ABRUPTO

13.12.08


COISAS DA SÁBADO: AXIOMA

Tudo o que apareça nos jornais sobre Dias Loureiro e os seus negócios cai em cima do Presidente Cavaco Silva, do PSD e só em último lugar de Dias Loureiro. Por esta ordem. Ninguém sabe isso melhor do que o PS e o governo

ENFRAQUECER O PRESIDENTE QUANDO ELE TEM MAIS PODER POLÍTICO

No sistema constitucional português, e na realidade simbólica da política, o Presidente tem mais poderes de facto numa situação como aquela que se vai viver em 2009: crise económica e social, descontentamento, protesto contra o governo, políticas controversas, medidas eleitoralistas que implicam desperdício. Quando o PS quer ter as mãos mais livres, o Presidente é um estorvo. E por isso, o PS quer colocá-lo na ordem. Daí a intransigência na questão do estatuto dos Açores e a mão invisível nalgumas notícias sobre o BPN, em que a acção do governo está longe de ser transparente.

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LIVROS DE QUATRO GERAÇÕES (91)


Clicando fica na boa dimensão

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EARLY MORNING BLOGS

1451 -Vespers

In your extended absence, you permit me
use of earth, anticipating
some return on investment. I must report
failure in my assignment, principally
regarding the tomato plants.
I think I should not be encouraged to grow
tomatoes. Or, if I am, you should withhold
the heavy rains, the cold nights that come
so often here, while other regions get
twelve weeks of summer. All this
belongs to you: on the other hand,
I planted the seeds, I watched the first shoots
like wings tearing the soil, and it was my heart
broken by the blight, the black spot so quickly
multiplying in the rows. I doubt
you have a heart, in our understanding of
that term. You who do not discriminate
between the dead and the living, who are, in consequence,
immune to foreshadowing, you may not know
how much terror we bear, the spotted leaf,
the red leaves of the maple falling
even in August, in early darkness: I am responsible
for these vines.

(Louise Glück)

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LIVROS DE QUATRO GERAÇÕES (90)





Clicando fica na boa dimensão.

Marcas de livrarias antigas.

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12.12.08


EXTERIORES: CORES DE HOJE

Clicando na fotografia fica na boa dimensão. Para se ver



Lua em Caxias, agora. (ana)

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VÍRUS

O som napolitano.

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COISAS DA SÁBADO: CORNUCÓPIA DA ABUNDÂNCIA

De repente, após anos de vacas magras, parece que uma cornucópia celeste derrama milhões sobre alguns. É a “crise”? É a “crise”, mas não é só a crise, é o ano eleitoral, são as eleições. Os milhões que amparam a banca, a indústria automóvel, as pequenas e médias empresas, o imenso programa de investimento público em “betão”, e benesses vastas e variadas, têm uma função no contexto da “crise”, mas servem os objectivos eleitorais do PS a curto prazo. Mas não só: servem também um projecto de controlo estatal da economia privada, que ameaça diminuir os poucos espaços de autonomia da sociedade civil que ainda sobrevivem. Este último aspecto é muito preocupante e disfarça-se por detrás de uma retórica entre o marxista e o keynesiano, que é instrumental apenas para objectivos políticos precisos: dar ao governo mais controle sobre a sociedade, reforçar o poder político de José Sócrates.

O Primeiro-ministro deve estar satisfeito porque todos lhe vão, como os passarinhos, comer à mão. Quem é o banqueiro que vai desperdiçar os avales do estado, mesmo que não precise deles? Quem protesta contra “nacionalizações”, que parecem rodeadas de todas as melhores intenções do mundo e ainda por cima “justificadas” pelas fraudes da ganância? Quem quer ficar de fora de linhas de crédito tão generosas, mesmo que seja para aumentar o endividamento? Quem não quer investimento público que canalize dinheiro para a galáxia da construção civil, mesmo que seja para construir inutilidades ou obras pouco prioritárias? Que grupo económico ou empresário vai nestes tempos dizer ao Primeiro-ministro “não obrigada”, o país precisa de outra política? O resultado é que tudo lá está na entourage das sessões de propaganda do Primeiro-ministro, quando ele promete mais uns milhões, ou inaugura uma maquete de hospital.

O pobre devia desconfiar da grande esmola, mas o pobre tem os olhos e os ouvidos cheios de “crise” e de ameaças. Sabe melhor do que ninguém que o seu emprego está em risco, sabe que deve mais do que devia, sabe que as dificuldades aumentam dia a dia. Na rádio e na televisão a regra é uma comunicação social complacente com o governo quando não abertamente propagandística, temperada por muito futebol, concursos e reality shows. E o pobre acaba também por achar que mesmo que deva desconfiar da largueza da esmola, vale mais pouco do que nada, e no fundo, com a “crise” não há nada a fazer.

A factura virá depois, depois de 2009, para os pobres e para os empresários que povoam os gabinetes ministeriais. Os primeiros ficarão mais pobres, os segundos, se pensam ter veleidades de independência com um eventual governo PS, tirem daí os pensamentos.

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EXTERIORES: CORES DE HOJE

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Memorial a Jorge Luis Borges inaugurado há momentos em Lisboa.



Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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VÍRUS

Esta é a ditosa língua minha amada.

Livros e leitura (2).

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COISAS DA SÁBADO: A CRISE DO PSD...



... não nasceu na última sondagem por muito que isso convenha às facções internas para quem a simples explicação conjuntural, - a culpa é de Manuela Ferreira Leite, - não só chega como é conveniente. Nas dificuldades do PSD não conta, segundo eles, o passado, a imagem que a maioria dos portugueses têm da experiência governativa Barroso – Portas – Lopes, não conta a fuga de Barroso, não contam as peripécias do governo Lopes – Portas, não contam os sucessivos escândalos com sobreiros, submarinos, casinos, não contam os financiamentos ilegais, não conta a imagem do grupo parlamentar escolhido por Santana Lopes, não conta o “menino guerreiro”, não contam as histórias do BPN, não conta a “estratégia” de desgaste de Passos Coelho sempre apresentada como sendo de uma benévola expectativa, não contam os impropérios raivosos de Menezes, resumindo e concluindo, não conta a imagem pública pelas ruas da amargura do PSD como partido político, isso não conta nada. O PSD não sobe porque Manuela Ferreira Leite faz gaffes, e apenas por isso. Compreendo muito bem este ponto de vista que anima as facções internas, visto que falar de outras coisas atira demasiado a luz sobre os próprios que as omitem.

Para que o PSD inverta a situação que data já de 2004, exige-se muito trabalho para tecer de novo a relação de confiança com os portugueses, outras pessoas, outros métodos, outra seriedade e credibilidade. O PSD precisa de tempo e de determinação, porque cada passo nesse sentido terá que ser feito contra enormes resistências internas. Mas tenho de há muito a convicção de que enquanto o PSD não fizer as contas com o seu passado mais imediato, em particular com a sua experiência governativa desastrosa, vai ter muita dificuldade em sair do buraco em que o meteram.

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EARLY MORNING BLOGS

1450 - Dulcissime vanus Homems

Al amor de la lumbre cuya llama
como una cresta de la mar ondea.
Se oye fuera la lluvia que gotea
sobre los chopos. Previsora el ama

supo ordenar se me temple la cama
con sahumerio. En tanto la Odisea
montes y valles de mi pecho orea
de sus ficciones con la rica trama

preparándome el sueño. Del castaño
que más de cien generaciones de hoja
criara y vio morir, cabe el escaño

abrasándose el tronco con su roja
brasa me reconforta. ¡Dulce engaño
la ballesta de mi inquietud afloja!

(Miguel de Unamuno)

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10.12.08


COISAS SIMPLES



(Cézanne)

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EARLY MORNING BLOGS

1449 - Gathering Leaves

Spades take up leaves
No better than spoons,
And bags full of leaves
Are light as balloons.

I make a great noise
Of rustling all day
Like rabbit and deer
Running away.

But the mountains I raise
Elude my embrace,
Flowing over my arms
And into my face.

I may load and unload
Again and again
Till I fill the whole shed,
And what have I then?

Next to nothing for weight,
And since they grew duller
From contact with earth,
Next to nothing for color.

Next to nothing for use.
But a crop is a crop,
And who's to say where
The harvest shall stop?

(Robert Frost)

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9.12.08

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LIVROS DE QUATRO GERAÇÕES (89)


Clicando fica na boa dimensão.

É difícil encontrar um livro tão magnificamente ilustrado como este Dans La Rue de Aristide Bruant. Os desenhos e a capa são nem mais nem menos do que de Steinlein, o que basta para perceber a qualidade. Algumas destas letras ficaram como o paradigma da canção revolucionária, anti-militarista, e anarquista.











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EARLY MORNING BLOGS

1448

Espérez-vous que la postérité
Doive, mes vers, pour tout jamais vous lire?
Espérez-vous que l'oeuvre d'une lyre
Puisse acquérir telle immortalité?

Si sous le ciel fût quelque éternité,
Les monuments que je vous ai fait dire,
Non en papier, mais en marbre et porphyre,
Eussent gardé leur vive antiquité.

Ne laisse pas toutefois de sonner,
Luth, qu'Apollon m'a bien daigné donner :
Car si le temps ta gloire ne dérobe,

Vanter te peux, quelque bas que tu sois,
D'avoir chanté, le premier des François,
L'antique honneur du peuple à longue robe.

(Joachim Du Bellay )

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8.12.08


COISAS SIMPLES



(Ivan Shishkin)

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O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
O QUE O GOVERNO FEZ POR SI (ANTES DA CRISE)




Muito antes da crise financeira e económica, o fosso de rendimentos entre os 20% de portugueses mais ricos e os 20% mais pobres era um dos dois piores dos 27 países da União Europeia, sendo o rendimento dos primeiros 6,8 vezes superior ao dos segundos. Só a Letónia faz pior.

Foi em 2006 que a taxa de desemprego em Portugal ultrapassou a média da UE, estando agora perto dos 8%.

O défice da nossa balança corrente, que era de 0,1% em 1995, começou a agravar-se e atingiu uns exorbitantes 10,2% em 2000, sob Guterres; mantém-se, desde antes do deflagrar da crise e sob a batuta Sócrates, acima dos 9%, ou seja, todos os anos nos vimos endividando para pagar 9% do que gastamos.

Desde 2004, desde bem antes da crise, que Portugal vem caindo no ranking de competitividade do Institute for Management Development, de 36º, para 37º para 39º ( e 19º entre os 24 países da UE analisados).

Entre 1996 e 2006, vinha distante a crise, as exportações portuguesas cresceram cerca de 6%. As exportações da Hungria cresceram 19%; as da Eslováquia, 18%; as da Polónia, 17%; as da República Checa, 16%.

O rendimento per capita português (corrigido em termos de paridade de poder de compra) era de 84,2% da média da UE 27 em 1999. Era de 72,8% em 2008. Fomos ultrapassados, bem antes da crise, em 2003, por Malta e Eslovénia; em 2004, pela República Checa; pela Estónia, este ano. Somos agora 20º entre 27, e a cair.

A carga fiscal sobre os portugueses (soma da taxa máxima de IRS + taxa standard de IRC + taxa standard de IVA + contribuições para a segurança social de empregadores e empregados) ultrapassou em 2005 a média da UE e manteve-se muito acima com os aumentos de todos os 9 impostos desde Fevereiro de 2005. A carga fiscal portuguesa é de 123 pontos hoje, contra os 116 da média da UE27 e, pior, contra os 102 pontos dos nossos mais directos concorrentes, os 12 países que aderiram em 2004 e 2007.

O défice público ficou, em 2007, em 2,6% do PIB, mas a despesa pública cresceu e situou-se, antes da crise, nuns asfixiantes 45,7% do PIB. Será de 47,7% em 2009, segundo as fantasias do OE, ou na realidade pior. Como, ainda, o défice foi corrigido só com mais receita fiscal, estamos sempre em risco de regredir.

A paixão da educação de Guterres e as grandes reformas de Sócrates não impediram um abandono escolar de 36,3% em 2007, um ano pré-crise, contra os 15% da UE.

A dívida externa em relação ao PIB estava, antes da crise, perto dos 90%, e vinha subindo 10% ao ano. Em breve deveremos toda a riqueza produzida num ano. E só os juros dessa dívida equivalem a 6% do PIB.

Eis o que dá novo e revigorado sentido às declarações do primeiro-ministro sobre as más previsões da OCDE : «Com a situação dos outros podemos nós bem.» Ninguém o diria melhor.

(FONTES: INE, EUROSTAT, RELATÓRIO DA OCDE, PORTUGAL REVIEW DA OCDE, ARTIGO DE MIGUEL FRASQUILHO IN IPRIS, INDEX DO IMD)

(José Mendonça da Cruz)

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EXTERIORES: CORES DESTES DIAS

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Hoje na Foz do Douro. (José Carlos Santos)



Entre aguaceiros, em Lisboa, na Tapada das Necessidades. (Fernando Correia de Oliveira)


Arco-íris junto à Igreja da Cartuxa, Caxias. (Miguel R. de Almeida)



Nos dias 6 e 20 de Dezembro, o Planetário da Biblioteca Municipal da Nazaré irá promover sessões de astronomia, orientadas pelo cientista Máximo Ferreira. Entre as 15 e as 18 horas, todos os interessados poderão descobrir os mistérios do Sistema Solar, ouvir as histórias milenares que deram origem aos nomes das constelações ou recordar porque razão o céu vai variando ao longo do ano, na rotação da Terra em volta do Sol. A entrada no Planetário é gratuita e aberta ao público em geral.

Estas sessões marcam a entrada em funcionamento do novo Planetário da Biblioteca Municipal da Nazaré, inaugurada no passado dia 22 de Novembro. Esta infra-estrutura será o palco, a partir do próximo ano, de acções regulares de observação astronómica e de divulgação da cultura científica, bem como de sessões dirigidas para as escolas. As sessões de Astronomia no Planetário da Biblioteca Municipal da Nazaré são promovidas pela autarquia local. (Jorge Lopes)



(Miguel Sebastião)



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Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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LIVROS DE QUATRO GERAÇÕES (88)


Clicando fica na boa dimensão.

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EARLY MORNING BLOGS

1447 -Le poulpe



Jetant son encre vers les cieux,
Suçant le sang de ce qu'il aime
Et le trouvant délicieux,
Ce monstre inhumain, c'est moi-même.

(G. Apollinaire)

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7.12.08


RECONSTITUIÇÃO DAS IMAGENS PERDIDAS DO ABRUPTO


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O QUE NUNCA CHEGA AOS JORNAIS



No início desta semana João César das Neves publicou no Diário de Notícias um artigo muito crítico do jornalismo português. Contrariamente à habitual reacção corporativa, o artigo foi abafado num grande silêncio, como se as suas palavras queimassem de mais para serem sequer lembradas. Nele se escreviam estas verdades como punhos:

"A nossa imprensa traz pouca informação. Muita análise, intriga, provocação, boato, emoção, combate, mas pouca informação (...). Assiste-se a uma verdadeira caça ao deslize, empolado até à hilaridade. (...) Aliás, relatar o sucedido é o que menos interessa. O jornalista vai ao evento para impor a agenda mediática que levou da sede.

O mais curioso é que, embora a imprensa escrita e falada seja intensamente opinativa, nunca se assume em termos políticos. (...) O público não é informado da orientação do meio que escolheu, porque todos dizem apenas a verdade. Todos os repórteres têm opinião, mas todos são isentos de orientações e partidarismos."

Não há semana que não forneça novos exemplos a esta degradação e muito do que acontece nem sequer é conhecido do público, ou porque não interessa aos jornalistas, ou porque eles não estão lá. Esta semana tive ocasião de assistir em directo e, de algum modo, participar num evento que ilustra de forma exemplar como se faz informação em Portugal. Convidado a participar no 2.º Encontro Nacional de Centros Novas Oportunidade, pude assistir ao modo como as coisas funcionam e como chegam (ou não chegam) ao conhecimento público.

Saudei desde início o programa das Novas Oportunidades como uma política pública com relevo para um país como Portugal onde a baixa qualificação é um dos mais graves problemas nacionais. Os objectivos do programa foram definidos pelo primeiro-ministro:

"A estratégia da Iniciativa Novas Oportunidades tem dois pilares fundamentais. Em primeiro lugar, fazer do ensino profissionalizante de nível secundário uma verdadeira e real opção, dando oportunidades novas aos nossos jovens. (...) O segundo pilar é o de elevar a formação de base dos activos. Dar a todos aqueles que entraram na vida activa com baixos níveis de escolaridade, uma nova oportunidade para poderem recuperar, completar e progredir nos seus estudos."
O arranque da iniciativa foi muito positivo e levou muitos portugueses a revalorizarem o saber, o ensino, a escola, que de há muito tinham abandonado e procurar uma certificação para que estavam habilitados. Embora o entusiasmo inicial tenha esmorecido, o que se compreende, a amplitude do trabalho já realizado merece reconhecimento e mérito, embora seja tempo de começar a medir-se os resultados. Na verdade, as boas intenções não chegam: o país já desbaratou milhões em programas de formação profissional com escasso resultado, como aconteceu com os cursos financiados pelo Fundo Social Europeu.

Eu conhecia o programa oficial do encontro, onde participava num dos debates, só que, na verdade, o que aconteceu foi mais uma sessão preparada para que o primeiro-ministro tivesse a sua dose diária de televisão, num evento "positivo", com a vantagem de poder fazer um comício para 1500 pessoas, professores na sua esmagadora maioria, que tinham que lá estar por obrigação profissional. No programa oficial não há qualquer menção à presença do primeiro-ministro, devendo o encontro ser aberto pela ministra da Educação e pelo ministro do Trabalho. Só que se percebia de imediato, pelo aparato na rua, que ia haver um participante não anunciado, José Sócrates. Aliás, a comunicação social também fora prevenida, porque estava lá um batalhão de jornalistas, câmaras, carros de reportagem, etc. Este chegou com quase uma hora de atraso, sem qualquer pedido de desculpas, e tudo esperou por ele.

Eu, que não gosto de ser "levado", ainda hesitei se continuaria ou não na sala, mas decidi continuar, caminhando para a última fila. As intervenções dos ministros da Educação e do Trabalho foram sóbrias e correspondentes ao espírito de um encontro de trabalho, como era suposto este ser. Só que depois veio o primeiro-ministro e, no meio da agitação dos jornalistas, fez o seu comício diário para a televisão, cheio de "paixões" e "desejos" e "intenções" e sentimentos vários a que, obviamente, só o seu Governo respondeu na história da nação. As Novas Oportunidades somaram-se a muitas outras "mais importantes" iniciativas do Governo. Em cada uma ele diz que é "a mais importante", mas ninguém dá pelo contra-senso.


Nunca como ali me pareceu mais certeira a classificação que dei de "momentos Chávez" a essas intervenções. Chávez tem um espaço diário oficial na televisão e rádio, numa comunicação social governamental e típica dos generais Tapioca que pululam na América Latina. José Sócrates tem o mesmo, só que feito doutra maneira. Na agenda do seu dia há sempre um pequeno comício que as televisões, a começar pela RTP, cobrem obedientemente e ele, todos os dias, como Chávez, aparece na televisão.
O momento-Chávez de hoje foi no anúncio do Hospital de Braga. Em maqueta.
O caso é único na Europa, onde não se imagina uma prelecção diária de propaganda de Zapatero, Sarkozy, Merkel ou Gordon Brown. Estes aparecem no exercício das suas funções, mas de modo muito diferente de Sócrates. Os nossos jornalistas não se apercebem, ou apercebem-se bem de mais, do seu papel de instrumentos de propaganda, sem qualquer conteúdo informativo, e acham natural o que se passa.

Terminado o comício, Sócrates saiu e com ele os jornalistas todos (se algum ficou não dei por ela). Quando resolvi ficar, decidi também que iria acrescentar à minha comunicação sobre as Novas Oportunidades, algo mais: uma referência à politização e governamentalização daquela iniciativa, e aos seus efeitos perversos bem visíveis, ouvindo-se o primeiro-ministro. Foi o que fiz, referindo como sinais dessa politização, que pode pôr em causa os objectivos das Novas Oportunidades, a obsessão pelas estatísticas e os números redondos (por muitos números redondos que se atirem, o objectivo apontado para 2010 de um milhão de participantes está muito longe de ser alcançado), a condição básica de exigência na certificação, e, por fim, a necessidade de medir os resultados do programa por uma avaliação externa e pelo seu impacto na empregabilidade e no aumento da produtividade nacional.

Parece que referir esta necessidade de resultados mensuráveis, a prazo sem dúvida mais dilatado, incomoda muita gente, mas é inteiramente coerente com os objectivos da iniciativa, porque não se pode considerar que a "batalha da qualificação" se fica só pelos "saberes" mais ou menos intangíveis dos participantes ou por um diploma que não serve para nada. Que estas preocupações são partilhadas pelos formadores presentes na sala, que também não devem ter gostado muito do comício a que foram obrigados a assistir, está o facto de eu ter sido o único participante a receber palmas em plena intervenção e exactamente nas partes mais críticas para a governamentalização da iniciativa. Mas o que aconteceu foi mais um não-evento, como muitos outros que devem ocorrer pelo país fora, e que não encaixam no padrão comunicacional da subserviência ao poder.



Eu sei que este meu artigo traduzido em "jornalistês" dá qualquer coisa como isto: ele quer comparar-se ao primeiro-ministro de Portugal no "critério jornalístico", e está danado por ter ido lá dizer coisas a despropósito, ninguém lhe ter ligado e não vir nos telejornais. Nem sequer precisam de se esforçar, porque eu sei o que as casas gastam. Se isto não vier nos jornais, vem nos blogues dos jornalistas. Mas, voltando ao sério, continuam para mim de pé as afirmações mais duras de César das Neves:
"O actual Governo goza de clara benevolência jornalística. Apesar da contestação e inevitáveis 'gaffes', o tratamento não se compara com o dos antecessores. (...) Muitos dos que relatam o jogo participam nas equipas. Quando o jogo se suja, avolumam-se as suspeitas. Isto ainda não afecta o poder da imprensa, mas já degrada a classe."
Os jornalistas sérios sabem que é assim, mas mesmo esses deviam fazer mais do que o que fazem para não pecarem por omissão. Também se vai para o Inferno por isso.

(Versão do Público de 6 de Dezembro de 2008.)

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LIVROS DE QUATRO GERAÇÕES (87)



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EARLY MORNING BLOGS

1446 - A ventura é traidora

Tembra a que unha inmensa dicha
neste mundo te sorprenda;
grorias, aquí, sobrehumanas,
tran desventuras supremas.
Nin maxines que pasan os dores
como pasan os gustos na terra;
¡hai infernos na memoria,
cando n'os hai na concencia!

Cal arraigan as hedras nos muros,
nalgúns peitos arraigan as penas,
e unhas van minando a vida
cal minan outras as pedras.
Si; tembra, cando no mundo
sintas unha dicha imensa;
val máis que a túa vida corra
cal corre a iaugua serena.

(Rosalia de Castro)

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© José Pacheco Pereira
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