ABRUPTO |
semper idem Ano XIII ...M'ESPANTO ÀS VEZES , OUTRAS M'AVERGONHO ... (Sá de Miranda) _________________ correio para jppereira@gmail.com _________________
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31.3.12
NESTES DIAS
E HOJE
(em directo)
SUÉCIA – SYNDIKALISTISKA UNGDOMFÖRBUNDET (SUF)
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Comecemos pela imagem, toda ela um equívoco. Como não há nenhuma fotografia genuína de uma manifestação “contra os direitos adquiridos”, a imagem é tirada de uma manifestação da CGTP, com um contingente de jovens, incluindo umas jovens mães com crianças, integrados nos manifestantes da função pública. Alguém explique à JSD que a bandeirola no carrinho de bebé que diz FP, não é a marca do carrinho, é o símbolo dos sindicatos e da Federação da função pública. E os funcionários públicos que se manifestam estão certamente a fazê-lo pelos seus “direitos adquiridos”. O grafismo é copiado do Bloco de Esquerda, incluindo o megafone, embora a JSD, desde que participou na manifestação dos “indignados”, ainda na era Sócrates, que se saiba, não fez nenhum uso ao megafone. Nem sequer há aqui qualquer humor negro: percebe-se que é a juventude dos manifestantes que serviu para “pintar” a falsa faixa que diz “Estamos em Luta! Contra os Direitos Adquiridos”, a principal mensagem da imagem.
(Continua.)
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COISAS DA SÁBADO:
PAI, VAI PARA O DESEMPREGO, PARA EU, TEU FILHO, PODER TER EMPREGO
Quando me chamaram a atenção para esta imagem pensei que fosse uma montagem ou uma falsificação. Tudo me parecia absurdo e por muito que a JSD queira cultivar uma imagem de irreverência como factor de identidade (se a realidade corresponde à imagem é outra coisa), nunca pensei que fosse verdadeira. Depois de a ver reproduzida um pouco por todo o lado na Internet, acabei por confirmar a sua veracidade como ilustração da capa da Moção L intitulada “sustentabilidade das futuras gerações”, de autoria da JSD, apresentada ao Congresso do PSD. Passada a dúvida quanto à veracidade, ficou o espanto quanto ao conteúdo e significado da dita imagem, a enorme confusão ideológica e política que ela representa e a certeza da incompatibilidade profunda com qualquer coisa que tenha a ver com o sentido da acção política de um partido que se intitula de “social-democrata”. Escrevi “espanto”, mas é uma figura de retórica, porque na verdade já nada me espanta.
(Continua.)
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2182 - To Memory
Strange Power, I know not what thou art,
Murderer or mistress of my heart. I know I'd rather meet the blow Of my most unrelenting foe Than live---as now I live---to be Slain twenty times a day by thee. Yet, when I would command thee hence, Thou mockest at the vain pretence, Murmuring in mine ear a song Once loved, alas! forgotten long; And on my brow I feel a kiss That I would rather die than miss.
(Mary Elizabeth Coleridge)
(url) 29.3.12
(url) 28.3.12
2181 - In the Library
for Octavio
There's a book called
"A Dictionary of Angels."
No one has opened it in fifty years,
I know, because when I did,
The covers creaked, the pages
Crumbled. There I discovered
The angels were once as plentiful
As species of flies.
The sky at dusk
Used to be thick with them.
You had to wave both arms
Just to keep them away.
Now the sun is shining
Through the tall windows.
The library is a quiet place.
Angels and gods huddled
In dark unopened books.
The great secret lies
On some shelf Miss Jones
Passes every day on her rounds.
She's very tall, so she keeps
Her head tipped as if listening.
The books are whispering.
I hear nothing, but she does.
(Charles Simic)
(url) 26.3.12
ESTÁ O ESTADO A TORNAR-SE MAIS FORTE OU MAIS FRACO?
Como uma grande quantidade de portugueses, recebi a carta das Finanças
exigindo-me que "efectue a activação da caixa postal electrónica no
serviço Via CTT". Isto foi corrigido para a ortografia portuguesa
em vigor, porque o que lá vinha era "ativação", "efetue" e
"eletrónica", tudo erros de ortografia. O Estado não respeita sequer a
lei, visto que o Acordo Ortográfico não está em vigor. Depois explica-me
que a "activação" é "obrigatória" e que se não o fizer até 30 de Março
terei uma multa.
A carta é típica do burocratês associado a um claro
laivo autoritário que todas as comunicações das Finanças têm. Para as
Finanças não há cidadãos, mas potenciais fugitivos dos impostos e
fala-lhes sempre num tom inadmissível num Estado democrático, para quem
não cometeu nenhum crime, e não passou nem a servo, nem a súbdito.
Informa-me a extensa carta de determinados procedimentos, de um modo
geral complicados para o comum dos mortais, impõe-me um prazo curto e,
de uma ponta à outra, está cheia de ameaças que se percebe serem
expeditas e sem contradita. Caso se pretenda contestar, paga-se primeiro
e depois entra-se numa via-sacra, cara e demorada, que o comum dos
cidadãos não tem conhecimentos, nem saber, nem dinheiro para percorrer.
A ironia da história é que esta "obrigação" vem tentar ressuscitar um dos grandes falhanços, com correspondente prejuízo dos dinheiros públicos, do Governo Sócrates no seu início: criar um endereço electrónico para todos os portugueses, a Via CTT. A dita Via, na qual foi investido dinheiro, publicidade, máquinas colocadas nas estações dos CTT, tudo inaugurado pelo primeiro-ministro de então, que exibiu ao país o seu novo endereço electrónico, falhou redondamente. Apenas um escasso número de pessoas aderiu ao novo serviço, os relatos testemunhais sobre o serviço mostram a sua péssima qualidade e o mau atendimento nas estações dos CTT. As reclamações eram respondidas com sobranceria pelo então gestor socialista dos CTT, depois as máquinas avariaram e foram retiradas, e a Via CTT passou ao esquecimento. O Governo Passos Coelho veio retirá-la do lixo, para a tornar obrigatória na relação com as Finanças. Para muitas pessoas isso vai aumentar a sua dependência de ajudas - há gente que não tem computador, nem acesso à Internet, nem literacias para o usar, nem estação do correio próxima da sua localidade, nem junta de freguesia que faça o apoio, etc., etc. - e para outras, os que se movem à vontade no computador e na Internet, vai aumentar a complicação, obrigando a um endereço electrónico complementar, a uma nova caixa de correio suplementar a ver ou a agregar, tudo obviamente inútil porque bastava que houvesse a obrigação de ter um endereço de e-mail declarado às Finanças e nada mais. Mas o Estado obriga à força a complicar a vida às pessoas, e há multas no dobrar da esquina. Este é um exemplo menor num mundo maior, o das Finanças, onde o autoritarismo do Estado e o chicote antecedem a informação e a normal relação entre a administração pública e os cidadãos. Veio do Governo Sócrates, que usou politicamente o fisco e a ASAE, para criar uma imagem de autoridade e determinação e, quando lhe convinha, metia a autoridade no bolso para dar ares de amigo do povo, como aconteceu com a ASAE. Mas não sofreu qualquer recuo, bem pelo contrário, com o actual Governo. Ora, uma das narrativas usadas na actual legitimação do poder é a de que se está a emagrecer o Estado, a remeter o Estado para as suas funções essenciais - que no discurso liberal clássico eram as funções de soberania, relações internacionais, defesa e segurança, mas agora não se sabe quais são, não sendo nenhuma destas de certeza. Um pseudodiscurso liberal circula como elemento legitimador, acentuando aquilo a que os anglo-saxónicos chamam o empowerment das pessoas e da sociedade. Ora, com excepção do real empowerment de certos sectores económicos e da elite que circula entre a política, os grupos económicos, as fundações, os bancos, as "comissões de acompanhamento", etc., uma coisa é certa: empowerment dos cidadãos é que não há. Para os que pensam que isto é marxismo, talvez uma ou duas prateleiras de estante de autores liberais, e várias estantes de autores "burgueses", lhes expliquem alguma coisa sobre os malefícios de pensar a preto e branco sobre o poder social, as classes sociais, as elites, a exclusão e as oligarquias. É por tudo isto que já há algum tempo escrevo sobre o risco real de sairmos deste processo com um Estado mais forte, mais poderoso, mais intrusivo, mais autoritário. Como no discurso pseudoliberal só se considera o liberalismo económico, confundindo-o com a pulsão liberal, que vê a liberdade nas sociedades como muito mais do que a retirada do estado da economia, ainda por cima feita mais por necessidade do que escolha, percebe-se pouco o que se está a passar. Percebe-se pouco que o que se está a passar é mais uma redistribuição do poder, do que uma libertação da sociedade,
O
Estado está mais pobre, deixou de ter dinheiro para muito que fazia?
Verdade, mas isso não significa que esteja mais fraco, significa apenas
que tem menos dinheiro. Está o Estado-providência a encolher, com uma
progressiva retirada do Estado de muitas funções sociais? Verdade, mas a
substituição de um Estado-Providência por um estado assistencialista
não diminui o seu papel "providencial", apenas muda a concepção do seu
lugar e função, substituindo-se um mundo regulado de direitos colectivos (e de
expectativas) por um mundo mais pontual de protecção individualizada aos
pobres. Está o Estado a recuar de algumas das suas prerrogativas de
decisão em matéria de economia, de sociedade, de vida das pessoas? Não
está. Bem pelo contrário. Continua a ser impossível fazer um grande
negócio em Portugal, sem o beneplácito do Governo, e, a um nível mais
localizado, sem o apoio da autarquia, processos como as privatizações
continuam a ser feitos de forma discricionária, ao mesmo tempo que a
regulação não existe ou está subordinada aos interesses dos sectores
regulados. Mudou-se significativamente a subsidiodependência, em áreas
como a cultura? Não, apenas não há dinheiro para manter os subsídios e
mesmo assim não todos. Como acontece em muitas áreas, a falta de
dinheiro impede a manutenção dos velhos hábitos de "encosto" ao Estado,
principalmente para os pequeno e médio-subsidiados, mas o princípio não
foi alterado. Quando tornar a haver dinheiro, ele correrá pelas mesmas
valas para os mesmos campos. O Acordo Ortográfico, um exemplo que devia
envergonhar todos os liberais genuínos, tem sido travado? Bem pelo
contrário, este Governo continua a implementá-lo na fase crítica da sua
imposição às escolas. O Estado acabou com abusos de vencimentos e
desigualdades escandalosas nos salários e prebendas que paga? Não,
passou a haver "excepções" para regras cada vez menos gerais e isso
ainda reforça mais o poder de quem decide.
Os exemplos são muitos e a
continuidade com o Governo anterior uma regra, embora a crise acentue a
fragilização do cidadão face ao Estado e essa seja uma diferença
importante. Não é o Estado que está mais fraco, é o cidadão que está mais débil. O navio-almirante continua a ser as Finanças, cujo poder vai
muito para além da lei (para os remediados e pobres), seguido, pela
discricionariedade nas decisões económicas, associado a um processo
geral de concentração do poder num momento de grande fragilização
institucional. Com excepção meritória do Tribunal de Contas, a justiça
está descredibilizada e actua de modo pontual e caótico, ou seja,
injusto. O Tribunal Constitucional tornou-se numa letra morta,
permitindo, em nome das costas largas da "emergência nacional", a
subversão da sua função. O Parlamento, dominado pela sua lógica habitual
situação/oposição, desprestigiado e acossado, não tem papel na
expressão das preocupações populares. Os sindicatos ou estão domados ou
enfraquecidos, e a sociedade civil, atingida pela crise do seu sector
mais activo em termos de opinião pública, a classe média, não tem vigor
nem voz que se faça ouvir. A comunicação social ou funciona como espelho
mimético do poder, ou, atravessada pela situação de crise, apenas
sobrevive.
É verdade que o Estado faz muita coisa porque o deixam fazer, quer porque os cidadãos não têm poder, nem capacidade financeira, para se opor ao que pensam ser injustiças, quer porque concordam com medidas intrusivas da sua liberdade e privacidade, principalmente no caso da segurança. Operações-stop com buscas, câmaras de videovigilância, formulários estatais ou consentidos aos bancos e instituições de crédito com devassa da privacidade, muito para além do aceitável e muitas vezes cláusulas abusivas, tornaram-se "habituais". O abuso de posição dominante tornou-se uma regra na economia, na sociedade, no Estado, em nome da crise e da "emergência". Não, caros amigos liberais, daqui não vai sair um Estado esbelto e essencial, acompanhado por uma sociedade vigorosa e dinâmica. Vai continuar um Estado torto, excessivo e injusto, mas mais prepotente e autoritário.
Eu não queria vir com o argumento da
história, mas não surpreende quem a conheça, porque os partidos são elementos
endógenos do poder estatal e a partidocracia não mudou, reforçou-se. Tem
sido sempre assim, o que nasce torto dificilmente se endireita.
(Versão do Público, 24 de Março de 2012.)
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2180 - The Soul Selects Her Own Society
The soul selects her own society, Then shuts the door; On her divine majority Obtrude no more. Unmoved, she notes the chariot's pausing At her low gate; Unmoved, an emperor is kneeling Upon her mat. I've known her from an ample nation Choose one; Then close the valves of her attention Like stone. (Emily Dickinson) (url) 25.3.12
NESTES DIAS
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2179 - The Bad Old Days
The summer of nineteen eighteen
I read The Jungle and The
Research Magnificent. That fall
My father died and my aunt
Took me to Chicago to live.
The first thing I did was to take
A streetcar to the stockyards.
In the winter afternoon,
Gritty and fetid, I walked
Through the filthy snow, through the
Squalid streets, looking shyly
Into the people’s faces,
Those who were home in the daytime.
Debauched and exhausted faces,
Starved and looted brains, faces
Like the faces in the senile
And insane wards of charity
Hospitals. Predatory
Faces of little children.
Then as the soiled twilight darkened,
Under the green gas lamps, and the
Sputtering purple arc lamps,
The faces of the men coming
Home from work, some still alive with
The last pulse of hope or courage,
Some sly and bitter, some smart and
Silly, most of them already
Broken and empty, no life,
Only blinding tiredness, worse
Than any tired animal.
The sour smells of a thousand
Suppers of fried potatoes and
Fried cabbage bled into the street.
I was giddy and sick, and out
Of my misery I felt rising
A terrible anger and out
Of the anger, an absolute vow.
Today the evil is clean
And prosperous, but it is
Everywhere, you don’t have to
Take a streetcar to find it,
And it is the same evil.
And the misery, and the
Anger, and the vow are the same.
(Kenneth Rexroth)
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COISAS DA SÁBADO:
JÁ NÃO BASTA PAGAR A RTP, AINDA POR CIMA TEMOS QUE PAGAR A EURONEWS
A Euronews está para as instituições europeias, Comissão, Parlamento e Conselho, como a RTP África está para a política externa portuguesa: nem num caso nem noutro se trata de verdadeiros órgãos de comunicação, mas sim de veículos transmissores de políticas de estado, seja o nacional, seja o de Bruxelas.
Quando estive no Parlamento Europeu manifestei-me com dureza contra a existência e a cobertura tendenciosa da Euronews, uma estação televisiva cuja ideologia é o “europeísmo” militante, e cujo patrão é a Comissão Europeia. Foi criada numa altura em que os franceses queriam atacar a política americana e aquilo que consideravam a hegemonia da CNN no mercado global da informação. A sua origem foi resultado de uma decisão política, o seu programa é político e a sua “justificação” é a mesma de muitos outros “serviços públicos”, uma ideologia da superioridade da racionalidade do estado na comunicação, acima dos interesses privados.
É por isso que a Euronews com o seu “espírito europeu” nenhum papel tem no debate europeu, porque está de um lado e o seu reporting, débil aliás, está cheio de silêncios e censuras. Do mesmo modo que defendo o fim da comunicação social do estado, também defendo o fim da participação portuguesa na Euronews, e, em bom rigor, o fim da Euronews. Estados, nacionais e proto-estados transnacionais, não devem ter órgãos de comunicação social. Ponto.
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COISAS DA SÁBADO: O CANSAÇO DA CRISE E A PROPAGANDA
Há um mecanismo conhecido e que vem sempre em ajuda dos “especialistas” de propaganda de que os governos estão cheios e de que este não é excepção. Pessoas, habilidosos, assessores de imprensa, agências de comunicação, e de marketing “político”. Esse mecanismo é a procura de novidade, que, quando não há, inventa-se. Depois o efeito conjugado do pack journalism e da moda fazem o resto. O resultado é a manipulação tentada da opinião pública por estes profissionais e depois ampliada pela incompetência dos media e pelo situacionismo face ao poder. Eu sei que é muita maleita ao mesmo tempo, mas é assim que as coisas funcionam. Os vícios atraem-se.
É o que se passa com a campanha em curso de que “a crise acabou”, a “crise já está a prazo”, ou seja, já se vê luz ao fim do túnel. Esta campanha vem dos governantes, mas aí é natural que haja declarações optimistas, assim como também é óbvio que valorizam as escassas estatísticas favoráveis, como é o caso da subida das exportações e da descida das importações. É certo que o segundo caso é fruto da crise das pessoas, famílias e, em particular das empresas, mas o resultado é positivo. Do mesmo modo, o pico da crise europeia parece ter-se transformado em planalto, e isso também é positivo.
Porém todos os outros indicadores são negativos e o que há é wishful thinking sobre o futuro e uma crença ilimitada num arranque milagroso da economia em 2013. O terreno para as festividades já está preparado quando governantes encontraram na travagem de alguns indicadores, ou na sua ligeira inversão, os motivos para dizerem que “já se deu a volta”, quando na verdade apenas se estagnou na crise ou se desacelerou um pouco, porque já se bateu no fundo. Se não estamos a descer para o Inferno a toda a velocidade, nem por isso estamos a caminho de qualquer purgatório.
Na verdade, ninguém nos diz que o desemprego vai baixar, mas apenas que não vai crescer com a mesma velocidade, ninguém nos diz que a austeridade vai diminuir (alguma coisa haverá em vésperas de eleições), mas apenas que não vão ser preciso novas medidas, ninguém nos diz que os impostos vão baixar, a não ser talvez sobre as empresas aí para 2014, e ninguém nos garante que vamos crescer mesmo, mas apenas que daqui a um ano deixaremos a recessão.
Os propagandistas, supostos conhecedores daquilo que no passado se chamava a “psicologia das multidões”, sabem que há sempre um momento de cansaço da crise, um momento em que de tanto ouvirem falar de crise (eu digo falar, não de sentir, porque no sentir ainda estamos nos preliminares) desejam outras notícias, desejam alguma esperança, desejam acreditar nalguma possibilidade de não continuarem a sofrer ou de virem a sofrer mais. É o mais humano dos sentimentos e, como o tempo mediático faz sempre os exageros da desgraça antes das desgraças baterem à porta com força, “o que parece é”. Portanto, nesta base de desejo de conforto psicológico, constrói-se a manipulação. Ela não dura muito, nem pode ser repetida muitas vezes sem se voltar contra os seus autores, mas enquanto o pau vai e vem folgam as costas.
O desejo de novidade permanente que está no âmago dos mecanismos mediáticos faz o resto: as notícias de que a crise está a abrandar, está a termo, vai acabar, são hoje mais “novidade” do que qualquer outro indicador negativo que é “mais do mesmo”. Nas últimas duas semanas, foram conhecidos vários indicadores negativos, assim como declarações internacionais pessimistas sobre Portugal, mas a sua visibilidade mediática foi menor. A crise cansa, a crise deixou de ser novidade. A crise está a acabar. Ufa!
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ÍNDICE DO SITUACIONISMO (147)
A questão do situacionismo não é de conspiração, é de respiração.
E, nalguns casos, de respiração assistida.
Todos nós sabemos que ontem aconteceu uma única coisa em Portugal: dois jornalistas foram agredidos pela polícia. Tudo o resto foi irrelevante. Em matéria de corporativismo estamos conversados.
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NESTES DIAS
PLATAFORMA 15 DE OUTUBRO – MANIFESTAÇÃO JUNTO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA (22 DE MARÇO DE 2012)
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2176 - A Raposa e o Cacho de Uvas
Fame coacta vulpes alta in vinea
uvam adpetebat, summis saliens viribus.
Quam tangere ut non potuit, discedens ait: "Nondum matura es; nolo acerbam sumere." Qui, facere quae non possunt, verbis elevant, adscribere hoc debebunt exemplum sibi apanhar um cacho de uva numa alta videira, saltando com todas as forças; Como não conseguisse alcançá-lo, disse, afastando-se: "Ainda não estão maduras; não quero apanhá-las verdes". Aqueles que desdenham com palavras o que não conseguem realizar deverão aplicar para si este exemplo. (Fedro) (url) 21.3.12
2175 - This is the House that Jack built
This is the house that Jack built!
This is the malt that lay in the house that Jack built. This is the rat that ate the malt That lay in the house that Jack built. This is the cat that killed the rat That ate the malt that lay in the house that Jack built. This is the dog that worried the cat That killed the rat that ate the malt That lay in the house that Jack built. This is the cow with the crumpled horn That tossed the dog that worried the cat That killed the rat that ate the malt That lay in the house that Jack built. This is the maiden all forlorn That milked the cow with the crumpled horn That tossed the dog that worried the cat That killed the rat that ate the malt That lay in the house that Jack built. This is the man all tattered and torn That kissed the maiden all forlorn That milked the cow with the crumpled horn That tossed the dog that worried the cat That killed the rat that ate the malt That lay in the house that Jack built. This is the priest all shaven and shorn That married the man all tattered and torn That kissed the maiden all forlorn That milked the cow with the crumpled horn That tossed the dog that worried the cat That killed the rat that ate the malt That lay in the house that Jack built. This is the cock that crowed in the morn That waked the priest all shaven and shorn That married the man all tattered and torn That kissed the maiden all forlorn That milked the cow with the crumpled horn That tossed the dog that worried the cat That killed the rat that ate the malt That lay in the house that Jack built. This is the farmer sowing his corn That kept the cock that crowed in the morn That waked the priest all shaven and shorn That married the man all tattered and torn That kissed the maiden all forlorn That milked the cow with the crumpled horn That tossed the dog that worried the cat That killed the rat that ate the malt That lay in the house that Jack built!
(Anónimo)
(url) 19.3.12
NESTES DIAS
DESDE ONTEM
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SENHOR, ENCOLHI O PAÍS!
(Versão integral)
Ser membro do PSD nestas alturas tem que ser um momento particular de perplexidade. Claro que me refiro àqueles membros do PSD que foram atraídos pela muito sui generis e portuguesa fusão de tradições políticas, que ia do liberalismo político à noção de que a política não esgota o campo do humano, até à consciência de que é obrigação do Estado garantir um quantum de justiça social, tudo isso fundido num partido com uma história que era o seu "programa não-escrito". Em momentos decisivos, em 1975, no PREC, na luta de Sá Carneiro contra a hegemonia militar pós-25 de Abril e pelo retorno a uma democracia civilista plena; em 1979, na vitória da AD e na materialização da alternância política; em 1987, com a maioria absoluta subvertendo um défice de governabilidade inscrito na Constituição; em 1989, na revisão constitucional que permitiu a reconstrução de uma economia privada fora do Estado, o PSD teve um papel central. Não me custa admitir que, em 1975 e em 1986, o PS teve um papel mais importante, quer na defesa da democracia, quer na entrada de Portugal na Europa, mas o PSD esteve ao seu lado.
Nem toda a história do PSD é linear, há momentos em que se caiu numa lógica de gestão de interesses no "bloco central", ou se permitiu uma viragem à direita, com Durão Barroso, e com Santana Lopes, roçando-se um populismo e um culto da personalidade, que abriu caminho a uma diluição programática. Por outro lado, a qualidade da governação, que tinha sido um ponto de honra na AD, perdeu-se com o acesso ao poder de muita gente impreparada ou ligada a interesses, que ajudou a retirar ao PSD o prestígio da boa governação. Na oposição, com excepção do momento de patologia de Menezes, quer Marques Mendes, quer Marcelo Rebelo de Sousa, quer Manuela Ferreira Leite tentaram introduzir alguma sanidade interna e algum rigor nas posições, mas todos falharam às mãos da degenerescência oligárquica no seio do aparelho partidário. Permitiu-se, como no PS, uma captura de um partido democrático por um aparelho de poder interno, muitas vezes medíocre, interesseiro e corrupto.
Assim se chegou aos dias de hoje. Em 2012, o PSD no Governo está a gerir apenas uma crise herdada, está a cumprir o seu programa, ou a permitir que se faça outra coisa de natureza muito distinta pouco coerente com o seu programa e a sua tradição? Temo que seja este último caso, e temo que se deixem isolados num vazio incómodo muitos dos militantes que ainda permanecem fiéis ao seu património fundador, que, esse sim, não é "actualizável", sob pena de perda da identidade do partido. Os mais veementes aplausos à acção governativa vêm de poderosos interesses na sociedade portuguesa, que pouco têm a ver com o eleitorado "genético" do PSD ou com os portugueses que é suposto representar pelo seu programa e acção.
A deslocação à direita foi tão violenta, sem rigor nem memória, que hoje um moderado do PSD que tente reformular no actual contexto algumas preocupações que fazem parte do gene do PSD parece um adversário do capitalismo e da liberdade económicos. Olhem que não, olhem que não. Falo, como é óbvio, do gene mesmo e não da sua reconstrução mutante feita para incorporar o memorando da troika como sendo a quinta-essência do programa do PSD.
A falta de equilíbrio do debate político, a sua ausência de memória histórica e ideológica e a sua subserviência às modas, o mimetismo da linguagem mediática e o simplismo redutor dos blogues chegaram a um ponto quase esquizofrénico de que falar com preocupação do desemprego, em vez das maravilhas do empreendedorismo, falar de equidade fiscal, falar de "justiça social", de preocupação com a pobreza, dos direitos dos trabalhadores, da "dignidade do trabalho", tudo isto pareça ser de um esquerdismo muito para lá do BE e do PCP. Mas, foi desta incomodidade face à injustiça, à desigualdade, à exclusão, ao desprezo pelos mais fracos, que os fundadores do PSD, a começar por Sá Carneiro, falaram. O resto vinha depois e era subordinado, instrumental, dependente deste sentido de fundo. Nenhuma deles veria sem repulsa a indiferença olímpica face ao empobrecimento colectivo e ao desemprego, seu principal factor. E nenhum deles tinha a mais pequena hesitação sobre o papel da economia privada, sobre o capitalismo, como instrumento de riqueza, mas a expressão "com sentido social" não era retórica, mas preocupação constante e primeira. Há várias coisas que se estão a passar sob o manto da austeridade necessária que nada têm a ver nem com a austeridade, nem com a necessidade. Basta ler o que escrevi nos últimos anos para não ter dúvida nenhuma de que de há muito penso que um "ajustamento", como agora se diz, mesmo muito severo, seria inevitável e necessário. Nenhuma dúvida se me colocou de que esse "ajustamento" iria afectar muitos portugueses no seu nível de vida, e que não se podia escapar a esse destino, nem a bem, nem a mal. Foi a mal, com a troika a bater à porta. Mas depois deu-se uma sucessão de acontecimentos, que, esses sim, podiam ter ocorrido de outra maneira. Há várias coisas que estão a acontecer que deveriam merecer uma maior atenção de toda a gente sensata e moderada, a começar por aqueles que ainda chamam social-democrata ao seu partido. O que está a mudar Portugal é que se está a dar uma enorme deslocação de recursos entre classes e grupos sociais, uns ganhando, outros perdendo. Não é um processo unívoco, mas a sua dimensão deveria preocupar um Governo do PSD. Mas não só não o preocupa como está activamente a contribuir para que isso aconteça. E, se é verdade que todos perdem - e os milhões que os nossos "milionários" perderam e estão a perder são reais e vultuosos -, nem por isso todos estão a perder da mesma maneira e alguns vão poder "sair" da crise com muito mais poder e mais bens, logo, a prazo, com mais dinheiro. Pelo contrário, a destruição da classe média vai deixar a sociedade sem mecanismos de mobilidade social e sem dinâmica. A ideia de que pode haver uma "democratização da economia", signifique lá isso o que significar, não tem nenhuma correspondência com a realidade. A destruição maciça de empresas, a entrega de participações, bens, recursos à banca, quer directamente, quer por via intermediária do fisco, acompanha o desemprego como meio de embaratecer o trabalho. Em complemento deste processo, e com ele associada, há uma enorme redistribuição de poder, resultado de uma brutal e rápida concentração de poder de decisão e de recursos nas mãos de um grupo cada vez mais pequeno de pessoas, que circulam numa elite que sempre foi muito fechada, mas que agora ainda o é mais. As redes interiores do poder, que circulam entre os grupos económicos, o poder político, a grande advocacia de negócios, alguns think tanks, empresas de consultadoria, conselhos de administração das fundações mais poderosas, reguladores e, de um modo geral, todos os lugares de nomeação estatal, em "grupos de trabalho", "comissões de acompanhamento", etc. estão cada vez mais entregues "sempre aos mesmos". A razão é que as relações de confiança nestes momentos de crise são mais importantes do que tudo o resto, seja a competência e mérito, seja a renovação, sejam mesmo os valores propagados da competição e da liberdade económica. E os "mesmos" já deram provas de lealdade e serviço. Os "mesmos" estão por isso também a escapar, quando não mesmo a beneficiar da crise. A demagogia reinante obriga toda a gente a dizer que trabalha de graça, mas aliás podiam até todos trabalhar de graça, porque o poder que assumem no exercício de certas funções acompanha-os para o lugar seguinte, que já é bem pouco gratuito. O mundo divide-se, pois, entre os que têm "acesso" e os que não têm, e a concentração do poder económico, o reforço do Estado fiscal, as ondas de eco de procedimentos autoritários e expeditos em nome da crise por todo o sistema bancário, o esbulho puro e simples ou a aceitação de propostas chantagistas para o acesso ao crédito estão a permitir centralizar o poder de decisão. O medo faz o resto. Os aplausos não enganam. E os aplausos são cada vez mais agressivos, mais abafantes, menos tolerantes. É que oportunidades como esta de moldar o estado, a economia, os trabalhadores, as pessoas a uma mais drástica hierarquia de poder dos "mesmos", não acontecem todos os dias. O que está em jogo são poderosos interesses e encontraram ouvidos atentos e "espírito de serviço". Os "mesmos" desprezam os "políticos", mas não podem viver sem eles. Não ganham eleições, precisam dos "políticos". Para "encolher o país", como no filme. (Versão do Público de 17 de Março de 2012.) (url) (url) 18.3.12
NESTES DIAS
DE NOVO
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© José Pacheco Pereira
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