ABRUPTO

30.11.10

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29.11.10

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O MUNDO DAS GRANDES LIVRARIAS AMERICANAS


Uma grande livraria americana é um mundo muito próprio e pouco semelhante ao das livrarias europeias. O “grande” aqui significa grande em espaço, não necessariamente em qualidade, embora essa relação exista. Refiro-me ao modo como o espaço interior é organizado e a um “espírito” da livraria diferente, a começar pelo modo como ela é “habitada” pelos seus leitores. Trato essencialmente de cadeias de livrarias, mais ou menos estandardizadas, e nessas cadeias à principal livraria em espaço urbano e não às mais pequenas filiais. Também não me refiro aqui às livrarias mais pequenas, cuja identidade vem de muitos outros factores, nem aquelas que vendem livros usadas, mesmo não sendo alfarrabistas.

De facto, o espaço conta. Uma Barnes and Noble, uma Borders, são mesmo grandes, embora aí não esteja a diferença essencial com outras grandes livrarias europeias, como por exemplo, a Waterstones de Londres, ou as FNACs de Paris, Madrid ou Lisboa, que tem também muito espaço mas outro “espírito”. Isso não significa que não haja também nos EUA livrarias europeias, mesmo onde menos se espera. Por exemplo, a grande livraria da Coop de Harvard é muito europeia, mais parecida com as livrarias de Oxford e algumas de Londres, do que com uma Barnes and Noble.

O espaço de entrada é fundamental. De um modo geral, as livrarias americanas valorizam o espaço inicial, o espaço de entrada, com grandes expositores. O papel dos expositores é mais importante numa livraria do que as estantes, porque o grosso dos livros comprados por um flâneur de livrarias são os que estão expostos. Às estantes vai quem quer um livro muito preciso e é cada vez mais difícil ver as secções e subsecções de uma zona devido ao crescente número de livros. Por exemplo, uma secção de “current affairs”, assuntos correntes, política viva, encontra muito dificilmente uma ordem natural para quem procura. A organização por ordem alfabética é sempre pior para um flâneur do que a temática, embora para uma procura de um determinado livro seja pior. Por exemplo, querendo livros sobre os “terceiros partidos”, ter que andar a procurar por autor numa estante por ordem alfabética implica anotações prévias, que é um modo de ir às livrarias em que estas não tem qualquer vantagem face à compra na Internet. Se as livrarias querem sobreviver, só pode ser cativando aquele que anda só “a ver o que há”, que é a resposta que dou à irritante pergunta, para mim, se quero ajuda, feita por um empregado mais solícito que confunde o flâneur com o perplexo.

Por isso, as vastas filas de expositores com novidades, organizadas por ficção e não ficção, novidades-novidades e novidades em paperback, acompanhadas pelas escolhas do pessoal (uma forma de tornar intimista o espaço gigantesco da livraria e de mostrar que o pessoal não está ali a vender livros como salsichas), e pelos tops, com relevo para o do New York Times, mas também temáticos, economia e história por exemplo, são uma verdadeira introdução à livraria e quase sempre compro aí os primeiros livros. No mesmo espaço de entrada há revistas e jornais, uma secção importante muitas vezes especializada na área literária, com a multiplicidade de revistas literárias e de crítica. Nas revistas permanece a divisão que devia horripilar as feministas entre revistas de “interesse para as mulheres”, da moda ao mundo cor de rosa, e de “interesse para os homens”, também já com moda e mulheres pouco vestidas no contexto da “cultura” masculina yuppie. Outra diferença que se observa com o tempo, é o elevado número de revistas sobre comida, e o número cada vez menor de revistas de computadores. Muito Linux e Apple, muito manuais de gadgets e algumas revistas mais técnicas, mas cada vez menos.

Nas caixas, que também estão nesta zona inicial, há toda uma parafernália de objectos que tem a ver com a leitura, lupas, lâmpadas, marcadores, bonecos de literatura infantil, alguns livros miniatura, e agora cada vez mais e-readers. Como se está numa fase de luta entre e-readers, com o aparecimento de leitores dedicados como o Nook ou o Kindle, e cada livraria promove o seu agressivamente. Umas vezes na entrada, noutras nos andares superiores há uma secção de papelaria resumida a envelopes e postais, pouco atractiva.

Existem algumas destas “entradas” com secções de livros de bolso, as excelentes séries de clássicos da Pelican e da Penguin, e mesmo num assomo de erudição, algumas livrarias tem uma estante com a edição da Loeb dos clássicos gregos e latinos em edições bilingues. Nas cidades em que o turismo é importante, é também na entrada que estão os guias e os livros de interesse local, mapas e livros ilustrados. Mas, passada a entrada, há toda uma série de secções, algumas ocupando andares inteiros, cobrindo a ficção, quer a clássica, quer as novidades, a biografia, uma secção muito anglo-saxónica e popular, a história, os “assuntos correntes” e depois muitas secções mais especializadas algumas com nomes latinos como a Americana, a Judaica, ou a Militaria. Em países como os EUA em que as forças armadas entraram em várias guerras, há sempre, como em Inglaterra, uma grande secção de estudos militares, cobrindo os conflitos (começa a haver uma secção para o Vietname que antes não existia) e detalhes das unidades militares, como as “operações especiais”. A espionagem tem também uma boa parte de uma estante.

A parte respectiva às religiões é também importante, dividida por fé, cristandade, judaica, islão, budismo, etc, e as secções de sociologia e antropologia são menores comparadas com a literatura religiosa. No âmbito das ciências sociais costuma haver também boas secções sobre media, incluindo vários livros populares sobre séries televisivas de culto, os Soprano, Twilight Zone, House, e sobre filmes. Depois há secções típicas, como a parte do “Gay and Lesbian interest” ou a enorme quantidade de livros sobre auto-ajuda, doenças, saúde, gastronomia, desportos e coleccionismo (muita numismática e pouca filatelia), carros, rendas, antiguidades, histórias aos quadradinhos, cromos de jogadores de baseball, etc. Os livros de arte não são muito abundantes, talvez porque o seu peso e preço, os tornem mais atractivos para o público das livrarias dos museus de arte, onde há excelentes colecções para escolher. A secção infantil tem muitas vezes um pequeno espaço para crianças, mas o que faz o seu êxito é o enorme boom de qualidade, particularmente gráfica dos livros infantis.

Por todo o lado das livrarias há gente sentada no chão a ler, ou em sofás distribuídos com abundância, com mesas ou sem mesas, o que, para além do omnipresente Starbucks, também sempre muito frequentado, faz muito do ambiente da livraria. Ah! e há Wi-Fi gratuito. Ou seja, as livrarias fazem muito para que o seu espaço seja habitado e não apenas para que se entre e compre um livro, e este ambiente faz muita diferença. A informalidade da sociedade americana torna inimitável muito desta organização de espaço, que algumas livrarias europeias tentam copiar com menos sucesso. Eu gosto muito da Waterstones e da Tropisme de Bruxelas, mas não me passa pela cabeça “estar” lá. Nas grandes livrarias americanas, para além da organização peculiar dos seus livros, passeia-se e está-se. É uma grande diferença.

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ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE

Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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EARLY MORNING BLOGS

1916 - During Wind And Rain 

They sing their dearest songs --
He, she, all of them -- yea,
Treble and tenor and bass,
And one to play;
With the candles mooning each face....
Ah, no; the years O!
How the sick leaves reel down in throngs!

They clear the creeping moss --
Elders and juniors -- aye,
Making the pathways neat
And the garden gay;
And they build a shady seat....
Ah, no; the years, the years;
See, the white storm-birds wing across!

They are blithely breakfasting all --
Men and maidens -- yea,
Under the summer tree,
With a glimpse of the bay,
While pet fowl come to the knee....
Ah, no; the years O!
And the rotten rose is ript from the wall.

They change to a high new house,
He, she, all of them -- aye,
Clocks and carpets and chairs
On the lawn all day,
And brightest things that are theirs....
Ah, no; the years, the years;
Down their carved names the rain-drop ploughs.

(Thomas Hardy)

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28.11.10


EARLY MORNING BLOGS

1915 - Stupidity

Stupidity, woe’s anodyne,
Be kind and comfort me in mine;
Smooth out the furrows of my brow,
Make me as carefree as a cow,
Content to sleep and eat and drink
And never think

Stupidity, let me be blind
To all the ills of humankind;
Fill me with simple sentiment
To walk the way my father went;
School me to sweat with robot folk
Beneath the yoke.

Stupidity, keep in their place
The moiling masses of my race,
And bid the lowly multitude
Be humble as a people should;
Learn us with patient hearts, I pray,
Lords to obey.

Stupidity and Ignorance,
Be you our buffers ’mid mischance;
Endoctrine us to do your will,
And other stupid people kill;
Fool us with hope of Life to be,
Great god to whom we bow the knee,
—STUPIDITY.

(Robert Service)

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27.11.10


NUNCA É TARDE PARA APRENDER: O COLOSSO EM MOVIMENTO

David M. Kennedy, The American People in World War II: Freedom from Fear, Part Two (The Oxford History of the United States, V. 9)

(Em breve.)

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COISAS DA SÁBADO: GREVE GERAL: POLÍTICA

Claro que o nosso sindicalismo, aquele que concretamente vai parar o trabalho em quase todo o país e que virá para a rua protestar, o da CGTP, não é apenas uma expressão dos interesses dos seus representados nos sindicatos filiados, é também o resultado de uma visão do mundo assente na luta de classes, no marxismo, na ideologia do comunismo e do PCP. E o PCP não está na rua apenas a protestar contra o assalto ao bolso dos trabalhadores que estão a pagar os desmandos do sistema bancário e as políticas criminosas do governo Sócrates. Está na rua por uma visão da sociedade revolucionária, mesmo que oculte essa vontade no meio de fórmulas de disfarce. O mesmo se passa com o BE, outra força cujas propostas só tem sentido numa sociedade em que a propriedade privada seria residual e em que o controlo estatal de toda a economia, seria também o controlo das liberdades dos cidadãos. Eles sabem que é assim, mas não o enunciam, mesmo num momento em que o PCP retorna a um vocabulário marxista-leninista menos deslavado. E, por isso, para eles a greve geral tem uma componente instrumental, muito para além da vontade subjectiva de muitos trabalhadores em fazê-la. E isso leva a que a greve geral, que não tem necessariamente que omitir o protesto em nome da crise, seja também um factor de agravamento da crise, reforçando os bloqueamentos já existentes. O mundo é sempre mais complicado do que parece, mesmo na sua simplicidade.

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EARLY MORNING BLOGS

1914

The key to the age may be this, or that, or the other, as the young orators describe; the key to all ages is — Imbecility; imbecility in the vast majority of men, at all times, and, even in heroes, in all but certain eminent moments; victims of gravity, custom, and fear.

(Ralph Waldo Emerson)

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26.11.10


ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE

Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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EARLY MORNING BLOGS

1913 - I Hear America Singing

I hear America singing, the varied carols I hear,
Those of mechanics, each one singing his as it should be blithe and strong,
The carpenter singing his as he measures his plank or beam,
The mason singing his as he makes ready for work, or leaves off work,
The boatman singing what belongs to him in his boat, the deckhand
singing on the steamboat deck,
The shoemaker singing as he sits on his bench, the hatter singing as he stands,
The wood-cutter's song, the ploughboy's on his way in the morning,
or at noon intermission or at sundown,
The delicious singing of the mother, or of the young wife at work,
or of the girl sewing or washing,
Each singing what belongs to him or her and to none else,
The day what belongs to the day- at night the party of young
fellows, robust, friendly,
Singing with open mouths their strong melodious songs.

(Walt Whitman)

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25.11.10

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ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE
 

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24.11.10


COISAS DA SÁBADO: GREVE GERAL: PROTESTO


É por isso que o sindicalismo é um mecanismo correctivo fundamental numa sociedade democrática, mesmo que gere efeitos perversos, o mais importante dos quais é favorecer quem tem emprego em detrimento de quem não o tem. Isto é verdade, mas também é verdade que quem não o tem sabe que se o tiver não pode ficar sempre suspenso no medo de o perder. E o sindicalismo como contra-poder não impede esse medo, mas impede que ele se torne o principal mecanismo da relação entre quem emprega e quem trabalha. Dirão os realistas da economia cínica – que se caracterizam quase sempre por não estar na situação laboral sobre a qual opinam – que, com medo ou sem ele, com sindicatos ou sem eles, quando a racionalidade económica obriga, não há outro remédio senão perder o emprego, a bem ou a mal. E a realidade dos dias de hoje parece comprová-lo: seja qual for a retórica sobre os direitos laborais, se a economia real não os suporta, eles não valem nada. Não é verdade, porque no mundo complexo do real, a racionalidade económica não é uma linha definida que deixa de um lado o branco e do outro o preto. As coisas são quase sempre cinzentas e o jogo de luz e sombra faz-se de múltiplos interesses contraditórios sem os quais haveria muitos abusos e prepotências.

Por tudo isto, mesmo em crise, o protesto sindical é uma manifestação de forças que equilibra e impede os desequilíbrios. Por tudo isto, a greve geral tem uma componente de resposta ao medo e à prepotência que, não contribuindo para “combater” a crise, impede que no seu decurso haja uma perda completa da dignidade pessoal de quem trabalha. Um trabalhador, que vê o seu rendimento drasticamente diminuído, pode até achar que não há outro remédio, – e muitos dos que vão fazer greve sabem que é assim, - mas nem por isso perde a vontade de protestar, bem pelo contrário. Não só entende que não teve “culpa”, como quer mostrar que ainda pode tomar uma atitude contra alguma coisa que pensa ser “injusta”.

(Continua.)

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ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE

Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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COISAS DA SÁBADO: GREVE GERAL: PROTESTO E POLÍTICA


Para se compreender o papel do sindicalismo, em bom rigor, da defesa organizada de interesses numa democracia, pode fazer-se este exercício que em muitos sítios é tudo menos absurdo. Imaginem que, em Portugal, em 2010, não havia sindicatos, nem os que existem (na sua maioria influenciados pelo PCP através da CGTP), nem quaisquer outros. Uma coisa seria certa, os salários seriam muito mais baixos, os desempregados muitos mais, o trabalho precário a norma, a vida dos trabalhadores muito mais fragilizada e a economia não seria muito diferente. Pelo contrário, teria continuado a viver de uma competitividade à custa dos baixos salários, mas mesmo assim longe dos salários chineses e indianos, romenos ou búlgaros. Haverá quem diga que não há problema porque é assim nos EUA, mas a verdade é que não é assim nos EUA. Nos EUA há legislação laboral, sindicatos e uma muito diferente mobilidade social, profissional e geográfica. E é para cima, por regra. Haverá também quem diga que não faria mal à competitividade da economia portuguesa uma nova “flexibilidade” especialmente com maior facilidade de despedir e empregar e menos rigidez da legislação laboral. É verdade, mas coloquem-se no lugar de alguém que tem emprego, e perguntem-lhe se está disposto a perdê-lo ou a torná-lo mais precário em nome da reparação da economia e da sua competitividade. Não está, porque uma coisa é a racionalidade económica e outra a expressão de interesses individuais e colectivos que partem das circunstâncias concretas das pessoas.

(Continua.)

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23.11.10


ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE

Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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EARLY MORNING BLOGS

1911- Weather

Whether the weather be fine
Or whether the weather be not,
Whether the weather be cold
Or whether the weather be hot,
We'll weather the weather
Whatever the weather,
Whether we like it or not.

(Anónimo)

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21.11.10


COISAS DA SÁBADO: TEORIAS SOBRE AS LEITURAS EM VIAGEM 
(3) UM CAPÍTULO AQUI E OUTRO ALI: KISSINGER E BENJAMIN BRITTEN

Britten e Peter Pears

E começou então a leitura pêle-mêle, um capítulo aqui, outro ali, sem grande nexo a não ser a prisão da minha atenção, – ainda sou da geração que não sofre de ADD, Attention Deficit Desorder – por dois excelentes ensaios. Neste caso um sobre Kissinger, outro sobre o compositor inglês Britten. Tenho a a impressão que juntar este par , num texto deve ser a uma estreia mundial fruto de leituras verdadeiramente en vrac. Comprei em segunda mão, como novo, The Coming Anarchy, de Robert Kaplan, de que conhecia o livro sobre os Balcãs. E no meio do índice estava um ensaio sobre o “realismo” de Kissinger que faz justiça a um dos grandes diplomatas, políticos e teóricos das relações internacionais do século XX. Kaplan mostra como, contrariamente a outras leituras, Kissinger foi profundamente influenciado pela sua juventude na Alemanha nazi e por uma aversão profunda à “revolução” hitleriana e à política de apaziguamento que conduziu não à paz, mas à guerra. O seu “realismo” vinha da consciência de que nada melhor para gerar instabilidade e revolução do que políticas bem-intencionadas e diplomacias sem disponibilidade e capacidade para usar força. Obama devia ler Kissinger.

O outro ensaio, sobre Britten, vem no livro de Alex Ross, The Rest is Noise. Listening to the Twentieth Century. Era para mim um livro azarado que já tinha tentado comprar e desistido à última hora. Quando saiu, nas “novidades” da Waterstones de Londres, fresco na sua capa dura de primeira edição, atraiu-me logo a atenção, peguei nele para o levar, mas já tinha tanta coisa e tanto peso que desisti. Foi uma asneira de que só me estou a redimir agora, porque a julgar pelo ensaio sobre Benjamin Britten, o único capítulo que li, o livro merece os prémios e fama. Ross retrata Britten no contexto da sua Aldeburgh natal e onde está sepultado, uma terra de pescadores cinzenta, despida, inóspita, varrida pelo vento, com um estuário e um mar perigosos. O centro da análise é a opera Peter Grimes, passada exactamente no cenário trágico da sua terra de pescadores, com uma história do mal, da culpa e da loucura. À volta de Britten, da sua homossexualidade, dos dilemas artísticos da sua criação, solitária e fora de moda como a de Chostakovitch com que pode ser comparado, à margem do atonalismo e do experimentalismo vanguardista – Luigi Nono recusou-lhe um aperto de mão – Ross mostra os dilemas e contradições dos anos da Guerra Fria e da passagem de um mundo que tirou a homossexualidade do armário. Quando Britten morreu a Rainha Isabel mandou um telegrama de condolências a Peter Pears, o seu companheiro de quase uma vida toda. O mundo tinha mudado entretanto.

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ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE

Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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COISAS DA SÁBADO: TEORIAS SOBRE AS LEITURAS EM VIAGEM 
(2) A OPÇÃO PÊLE-MÊLE OU SEJA UMA MISTURADA CAÓTICA

Desta vez, no meio desta viagem, a intenção foi semelhante à árctica, uma única e totalitária leitura de mais um volume da história de Oxford dos EUA (como já era o de McPherson), o livro de David Kennedy, The American People in World War II. Faltavam-me (faltam-me) cerca de cem páginas e pensei que ia acaba-lo na viagem de ida e compraria outro para o regresso. Nada disso, a colheita de imprensa foi tão vasta e rica, incluindo alguma imprensa cor-de-rosa, para actualizar quem anda com quem, que não lhe peguei. E no destino, a opção pêle-mêle acabou por se impor porque esta opção associa-se quase sempre a uma intensa pesca de arrasto no destino, livros e livros e papéis, folhetos, jornais, revistas, tudo. Uma misturada caótica que encontra rapidamente nas minhas mãos, ordem e progresso. E prazer.

(Continua.)

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EARLY MORNING BLOGS

1910

The butterfly counts not months but moments,
and has time enough.

(Rabindranath Tagore)

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20.11.10


COISAS DA SÁBADO: TEORIAS SOBRE AS LEITURAS EM VIAGEM

Quando viajo tenho sempre uma opção difícil de leituras que me faz andar um pouco tonto de estante em estante, ou de pilha em pilha de revistas e jornais para decidir o que vou levar. As opções são duas: ou sou leitor de um livro só, a opção totalitária, ou levo uma tonelada de coisas e faço leituras pêle-mêle ou en vrac. Hoje isto vai de galicismos em vez de anglicismos. Normalmente decido não decidir e levar livros e revistas para as duas opções, a que se soma a única coisa boa que há em aeroportos, a imprensa internacional do dia.

Claro que há dois factores a condicionar esta opção; a duração dos voos ou das esperas, e a existência de livrarias em línguas estendíveis nos destinos. Esta última avaliação sobre os livros que vou comprar sai sempre errada, porque foi a opção que fiz para duas recentes viagens, para a Letónia e para a Gronelândia, e tive que comprar sacos de viagem no regresso porque os livros não cabiam. Mesmo em letão havia sempre uma história ilustrada das guerrilhas anticomunistas do pós-guerra, e, no meio dos icebergs, sempre aparecia um livrinho sobre Narsarsuaq, a sua pista aérea e os seus 158 habitantes. De qualquer modo nas longas viagens árcticas a opção totalitária por um livro só, neste caso a grande, no duplo sentido de excelente e volumosa, história da guerra da secessão americana de James McPherson, revelou-se acertada. No meio da escassa luz de um avião militar, brilhavam as personalidades excepcionais de Lincoln e os seus generais da fase final da guerra e de Robert Lee e os seus companheiros de mil combates. Não se estava mal.

(Continua.)

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COISAS DA SÁBADO: NADA DE NOVO NA FRENTE OCIDENTAL

Não havendo autonomia na politica portuguesa, dependente nas suas decisões fundamentais do exterior, ou mais cruelmente dito, do estrangeiro, dos “mercados” e da Alemanha, e não querendo ou não podendo os principais actores políticos nacionais fazer alguma coisa para diminuir essa dependência, não vale a pena desperdiçar muito espaço com uma coisa que não há.

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ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE

Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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EARLY MORNING BLOGS

1909 -  American Sketches - Poem to be Read at 3 A.M.

Excepting the diner
On the outskirts
The town of Ladora
At 3 A.M.
Was dark but
For my headlights
And up in
One second-story room
A single light
Where someone
Was sick or
Perhaps reading
As I drove past
At seventy
Not thinking
This poem
Is for whoever
Had the light on

(Donald Justice)

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18.11.10


AS DEMOCRACIAS DEVEM ESTAR ARMADAS

A uma semana da cimeira da NATO, Lisboa enche-se de inscrições, cartazes, murais contra a organização. Alguns dos cartazes são em inglês e alemão, o que mostra internacionalização do protesto. Na sua maioria, as inscrições são do PCP e de alguns dos seus avatares criados para a ocasião, e do Bloco de Esquerda cujas posições merecem alguma atenção mais à frente. O resto provém de alguns grupos esquerdistas ínfimos, como aqueles ligados à Internacional de que faz parte o POUS. Com a ignorância habitual, a televisão deu a estes pequenos e insignificantes grupos portugueses o papel de espantalhos para meter medo, certamente com informações sopradas para justificar as despesas com a segurança pela central de contra-informação que actua junto do Governo. Fossem apenas estes os participantes no mais que legítimo direito democrático de protestar, e pouco mais poderia haver do que alguns incidentes isolados, ou nem isso. Mas não é assim.

No plano internacional já a coisa fia mais fino, porque há grupos especializados e profissionalizados em criar tumultos nestas ocasiões, não por a cimeira ser em Lisboa, um país irrelevante para eles, mas por virem cá os grandes do mundo e uma coorte de jornalistas. Muita televisão, muitos jornais, muitas agências, logo grande cobertura mediática, o isco para pequenos grupos violentos que fazem este turismo caro da pancadaria anti-capitalista, anti-imperialista, antimilitarista, anti-etc. Um autocolante em inglês de um grupo "antifascista" alemão, colado nas ruas de Lisboa, mostra uma velha camponesa a "fazer o dedo", e tem uma legenda significativa; "Fuck off!" os "racistas, fascistas, anti-semitas, suprematistas da espécie ("speciesists"), sexistas, homofóbicos, nacionalistas e patriotas". Como catálogo dos inimigos não está mal, incluindo a luta contra os "speciesists", uma palavra difícil de traduzir, mas que denota a vinda de um grupo de gente muito radical que promete fazer a vida negra aos donos dos aviários, para combater os preconceitos contra as espécies não humanas...
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Estes grupos anarquistas (uma designação que utilizo pelo costume habitual, mas que é pouco rigorosa) e esquerdistas, alguns com história conhecida de protestos violentos, prometem animação. Alguma sarrafusca haverá, mas espero que a nossa polícia não seguirá as práticas mansas que tem com as claques, mesmo desprovida das viaturas antimotim que deviam vir a tempo e não vieram, e que quando vierem vão gloriosamente apodrecer no mesmo armazém que deve ter os equipamentos de protecção antinuclear que o engenheiro Guterres comprou em plena histeria do "urânio enriquecido". Estas histórias de sumo ridículo são mais uma contribuição dos nossos incapazes governantes para ajudar a deslegitimar uma organização de que Portugal faz parte e cujo destino devia tomar muito a sério.

Os veteranos do combate contra a NATO e aqueles que vão dar o grande contingente de rua (e o mais pacífico) são os comunistas. Os bloquistas vão ter um pé nos dois grupos, um na massa pacífica dos herdeiros da geoestratégia da URSS, outro nos grupos mais agressivos. Mas os comunistas levarão à rua uma curiosa contradição que revela o peso da história e da tradição (o PCP é uma das mais conservadoras organizações da vida política portuguesa) e a sua incongruência com as realidades contemporâneas, a começar pela suprema ironia de ver o descendente directo do "sol na terra", sob a forma do Presidente Medveded, a participar numa cimeira da NATO, descendo na Portela num avião com a bandeira de Pedro, o Grande. Os comunistas, quer a organização-mãe, quer as sobrevivências do mundo póstumo do internacionalismo pró-soviético, como esse curioso Conselho Português para a Paz e a Cooperação, muito anos financiado pela URSS, e que não era nem português, nem pacífico, nem cooperante, transportam para as ruas de Lisboa o mundo orwelliano das últimas abencerragens da política externa soviética, agora sem URSS.
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O que ficou dessa geoestratégia soviética foi um forte antiamericanismo que se dissolveu em múltiplas versões menores, em particular no novo esquerdismo antiglobalizador que cresceu com o desastre do Iraque e com as dificuldades do Afeganistão. Esse antiamericanismo global acaba por ser também o terreno natural em que se coloca o Bloco de Esquerda, herdeiro de outras tradições do movimento comunista, como a da IV Internacional e a do maoísmo, irmanadas também elas nesse mesmo manto de causas difusas, agora sem guia nem vanguarda. Nesse sentido há pouca autonomia real do Bloco de Esquerda em relação à posição de orfandade do PCP, apesar de uma retórica que tenta a diferenciação através de uma valorização de causas e de direitos que nenhum papel tinha na subserviência face à URSS da posição comunista.

Quem combatem todos estes grupos? A única organização armada que é hoje constituída na sua esmagadora maioria por democracias. Nem sempre foi assim no tempo da guerra fria e concedo que não o possa ainda ser inteiramente, para deixar em aberto o caso especial da Turquia, de qualquer modo muito mais democrática do que a plêiade dos mais virulentos opositores da NATO como Cuba, a Venezuela e a Coreia do Norte. A NATO venceu a guerra fria ao Pacto de Varsóvia e foi o instrumento fundamental para travar o expansionismo soviético na Europa do pós-guerra, mantendo uma força de dissuasão permanente que impediu a URSS de ultrapassar os seus já ilegítimos domínios nos países do Centro e Leste da Europa e a ocupação dos países bálticos.

Porém, terminada a guerra fria, que papel pode ter a NATO? Esta é a questão que mais uma vez estará presente na actual revisão do conceito estratégico da NATO, numa altura em que esta está presente no mais complexo teatro de guerra mundial, o Afeganistão. O complexo processo de encontrar um novo consenso sobre as regras de intervenção da organização num mundo pós-guerra fria, para além da regra da defesa colectiva dos seus membros, incluindo as novas parcerias de segurança, a mais importante das quais é com a Federação Russa, não pode, no entanto, esconder uma realidade nua e crua. É que sem a NATO o mundo fica muito mais perigoso e inseguro. Mesmo que desaparecesse a ONU, os riscos para a segurança mundial seriam maiores, se as democracias perdessem a sua organização de defesa e segurança. E é por isso que o papel dos EUA, a única verdadeira democracia armada que subsiste no mundo, é crucial. Também por isso se compreende que o antiamericanismo esteja no âmago da luta anti-NATO que andará à solta pelas ruas de Lisboa.

(Versão do Público, 13 de Novembro de 2010.)

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17.11.10


ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE


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COISAS DA SÁBADO: TEA PARTY / FOX NEWS VERSUS JON STEWART

Mas a América foi sempre assim e dessas contradições também nasceu Jon Stewart, o homem tido como “mais influente” nos EUA, facto de que, muito respeitosamente, duvido. Aliás Stewart não resistiu a esta tendência, tão populista como a do Tea Party, de colocar palhaços, sem ofensa, a competir com políticos nas eleições. Tudo começou com Coluche, depois foi Beppo Grillo, Jon Gnarr, e Tiririca, todos com sucesso. Gnarr é presidente da câmara de Rekjavik e Tiririca bateu em votos todos os outros. Só que Stewart quis medir-se com o Tea Party em comícios (e implicitamente em votos) e perdeu para Sarah Palin e os seus amigos da Fox News… É por isso que o Rally To Restore Sanity And / Or Fear foi fraquito de gente, argumentos, e, como sempre acontece quando há estas cavalarias altas, de graça. Vamos ver agora no que dá o Rally To Determine Precisely The Percentage Of Blame To Be Doled Out To The Left And The Right For Our Problems Because We All Know That The Only Thing That Matters Is That The Other Guys Are Worse Than We Are And / Or Fear. É muito difícil de traduzir, mas o inglês técnico chega.

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COISAS DA SÁBADO: OBAMA OBSCURECIDO PELO SEU PRÓPRIO BRILHO



Obama foi eleito com tanto esplendor que a chama iria obscurecer alguém. A curto prazo foi McCain e os republicanos, a médio (o médio cada vez mais curto que o encolher do tempo mediático gera) foi o próprio Obama a vítima. É que a sua presidência tem sido pouco mais do que entre o medíocre e o suficiente, enredada em promessas irrealistas e em esperanças exageradas. Como diz um provérbio com base na física popular, tudo o que sobe tem que descer. A gravidade é uma coisa muito séria.

Mas quem iria imaginar que a Nemésis da vitória pessoal de Obama iria ser não uma pessoa mas um movimento colectivo? Com a história é sempre a aprender… Há muitos lunáticos no Tea Party mas o movimento é do mais puramente americano que há. Mário Soares chama-lhe “movimento de extrema-direita”, com o mesmo radicalismo com que no Tea Party há quem ache que Obama é comunista. Mas o Tea Party derrotou esmagadoramente um Obama que há um ano parecia invencível e pode estar aí para durar. Pode, mas não é certo.

Movimento populista, grosseiro nas críticas, como é típico na chamada vox populi, fundamentalista religioso nalguns sectores, mas liberal-libertário noutros, o Tea Party exprime a desconfiança face ao estado, ao big government que é genética na democracia americana. Só o afastamento dos democratas e de Obama dessa fonte original, querendo fazer política “à europeia”, explica muito do radicalismo das suas críticas.

O individualismo também lá está, mas é o individualismo que Stuart Mill descreveu nestes termos: “apenas a parte da conduta de cada um que se reflecte na sociedade diz respeito a outros. Na parte que apenas diz respeito a si próprio, na sua independência é absoluta. Sobre si próprio, sobre o seu corpo e a sua mente, o individuo é soberano”. Claro que para muita gente que vai para a rua e votou nos candidatos apoiados pelo Tea Party, este individualismo é genuinamente contraditório, por um lado são contra a liberdade nas condutas sexuais, por outro não querem o governo a decidir a que médicos podem ir, quando podem.

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EARLY MORNING BLOGS

1908- The Microbe

The microbe  is so very small
You cannot make him out at all,
But many sanguine people hope
To see him through a microscope.
His jointed tongue that lies beneath
A hundred curious rows of teeth;
His seven tufted tails with lots
Of lovely pink and purple spots,
On each of which a pattern stands,
Composed of forty separate bands;
His eyebrows of a tender green;
All these have never yet been seen--
But Scientists, who ought to know,
Assure us that is must be so...
Oh! let us never, never doubt
What nobody is sure about!

(Hilaire Belloc)

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ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE
 
 

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COISAS DA SÁBADO: A HAGIOGRAFIA DE PEDRO PASSOS COELHO NO SOL

Pode ser que, quanto ao resto, alguma coisa seja verdadeira, mas desconfio muito pela amostra. No que me diz respeito directamente, ou a factos, reuniões e acontecimentos de que fui testemunha directa, em particular nos anos de Cavaco Silva (de cuja Comissão Política fui membro), tudo o que lá está são reconstruções a posteriori de eventos, com o objectivo explícito de gerar uma determinada imagem biográfica, mas muito longe da verdade. No que mais directamente se me refere, por exemplo quanto às eleições na Distrital de Lisboa, não há um único facto que seja verdadeiro: os números estão errados, as descrições são falsas, o que se passou grosseiramente deturpado. E é que não é um problema de interpretação, se fosse isso deixaria passar com caridade, mas são factos, números, eventos, testemunhos. Portanto a autora Felícia Cabrita confiou nas suas fontes, que a enganaram, e deveria tirar daí as suas ilações, mas também não verificou o que lhe disseram, o que devia ter feito. Até porque vem tudo nos jornais da época, ou quase tudo. E, felizmente, para a história futura, eu guardo os papéis todos e tenho uma excelente memória

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COISAS DA SÁBADO: A CORNUCÓPIA DAS MÁS NOTÍCIAS



As más notícias de ontem parecem um bálsamo diante das más notícias de hoje. E as de amanhã parecerão um pesadelo face às péssimas notícias de hoje. É assim quando se está num plano inclinado, é sempre pior, é sempre para baixo.

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13.11.10


EARLY MORNING BLOGS

1907

"La sottise ne serait pas tout à fait la sottise, si elle ne craignait pas l'esprit. Le vice ne serait pas tout à fait le vice, s'il ne haïssait pas la vertu."

(Chamfort)

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© José Pacheco Pereira
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