ABRUPTO

23.8.05


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
QUANDO TUDO CONTINUA A ARDER




Em visita recente a Espanha, numa incursão de pouco mais de 100 km, é evidente o contraste verificado no que respeita a incêndios florestais. No nosso país são por demais evidentes os sinais de fogo: mata ardida, floresta destruída, cheiro a queimado, horizonte enegrecido. A paisagem portuguesa revela na sua maior extensão montes despidos de vegetação, desordenamento na pouca florestação existente, matas compostas na sua maioria de pinhais, que cresceram à lei da natureza, sem corta-fogos, sujos de arbustos e vegetação rasteira e apresentando sinais de abandono e de desorganização.

O primeiro sinal de diferença foi-me dado à saída de Portugal na fronteira de Quintanilha. Vestígios recentes de um incêndio que lavrou no local e devastou uma grande área. Este quadro constitui, logo à entrada, um cartão de visita pouco digno para quem nos visita.

Nas dezenas de kms que percorri no país vizinho, em direcção a Zamora, a vegetação é constituída ainda por abundantes conjuntos de carvalhos, árvore autóctone, abrigo e sustento de variadas espécies cinegéticas, muito menos propícias à deflagração de fogos de Verão. Só a alguns kms das vias rodoviárias se podem ver, de quando em quando, e, preferencialmente nas encostas das colinas, matas de pinheiros, perfeitamente alinhados, todos do mesmo calibre, denotando uma clara organização e predisposição para a sua rentabilização, com largos corredores sem vegetação, de modo a haver limitações a possíveis incêndios. Afastados e protegidos da presença humana. Tudo denota uma organização e um planeamento que contrasta de forma gritante com o nosso caos.

No regresso e a cerca de trinta km do nosso país, vislumbro uma coluna de fumo que indiciava um incêndio florestal. Tive uma leve esperança que seria no país vizinho. Acelerei um pouco mais, na ânsia de saber a sua exacta localização. Pouco depois saíram-me frustradas as expectativas. O fogo era novamente em Portugal. Tinha tudo voltado à normalidade!

(José Alegre Mesquita, Carrazeda de Ansiães)

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Há efectivamente um aproveitamento feito pelos meios de comunicação social (sobretudo da televisão - onde o sentimento tem mais peso do que a razão e a explicação) dos sentimentos da população afectada pelos incêndios (desespero, raiva, angústia, dor...).
Porém, a selecção dos sentimentos tem sido feita de forma bastante interessante. Na noite de ontem estive (porque moro em Coimbra) também a ajudar pessoas amigas que procuravam travar o avanço das chamas. Uma multidão subia e descia a rua, corria com baldes, pedia mangueiras, e ajuda, gritava, chorava... E criticava o governo e a actuação das entidades públicas responsáveis. Várias vezes o faziam. Não queriam com isto tirar as culpas que muitos proprietários têm por não cuidarem das suas terras, mantendo-as limpas, ou que recusam a ajuda de funcionários de limpeza das juntas de freguesia que para isso se disponibilizam (porque também disso se falou, já que estava presente um elemento da junta de freguesia em questão). Mas não esqueciam as responsabilidades que entidades estatais têm.
Assim sendo, não percebo por que motivo nunca se ouve na televisão, no meio de tantos desabafos da população, críticas ao governo. Só porque são desabafos sem fundamento? Porque são injustos? Porque são apenas isso, desabafos? Mas o Primeiro Ministro também teve um desabafo quando se sentiu prejudicado pelas críticas que sofreu por não ter interrompido as suas férias. E esse desabafo (esse sim, sem fundamento) passou na televisão.

Nota positiva para a TSF, que às 4h da manhã dava notícias actualizadas sobre a situação dos fogos em Coimbra (entre outras regiões), e para o Presidente da Câmara, Carlos Encarnação, que falou a essa hora em directo e mostrou um interesse pela situação que o Primeiro Ministro tardou em mostrar.

(Paulo Agostinho)

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© José Pacheco Pereira
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