ABRUPTO

30.7.05


NATUREZA MORTA DE NOITE COM VENTO

À esquerda, pela primeira vez um espaço vazio. Havia as folhas de um capítulo de um livro, mas estão a ser corrigidas noutro sítio. Ficou um vazio inabitável, arrumado. Quase arrumado. Por baixo, havia pouca coisa: um post-it com uma morada, duas agendas antigas que vieram num espólio. Uma de 1967 está vazia e com excepção da assinatura do dono não parece ter nada escrita. Na capa diz licores Mala Posta.

A outra é vermelha e tem um nome estranho: “Agenda Quadrimensal de Medicina Internacional” e é de 1931. Não sei como foi parar a este espólio em que não encaixa. Encontrei-a no chão, entre recortes quase a desfazerem-se e revistas Sinal. Na agenda, escritas em tinta castanha e numa letra muito pequena estão números de telefone, recados, datas. Uma agenda de um médico? Talvez. Entre os nomes, quase todos os grandes médicos portugueses. Todos mortos. Uma tesoura, um agrafador, uma lupa, cinco zips, uma máquina fotográfica, três canetas. Um ecrã com este texto. Um espelho côncavo. Um azulejo de Delft. Uma mão. Duas mãos. Um rato sobre azul. Mais simplicidade do que o costume. Menos caos. Um ramo de flores secas. Um ponto de luz que brilha ao longe. Mais um Agosto, o mês menos interessante. Vento.

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© José Pacheco Pereira
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