ABRUPTO |
semper idem Ano XIII ...M'ESPANTO ÀS VEZES , OUTRAS M'AVERGONHO ... (Sá de Miranda) _________________ correio para jppereira@gmail.com _________________
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11.6.16
O QUE EU DIRIA SE FOSSE A UM CONGRESSO DO PSD...
…onde não posso ir porque não sou delegado, não tive nenhum cargo que me desse esse direito por inerência e não quereria falar numa condição de favor em relação aos que têm o direito de lá estar. Aliás, essa hipótese já se colocou num dos primeiros congressos da era Passos Coelho e foi recusada pela direcção do partido. Aos energúmenos que nos partidos têm a sua única vida profissional e que adorariam essa ocasião para me apupar devo dizer-lhes que é para o lado em que durmo melhor. Já tive na vida muitas mais ocasiões de incómodo e riscos muito maiores, para me assustar com isso. Além disso seria uma honra, como se percebe deste texto.
Aqui vai, de fora, como se fosse lá dentro.
Ponham lá nas paredes das sedes do PSD...
Passavam menos de 15 dias sobre o 25 de Abril de 1974, a 6 de Maio, três homens, Francisco Sá Carneiro, Joaquim Magalhães Mota e Francisco Pinto Balsemão, liam a declaração genética do PPD, depois PSD, intitulada Linhas para um Programa. Chamo a atenção: o habitual argumento destinado a desqualificar os documentos dos primeiros anos do PSD, de que são o resultado de habilidades linguísticas destinadas a obter legitimidade nos anos do PREC, não colhe de todo. Este documento é escrito muito antes de se dar a radicalização política do ano de 1975 e aliás não esconde a génese do novo partido na chamada "ala liberal" cuja actividade cessava então "pelo nascimento dum partido de orientação social-democrata". Ou seja, os autores desta declaração estavam a dizer exactamente o que queriam dizer e a situar-se exactamente onde queriam situar-se.
Inscrito a letras de ouro ...
Deixemos de lado a parte do apoio ao MFA e ao 25 de Abril, para nos atermos às demarcações do texto e ao seu conteúdo programático. Primeira demarcação: a "concepção e execução dum projecto socialista viável em Portugal, hoje, exige a escolha dos caminhos justos e equilibrados duma social-democracia, em que possam coexistir, na solidariedade, os ideais de liberdade e de igualdade." A expressão "caminhos justos e equilibrados duma social-democracia" significa que o novo partido se distanciava dos outros "socialismos", em particular dos dois partidos que tinham chegado ao 25 de Abril aliados por um "programa comum": o PS e o PCP. Esse "programa" não durou muito, mas existia.
Para não se esquecerem de onde vimos...
O que é que significava esta "visão social-democrata da vida económico -social"?
"a) Planificação e organização da economia com participação de todos os interessados, designadamente das classes trabalhadoras e tendo como objectivos: desenvolvimento económico acelerado; – satisfação das necessidades individuais e colectivas, com absoluta prioridade às condições de base da população (alimentação, habitação, educação, saúde e segurança social); – justa distribuição do rendimento nacional.
b) Predomínio do interesse público sobre os interesses privados, assegurando o controlo da vida económica pelo poder político (…).
c) Todo o sector público da economia deve ser democraticamente administrado (…) .
d) A liberdade de trabalho e de empresa e a propriedade privada serão sempre garantidas até onde constituírem instrumento da realização pessoal dos cidadãos e do desenvolvimento cultural e económico da sociedade, devendo ser objecto de uma justa programação e disciplina por parte dos órgãos representativos da comunidade política.
(…)
f) Adopção de medidas de justiça social (salário mínimo nacional, frequente actualização deste salário e das pensões de reforma e sobrevivência, de acordo com as alterações sofridas pelos índices de custo de vida, reformulação do sistema de previdência e segurança social, sistema de imposto incidindo sobre a fortuna pessoal preferentemente ao rendimento de trabalho com vista à correcção das desigualdades)."
Citei mais extensivamente porque é uma parte crucial da "visão". Estão lá mais coisas, como a crítica ao absentismo dos latifundiários, a defesa do direito à greve ("meios necessários para uma permanente e contínua subordinação da iniciativa privada e da concorrência aos interesses de todos e à justiça social"); a possibilidade de nacionalizações para garantir o "controlo da vida económica pelo poder político"; a defesa do "saneamento" e do "julgamento dos crimes constitucionais de responsabilidade, de corrupção, contra a saúde pública e os consumidores e, dum modo geral, contra a vida económica nacional, bem como dos abusos do poder."
No plano político está lá a defesa daquilo que viria a chamar-se o "poder local"; a independência do poder judicial; a laicidade do Estado; o fim da discriminação das mulheres, e a afirmação de que a "educação e a formação constituem serviço público no mais amplo e digno sentido de expressão porquanto são fundamento e garantia de liberdade e de responsabilidade. A igualdade de oportunidades, alargamento de horizontes e a preparação ou readaptação à vida em sociedade são os objectivos fundamentais de educação e formação." Ou seja, a educação é o mecanismo-chave da mobilidade social. E por fim, a defesa da "autodeterminação" nas colónias com imediato cessar-fogo.
Para quem não sabe o que é a social-democracia...
Talvez a mais significativa frase do texto seja esta:
"Consideração do trabalhador como sujeito e não como objecto de qualquer actividade. O homem português terá de libertar-se e ser libertado da condição de objecto em que tem vivido, para assumir a sua posição própria de sujeito autónomo e responsável por todo o processo social, cultural e económico."
Ela é uma das chaves para perceber o pensamento de Sá Carneiro e dos fundadores. Não vem do marxismo, nem do socialismo, nem do esquerdismo, vem da doutrina social da Igreja tal como se materializava no pensamento da social-democracia que se queria instituir. Demarca o PSD do PS, do PCP mas, acima de tudo, daqueles que no lugar do "trabalhador" colocam as "empresas", a "economia", ou outras variantes de qualquer poder que não "liberta".
A escolha e a ordem das palavras não são arbitrárias. Estes homens devem ter ponderado todas as palavras, todas as ideias e todas as frases deste documento com o máximo cuidado e rigor. Sabiam que estavam a escrever para a História e para o dia seguinte, para os portugueses e para Portugal.
Nem é preciso dizer, de tão evidente que é, que nada disto é o que pensa e o que diz a direcção do neo-PSD que hoje existe.
Este é o PSD antigo, mas esta é também a parte que não é "modernizável".
( )
(url) 20.5.16
CRÓNICAS DO ENSINO INFERIOR
Há uma altura do ano em que uma pessoa saudável deve evitar passar por uma escola que supostamente é de "ensino superior" mas que nessa altura fica claramente de "ensino inferior". É a época das "semanas académicas" da Queima das Fitas e quejandas iniciativas de imbecilidade colectiva. Infelizmente a coisa tende a alastrar para fora das imediações das faculdades onde meia dúzia de meninos e meninas com ar de mandões capitaneiam uma trupe, volto à palavra, de imbecis que se deixam ver em poses de submissão e rastejo. E pelos vistos gostam. Não me venham com as virtudes da "geração mais qualificada", porque o que apetece é fazer uma espécie qualquer de manifesto Anti-Dantas que torne o ridículo daquilo tudo ainda mais ridículo.
( ) (url) 17.5.16
Escrito contra Sócrates em 2005, quando muitos dos nossos "liberais" eram desenvolvimentistas, quando se dizia que Sócrates estava a "roubar" o programa ao PSD, quando Sócrates aparecia como o herói da direita para pôr em ordem o défice que recebera de Santana Lopes, quando Sócrates aparecia como lutador contra as "corporações", aquilo que hoje a direita chama "oligarquia" (maldita memória!), um texto meu convenientemente descontextualizado tem sido muito citado (agradeço) para mostrar que o Pacheco Pereira "bom" era liberal e o Pacheco Pereira "mau" é socialista. Como no banco mau e no banco bom. E, portanto, ou "traiu" ou está doido. O argumento psiquiátrico tem sido muito usado, ao estilo da "psiquiatria" política da velha URSS.
Desenganem-se que sou muito mais liberal que socialista, mas sou sujeito a esse interessante anátema de que agora tudo o que não pertence a essa direita radical é socialista, pelo menos, quando não é esquerdista, radical, comunista, etc. Aliás, sobre o que disse no artigo que publiquei e que suscitou a fúria destes "liberais" ("Para a nossa direita radical o Papa é do MRPP"), nada é dito e percebe-se porquê: é que eles pensam mesmo que o Papa é do MRPP com aquelas histórias da "economia que mata…"
Sabem qual é a surpresa? É que no essencial continuo a pensar o mesmo e não me converti ao socialismo, a não ser à parte de socialismo que existe na social-democracia. Hoje diria mais coisas, porque o espírito dos tempos é outro e os problemas de 2016 são diferentes dos de 2005, mas podia dizer e certamente direi as mesmas.
Sim "precisamos de mais liberalismo, de mais liberdade económica, de mais espírito empresarial", até porque a herança do governo Passos Coelho/ Portas é tudo menos liberal. Aliás, muitas coisas são uma continuidade ainda mais agressiva de política de Sócrates, como se passou com o fisco, onde os portugueses não são cidadãos, mas mentirosos à cabeça e onde os direitos de privacidade são inexistentes, como se vê consultando a história da nossa vida toda em facturas.
A substância do que ocorreu nos últimos anos é apenas cortes ilegais de salários e pensões e alterações à legislação laboral. Nenhuma reforma estrutural foi feita, a não ser o perigoso desequilíbrio de poder no mundo do trabalho, de que pelos vistos estes nossos "liberais" gostam. Imaginem se tinham que conviver com a presença dos sindicatos nos conselhos de administração das empresas como na Alemanha. Ah!, mas os sindicatos não são os mesmos! Verdade, mas os patrões também não são e se pensam que os grandes sindicatos alemães não fazem greves e muitas vezes bem duras, estão enganados.
Agora "espírito empresarial" não é o jovem do Impulso Jovem aos saltos num palco a dizer inanidades, não é assentar o sucesso empresarial em salários baixos, não é combater os sindicatos e impedir o direito à greve, é olhar para a realidade das nossas empresas e ver, antes dos malditos dos trabalhadores preguiçosos, a muito má qualidade da nossa gestão.
O "espírito empresarial" faz muita falta em Portugal, mas o que o governo de Passos Coelho fez foi usar o poder político para colocar as "empresas" como sujeito da política e isso é o menos liberal que há. Significa, entre outras coisas, soçobrar o Estado numa política de interesses que não serve a Economia nem as pessoas. A paixão por Singapura é um bom exemplo, a tentação de um modelo autoritário de governo em nome do "sucesso empresarial".
Sim, precisamos de "crise" no sentido schumpeteriano e de mais "insegurança", mas não é apenas para os mais fracos, que já têm que chegue. O que herdámos foi a pior das "inseguranças", uma sociedade sem palavra nem boa-fé, em que todos os contratos com uns eram para romper e com outros para manter sem hesitações. Em que se governou contra a lei e pelo medo, com desprezo pelos efeitos sociais da pobreza e da desigualdade, vistos como "efeitos colaterais".
Uma sociedade liberal, usa a liberdade, toda a liberdade, para dar poder às pessoas, empowerment no sentido anglo-saxónico, e não para as fixar numa vida sem esperança nem perspectivas. E, admirem-se, sem propriedade como condição de liberdade.
É que os nossos "liberais" o que fizeram por essa Europa toda foi exactamente o contrário do sentido schumpeteriano da crise criadora, "protegendo" o sistema financeiro da crise que ele próprio tinha criado e fazendo recair as custas dessa "protecção" sobre os trabalhadores e pensionistas.
Podia continuar, mas a causa é ruim.
O problema está no enorme simplismo e na dicotomia com que se fala de política em Portugal. Ou é a preto ou é a branco. É falar do "liberalismo económico" como se fosse alguma coisa que sem liberalismo político, em primeiro e em último lugar, fosse diferente da lei da selva. Para um verdadeiro liberal a liberdade nasce da política e não da economia, e a subordinação do poder económico ao poder político é vital. Para quem ama a liberdade, a democracia implica o voto e o primado da lei, tudo coisas que nos anos da "crise" perdemos. O nosso voto não vale quase nada porque não nos governamos a nós próprios e a lei, a começar pela Constituição, de nada valia.
Quanto ao resto batam à porta da Europa s.f.f.
É que hoje a "Europa" do Eurogrupo, os seus mandantes de Bruxelas e os seus mandados em cada país são a principal ameaça à liberdade dos povos. Hoje, ser liberal, no completo e genuíno sentido da palavra, é combater aquilo que na verdade nem é sequer um "superestado", mas uma máquina de poder ao serviço de interesses da Alemanha e dos seus aliados, e de uma burocracia tecnocrática que acha que governa melhor os países do que os seus políticos eleitos. Nada tem feito mais mal à liberdade do que o pôr em causa a soberania como espaço em que a democracia tem sentido.
O que é que pensam que a Europa está a impor aos gregos a ferro e fogo? Mais liberdade na sociedade e na economia? Soluções para a crise da economia grega? Não. Um puro diktat punitivo, sem canhoneiras como no passado, mas com dinheiro. Ainda estou à espera de ver os nossos "liberais" incomodados.
É disto que tem sentido falar em 2016.
( .) (url) 12.5.16
SURPRESA!
Desenganem-se que sou muito mais liberal do que socialista,
mas sou sujeito a esse interessante anátema de que agora tudo o que não
pertence a essa direita radical é socialista, pelo menos, quando não é
esquerdista, radical, comunista, etc. Aliás, sobre o que disse no artigo que publiquei
e que suscitou a fúria destes “liberais” (“Para a nossa direita radical o Papa
é do MRPP”), nada é dito e percebe-se porquê: é que eles pensam mesmo que o
Papa é do MRPP com aquelas histórias da “economia que mata…”
Sabem qual é a surpresa? É que no essencial continuo a
pensar o mesmo e não me converti ao socialismo, a não ser à parte de socialismo
que existe na social-democracia.
....
(Hoje na .)
(url)
O PROBLEMA
DOS GRANDES PARTIDOS
Existe um
problema com os grandes partidos, o PS e o PSD? Existe e não é pequeno. Nem um
nem outro estão longe de corresponderem às necessidades dos actuais tempos
portugueses. Nem um nem outro são capazes de qualquer renovação significativa,
embora o PSD a tenha mais feito do que o PS, mas para pior. Nenhum tem hoje
qualquer capacidade de mobilização própria fora de eleições, não agregam por
mérito os sectores mais dinâmicos da sociedade, não produzem ideias, nem
políticas novas, estão lá à espera da mudança dos ciclos políticos e mesmo
assim sem grande eficácia.
O PS pode
estar hoje no governo, mas nunca se deve esquecer que perdeu as últimas
eleições. Repito: perdeu as últimas eleições. E também não se deve esquecer, e
às vezes parece, que para manter o governo tal como ele é, um governo “novo” de
PS com apoio parlamentar do BE e PCP,
vai ter que travar combates políticos muito duros, quer lá fora na
“Europa” do Eurogrupo, quer cá dentro com uma direita “passista” que não tem um
pingo de moderação. Duvido que nessas circunstâncias o PS como está sirva para
muito a não ser para aumentar o isolamento do governo com todos os viúvos e
viúvas de Seguro e Belém a virem a terreiro criticar a “experiência radical “
de Costa quando este parecer mais frágil.
Quanto ao
PSD está cada vez mais longe do que foi, um partido social-democrata,
reformista e basista. Cavaco, mesmo apesar dos seus tempos finais na
Presidência, foi o último a manter alguma ligação com as origens do partido,
com excepção dos interregnos de Manuela Ferreira Leite e Marques Mendes. O
primeiro sinal do que se ia passar foram as direcções de Lopes e Menezes, muito
diferentes entre si, mas trazendo elementos que desvirtuaram a identidade partidária, desde o culto de
personalidade do “menino guerreiro” até ao modo como Menezes construiu uma
estrutura de controlo que ainda lá está com Passos Coelho. Mais do que Relvas, Passos teve a “mão” de Menezes.
Mas todos
vinham de “dentro”, dos maus costumes aparelhísticos que sempre existiram no
PSD, como Passos vinha dos mesmos hábitos de carreira reproduzidos na JSD para
pior. Quando hoje se olha para a elite partidária que dá o poder “albanês” de
Passos dentro do partido é difícil reconhecer qualquer identidade
social-democrata, mas sim uma mescla de gente da Maçonaria, jovens de uma
direita radical feita nos blogues e redes sociais muito ignorante e agressiva,
que, como já o escrevi, acha que o Papa é do MRPP…
Chega para a
“luta de classes”, tem aliados poderosos na “Europa”, mas nada tem a dar ao
país que não seja servir os poderosos e punir os fracos e institucionalizar,
com as fórmulas dos think tanks mais reaccionários, uma ideia de “liberalismo”
que envergonharia Adam Smith. Não gostam da liberdade, gostam da autoridade e
do poder.
O PROBLEMA
DOS PEQUENOS PARTIDOS
É que nada
indica que possam deixar de ser pequenos, nem a curto, nem a médio e muito
menos a longo prazo. O CDS está a seguir a política habitual dos tempos em que
não está no governo como partido de coligação: pôr-se a jeito para voltar ao
governo como partido de uma outra coligação, quer com o PSD, quer com o PS. O
PS que sabe isso muito bem, alimenta-o com elogios que tem também a vantagem de
o ajudar a cortar as amarras com o PSD, coisa que o CDS quer rapidamente fazer.
O PSD é nestes dias uma espécie de trambolho para o CDS, e impede-o de voltar a
ser “responsável” outra vez e poder “negociar”.
O BE parece
estar bem, mas não está. Tudo o que o alimenta como partido de certas causas
tribunícias que o PCP não quer por conservadorismo, cultura e tradição, como as
chamadas “causas fracturantes”, está ou a esgotar-se ou a perder sentido, num
partido que participa no poder político actual. A “causa” do Cartão do Cidadão,
ou do cartaz com Jesus Cristo com “dois pais”, é um exemplo de uma irrelevância
mais ou menos inócua, que mostra o esgotamento de um caminho. O outro caminho,
as medidas que envolvem a melhoria das condições de vida da população, se
conseguidas serão, para a maioria que delas pode beneficiar, mérito do governo
do PS.
O PCP está
também num impasse. O seu poder existe, essencialmente nos sindicatos da CGTP,
mas está estagnado e não dá os proventos políticos que deu no passado. Os
militantes do PCP votarão por regra no partido até morrerem, mas o problema é
que a “lei da vida” faz com que morram cada vez mais e os esforços de renovação
interior, que existem de facto, não permitem ao PCP sair do gueto em que
sobreviveu, mas de onde se mostra incapaz de sair. Os comunistas portugueses
são um milagre de sobrevivência política se comparados com muitos outros
partidos à cabeça mais fortes, e que desapareceram de todo. As diferentes
variantes de comunismos reformistas ou de “eurocomunismos” teriam feito desaparecer
o PCP, como fizeram ao PCE e ao PCF, e isso foi o último combate de Cunhal, já
a URSS estava a cair com Gorbachev. Mas essa época acabou e hoje reformas
profundas no pensamento teórico e organizacional, na linguagem e no modus
operandi, caso houvesse forças endógenas no PCP para as forçar, teriam um
impacto diferente. O BE pode ter avanços ou recuos eleitorais, o PCP não pode
ter recuos eleitorais muito significativos e agarrar-se ao que sempre fez, -
“vão-se os anéis e fiquem os dedos”-, não funciona porque já não tem anéis e os
dedos não estão grande coisa.
/Da .)
(url) 1.5.16
RISCOS PARA AS NOSSAS LIBERDADES
Três riscos
corre hoje a nossa liberdade:
1.
Primeiro, o risco de perdermos o controlo
democrático sobre o nosso país. O risco de que o nosso voto valha menos ou não
valha nada. O risco de ter um parlamento que não pode cumprir a sua mais nobre
função: decidir sobre o orçamento dos portugueses. O risco de termos também
nós, como os colonos americanos no
taxation without representation, e fizeram uma revolução por causa disso. O
risco de sermos governados de fora, por instituições de dúbio carácter
democrático, que decidem sobre matérias de governo, em função de interesses que
não são os interesses nacionais, e cujos custos o povo português paga.
2.
Segundo, o risco de que o estado abuse dos
seus poderes, como já o faz. Não só o estado tem hoje uma panóplia vastíssima
de meios para nos controlar e vigiar, como os usa sem respeito pela autonomia,
liberdade, identidade dos cidadãos.
Há uns anos
discutimos muito que dados diversos deveria ou não juntar o Cartão do Cidadão, dados
pessoais, de identificação, médicos, número de eleitor, etc. Limitámos os dados que lá podemos colocar e
temos uma entidade que fiscaliza a utilização dos nossos dados pessoais e que é
suposto “protegê-los”. Muito bem.
Mas já
olharam para as facturas que estão disponíveis no site das Finanças? Já olharam com olhos de ver, a vossa vida diária
espelhada em cada acto em que se compra uma coisa, se almoçaram sós ou
acompanhados, onde e que tipo de refeição, onde atravessamos um portal da
auto-estrada, onde ficamos a dormir, que viagens fizemos?
Em nenhum
sítio o estado foi mais longe no escrutínio da nossa vida pessoal do que no
fisco. Com a agravante de que nenhuma relação com o estado é hoje mais
desigual, onde o cidadão comum tenha os seus direitos tão diminuídos, onde
objectivamente se abandonou o princípio do ónus da prova, ou seja, somos todos
culpados à partida.
Em nome de
quê? De que eficácia? Perguntem aos donos de offshores, aos que tem dinheiro para pagar o segredo e a fuga ao
fisco, para esconder o seu património do fisco, se eles se incomodam com o
fisco. Incomodar, incomodam, mas podem pagar para deixarem de ser incomodados.
Já viram algum offshore de uma
cabeleireira, de um feirante, de um mecânico de automóveis, de um pequeno
empresário que tem um café ou um restaurante, aqueles sobre os quais o fisco
actua exemplarmente como se fossem esses os seus inimigos principais?
É por isso
que se hoje se existisse uma polícia como a PIDE não precisava de mais nada do
que de aceder aos bancos de dados do fisco, do Multibanco, das câmaras de vigilância,
do tráfego electrónico. Podia reconstituir a nossa vida usando o Google, o
Facebook, o Twitter, o Instagram. Podia encontrar demasiadas coisas em linha,
até porque uma geração de jovens está a ser mais educada pelas empresas de hardware e software de comunicações, do que pela escola ou pela família. Elas têm
à sua disposição múltiplos meios para desenvolveram uma cultura de devassa da
privacidade, pondo em causa séculos de luta pelo direito de cada um de ter um
espaço íntimo e privado e uma educação do valor da privacidade.
3.
Terceiro, o risco de que a pobreza impeça o
exercício das liberdades. A miséria, a pobreza, a precariedade, o desemprego,
são maus companheiros da liberdade. A pobreza ou qualquer forma de privação do
mínimo necessário para uma vida com dignidade é uma forma de dar aos poderosos
o direito natural à liberdade e a dela privar aos mais fracos.
Sim, porque
ser pobre é ser mais fraco. É ter menos educação e menos oportunidades de a
usar, é ter empregos piores e salários piores, ou não ter nem uma coisa nem
outra. É falar português pior, com menos capacidade expressiva, logo com menos
domínio sobre as coisas. É ter uma experiência limitada e menos qualificações.
É depender mais dos outros. É não ter outro caminho que não seja o de reproduzir
nas novas gerações, nos filhos, o mesmo ciclo de pobreza e exclusão dos pais. E
a exclusão reproduz-se mesmo que se tenha telemóvel e Facebook, porque o acesso
ao mundo virtual e a devices
tecnológicos não significa sair do círculo infernal da pobreza. É apenas
“modernizá-lo”.
O
agravamento na sociedade portuguesa da desigualdade social, do fosso entre
pobres e ricos, é uma ameaça à liberdade
4.
Há um risco
ainda maior do que qualquer destes: o de pensarmos que não podemos fazer nada
face as estas ameaças à nossa liberdade e à nossa democracia. O risco de
dizermos para nós próprios que haverá sempre pobres e ricos e que a pobreza é
um inevitável efeito colateral de por a casa em ordem. Mas que ordem?
(Da Sábado e uma adaptação da intervenção feita na sessão solene em Leiria organizada pela Câmara Municipal para comemorar o 25 de Abril.)
(url) (url) 27.1.16
COMO É QUE CHEGAMOS AQUI?
Como é que, algures pelo caminho dos últimos anos, perdemos a independência? Como é que permitimos, todos, povo e governantes, o que se está a passar? E não me venham com a dívida. A dívida ajuda e muito, mas não é a questão central. A questão central é que ao abdicarmos de soberania, abdicamos também de democracia. E estamos agora governados por uma burocracia anónima, sem legitimidade eleitoral, que responde aos seus donos e nós não somos donos de nada. Nem sequer de nós próprios. (url)
© José Pacheco Pereira
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