Eu tenho a maior das simpatias pelo projecto do Ciberdúvidas, seu mérito, seu interesse, seu valor. Mas escapa-me de todo por que razão é que tem que ser subsidiado pelo estado. Não há um grupo mínimo de voluntários que o possam fazer? Não há meios para particulares, que usam o serviço, ajudarem aos seus custos, mesmo que de uma forma quase simbólica? Não é possível contratar com jornais, rádios e televisões um pagamento que sustente o lugar? É assim tão caro?
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Vê-se bem que não teve experiência de procurar vender serviços ou obter patrocínios privados para projectos online que não sejam encabeçados por figuras públicas ou por "boys" do poder na altura. O povo português é pobre e/ou invejoso e/ou desinteressado. Tudo o que seja pagar por serviços é considerado mau à partida, especialmente se "uns pagarem e outros não".
O 7arte.net, por exemplo, já teve online a programação actualizada diariamente de cerca de 500 salas de cinema em todo o país. Não conseguimos vender conteúdos a quem os comprava mais caros e de pior qualidade noutras fontes (ou os roubava do nosso site). Não conseguimos parcerias que evitavam duplicação de esforços mesmo quando os nossos interlocutores reconheciam que o nosso produto era melhor e lhes trazia poupanças. Não conseguimos que os utilizadores contribuissem em montantes minimamente significativos, mesmo sabendo que os visitantes regulares do site eram muitos milhares. Não conseguimos vender publicidade a quem sabemos que pagava muito mais caro em locais com menor visibilidade e muito menor prestígio. Como este caso há vários outros.
Porquê este insucesso? Não sei. Nunca cheguei a perceber. Acho que faltou subornar alguém ou encontrar algum gestor competente que decidisse sem ser em função das "conveniências" nublosas que só se verificam porque a nossa (micro-)economia é pouco saudável. E que decidisse em tempo útil: tivemos decisões (todas "não") que os nossos ex-potenciais parceiros demoraram vários anos a tomar, isto quando acabaram por decidir. Ainda há agora quem nos diga que "está a pensar"...
Subsídios ao Estado nunca pedimos. Nem vamos pedir.
(Tiago Azevedo Fernandes)
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Desde que existe (vai fazer nove anos em Janeiro), nunca o Ciberdúvidas contou senão com apoios residuais do Estado. O último, se de apoio se tratou, foi (e graças à intervenção directa do então primeiro-ministro Durão Barroso) a habilitação ao POSI, durante um ano, que, ao abrigo do relançamento do Ciberdúvidas, depois do falecimento do saudoso João Carreira Bom, financiou em 80% parte das despesas, pagas sempre a más e tardias horas (a última "tranche", veja lá, há um a ano que estou à espera!..).Ou seja: o Ciberdúvidas existe, primeiro, por via da generosidade do João Carreira Bom (que tinha bolsa para isso) e, depois, por via do meu endividamento até ao limite do insustentável. Refiro-lhe isto para dizer que um projecto da natureza do Ciberdúvidas – como não há outro no espaço da lusofonia, no seu âmbito e concepção, e que faz o que o Estado não faz nem nunca fará (o Estado nem nenhuma outra entidade de espécie nenhuma em Portugal, a começar pelas universidades, públicas ou privadas) – nunca viveu da subsidiodependência, para fazer o que faz. Com a qualidade, o prestígio e a notoriedade reconhecidos unanimemente (a começar no Brasil que, como sabe, olha-nos bem por cima, e com razão, em tudo que seja matéria de língua em geral, e de dicionários, gramáticas, glossários e livros de toda a ordem, em particular). Como não vale a pena argumentar consigo sobre serviço público e os deveres correlativos do Estado para quem, na sociedade civil, o faz por ele – e muito menos contrapor-lhe o que aqui ao lado, em Espanha, se acaba de fazer com a criação da Fundação para o Espanhol Urgente, envolvendo entidades públicas (a Academia Real de Espanha, o Instituto Cervantes, a agência Efe, a rádio e televisão nacionais) e privadas (o BBVA, como patrocinador), qualquer delas entendendo a importância estratégica da sua língua oficial no mundo actual –, termino dando-lhe a lista de empresas e bancos de quem tenho levado sistematicamente com a porta na cara: Portugal Telecom, Galp Energia, CTT, Caixa Geral de Depósitos, Câmara Municipal de Lisboa (a quem em vão propus conteúdos de língua portuguesa nos seus painéis que passam coisas da noite e informações afins), "Jornal de Notícias" (não viu interesse numa coluna sobre língua portuguesa, olhe, como qualquer jornal brasileiro tem...), Readers Digest, Círculo de Leitores, Montepio Geral, Millenium, BPI, Banesto, etc., etc., etc. E escuso-me de lhe referir as várias propostas que tive para vender o Ciberdúvidas a interesses meramente comerciais – via verde, obviamente, para sua descaracterização. Portanto, se lhe ocorrer uma qualquer outra entidade das que mencionou, que troque os milhares que dá pelo patrocínio do futebol ou de um concerto de "rock" pela insignificância que eu preciso para manter o Ciberdúvidas, fico-lhe imensamente grato. Ah!, a insignificância que o Ciberdúvidas precisa (os custos da manutenção são na ordem dos cinco mil euros mensais) viria sempre ao abrigo da lei do mecenato, com as inerentes facilidade fiscais e, já agora, a associação pública a um projecto, repito a imodéstia, como não há outro no espaço que fala a língua portuguesa.