostas que permitem criar um termo para cada pequena nuance das coisas e dar-lhe a dignidade de um conceito teórico. Assim não, estamos condenados a remendar as palavras com hífens e ainda por cima ter que as explicar sem hífenes.

O Mundo-que-Aparece é o que Aparece na televisão. Não é o mesmo na RTP, na SIC, na TVI, embora tenha pontos de contacto entre si. A RTP tem uma Ordem, pertence às forças da Ordem, a SIC está no meio, a TVI é uma emanação diabólica da Desordem. Os magos do Parece produzem todos um evento para Aparecer todos os dias. Na agenda do mago principal, o nosso Primeiro-ministro, está marcado com uma estrela o momento da declaração do dia, preparada por ele e pelos magos acessórios, com um cuidado que não parece abundar em todas as outras coisas, a começar pela governação. Aí eles usam a cabeça toda, na governação tem uma tendência para usar mais o joelho, para fazer as coisas no joelho.

Vejam o Magalhães. Tudo feito sobre o joelho. Vejam o magnífico anúncio da energia das marés que teve direito a barco de guerra. Em terra, avariado, e parece que definitivamente. Vejam os painéis solares que o mago principal e a sua comitiva propagandearam esta mesma semana e que são apenas “uma bomba de calor accionada a electricidade com apoio secundário em energia solar e não de um painel solar térmico”. "A pretexto de vender energia solar, [a Energie] vende mais electricidade", diz um especialista a propósito da fábrica visitada pelo Primeiro-ministro. Todos os dias é isto. Já o disse, há muito que não se governa em Portugal, é tudo arranques e travagens, medidas avulsas e muito, muito engano.

(Continua.)

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ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE







Londres. (Vitor Magalhães)



Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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ÍNDICE DO SITUACIONISMO (80):
SÓ SE ABRE COM O CASO FREEPORT QUANDO A "NOTÍCIA" É FAVORÁVEL AO PRIMEIRO-MINISTRO.


A questão do situacionismo não é de conspiração, é de respiração.
E, nalguns casos, de respiração assistida.

A RTP tratou o artigo do bastonário da Ordem dos Advogados (que, em bom rigor, nada tem de novo em relação ao que já se sabe há vários anos e representa apenas uma reciclagem dos dados do processo que condenou um agente da Judiciária) como notícia de primeira página, com tratamento gráfico e uma longa entrevista ao próprio. Não acrescentou nada do que já se sabia sobre os eventos descritos pelo Bastonário, como se dele fosse a última palavra e interpretação, de que tudo se reduz a uma carta anónima, e tal pudesse ser sustentado com os factos que já se conhecem. O resultado é o de mais uma vez dizer-nos que foi tudo uma "campanha negra", tese que a RTP assume nas suas notícias com frequência. Nada teria contra esta primeira página no noticiário, se fosse uma prática habitual da RTP sempre que há novidades no caso Freeport. Só que nunca é. Agora foi.

ADENDA: Só que, por azar, o muito atacado Jornal Nacional da TVI abriu com a gravação do DVD em que Charles Smith acusa Sócrates de ser "corrupto", de viva voz, e explica os passos da "corrupção". Vale o que vale, mas como notícia vale muito. (Ferro Rodrigues e Jaime Gama mal foram acusados no caso Casa Pia processaram de imediato os seus acusadores. Vou contar os minutos até que Sócrates faça o mesmo a Charles Smith). No Público e no Diário de Notícias online já está, e bem, uma síntese do que a TVI revelou, obedecendo a critérios jornalísticos indiscutíveis. Na RTP ainda esperei que alguma coisa fosse dita sobre a notícia da TVI, já que se estava a falar do Freeport. Só silêncio.

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© José Pacheco Pereira
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