ABRUPTO

21.12.03


EARLY MORNING BLOGS 100

Chegamos aos cem. Tudo começou por esse mecanismo do nosso pensar que vem do nosso sentir, e que é a associação de ideias. Dos “early morning blues” para os “early morning blogs”. Representava uma entrada matinal sobre os mais interessantes blogues e notas do dia anterior. No entanto, estava-se então numa fase particularmente zangada na blogosfera, com o tumulto do crescimento rápido a perturbar quem estava, e a excitar quem entrava com grandes esperanças. O território, sempre escasso (talvez o factor singular mais importante para perceber o nosso país e a sua vida intelectual, é que estamos sempre em cima uns dos outros, salvo seja) levava a guerras de fronteira, influência e bandeira. Não me apeteceu participar e, sem deixar de louvar o que me parecia interessante, passei para outra.

Começou pelas letras das músicas matinais e pela procura da letra perdida do “Early Morning Blues” de Nat King Cole, de que tenho um disco em que ele canta, mas em que penso que há um erro na numeração das canções. O meu leitor Jiminy Cricket fez aliás consultas a vários locais especializados e não encontrou nada. Nat King Cole só tocava e não cantava e por isso, desde o início, por ironia, os “early morning” assentam num equívoco de números.

Das canções passou-se para os poemas, e a manhã, triste e gloriosa, marcava a aurora destas pequenas letras electrónicas. Muitos leitores colaboraram e colaboram na sua escolha e há poemas para mais cem manhãs. Os “early morning blogs” continuarão, desviando ocasionalmente para todos os lados, semper fidelis a uma constância e persistência dos actos, que faz parte da “filosofia da alcova” do autor.

Hoje há um belo e duro poema, Aubade de Philip Larkin. Por coincidência, falei sobre ele, no exílio da semana passada, com VGM, e um leitor dedicado, João Costa, enviou-o. Para servir os augúrios da coincidência, aqui está, “work has to be done”.

Aubade


I work all day, and get half-drunk at night.
Waking at four to soundless dark, I stare.
In time the curtain-edges will grow light.
Till then I see what's really always there:
Unresting death, a whole day nearer now,
Making all thought impossible but how
And where and when I shall myself die.
Arid interrogation: yet the dread
Of dying, and being dead,
Flashes afresh to hold and horrify.
The mind blanks at the glare. Not in remorse
- The good not done, the love not given, time
Torn off unused - nor wretchedly because
An only life can take so long to climb
Clear of its wrong beginnings, and may never;
But at the total emptiness for ever,
The sure extinction that we travel to
And shall be lost in always. Not to be here,
Not to be anywhere,
And soon; nothing more terrible, nothing more true.

This is a special way of being afraid
No trick dispels. Religion used to try,
That vast, moth-eaten musical brocade
Created to pretend we never die,
And specious stuff that says No rational being
Can fear a thing it will not feel, not seeing
That this is what we fear - no sight, no sound,
No touch or taste or smell, nothing to think with,
Nothing to love or link with,
The anasthetic from which none come round.

And so it stays just on the edge of vision,
A small, unfocused blur, a standing chill
That slows each impulse down to indecision.
Most things may never happen: this one will,
And realisation of it rages out
In furnace-fear when we are caught without
People or drink. Courage is no good:
It means not scaring others. Being brave
Lets no one off the grave.
Death is no different whined at than withstood.

Slowly light strengthens, and the room takes shape.
It stands plain as a wardrobe, what we know,
Have always known, know that we can't escape,
Yet can't accept. One side will have to go.
Meanwhile telephones crouch, getting ready to ring
In locked-up offices, and all the uncaring
Intricate rented world begins to rouse.
The sky is white as clay, with no sun.
Work has to be done.
Postmen like doctors go from house to house.


Philip Larkin


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© José Pacheco Pereira
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