ABRUPTO

9.2.08


COISAS DA SÁBADO: A DOENÇA



Na continuidade deste texto.

Há dois factores em presença no tratamento noticioso da questão Sócrates II (a I foi o diploma): o primeiro, é um julgamento sobre a oportunidade e o valor jornalístico da notícia do Público; o segundo, é a sua incomodidade para o Primeiro-ministro e as estratégias de spin para a contrariar. Quanto ao primeiro, só gostava que me dissessem com clareza se jornais como o New York Times, o Times, ou o Le Monde (tenho mais dúvidas sobre este último) tivessem uma investigação como esta, sobre Bush, Gordon Brown ou Sarkozy, não a publicavam e isso não era entendido como um “furo” jornalístico? É tão óbvia a resposta que nem vale a pena perder muito tempo aqui. Insisto, o escrutínio rigoroso do currículo público de um Primeiro-ministro, que já era político no activo há “vinte anos”, como insiste Sócrates para minimizar os factos, é uma prática jornalística não só aceitável como exigível. E há factos, declarações, documentos, realidades, que a sustentam e talvez seja por isso que o Primeiro-ministro até agora não processou o Público, nem o jornalista, como fez com o elo mais fraco no caso do título académico, o autor do blogue Portugal Profundo, aliás sem sucesso.

O segundo factor é onde está a doença, e essa doença é muito preocupante, é a capacidade que tem o poder de, nos casos em que realmente dói, exercer uma pressão eficaz, não escrita, que não está nos telefonemas, está no próprio poder e nas suas teias implícitas e explícitas, sobre a comunicação social. Desconto já aqui, a dificuldade da comunicação social reconhecer o mérito alheio, neste caso do Público e dos seus jornalistas, num meio onde há muita fome e todos ralham. Desconto também as afinidades políticas que levam muitos jornalistas a proteger um governo PS. Agora, que a RTP tivesse começado a sua notícia, convenientemente remetida para os fundos do telejornal, com as palavras “a nova ofensiva do jornal Público contra o PM ...” já é a doença. Que, no dia seguinte, o Jornal de Notícias tivesse uma pequena notícia num canto de página em que se diz “Sócrates diz-se alvo de “ataque pessoal”, já é a doença. Embora o Diário de Notícias e o Correio da Manhã fossem salomónicos entre o conteúdo da notícia do Público e o spin do Primeiro-ministro, pelo menos sempre se distanciavam da pura conspiração, com mérito do Correio da Manhã que entrevistava o jornalista acusado pelo Primeiro-ministro, acrescentando pormenores da investigação. Já percebo menos porque razão a notícia foi para a secção dos media e não a da política... Mas, a atitude geral foi isolar o Público, como se fosse pestífero. É essa a doença.

Na verdade, havia duas linhas para tratar o assunto no dia seguinte, ou se desenvolvia a matéria da notícia (as assinaturas, os projectos de casas, as circunstâncias, a exclusividade) ou o contra-ataque de Sócrates que queria colocar o Público no centro da notícia e não as casas da Guarda. Para mim a doença está no facto de a maioria da comunicação social seguir Sócrates e fazer de conta que não há uma notícia do Público de interesse público.

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© José Pacheco Pereira
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