ABRUPTO

6.11.07


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ÁTOMOS E BITS

de 6 de Novembro de 2007


O país político está muito estranho, ou então está como sempre esteve, nós é que desejaríamos que fosse diferente. No telejornal das 13 horas, a RTP resumiu o Prós e Contras à intervenção do Ministro das Finanças, traduzindo a realidade de um programa que não teve Contras. Ou melhor teve, mas foi deixada aos sindicatos e ao PCP essa função. Oposição do PSD ou do PP não existiu, e Mira Amaral no fundamental esteve lá para concordar com o Ministro. Bizarro um programa destes em que está o governo e não há oposição. Não é só não estar a oposição do centro e da direita, é não haver oposição. Deixar a oposição aos sindicatos é o mais cómodo que há para o governo. Mas, na verdade, o Prós e Contras revela involuntariamente uma verdade maior: há hoje menos oposição em Portugal do que há uns meses, no que verdadeiramente conta, no que dói ao PS e ao governo.

Distraídos com a coreografia do debate desta tarde, excelente pasto comunicacional pelo seu aspecto de duelo ao sol, esquecemo-nos de que os problemas políticos estão longe de se reduzirem ao espectáculo teatral da Assembleia. O que Menezes disse na conferência de imprensa de ontem é muito mais importante e explica o Prós e Contras e os múltiplos silêncios do PSD dos dias de hoje. Ele anunciou a vontade de "entendimentos alargados" com o PS, numa série de sectores fundamentais da vida pública, indo mais longe do que Marques Mendes alguma vez foi com o seu modesto Pacto de Justiça.

Pode ser um exercício comunicacional proposto pela sua agência para "lavar" a imagem populista e dar ar de responsável? Duvido que resulte, porque Menezes anunciou uma dupla política: por um lado, colaboração com o PS em todas as áreas fundamentais da vida pública; por outro. oposição casuística tipificada na "Educação, os episódios de criminalidade no grande Porto, a crise no Hospital de Faro". Esta redução da oposição à casuística comunicacional (uma das coisas que criticava em Mendes) reduz o PSD a um papel tribunício, e minimiza-o como partido de alternativa de governo.

Repito: pode ser um exercício comunicacional proposto pela sua agência para "lavar" a imagem populista e dar ar de responsável? Pode, tudo é possível. Mas há razões para se tomar a sério a sua proposta porque ela acrescenta um "entendimento alargado" sobre as Obras Públicas e isto percebe-se que é a valer. Ora esta é a única proposta que o PSD não pode de todo fazer num país como Portugal, onde esse é o terreno do verdadeiro "bloco central de interesses" que mina o estado, corrompe os partidos e a política, e que exige o maior escrutínio de uma oposição que se toma a sério. Esta é a mais preocupante proposta do PSD, numa área em que nada justifica "consensos", por muito que estes sejam pedidos pelos empreiteiros por razões que se percebem muito bem. As grandes obras públicas são política pura, nenhum partido que tenha um projecto para Portugal alternativo ao dos socialistas pode achar que esta é uma zona de "consenso", nem deixar de perceber a perigosidade da proposta.

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As palavras "realistas" de Silva Lopes foram o momento mais interessante do Prós e Contras e um verdadeiro retrato do que não é dito na política socialista, mas está lá. Silva Lopes disse, preto no branco, duas coisas: uma, que os orçamentos do PS não diminuem as disparidades sociais que se agravam em Portugal; outra, que é a classe média que deve pagar a crise, são os seus rendimentos que devem ser diminuídos para garantir maior equilíbrio social. Ou seja, traduzido em não-socialistês, o estado deve agravar a política de agressividade fiscal sobre a "classe média", os "remediados", para redistribuir aos "verdadeiramente pobres". Nesta equação, que corresponde ao modo como o PS pretende salvar o "modelo social", embora dito com mais crueza, não há qualquer consideração para o papel que a "classe média" possa ter na criação de riqueza, ou dito de outro modo, qualquer papel para o crescimento económico que, com uma "classe média" a caminhar para o remediamento mais absoluto, será impossível. É um programa de empobrecimento colectivo, lento mas seguro.

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