ABRUPTO

8.2.07


NOTAS SOBRE A "CULTURA DE BLOGUE" 2

A actual campanha publicitária do Público é interessante porque parece voltada em parte para esse público da "cultura de blogue", apelando às suas referências culturais, para o trazer para a imprensa escrita em papel, o que é uma contradição nos seus termos. A contradição tem a ver com o facto dessa "cultura" ser estruturante e dos seus hábitos não serem "em papel". Não só os hábitos não são "em papel", mas sim no ecrã, como a forma de ler em volume e em profundidade (do hipertexto) é diferente da forma de ler em superfície e sequência (dos textos em papel, dos livros). Os hábitos são também mais de "ver" ( e de "ouvir") do que de "ler", o que explica o sucesso do YouTube como percursor de uma Rede em que se vai "ver" mais do que "ler".

Por isso, a campanha de publicidade resultará mais naqueles que chegaram a uma "cultura da Rede" mais do que a uma "cultura de blogue", ou seja, que não foram feitos "dentro" da "cultura de blogue", mas que ajudaram a fazê-la. Gente mais velha, com os pés em ambas as literacias, as do livro e jornal clássicos e as da Rede. Se foram estas as pessoas que deixaram de ler jornais pela décalage de interesses mais do que pelo facto de serem em papel, a campanha (e presumo que o jornal) terá sucesso, porque fará um produto mais próximo da sua agenda de interesses.

Os que já foram moldados pelos hábitos da Rede, os que se habituaram (como muitos adolescentes a chegarem ou nos primeiros anos na universidade) a olhar para o mundo no modo pick and choose típico dos blogues, nunca mais lerão em papel como se lia antes e não há campanha publicitária que os agarre. Vamos ver.

(Continua)

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© José Pacheco Pereira
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