ABRUPTO

4.7.04


ELOGIO DO ALMOCREVE DAS PETAS



Este é o logótipo dos blogues de que eu gosto mais. Não gosto das letras, mas sim do fundo.

Que mais me interessa. Que mais me lembra. Quem já viveu em casas antigas reconhece aquele sótão, aquelas paredes, aqueles papéis, aquele ar, aquela poeira que está em cima de tudo. Reconhece o que aquilo é, os restos de vidas outras. Tudo aquilo já teve outro sentido. Já foi novo. Aqueles restos de jornais já foram lidos com interesse. Aqueles restos de mobílias, cadeiras a que falta uma perna, mármores de toucador partidos, camas de ferro enferrujadas, pequenas demais para os gigantescos adolescentes de hoje, espelhos sem espelho. Coisas que não servem, nem ninguém quis deitar fora. Até um dia.

Que mais Luz tem naquela luz. Que não me deixa parar de olhar. A Luz é platónica, é a luz da caverna: olhamos mas não vemos nada. Brilha demais.

O autor anónimo do Almocreve é um homem “antigo”, percebe-se. Iniciado, percebe-se. Alimentado por aquela Luz, percebe-se. As leituras, percebem-se. O sítio de Lisboa, percebe-se. Os alfarrabistas, percebe-se. Aquela mistura de surrealismo com bibliofilia, percebe-se. Aquela mistura de radicalismo político com memória, percebe-se. O bom observador percebe quase tudo daquele anonimato, mas não interessa. O homem sabe o que é um “almocreve”, sabe o que são “petas” e sabe o que é o “Almocreve das Petas”. E produz uma fala única, uma mistura única, uma leitura única.

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© José Pacheco Pereira
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