ABRUPTO |
semper idem Ano XIII ...M'ESPANTO ÀS VEZES , OUTRAS M'AVERGONHO ... (Sá de Miranda) _________________ correio para jppereira@gmail.com _________________
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29.12.03
IDADES
Isto das idades, das idades relacionadas com o sexo e o amor, é , sabe-se, muito complicado. Vamos, nos próximos meses, ter à saciedade, discussões sobre o sexo e a idade, consentimento ou falta dele, crianças a comportarem-se como adultos e adultos a comportarem-se como predadores. Muito complicado. Tenho-me lembrado muitas vezes como na literatura portuguesa, quando havia inocência ou falta dela, as idades roçavam a perigosa pedofilia. O Carlos e a Joaninha de Garrett, diz Silva Carvalho, parece pedofilia. Ele gostava demasiado de a ver saltar para o seu colo com seis anos. Camilo Castelo Branco (que se casou com 16 anos) fez a Teresa do Amor de Perdição com 15. Que a coisa não era inequívoca percebeu-o o autor que abriu uma excepção para a sua heroína: "Os poetas cansam-nos a paciência a falarem do amor da mulher aos quinze anos, como paixão perigosa, única e inflexível. Alguns prosadores de romances dizem o mesmo. Enganam-se ambos. O amor dos quinze anos é uma brincadeira; é a última manifestação do amor às bonecas; é a tentativa da avezinha que ensaia o voo fora do ninho, sempre com os olhos fitos na ave-mãe, que a está da fronde próxima chamando: tanto sabe a primeira o que é amar muito, como a segunda o que é voar para longe. Teresa Albuquerque devia ser, porventura, uma excepção no seu amor." Na poesia, lembro-me desta mesma ambiguidade. Castilho, que tinha a desculpa de ser cego, fazia a coisa aos treze anos: “Já tenho treze anos, que os fiz por Janeiro; madrinha, casai-me com Pedro Gaiteiro.” E Machado de Assis lembrando-se de uma Menina e Moça (com que idade a teriam levado de casa dos seus pais?) e tendo dois olhos, sabia-a Está naquela idade inquieta e duvidosa, Que não é dia claro e é já o alvorecer; Entreaberto botão, entrefechada rosa, Um pouco de menina e um pouco de mulher. (…) É que esta criatura, adorável, divina, Nem se pode explicar, nem se pode entender: Procura-se a mulher e encontra-se a menina, Quer-se ver a menina e encontra-se a mulher! Por aí adiante. Muito complicado. (url)
© José Pacheco Pereira
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