ABRUPTO

18.7.03


NOTAS CAMUSIANAS 6

Um leitor pergunta, sobre o Dom Juan de Camus (neste caso sobre todos) :

“porque é que Dom Juan é feliz?"

Porque não espera.

*

Outro leitor, Salvador Santos, escreve esta outra interpretação das primeiras “notas camusianas” sobre Dom Juan e a traição – Dom Juan “el burlador” :

"Chamo, por agora, à colação, a multiplicidade de D. Juans que existe na figura mítica do grande traidor. Assim, parece-me mais importante saber quem é D. Juan que divagar sobre a qualidade da sua traição ou até, como o faz, como não traidor.

Comecemos por afirmar que D. Juan seria arrogante, cruel e traidor por convicção ou natureza. Em última instância não seria este D. Juan o próprio representante da decadência social que tanto contestava? É ele quem o afirma em El Burlador de Sevilla:

Sevilla a voces me llama
el Burlador, y el mayor
gusto que en mi puede haber
es burlar una mujer
y dejalla sin honor.
Viva Dios, que le he de abrir,
pues salí de la plazuela!
Mas, ¿si hubiese otra cautela?...
Gana me da de reír (Tirso, I, 1448-57).

Ei-lo, o Übermensch.

(…) recordo e cito de memória Nietzsche cuja ideia matriz se aplica a D. Juan. Dizia o pensador que ao indivíduo nunca o elogio o sacia, uma vez atingido o seu objectivo, a paz significa para ele uma nova guerra e a vida deve ser um nunca mais acabar de aventuras cada vez mais perigosas. Ele não procura a felicidade mas apenas o gozo que o jogo lhe proporciona.

Não será por aqui que D. Juan, o traidor, tem ou não esperança. Ou sequer que se consiga avaliar do grau de traição em valor menor ou valor maior, no caso dele ou de outrem. Trata-se, outrossim, de verificar que até os traidores têm esperança depositado a juros num futuro em que nunca o jogo pare, nunca a guerra acabe."

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© José Pacheco Pereira
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