Ainda a propósito dos incêndios, julgo que mais que tudo a "época de fogos" mostra-nos um retrato claro de um país profundamente terceiro-mundista, nos conceitos, nas atitudes e num estranho apego à boçalidade, como se de um bem valioso se tratasse. A culpa, essa é sempre dos outros, da falta de meios, do governo, dos pirómanos, das autarquias, da seca, mas nunca, nunca mesmo dos próprios, que constroem sem cuidar da envolvente, que acumulam lixo em áreas perigosas, que deitam vidros para o chão, que operam máquinas geradoras de faúlhas no Verão dentro das matas, que fumam e deitam beatas para qualquer canto, que insistem nas queimadas proibidas, etc., etc. Depois vem o cortejo dos directos televisivos, cujos jornalistas competem pela proximidade às chamas e pelo despropósito dos comentários. Usam-se os chavões habituais, desde o "fogo posto" até à "falta de meios", o que quer que seja que isso quer dizer. Segue-se um habitual confronto estéril entre um qualquer membro do governo e os representantes das oposições e já está, cumpriu-se mais uma época de fogos em Portugal, para o ano há mais.
No entanto, no seu afã informativo, as televisões e os demais "media", fazem questão de ignorar olimpicamente toda e qualquer discussão séria sobre este assunto gravíssimo. Porquê? Porque as discussões sérias (as únicas que valem a pena) fazem-se com especialistas, que existem, mas que as televisões preterem (se calhar por falta de telegenia) e não com políticos, comentadores ou generais. Quais as qualificações de quem coordena as operações de prevenção e combate aos incêndios, trata-se de facto de um especialista, com estudos e trabalhos publicados na matéria? Não se compreenderá se não for esse o caso. Que sabe o responsável da tutela sobre o assunto? Quem são os seus acessores para a área e quais as suas habilitações? São perguntas legítimas, dado que se tratam de lugares públicos, suportados pelos contribuintes. Eu, como contribuinte, preferia que o ministro fosse assessorado para este assunto por um doutorado em incêndios e não por mais um advogado ou economista. Os tópicos para discussão são conhecidos e a sua enumeração desnecessária, mas no fundo, desde a atitude dos cidadãos até à dos governos, tudo acaba por radicar no problema essencial deste país: a falta de educação, pior, a convicção profunda de que ela não faz falta.
(João Silva)
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Muito tenho visto escrevêr àcerca de incêndios, suas causas, origens ( criminosas ? doentias ? ), soluções para o combate.
São também constantes as acusações sérias aos proprietários , acusando-os de falta de limpeza das matas.....
Mas, sendo o Estado proprietário também, e a ele competindo protegêr as áreas que ele próprio determinou como protegidas “ parques naturais “ , como se justifica que essas reservas ardam com a mesma facilidade do que as bouças de quantos – muitas vezes emigrados – não tem meios nem auxilio para a sua limpeza !
E como castigar o proprietário de uma mata que arde apenas e só porque o seu vizinho não limpou a sua parte ?
Não tenho jeito para escrever mas queria deixar estas questões no ar. Porque falar do combate é fácil , venham mais aviões, troquem-se submarinos por helicópteros , procurem-se mais bombeiros , mas alguém tem de pagar, e aqui , mais uma vez estamos a tratar o doente em vez de evitar a proliferação da doença.
Também, e no campo da prevenção , julgo que todos se esquecem que temos 500 mil desempregados !!!
Não haverá no meio desse meio milhão de Portugueses alguns habilitados a serem recrutados para efectuar vigilância florestal ? Estará o País em situação de sustentar meio milhão de pessoas sem se socorrer delas para serviços cívicos ?
Não passaria aqui por um pacto de regime o acordar na possibilidade de “ requisição civil “ dos desempregados para acudir a esta situação de calamidade ? Ou apenas aqueles que trabalham para sustentar os desempregados é que se devem sujeitar á requisição civil ?
(Luis Miguel Moreira)
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(...) Alguém viu um fogo começar espontaneamente numa mata ou floresta? Há para aí alguém que tenha visto um incêndio começar sozinho, assim, a uns metros de si, sem intervenção humana? Há por aí alguém que possa afirmar "Olha estava numa mata quando vi, de repente, à minha frente, um fuminho libertar-se no meio de ervas secas e iniciar um fogo"?
Gostava muito de saber se alguém já assistiu, vendo com os seus próprios olhos, uma chamazinha irromper de forma espontânea. Porque senão, se ninguém presenciou um incêndio deflagrar naturalmente, das duas uma: ou os fogos, quando começam, são tão tímidos que só ocorrem quando toda a gente está de costas, ou...somos todos lorpas e hipócritas.
(Mjb Reduto)
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FOGOS : COMBATE ou POLÍTICA ?
De vez em quando imponho a mim próprio o silêncio , porque a revolta que sinto perante certos factos me tolhe a vontade de falar . Depois , a custo , vou recuperando e hoje acho que é altura de voltar a falar .
De falar do que muitos dizem ser tempo para calar : da vergonha nacional dos fogos florestais .
Não vou , porém , pelo caminho da crítica aos cortes orçamentais recentes ; da discussão do ridículo de certas afirmações de certos " cromos da bola " ; da comparação com o que se passou na Califórnia ou em qualquer outro lugar ; se os SAPADORES são melhores que os VOLUNTÁRIOS . Esta via – seguida há muito tempo por muitos responsáveis – leva ao esquecimento das verdadeiras causas e à não adopção das políticas necessárias : alimenta os demagogos .
Tão pouco vale a pena falar do anúncio da maior caça ao incendiário levada a cabo pela P.J. ou do agravamento de medidas penais ou do facto de um presumível incendiário aguardar julgamento em liberdade : continuaríamos na demagogia .
Falemos do que vale a pena :
1 – Para quando um cadastro efectivo da propriedade em Portugal ? Para quando uma política de emparcelamento obrigatória e de proibição de repartição de propriedade abaixo de certos limites ?
2 – Para quando dotar as Juntas de Freguesia de máquinas e equipamento ( e de verbas para a sua utilização ) e tornar obrigatório o ordenamento e a limpeza de matas ?
3 – Para quando um estudo sério e a sua aplicação obrigatória sobre a tipologia das florestas , mantendo a níveis controlados o potencial de fogo e sua expansão ?
4 – Para quando uma política de fomento do desenvolvimento integrado das zonas florestais , incluindo o fomento da fixação populacional através do investimento na agricultura e criação de gado , ambas , de características adequadas , numa rede de comercialização de produtos - transformados localmente - valorizados por certificados de origem e de natureza ?
5 – Para quando uma política de desenvolvimento turístico tirando partido do potencial que tantos estrangeiros já descobriram vindo fixar-se nas nossas serras ?
Com isto apagam-se os fogos ?
Não , previne-se o incêndio .
Pois : e o dinheiro para pagar tudo isso ?
Tem sido e vai continuar a ser gasto na construção de quartéis de bombeiros , na aquisição e aluguer de veículos de combate ao fogo , na compra de Kits de adaptação de aviões , na perda de bens ...
... e continuam a MORRER PESSOAS .
A solução é POLÍTICA .
J.A.Ferrão Morgado, na Comarca de Arganil, Agosto 2003, enviado pelo autor.