ABRUPTO

30.1.12


PERGUNTAS QUE NÃO LEVAM A PARTE NENHUMA


 

 

 

 

 

  1. POR QUE RAZÃO É QUE CONTINUAMOS SEM SABER SE HOUVE "DESVIO COLOSSAL" OU NÃO?

Com o início deste Governo deu-se algo de muito parecido com o início do Governo Sócrates de 2005 e muito parecido com o Governo Barroso de 2003: na retórica política encontrou-se um "facto-pretexto" destinado a justificar uma inflexão de medidas prometidas em campanha eleitoral. Barroso descreveu um país de "tanga" deixado por Guterres em que o "choque fiscal" seria impossível, embora fosse uma promessa central da campanha eleitoral. Sócrates encontrou no défice virtual convenientemente calculado pelo Banco de Portugal o modo eficaz de esquecer as suas promessas eleitorais de baixar os impostos. Passos Coelho encontrou no "défice colossal" o argumento para cortar metade do subsídio de Natal, que explicitamente jurara não fazer durante a campanha.

Compreende-se como estes argumentos são centrais nos mecanismos de legitimização política. Sem um forte motivo, não haveria maneira de manter a face perante os eleitores ainda bem lembrados por uma memória demasiado viva dos debates eleitorais. Mas eu referi tratar-se de "factos-pretexto", ou seja, tem que ter alguma factualidade. O relatório Constâncio sobre o défice veio a revelar-se muito pouco credível nos seus critérios, mas cumpriu a função legitimadora. O "desvio colossal" exerceu o mesmo papel, mas parece agora contestado por entidades independentes como "facto". Ou seja, a UTAO, muito gabada pela desmontagem que fez dos números orçamentais de Sócrates, agora vem pôr em causa a tese governamental PSD-PP. Ficamos assim sem saber ao certo o que se passou e não é de todo irrelevante tirarmos uma conclusão mais segura. O PS vai desejá-lo, porque isso o iliba, o PSD opor-se-á, porque isso o compromete. Eis uma pergunta que não terá pernas para andar, até porque muitos economistas com um papel central no discurso pró-governamental já se comprometeram com a justificação do abandono das promessas em nome do "desvio colossal".

(Versão do Público de 28 de Janeiro de 2012.)

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© José Pacheco Pereira
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