ABRUPTO

5.11.06


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: TLEBS DE NOVO



A propósito da Nova Terminologia Linguística do Ensino Básico e Secundário, e como Professora de Português, ocorrem-me muitas questões, sendo algumas as seguintes:

Que sentido faz para uma criança uma classificação como esta 'advérbio disjunto restritivo da verdade de asserção'? Alguém deseja explicar-me que significa isto?

E água , por exemplo, que , por Portugal inteiro tem sido uma farturinha? Vai ser um nome quantificável? mas é sempre quantificável? ou só o é se estiver bem medida dentro de uma garrafa? Porque não vejo ninguém a quantificar a água de uma catarata do Niagara, de uma cheia ou de uma enxurrada!

Que vai ganhar uma criança, aprendendo toda uma terminologia sobre a qual nem os próprios linguistas se entendem, para falar bem , escrever bem, dar as suas opiniões ? E para saborear as palavras de um texto?

(Terão que se queimar todas as gramáticas e dicionários 'antigos'? Já houve quem dissesse que era tudo para ir para o lixo. Vamos ler de modo diferente, um Camões, um Eça , um Saramago, um Lobo Antunes?... Ou a ideia é essa mesma : deixar os bons livros para uns tantos intelectuais e afastar as crianças e jovens deles por causa de tais terminologias? Ou já se esqueceram da tremenda asneira de ensinar 'Os Lusíadas' quase só à base da 'divisão de orações', que tornaram, para muitos , a obra intragável e detestada? E porque tem a nossa Língua, românica, que submeter-se aos ditames da Gramática Inglesa , anglo-saxónica?

Não creio que os problemas do ensino da Língua Portuguesa se ultrapassem com estas medicinas, nem - parafraseando uns quantos versos de Fernando Pessoa - consta que os grandes Escritores da nossa Língua conhecessem tais Terminologias. E, no entanto, escreveram como escreveram.

Mas isto sou eu a divagar, uma simples e anónima Professora de Português do 2º ciclo, pelo trigésimo quarto ano, que não sabe nada, nem pode nada...contra as modas! Ainda se lembram da experiência da Gramática Generativa e das ' árvores' todas? Pois, já ninguém se lembra... Mas, para os linguistas foi uma experiência muito bonita!

(Alexandrina Pinto)
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Na Nova Terminologia, ( um exemplo entre vários) nomes epicenos, sobrecomuns, comuns de dois que agora se retoma nem sequer é novidade nenhuma. Estudei esta terminologia na minha 4ª classe , há mais de quarenta anos...

(Alexandrina Pinto)

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• O ensino da TLEBS, cujo conteúdo contempla a Portaria 1488/2004, de 24 de Dezembro, sendo obrigatório e fazendo parte do currículo escolar, terá que ser adoptado na escola.

• A Associação de Professores de Português (é claro que haverá outras que têm outra percepção) apoia a introdução da nova terminologia (que substitui a nomenclatura de 1967), pelas razões que podem ser consultadas no respectivo site, tendo essa associação deixado os contributos na feitura da TLEBS que ali se mencionam.

• Considerações como se será preciso saber Linguística para escrever serão sempre inconclusivas. De todo o modo, a Linguística não é a ciência que ensina a escrever obras literárias.

• É bem verdade que esta reforma, como todas as reformas, poderá ter conotações ideológicas, como diz o Sr. Mithá Ribeiro. E também é bem verdade que o mesmo acontece com a Área de Projecto, de objectivos totalmente falhados. Mas o problema mais prosaico da Área de Projecto é que é visto como mera perda de tempo pelos alunos, por muitos professores ao que parece, e pelos pais, que estamos totalmente alheados do mundo escolar, por opção e por imposição. É devastador para a credibilidade da escola que existam disciplinas cujo único objectivo percebido seja o de “perder” o tempo que podia ser dedicado as disciplinas “importantes”.

(Carmen Formigo)

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Era bom que se distinguisse progresso científico, técnico ou humanista de «engenharia social». Caso contrário, continuaremos a ver apenas virtudes nas revoluções e nos revolucionários. Para que conste, sublinho que a questão da TLEBS é apenas um sintoma de uma «Revolução Cultural à Portuguesa» que se arrasta no ensino básico e secundário há meia década. Não discuto tecnicamente a TLEBS. Mas preocupa-me o sentido ideológico em que se enquadra. Outro exemplo claríssimo e não menos dramático que deriva do mesmo «espírito inovador» da TLEBS é a Área de Projecto. Escrevo porque estou neste momento «com a mão na massa». Está também a romper-se com o passado, incentivando, de modo quase boçal, os alunos a realizar trabalhos de investigação apenas porque têm umas luzes sobre leitura, escrita e «problemas sociais» (muitas vezes nem isso). É algo comparável à ideia do incentivo à actividade sexual na puberdade por ordem do Estado apenas porque biologicamente já se está apto. Está a forçar-se de modo compulsivo a maturidade intelectual e cívica. Corremos o risco com estas «experiências» de não só não inovar, como matar em idades precoces o interesse futuro por projectos de investigação ou desviar os professores de modo inaceitável de uma determinada empatia que desenvolveram ao longo da vida com o conhecimento. E vamos caindo em banalizações e simplismos irresponsáveis, como se o social se mudasse por decreto e por muitas acções de formação.

Sobre a Área de Projecto, adolescentes que, por exemplo, frequentam agora no 7º ano, arriscam-se a chegar ao 12º ano com «n» «investigações» ou «projectos» sobre droga, sexo, terrorismo, violência, religião, racismo, doenças terminais, eutanásia, música, desporto, ambiente, cinema, etc. A lista de temas da Área de Projecto por esse país fora, para pessoas com dois dedos de testa, mostra claramente que na esmagadora maioria dos casos tratam-se de temas de grande sensibilidade moral, intelectual, cultural, ideológica, académica, aqueles que exigem mais saber e maturidade para serem tratados com o mínimo de seriedade; ou então são temas que em si e no modo como são tratados servem objectivamente para denegrir o papel intelectual e civilizacional da escola. Está a brincar-se com a vida social, com as instituições e com o conhecimento naquilo que há neles de mais profundo. Como tudo tem sido feito, a «Revolução Cultural» que o Estado está a impor às escolas é tão perigosa e socialmente nefasta quanto o simplismo intelectual da «Revolução Cultural Chinesa».

No caso da Área de Projecto, porque a iniciativa é entregue aos alunos, a massa popular de onde brotam as preocupações e questões «genuínas», o resultado prático é demonstrar como o Estado está a dar o seu melhor para estupidificar os mais carenciados, a maioria dos alunos da escola pública. Enquanto as turmas excepcionais de classe média escolhem temas como «o ambiente», «o teatro» ou «a arte», a esmagadora maioria das turmas de classe média-baixa e baixa anda à volta do «sexo, drogas & violência». Quando, por exemplo, se solicita aos alunos organizados em grupos (outra medida «colectivista») que coloquem questões que gostariam de ver esclarecidas sobre o «seu» tema, surgem em adolescentes de 12-13 anos questões do tipo «Quais são as vantagens e desvantagens do sexo oral?», «Porque é que os jovens praticam tanto sexo?», «Quais as drogas com maior consumo?». Uma vez que as turmas não são rigorosamente homogéneas (e mesmo que assim não fosse), o Estado Democrático força-nos a colocar crianças com um mais saudável enquadramento familiar (e felizmente distantes destas questões), face a problemas que «a turma acha importantes que sejam debatidos». Portanto, não só não se resolvem os problemas de quem os tem, como se permite que eles sejam irresponsavelmente modeladores de comportamentos e atitudes dos outros, esses outros – alunos e professores – que o Estado deveria formar e proteger da barbárie. Se juntarmos a isso a desorientação (e até uma justa revolta entre os professores) provocada pelas TLEBS, percebemos como se gere a educação.

Um Estado que corta nos excessos (e bem!) e que deveria ser racional, deveria esclarecer quanto custam ao erário público por dia as Áreas Curriculares Não Disciplinares (Área de Projecto; Estudo Acompanhado e Formação Cívica). Cada turma consome cerca de um dia inteiro de aulas com tais barbaridades que podem equivaler a mais de um quinto dos salários pagos aos professores. Pior: há professores impedidos de ter mais horas da sua disciplina que tanta falta fazem (como história no 7º ano) porque o seu tempo lectivo e dos seus alunos é ocupado com essas «causas-maoístas-versão-século-XXI».

(...) Por muito que seja uma solução terceiro-mundista, espero que as elites que estão a oferecer de mão beijada um novo Estatuto da Carreira Docente à Ministra como panaceia para os males da educação, ao menos exijam em troca um pouco de inteligência, dignidade e estabilidade para o ensino. Quantas mais décadas isto continuará?

(Gabriel Mithá Ribeiro)

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Tendo sido aludida pela Sra. D. Cármen Formigo que não conheço de parte nenhuma, cumpre-me apenas dizer que:

- não tenho que aprender nada que muitos linguistas dizem que está errado;
- que , como a referida Senhora não me conhece não sabe o que já estudei pela vida fora e continuo a estudar todos os dias, porque não sei nada. A única motivação para ensinar são os meus alunos, os de trinta e três anos e os actuais. É perante com eles que sinto responsabilidade.
- para que eu não seja Professora das suas crianças é muito fácil, deve saber como se faz;
- e repito que nenhum dos GRANDES ESCRITORES da nossa Língua precisam de saber Linguística para serem GRANDES. Muitos nem sequer estudaram Humanidades, como agora se chama.Com certeza, Camões não estudou.

Com isto , (...) dou por finda esta troca de palavras que nunca imaginei poder originar, apenas quis mostar o meu sentir e de muitas colegas que não têm coragem de o dizer para não serem mal interpretadas. Eu, com a idade que tenho, já não me impressiono com ataques. Muito menos vindos de quem não me conhece e que se sente autorizado a fazer juízos de valor sem conhecer a minha vida profissional.

(Alexandrina Pinto, Professora de Português do 2º ciclo)

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Como mãe de alunos do 2º Ciclo, preocupa-me a resistência à auto-formação contínua da professora Alexandrina Pinto, na medida em que pode ser representativa do que acontece entre, espero que muito poucos, professores.

Ninguém tem que explicar aos professores a Nova Terminologia Linguística. Antes deveriam ser eles a procurar aprender (têm informação disponibilizada pelo Ministério de Educação desde, pelo menos, 2004 e capacidades intelectuais suficientes). Porque aprender sempre é o que todos esperamos que façam os médicos que nos curam, os engenheiros que constroem as nossas casas e os professores que ensinam os nossos filhos.

A TLEBS é aplicada por fases, segundo me parece. Os alunos não levam com toda ela de uma vez.

A terminologia científica é necessária em todas as disciplinas científicas, da Matemática à Física, da Biologia à Língua.

Não há que deitar fora as gramáticas antigas, que são imprescindíveis. Mas a verdade é que, custe a quem custar, a ciência evolui. Há muito que a medicina deixou de se basear no estudo dos quatro humores e na receita de sangrias.

Tenho a certeza de que os escritores conhecem o funcionamento da língua, porque o estudaram. Quem não o conhece, poderá escrever, mas não é escritor. Se dominam ou não a terminologia científica, é outro assunto totalmente diferente.

Todos os professores, anónimos ou não, têm que estudar. Não podem ter medo e, pior ainda, incutir aos pais e aos alunos, medo dos novos avanços científicos. O conhecimento humano é cada vez maior. Custa cada vez mais trabalho saber. Hoje, estudar é uma tarefa que não tem mais fim.

(Carmen Formigo)

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© José Pacheco Pereira
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