ABRUPTO

16.6.12


COISAS DA SÁBADO: A COLIGAÇÃO PSD-CDS 


Não é preciso ser especialmente bom observador para ir mais além do “a coligação funciona bem” do discurso oficial. Sim, é verdade que a coligação funciona bem porque os dois partidos têm o pescoço metido numa guilhotina comum e não podia deixar de ser de outra maneira. Caindo a lâmina, corta os dois pescoços, embora corpos sem cabeça abundem por aí a mexer-se como se a tivessem. Mas convenhamos que é uma parte importante do corpo, e ninguém gosta de ter que a transportar debaixo do braço. As necessidades de auto-preservação do PSD e do CDS, o mais poderoso sentimento colectivo dos partidos, exigem esse bom entendimento. Por aí não há novidades. 

No entanto, o modus operandi e o modus vivendi da coligação actual não é o mesmo da anterior coligação realizada por Durão Barroso em 2002. Nessa altura, a coligação fez-se após resultados eleitorais inesperados – Barroso estava convencido de que teria maioria absoluta – e resultou de uma imposição forçada desde o primeiro minuto da noite eleitoral por um CDS que quis criar um facto consumado. E um PSD que pretendia explorar outros caminhos mais minimalistas como por exemplo, um acordo parlamentar, cedeu por pressão de dirigentes mais à direita que de imediato aceitaram a política de facto consumado do CDS. Talvez por ter forçado a mão, o CDS precisava de se comportar exemplarmente e foi o que fez até aos últimos dias, já com Santana Lopes. Aí deu sinais bastantes de desconforto, para ajudar Jorge Sampaio na sua decisão. 

Mas esta coligação à volta de Durão Barroso colocou o CDS militantemente ao lado do PSD, usando todos os pretextos para mostrar que não hesitava um segundo em “ser parte” inteira e sem hesitações de um governo cujas responsabilidades assumiu por inteiro. Exactamente porque todos esperavam “problemas”, o CDS não tinha margem para provocar nenhum. A viragem à direita do PSD, que então se acentuou, favoreceu o entendimento, tornando mais fácil ao CDS a “lealdade” à coligação. O CDS por seu lado “virou” na questão europeia, mudando de 180º a sua posição. Até Santana Lopes, a coligação não podia ser mais perfeita. 

Hoje não é assim. Há coligação, “funciona bem”, mas é mais nítido que o governo se divide em duas áreas de actuação, o CDS numa, o PSD noutra, e cada um tenta mostrar o que vale em cada uma. Disse cada um, mas é mais o CDS que não abdica de aparecer como CDS na coligação, mostrando uma distância real com o destino comum. Em 2002, o destino comum era mesmo comum, hoje o destino comum é deixado para o PSD, que assumirá culpas em tudo o que não resultar, em particular na economia. Tal é facilitado pelas pastas governativas do CDS. 

 Enquanto em 2002, a viragem à direita do PSD facilitou o entendimento, em 2011, o CDS está bastante mais à esquerda do PSD, e deixa-o claramente sozinho no seu profetismo salvífico assente num rudimentar liberalismo económico e muito desconhecimento do país. Existe coligação como em 2002, mas o CDS permanece o CDS, marca o seu terreno. Talvez acabe por não valer nada, porque as paradas são muito altas, mas que o CDS tenta passar pelos pingos da chuva, tenta.

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© José Pacheco Pereira
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