ABRUPTO

8.1.12


NUNCA É TARDE PARA APRENDER: 


Terminei ontem de ver as 24 aulas deste curso, cada uma com cerca de 50 minutos, e cada vez mais reforço a minha "perdição" pelas aulas de Yale, embora também já tenha "provado" alguma coisa do MIT, de Stanford e de Oxford. Mas Yale permanece imbatível. No ano passado, vi todas as aulas de Donald Kagan sobre a Grécia antiga, as de Dale Martin sobre o Novo Testamento e as de Joanne Freeman sobre a "revolução americana", o que faz cerca de 100 horas, a que se devem somar alguns outros cursos que "estou a ver" aos poucos e que tenho a certeza verei completos (sobre Dante, sobre o Don Quijote, o de Stephen Steams sobre evolução, o de Ben Polak sobre "teoria dos jogos", todos de Yale, mais um sobre o Space Shuttle do MIT, e o de Oussama Kathib sobre robótica de Stanford). Tudo no iPad, mas está igualmente acessível no computador. Só posso dizer que aprendi muito, mesmo se este tempo foi roubado à leitura o que, para um leitor compulsivo como eu, implica sempre alguma culpa em fazê-lo. Mas valeu a pena e vale a pena.


O curso de Bailyn, um jovem astrónomo e professor, especializado em "buracos negros",  tinha para mim uma dificuldade, que se veio a revelar mais um motivo especial de interesse: todo o curso foi dado com a matemática necessária, mesmo que simplificada. A concepção do curso foi também diferente do habitual. Em vez de fazer um curso clássico de astrofísica, centrado num panorama da disciplina e tratando de forma geral os temas principais, Bailyn decidiu centrar-se em três questões controversas, sobre as quais não há conclusões sólidas, nem "ciência certa": exoplanetas, "buracos negros" e por fim, o estado da arte em cosmologia, com relevo para a "matéria negra" e a "energia negra".


Todo o curso vive das equações newtonianas e mais tarde das equações da física relativista, e Bailyn é um daqueles sobre-dotados da matemática que literalmente voa sobre os números, deixando quem o ouve sem fôlego, mas, pouco a pouco, emerge uma clareza e uma simplicidade nas equações em que se percebe o seu papel insubstituível para a ciência. No fundo lidam quase sempre com meia dúzia de valores, massa, velocidade, aceleração, densidade, tempo, espaço,  Com excepção dos logaritmos, matéria que nunca dominei e que aqui é fundamental em escalas como a de magnitude, o resto acompanha-se, umas vezes melhor, outras pior. Saliente-se que, na primeira aula, Bailyn manda embora todos os que tem uma formação científica mais especializada e desdenha dos resultados obtidos às milésimas, que ele associa às  calculadoras. Goza com a personagem do senhor Spock, o  Vulcano do Star Trek,  e usa as matemáticas com arredondamentos que deixariam um purista com os cabelos em pé.



A concepção problemática do curso, tratando questões muito controversas e em que diferentes teorias competem pela "solução", aliada ao carácter observacional da astronomia, em que os modelos são testados pela observação, leva-o a mostrar aos seus alunos como a investigação e a ciência é feita na prática. Há por isso uma componente epistemológica nas suas aulas, quase que imanente ao seu discurso, mas que, nalgumas alturas, se assume com clareza. Por exemplo, aprova a decisão de atribuir tempo, numa pequena percentagem, nos principais telescópios, incluindo o Hubble,  para projectos fora do mainstream corrente numa dada altura. É o caso da pequena minoria de astrofísicos que ainda recusam a teoria do big bang e defendem o universo steady state que se queixavam de não poderem desenvolver os seus projectos sem acesso aos grandes telescópios.


Nas duas últimas aulas dedicadas ao estado actual das teorias cosmológicas, Bailyn interroga-se se a "matéria negra" e a "energia negra", que se pensa constituírem mais de setenta por cento da energia  e mais de 80% da  massa do universo, e sobre as quais nada se sabe, se não serão uma versão moderna dos epiciclos ptolemaicos, os círculos, sobre círculos que "explicavam" os movimentos observáveis dos planetas e do Sol... à volta da Terra. E termina dizendo que toda a astrofísica actual precisa de uma grande mexida, como a que Einstein trouxe à física newtoniana, mesmo que considere que se vivem grandes tempos para a astronomia com os novos instrumentos, as sondas espaciais e novos métodos de observação. 

Vale a pena assistir a estas aulas. Em nome da Curiosidade, mãe de muita coisa e que não deixa a quem a tem um segundo de aborrecimento com o mundo.

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© José Pacheco Pereira
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