ABRUPTO

7.6.08


LENDO
VENDO
OUVINDO

ÁTOMOS E BITS

de 7 de Junho de 2008


Um dos camionistas envolvidos nos recentes protestos disse que os motoristas de pesados iam buzinar com abundância porque tinham dentro de si "o espírito da buzina".

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IMAGENS DO SALAZARISMO: UMA CASA PORTUGUESA (2)

"Casa salubre, independente, ajeitada como um ninho." (Salazar)



(Marimilia e Fernando Carlos, O Nosso Lar, Campanha Nacional de Educação de Adultos, s.d.)

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IMAGENS DO SALAZARISMO: UMA CASA PORTUGUESA (1)

"Casa salubre, independente, ajeitada como um ninho." (Salazar)



(Marimilia e Fernando Carlos, O Nosso Lar, Campanha Nacional de Educação de Adultos, s.d.)


*
O que eu mais aprecio na dita casinha é o pormenor dos vários livros encadernados que jazem na estante lá atrás...
Os livros, só por si, já são interessantes. Fico a pensar.
... Mas aquelas encadernações... estragam qualquer efeito positivo que a estante e o seu conteúdo pudessem ter!
Muito interessante.

(Maria Simões)

*

Se vai escrever no Abrupto sobre o conceito salazarista de «casa portuguesa», espero que não se esqueça da canção «Uma casa portuguesa». E com um extra: uma tradução para japonês da letra (cujo autor é Reinaldo Ferreira, o filho do Repórter X).

(José Carlos Santos)

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COISAS DA SÁBADO: O EXCELENTE PAPEL PARA OS GOVERNOS DO FUTEBOL COMO CIRCO E PARA DISTRAIR DA ESCASSEZ DO PÃO

Não é por acaso que a televisão que é paga com o dinheiro dos contribuintes para fazer uma coisa inefável que é o “serviço público”, ou seja ter outras prioridades que não sejam as audiências, é a que mais (ou uma das que mais) mergulharam na visão do país como um enorme campo de futebol e dos telespectadores como tendo uma bola na cabeça e o cachecol da “selecção”, com horas e horas de directos, semi-directos e pseudo-notícias sobre trivialidades, de tal maneira que Portugal, o mundo, os problemas, as notícias, ficam soterradas a um canto do delírio patriótico com o futebol. O governo, num dos piores momentos de sempre, agradece. Os romanos reconhecer-se-iam no Portugal de hoje, com o imperador a dar circo e gladiadores, para esconder que a guerra corre mal na Germânia e que não há dinheiro no tesouro para pagar o trigo do Egipto.

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EARLY MORNING BLOGS


1315 - In the Library

There's a book called
"A Dictionary of Angels."
No one has opened it in fifty years,
I know, because when I did,
The covers creaked, the pages
Crumbled. There I discovered

The angels were once as plentiful
As species of flies.
The sky at dusk
Used to be thick with them.
You had to wave both arms
Just to keep them away.

Now the sun is shining
Through the tall windows.
The library is a quiet place.
Angels and gods huddled
In dark unopened books.
The great secret lies
On some shelf Miss Jones
Passes every day on her rounds.

She's very tall, so she keeps
Her head tipped as if listening.
The books are whispering.
I hear nothing, but she does.

(Charles Simic)

*

Bom dia!

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6.6.08


COISAS DA SÁBADO: A EVOLUÇÃO NATURAL DA MÁ FÉ



Primeiro nunca, jamais, em tempo algum, ganhava; depois ficava em quarta, atrás de Patinha Antão; depois ficava em terceira, com certeza absoluta; depois, admitia-se, a contragosto, ficava em segunda, mas em nenhuma, nenhuma circunstância, ganharia; depois estava empatada na melhor das hipóteses. Ganhou. Ganhou mas todos ganharam; ganhou mas não foi o PSD mas o “tripartido”; ganhou, mas verdadeiramente não ganhou, foi o segundo que ganhou; ganhou, mas foi o terceiro que também ganhou; ganhou, mas não valeu a pena ter ganho; ganhou mas foi uma vitória de Pirro, ganhou mas perdeu. O que é que se teria dito se no dia 31 de Maio perdesse!

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EXTERIORES: CORES DESTES DIAS

Clicando na fotografia fica na boa dimensão. Para se ver



Noite. (RM)



Crepúsculo no Montijo. (António Cabral)



Amarante na Primavera. (Helder Barros)







Árvores.



Vento. (António Cabral)



Ushuaia. (MJ)



Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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O JUDEU ERRANTE








De regresso.

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5.6.08


EARLY MORNING BLOGS


1314 - Odysseus' Decision

The great man turns his back on the island.
Now he will not die in paradise
nor hear again
the lutes of paradise among the olive trees,
by the clear pools under the cypresses. Time

begins now, in which he hears again
that pulse which is the narrative
sea, or dawn when its pull is stongest.
What has brought us here
will lead us away; our ship
sways in the tined harbor water.

Now the spell is ended.
Giove him back his life,
sea that can only move forward.

(Louise Gluck )

*

Bom dia!

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EXTERIORES: CORES DESTES DIAS

Clicando na fotografia fica na boa dimensão. Para se ver





Grafitos. (António Cabral)



Buenos Aires. (João Almeida)



Calmaria em Alcochete. (António Cabral)

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3.6.08


EARLY MORNING BLOGS


1313 - Não debalde escolhe Cristo para o governo da sua casa um homem tão resoluto como Pedro.

Todos os demônios do Inferno, diz Cristo que não prevalecerão contra sua Igreja: Portæ inferi non prævalebunt adversus eam. E porque não basta estarem as portas inimigas defendidas, se as próprias não estiverem seguras, à fidelidade de Pedro cometeu o Senhor as chaves do seu Reino: Tibi dabo claves regni cælorum. Primeiro lhe chamou homem de pedra e depois lhe entregou as chaves, porque as chaves do Reino só em homens de pedra estão seguras. Os homens de barro quebram, os de pau corrompem-se, os de vidro estalam, os de cera derretem-se; tão duro e tão constante há-de ser como uma pedra, quem houver de ter nas mãos as chaves do Reino: Tu es Petrus, tibi dabo claves.

E qual há-de ser o ofício ou o exercício destas chaves? Fechar e abrir? Não diz isso o Senhor. As chaves que abrem e fecham, podem abrir para dentro e fechar para fora. Por isso vemos os tesouros tão estreitos e tão fechados para os outros, e tão largos e tão abertos para os que têm as chaves. Que havia logo de fazer com elas S. Pedro? Atar e desatar, diz Cristo: Quodcumque ligaveris, erit ligatum: quodcumque solveris, erit solutum. A peste do governo é a irresolução. Está parado o que havia de correr, está suspenso o que havia de voar; porque não atamos, nem desatamos. Não debalde escolhe Cristo para o governo da sua casa um homem tão resoluto como Pedro. Se Cristo lhe não mandara embainhar a espada, bem necessárias lhe eram as ataduras para as feridas. Assim há-de ser quem há-de obrar, e não homens que nem atam, nem desatam.

(Padre António Vieira)

*

Bom dia!

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2.6.08


LENDO
VENDO
OUVINDO

ÁTOMOS E BITS

de 2 de Junho de 2008


Está em curso outra grande entrevista de Mário Crespo na SICN, grelhando a fogo lento uma Secretária de Estado dos Transportes, a querer tomar-nos como parvos, e a dizer coisas de grande gravidade num estilo arrogante, subsidiário do do Primeiro-ministro. Ela foi lá para controlar os danos de uma entrevista de Sócrates em que este meteu os pés pelas mãos e errou. A uma dada altura, afirmou que um problema ambiental que vai existir com a linha do TGV, já não era tão importante assim, até porque já lá havia um olival clandestino. Crespo perguntou-lhe de quem era a responsabilidade pelo olival e a senhora irritada disse "de quem o plantou". E Crespo, e bem, indignou-se suavemente dizendo que o primeiro responsável era o Estado, o governo. E continua, com pérolas como esta "o que é mais importante, um alentejano ou as abetardas"?

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NUM BLOGUE PERTO DE SI, NUMA GALÁXIA MUITO LONGE



NESTES DIAS, COISAS RARAS E VARIADAS


COISAS DA SÁBADO: TREINOS E TESTES DO PCP

CONCHAS, PEDRINHAS, PEDACINHOS DE OSSOS -
o que se aprende lendo jornais.

NUNCA É TARDE PARA LER: O FANTASMA DE UM FANTASMA -
nota sobre o livro Ghost de Robert Harris.

UMA FRAUDE +
a "rectificação" da ERC dando razão às críticas do Abrupto.

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OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: MARCIANO GELO?



Sous les pavés, la plage. Debaixo da sonda Phoenix, debaixo da praia, parece estar gelo. Ninguém diga que desta água não beberá.

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COISAS DA SÁBADO: TREINOS E TESTES DO PCP



Não são só os futebolistas que andam em treinos e testes, o PCP também. Não em Viseu, mas no Porto. O PCP é o partido português com maior experiência na agitação, na manifestação, na concentração “espontânea” ou não, na conflitualidade de todo o tipo. Daqui não vem mal nenhum ao mundo, desde que tudo se passe na legalidade. Fazer manifestações, greves, protestos é uma marca típica da democracia e uma saudável sociedade contém uma dose considerável de actos de protesto cívico, e, desse ponto de vista, a sobrevivência da “ordem” e do “respeitinho” salazaristas ainda se revela na demonização desses actos.

O PCP sabe que a emergência de um “movimento social” (palavra de costas largas) com sucesso exige uma gestão muito cuidada dos avanços e recuos, e o melhor exemplo disso foi a componente sindical da luta dos professores, em que desde o crescendo da agitação até ao recuo organizado, tudo foi cuidadosamente medido. E era difícil, porque o PCP sabe melhor conduzir lutas que caibam nas baias sindicais, ou seja lutas minoritárias e limitadas, do que um movimento que cresceu mais do que a capacidade dos sindicatos de o controlar e lhes escapava à máquina. Ou seja, um movimento perigoso, pasto para moderados fortes ou esquerdistas sem freio, os dois riscos que o PCP não gosta de correr.

Por isso, é interessante ver o PCP a treinar-se para “novas lutas”, com o movimento contra o pagamento das SCUTs no Norte, uma marcha lenta na estrada (aceitável), seguida de uma tentativa de criar uma paralisação no centro do Porto (já menos aceitável). À frente da manifestação, gente conhecida do PCP, a medir o pulso às coisas, prestes a recuar, caso começassem a haver problemas que virassem a população contra os manifestantes, pronta a puxar a coisa mais para a frente até ao limite da confrontação com a polícia, com as televisões presentes.

Sabem-na toda, estes velhos militantes, a treinar uma variante do boicote da Ponte 25 de Abril, não para já, mas mais para cima das eleições, agora contra o PS e contra alguns dos idiotas úteis socialistas que andaram a brincar a quebrar a lei, porque era contra Cavaco. Eles sabem que é um jogo arriscado, porque a radicalização é uma arma que tanto dispara para a frente como para trás, tanto pode ajudar a consolidar os votos que da esquerda do PS têm ido para o PCP e o BE, como favorecer uma desagregação do PS (que só desejam na medida certa) a favor do PSD. Mas esta direcção do PCP está mais disposta que a anterior a ir mais longe, sente um terreno mais favorável, tem tido sucessos inegáveis. E treina, treina as tropas antes da batalha.

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EXTERIORES: CORES DESTES DIAS

Clicando na fotografia fica na boa dimensão. Para se ver



Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)



Café Flinstone, Capadócia, Turquia. (João José Gameiro)



Capeia Arraiana no Campo Pequeno organizada pela Casa do Concelho do Sabugal.
(Isabel Carreira)



Barragem Penha Garcia. (António Cabral)



Pedras parideiras. Em Castanheiro, Arouca. (José Manuel de Figueiredo)



Ponte da mulher (Calatrava) em Buenos Aires. (MJ)



22.90 rub = 0.62 eur
24.90 rub = 0.67 eur
30.90 rub = 0.83 eur
41.00 rub = 1.10 eur



A Kvas é uma bebida bastante popular na Rússia. Uma das marcas que a comercializa é a NIKOLA (trocadilho entre o nome Nicolau e "não Cola"). A sua publicidade é frequentemente feita contra as Colas. Neste camião lê-se: "Não à Kolanização! Kvas é a saúde da nação!"

(João Tiago Santos)







Bled, Eslovénia.

(Teresa)



Notícia do mesmo dia da aterragem da Phoenix no planeta Marte , vale a pena ler o texto.... (João Almeida desde o Rio Grande do Sul)



Memorial de Jean Palach, Praga. (Bruna Lombardo)



Caixa do correio nas ruas de Porto Alegre, Brasil. (João Almeida)





Paulo de Carvalho ontem no Funchal. (C. Oliveira)



Imagens da Iluminação na Ponte de S.º Gonçalo, para as Festas em honra deste Santo, que decorrerão no próximo fim-de-semana, em Amarante. (Helder Barros)



Xutos no Rock in Rio. (Nuno Oliveira)

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EARLY MORNING BLOGS


1312 - Provérbios espanhóis para nosso uso e proveito

Las mentiras tienen las patas cortas.

*

Bom dia!

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1.6.08


CONCHAS, PEDRINHAS, PEDACINHOS DE OSSOS



Ler jornais é uma actividade especialmente frutífera se for feita segundo as regras da entomologia, a ciência que estuda os insectos. Ou dito de outra maneira, fazendo uma colecção de coisas pequenas que existem no meio da superfície das grandes. Como dizia o nosso bom chinês Camilo Pessanha:
Seixinhos da mais alva porcelana,
Conchinhas tenuamente cor-de-rosa,

(...)

Róseas unhinhas que a maré partira...

Dentinhos que o vaivém desengastara...

Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos...
Porque, enterrados no espaço das enormes trivialidades, no lençol da vacuidade reinante, lá estão as coisas para ficar, aquelas com que se aprende sempre, os sinais do que muda ou não muda. Eu faço uma colheita todos os dias, com uma rede muito fininha, para apanhar os "pedacinhos de ossos", o que me leva a usar a maior quantidade de diminutivos que me lembre de usar em meia dúzia de frases. Mas é de facto um trabalho de pinça, lupa e atenção, parecido com o que os velhos filatelistas fazem para medir denteados, observar filigranas, ou encontrar a marca secreta na filatelia chinesa que distingue o selo raro do vulgar. China duas vezes, hum... é para desconfiar que isto é feito para tempos muito lentos, muito lentos mesmo.

Aqui vão alguns dos "dentinhos que o vaivém desengastara", cada um na sua caixinha da classificação:

MUDAR CUSTA MUITO: corticeiros e conserveiros deram o seu contingente de bons anarquistas e sindicalistas revolucionários na I República. Mas para além da revolução queriam duas coisas: closed shop, ou seja, o controlo pelos sindicatos do acesso ao trabalho, e que os homens ganhassem mais do que as mulheres. Suspeitavam, como cem anos de vida laboral vieram a confirmar para muitas profissões, que o acesso das mulheres ao seu mercado de trabalho significasse menores salários e degradação da posição "social" da sua profissão. Cem anos depois, no Portugal de 2008, finalmente se anuncia, com adiamento para mais oito anos, para 2015, o fim das desigualdades salariais entre homens e mulheres corticeiras.

O QUE ESTÁ A MUDAR: cada vez mais a nossa natalidade é salva pelos emigrantes. Em 2007, quase dez mil crianças portuguesas são pretinhas, amarelas, louras, têm os olhos em bico, e nasceram a ouvir crioulo, russo, romeno, moldavo, chinês, e a serem recebidas com diferentes rezas, mezinhas, altares, igrejas e mesquitas. Sejam bem-vindas a este nosso Cafarnaum ocidental que cada vez mais depende delas para não encolher. 2007 foi também o primeiro ano de saldo negativo entre a natalidade e a mortalidade desde que a pneumónica matou dezenas de milhares de portugueses em 1918.

EFEMÉRIDES PARA NÃO COMEMORAR: 1918 é um ano pouco propício para se lembrar porque não só por cá passou a pneumónica, levou o nosso Amadeo de Souza-Cardoso entre outros, mas também porque foi o ano da greve geral, da carestia de vida, dos assaltos às mercearias e do início do nosso peculiar "bolchevismo". Tanta coisa parecida com 2008. Esquece.

UMA ESTREIA: uma bola de futebol entrou no Processo Casa Pia pela mão de Carlos Cruz e foi mandada examinar pelo "advogado de Bibi", assim é designado o ilustre causídico que defende o sr. Carlos Silvino. Já só faltava aparecer uma bola no tribunal e ir parar ao laboratório científico da PJ, deve aliás ter graça a análise. Como a cabeça dos portugueses tem sido nos últimos tempos substituída por uma bola, convém ter muito cuidado em "escalpelizar" a dita bola, não vá ela vir de um telespectador da RTP.

JÁ NÃO HÁ RESPEITO: o "capitão de Abril" Vasco Lourenço parece que esteve para entrar em vias de facto com o distinto sportinguista Dias Ferreira por este lhe ter dito que a "que aquilo [uma assembleia do clube] não era uma assembleia do MFA e que não lhe dava lições de democracia." Um sócio que estava perto descreveu a resposta épica do "capitão de Abril", que "caminhou entre as poucas cadeiras que o separavam do conhecido causídico, que meio pavilhão temeu que tão ilustres sportinguistas chegassem a vias de facto". Mas não, ficou-se "pelo gesto forte e a palavra dura" e depois saiu da sala. Já não há respeito pelo 25 de Abril. Classificar em "sinais preocupantes" e enviar ao senhor Presidente da República para celebrações futuras.

AS TRADIÇÕES AINDA SÃO O QUE ERAM: Luís Fazenda é um deputado do BE subestimado face ao fogo calvinista - onde é que já ouvi isto? -, que arde sempre na palavra de Louçã. Savonarola talvez ficasse melhor do que Calvino, mas fica para outra ocasião. Fazenda vem da UDP, é mais clássico, mais sólido e mais fino. Veja-se a boa resposta que deu a Alberto Martins, que, sem imaginação e fora do contexto, lhe atirou com uns "uivos", sem evitar, numa de estereótipo antifascista, citar o Aquilino, fora aliás do contexto. Disse Fazenda com saber e elegância: "Numa concepção ontológica, animal é todo aquele que tem animação, e nesse sentido o senhor deputado é tão animal como nós." Tiro no porta-aviões.

NOVAS PROFISSÕES: eu, se fosse consultor de profissões com emprego absolutamente certo, não teria dificuldade em aconselhar os pais e mães dos meninos sobre as escolhas mais seguras. Por exemplo, aprender maltês, uma língua oficial da União Europeia, com um deficit aflitivo de tradutores credenciados. Mas há mais, contrariando quem se queixa que o Governo não ajuda ao emprego. Ajuda, ajuda, por exemplo, sendo-se "consultor de segurança alimentar", um bom exemplo de um novo tipo de empresas que proliferam à custa da ASAE. As que já existem pretendem, como os nossos corticeiros e conserveiros do início do século, que o Estado lhes garanta uma espécie de closed shop. Querem leis que regulamentem o exercício da profissão: "Estamos num mercado em que qualquer empresa pode exercer esta actividade, não precisa de ter condições especiais", afirmou o presidente da Associação Nacional das Empresas de Segurança Alimentar (ANESA). Querem as "condições especiais" para impedir que "os laboratórios, empresas de higiene e segurança no trabalho, de produtos, empresas de comercialização de produtos alimentares" entrem no sector. O mercado parece lucrativo à custa do medo da ASAE. Uma senhora coordenadora da Associação de Produtores dos Suínos de Raça Bísara queixava-se de que lhes pedem 500 euros para fazer "um plano de segurança alimentar" e que tanto lhes faz que os produtores dos "Suínos de Raça Bísara" sejam grandes ou pequenos, o preço é sempre o mesmo.

QUOTIDIANO: em Odivelas, um russo e dois ucranianos mandaram um taxista seguir para o metro do Senhor Roubado. Quando passavam pelo Vale do Forno, atacaram-no com gás pimenta para o roubar. O taxista teve sorte, escapou com vida, e conseguiu dar o alarme a tempo. A PSP fez tudo certo e apanhou primeiro dois dos homens e depois o terceiro, à sapatada porque resistiu. Estou a vê-los a todos, os eslavos com o seu treino militar, ou mafioso-militar, correndo rápidos, T-shirt, calças de ganga e sapatilhas, pelas ruas de Odivelas, com a nossa nova geração de polícias, imaginando-se numa cena típica dos Cops, atrás. E não é nada mau que seja assim, a ecologia do crime é cada vez mais parecida. Se alguém, há vinte anos, dissesse que em Odivelas a guerra fria entre o Leste e o Ocidente iria passar pelas suas ruas-dormitório, ninguém acreditava.

*

E podia continuar, dia a dia, jornal a jornal, a ver o que muda, e o que nada muda. Move-se? Claro que se move, mas não é onde nós queremos que se mova. Fica lá de pedra e cal? Fica, mas fica onde nós queríamos que mudasse. Não há nada como os coleccionadores para ouvirem o ruído do mundo, ordenado nas suas caixinhas chinesas...

(Versão do Público de 31 de Maio de 2008.)

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© José Pacheco Pereira
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