ABRUPTO

13.3.08


SETAS, COR, FUNDAÇÃO E HISTÓRIA



Neste caso, Menezes apenas prosseguiu um caminho de descaracterização iniciado por outros. Começou na JSD, ainda no tempo de Cavaco, e, depois acelerou-se com Durão Barroso continuou com Marques Mendes. Menezes deu apenas mais um passo, ao substituir o laranja pelo azul no fundo. A cor laranja, sabemos por vários relatos, foi escolhida em 1974 porque não havia outra disponível, mas a verdade é que a cor ficou como um traço forte de identidade feito pela história do PSD. Se dissermos os "laranjas", os "laranjinhas", sabe-se que falamos do PSD, se dissermos os "vermelhos" é com o PCP. Os outros "vermelhos", os do PS e os azuis, ficaram sem identidade colorida.

Apagar a cor é um passo significativo à luz dos dias do presente, mas, do ponto de vista simbólico, para o PSD é mais importante o que se passa com as setas do que com a cor. A cor tem a ver com a história, as setas com a fundação, o acto genético que para bem e para mal, é a marca de fundo do PSD. Ora as setas são três e não uma, e a sua transformação numa única significa apagar da memória do partido de onde é que vieram estas setas e por que razão Sá Carneiro e os fundadores as escolheram como símbolo.


Desenho de Cid que estava no sítio do PSD.

A origem das setas é a resistência da Frente de Bronze, de que faziam parte os social-democratas alemães, contra o nazismo, e essa génese foi descrita num texto de Pedro Roseta. Os resistentes alemães usavam as três setas para estragar o efeito da cruz gamada, e isso vinha descrito num livro de culto que era lido pelos que tinham possibilidade de o ler, porque estava proibido pela censura antes do 25 de Abril. Esse livro de Tchakhotine, A Violação das Massas pela Propaganda Política, foi certamente a fonte do símbolo, como se pode ver na reprodução aqui ao lado de uma das gravuras do livro. As três setas eram de um modo geral desenhadas de cima para baixo (quando virei a bandeira do PSD estava mais perto do seu símbolo do que com esta coisa ...) e significavam por parte dos fundadores a procura de uma fonte de legitimidade política para o partido, que não tivesse uma raiz marxista (como no PCP e no PS), nem conservadora. Essa procura resultou num híbrido muito especial entre o personalismo cristão, o liberalismo político e a social-democracia. Esse híbrido foi feito pela história do PSD, o "programa não escrito", e cortar qualquer uma das suas componentes genéticas é alterar o carácter do partido. Pode parecer incómodo para muita gente que as três setas sejam as mesmas do cartaz do lado, mas a história é assim, é o que é, e deixa marcas. Sem as marcas, somos outra coisa. Fazê-lo por razões de marketing, imagem e publicidade, indo para a seta única, substituindo as "antiquadas" três setas, como o PS fez com o punho, e pintar o partido do estandardizado azul (na verdade o mesmo azul da CDU e pelas mesmas razões), significa ou ignorância, ou novo riquismo deslumbrado, ou as duas coisas. Não sei se foi esta "mudança de imagem", a da setinha rabiante, , que a Somague pagou ilegalmente ao PSD. Se foi, foi um bonito serviço.

Se querem modernizar as setas, são as três setas que têm que modernizar e não uma. Se querem des-laranjar o partido têm que encontrar melhores razões do que o marketing. Se querem fazer um "novo partido", deixem este aos que ainda são fiéis ao legado de Sá Carneiro.

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Concordo inteiramente com a análise que faz no seu post "Setas, cor, fundação e história". É de facto preocupante como obscuras razões de marketing alteram precipitadamente os traços identitários de um partido como, no caso do PSD, as três setas e a cor laranja. Devo dizer que também nunca gostei da alteração do símbolo, efectuada já no tempo de Durão Barroso, e nem sequer me parece que essa alteração traga qualquer benefício em termos de imagem.

A alteração dos símbolos expressa quase sempre uma tentativa de romper com o passado de um partido, em ordem a criar nos eleitores a ideia de que nada se tem a ver com a prática anterior. António Guterres passou a usar a rosa em vez do punho, embora este se tenha mantido formalmente como símbolo do PS. Manuel Monteiro mudou o nome do CDS para Partido Popular e também fez alterações estilísticas ao símbolo, tendo Paulo Portas desfeito essa mudança quando assumiu a liderança, voltando a falar em CDS e a usar o símbolo anterior.

Diferente foi, no entanto, a atitude de Álvaro Cunhal. No dia em que Boris Ieltsin aboliu a bandeira comunista e a substituiu por aquela que tinha sido da Rússia czarista, lembro-me de ter visto Cunhal na televisão, filmado ao lado da bandeira do PCP, a dizer: "Nós não abdicamos da nossa bandeira". Embora nunca me tenha identificado com as suas ideias, acho esta atitude muito mais coerente.

(Luís Menezes Leitão)

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Na verdade estamos perante um truque de ilusionismo. O que aqui se tenta é deviar o foco da atenção do manancial de críticas para um outro assunto que dá sempre polémica, a mudança de imagem. Na verdade nada mudou. O logotipo é igual ao que foi pago pela Somague. A aplicação de um fundo azul não pode ser considerada uma
mudança, é só uma aplicação do Logotipo, mas que em outras situações poderá ter outro fundo. Num cartaz branco o fundo será branco. É preciso que tudo mude para que tiudo fique na mesma. Mudança de logotipo foi a efectuada nos tempos do Menino Guerreiro, em que se escolheu um globo medonho por baixo do lettering PSD. Trabalho dos famosaos consultores importados cujo trabalho em termos de comunicação política ainda hoje é recordada com espanto.

(Manuel Soares de Oliveira)

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(...) Pessoa amiga sabendo do meu "defeito", chamou-me a atenção para o post de hoje "SETAS, COR, FUNDAÇÃO E HISTÓRIA" e sabendo a profunda admiração que tive e tenho por Francisco Sá Carneiro, permitiu-se a ousadia de me pedir um comentário ao que se está a passar, especialmente porque fui uma das pessoas que lhe emprestei o livro de Serguei Tchakhotine, A Violação das Massas pela Propaganda Política (que entretanto me desapareceu...).

Ora, a descaracterização do símbolo é o final de um percurso, já encetado por outros, para apagar memórias e simbolismos. (...)

(Otília Martel)

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Há qualquer coisa aqui na questão da seta que não anda a bater certo. Esta seta ontem apresentada nem sequer é nova. Ela apareceu no tempo do Dr. Durão Barroso e não tenho ideia de tamanhas reacções. Depois veio o logo das três setas do tempo de Santana a dar a volta ao mundo (terá sido este o da Somague?). Marques Mendes foi quem reabilitou as três setinhas arredondadas, que surgiram no cavaquismo e que por sua vez já tinham sido uma modernização das três setas iniciais, mais rectilíneas.
A seta continua laranja, a cor do PSD continua o laranja.

Concordo que deveriam permanecer as três, mas também lhe digo que, para mim, esteticamente, esta nova seta laranja em fundo azul fica muito, mas muito mais bonita e interessante que todos os anteriores logos, mas isso já é subjectivo e vale o que vale, ou seja, nada. Todos os partidos, sem excepção, fizeram modernizações dos seus logotipos. Todos. O PS passou do punho para a rosa, o PCP passou de letras brancas em fundo vermelho para letras vermelhas e o último P em verde sobre fundo branco, etc. etc. Ver nisto um renegar da história parece-me muito forçado e eu no seu lugar não ia por aí, principalmente porque este é o logotipo criado originalmente no tempo de Durão Barroso e não agora, ex novo. Esse logotipo que o Senhor está a usar no post como sendo de agora e supostamente pago pela somague não é o de agora, é o logo do tempo do Dr. Durão Barroso. (...)

(Luís Bastos)

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É muito interessante esta prespectiva. Desconhecia em absoluto a história das setas do PSD, mas dá para constatar que é exactamente o mesmo que retirarem a foiçe e o martelo a um Partido Comunista. Mexer na identidade de um partido e nos seus simbolos tem sempre uma leitura política, parece-me que no essencial a sua leitura está acertada. Por outro lado, e a propósito do azul, acho interessante um dualismo particular entre os Estados Unidos e a Europa no que diz respeito às cores. Assim enquanto por cá a cor azul está normalmente associada aos partidos conservadores( o PP em Espanha, o RPR em França, a CDU na Alemanha ou os tories em Inglaterra são disso exemplo), e o vermelho à velha esquerda, na américa dá-se o inverso- e aos Repúblicanos está associado o vermelho, enquanto os democratas são blues. Nos últimos tempos contudo parece-me que se tem diluído papel da cor na simbologia agregadora de um partido político, por força das regras do Markting. Um partido demasiado identificado com uma cor ou com um campo deixa de poder cumprir devidamente o seu papel de Cacht All. É a vitória do centrismo e do mercado eleitoral sobre os valores- sem dúvida que o é, mas não vejo modo de mudar isso, porque implicaria mudar as regras do que é fazer política no século XXI. E de resto por cá, como bem assinalou, o PCP até "equipa" de azul... Não creio que a cor nos dias que correm tenha exactamente o mesmo peso que as setas, mas percebo a preocupação dos militantes do PSD. É que há sempre um fundo de sacralidade em qualquer simbolo.

(Pedro Pita Soares)

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Permita-me que me pronuncie sobre o caso do símbolo, ainda que nunca tenha votado PSD. Analisando o evoluir dos símbolos, apreciei o seu artigo sobre o significado de setas censoras e das do PSD.

Vejo o novo enquadramento do símbolo do PSD como:

A aplicação de uma assinatura inclinada e de uma seta encurvada e desequilibrada (muito tronco para pouca base) num centro em forma de um duplo círculo, que parece aludir à dupla volta do símbolo @

Sobre este conjunto de signos publicitários ocorre-me o seguinte:

- embora apareça em fundo desmaiado e azulado, o duplo círculo é a forma que ressalta;

- nele, a simulação de um @ remete-nos para os símbolos e os ícones da Comunicação&Informação;

- sendo este tema-ícon mais actual do que a seta curva, a sobreposição obriga-nos a um ajuste permanente de significação;

- a assinatura inclinada corresponde a pretensiosismo, pelos dados da grafologia;

- o símbolo da seta pode ser perturbador, pelo desgaste que se adivinha na determinação que pretende sugerir;

- as setas não encurvam nem rabiam - esse é o movimento que esperamos encontrar nos espermatozóides;

- existindo setas antigas, mais valeria deixá-las como nasceram.

Diria, assim, que tal símbolo nos pretendem obrigar a esta leitura subliminar: Um pretensioso espermatozóide tenta brincar com o mundo digital.

(MJ)

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