ABRUPTO

22.9.12


COISAS DA SÁBADO:  
PENSAR SOBRE AS FRASES QUE SE DIZEM: “ESTAMOS NUMA SITUAÇÃO DE GRANDE GRAVIDADE”  


Estou a escrever a dias desta revista sair, o que no actual ambiente volátil da nossa vida política é um risco maior. Tudo pode mudar, embora o que possa mudar já esteja inscrito nos acontecimentos da semana passada. Comecemos pelo princípio: não estamos bem informados do que se passou. Pior ainda, estamos desinformados sobre o que se passou, porque, quando se analisam os eventos, nada bate certo. 

Veja-se, por exemplo, esta frase repetida pelos governantes do PSD e pelo CDS na oposição, “estamos numa situação de grande gravidade”. Aqui está uma frase que deveria ser bem entendida, porque ela põe em causa toda a narrativa legitimadora do governo de há um ano para cá. Se entendida de forma genérica, é verdadeira, mas não diz nada de novo, nem ganha por isso mais “gravidade” actual. A questão está em saber, porque é que hoje estamos numa “situação de grande gravidade”, depois do governo (Passos, Gaspar, Aguiar Branco, Relvas, etc.) e do proto-governo (Borges) nos terem dito durante um ano que as coisas estavam a correr muito bem. Borges e Gaspar disseram várias vezes que o “ajustamento estava a correr muito bem e mais depressa do que se esperava”, a nossa situação estava “melhor” do que há um ano, e os sinais eram tão positivos que Passos Coelho prometeu a retoma em 2013, há cerca de um mês. O que é que se está a passar para a “gravidade” de hoje? 

Aqui penso que falta informação, mas a avaliação da troika parece ter corrido muito pior do que o governo quer admitir. Já se sabia do descarrilamento do défice, mas sabe-se pouco sobre os seus valores reais. Estamos em pleno “socratismo” de jonglerie com os números. E mais coisas devem estar a correr mal, para que a troika apareça tão inflexível com o seu melhor aluno, qualidade que pelos vistos nos obteve um adiamento que o governo sempre disse ser mau, mas nada mais. 

Os próprios números do adiamento são bizarros: de 5 para 4,5 e depois para 2,5, em três anos. Porquê este ritmo tão desigual na distribuição temporal do esforço? E por que razão se vai chegar aos 2,5 e não aos 3 exigidos? E como é que se vai passar dos 4,5 para 2,5 sem ainda mais brutais medidas de austeridade? É que, se de cada vez que o governo falha um objectivo, como ocorreu este ano (ainda sem estar em vigor a decisão do Tribunal Constitucional), há um novo plano de austeridade, isto vai rebentar muito mais cedo do que se pensa. 

É mesmo a Grécia que aí vem e não é porque as pessoas não aceitem muita austeridade, já aceitaram, é que não aceitam pagar pelo falhanço de um governo a quem dão tudo e tudo é desbaratado, nem por um governo que parece hostiliza-los pela exibição de flagrante injustiça que é a TSU. Esta é que devia ser “a situação de grande gravidade”. E é de responsabilidade do governo.

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© José Pacheco Pereira
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