ABRUPTO

28.2.06
 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(28 de Fevereiro de 2006)


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Novos descobrimentos: na noite, Mimas passa em frente de Saturno. Percebe-se o frio.


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No Guardian as guerras de livros e autores à beira dos prémios.

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Bom retrato de Sócrates feito por Valupi no Aspirina B:
"Sócrates é muito irritante. Tem uma pose sempre no limite da arrogância possidónia, tendência que se tem agravado com a idade e os papéis do poder. Mas Sócrates torna-se simpático quando se irrita; o que lhe acontece com facilidade, de resto. Aí, o seu temperamento sanguíneo tem uma genuinidade que se distingue dos artificialismos da circundante pandilha. Sente-se-lhe o gosto em passar responsos paternalistas, exercício que atinge o auge quando a vítima é Marques Mendes. A sua voz também se modula de acordo com a bancada do interlocutor: o CDS é tratado com indiferença fria, o PSD com agressividade cúmplice, o PCP com petulância agastada e o Bloco com bonomia agreste.
*
O que Valupi diz de Sócrates é apenas a confirmação do que diz o nosso clássico Vieira: "Se olharmos para as coisas com simpatia, até um cisne preto nos parece branco; se olharmos, com antipatia, até uma rato branco nos parece preto."

(João Boaventura)
 


EARLY MORNING BLOGS 730

Henri quatre

Henri quatre
Voulait se battre
Henri trois
Ne voulait pas
Henri deux
Se moquait d'eux
Henri un
Ne disait rien.

("Comptine" anónima)

*

Bom dia!

27.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO NOS OLIVAIS - LISBOA, PORTUGAL



Envio-lhe uma foto do trabalho duro de dois imigrantes de leste de Sábado à tarde, dia 25 de Fevereiro de 2006, enquanto a maioria da população de Lisboa se fazia à estrada para comemorar o Entrudo ou andava em roda viva para comprar os fatos de Carnaval a preços chorudos em centros comercais. Chovia torrencialmente a rua estava deserta e esses dois homens colocavam pedra a pedra a calçada da minha rua um. Um deles não tinha mesmo impermeável e estava encharcado. Envio-lhe a foto para que seja um pequeno tributo aos imigrantes que ajudam a desenvolver o meu país com trabalho muito duro e em condições muito difíceis. O grau de desenvolvimento de um país também se vê na forma como reconhece e integra aqueles que por aqui quiseram procurar uma vida melhor.

(Renato Gonçalves)
 


EARLY MORNING BLOGS 729

Coccinelle vole

Coccinelle vole
Va-t'en à l'école
Prends donc tes matines
Va à la doctrine.

("Comptine" anónima)

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Bom dia!

26.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO EM TIMOR-LESTE



Um grupo de alunas da Universidade Nacional de Timor-Leste depois de uma aula, falando sobre o futuro de Timor. No quadro negro pode ver-se uma frase com que eu havia intrigado os alunos, solicitando-lhes que descobrissem o que queria dizer em português. Quando descobriram, fizeram questão de a escrever naquele quadro que estava na minha sala de trabalho, gabinete frequentado pelos estudantes, onde tínhamos grandes conversas sobre as suas dificuldades, sobre as suas ansiedades, medos, esperanças, e ali ficou durante um ano. Carpe diem. Aproveitem o dia. Era assim que nos cumprimentavamos, Carpe Diem. No meio de tanta ambiguidade, de tanta dificuldade, era necessário aproveitar o dia, estudar, trabalhar, lutar, mas também criar amizades, solidariedades, fortalecer a paz. Esta farse ganhava ali mais sentido do que uma mera cópia romântica e paternalista do Clube dos Poetas Mortos.

(Ângelo Eduardo Ferreira)
 


RETRATOS DO TRABALHO NO SUL DE PORTUGAL


Obras.

(António Filipe Meira)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: LIÇÃO DE POPULISMO



No dia do primeiro aniversário da vitória com maioria absoluta pelo PS (20.02.2006) assistimos nas televisões a uma exibição de populismo de cátedra pelo Eng.º José Sócrates e governantes da educação:

1) Anunciou o primeiro-ministro o alargamento das aulas de substituição ao ensino secundário (10º-12º anos) num dia em que se iniciava uma semana greve de professores às mesmas, depois de numa greve anterior (18.11.2005) a ministra da educação ter publicado um texto «coincidente» com a data no PÚBLICO e no DIÁRIO DE NOTÍCIAS ser levantada, também nesse dia «oportuno», a questão das faltas dos professores. Começa a ser uma estratégia doentia ou então são coincidências a mais. Não vejo diferenças de fundo entre isso e a intervenção do primeiro-ministro sobreposta à de um candidato na noite eleitoral das presidenciais. No último caso admito que pode ter sido acidental, mas também não se podem deixar de assinalar outras atitudes comparáveis que revelam a estratégia de afirmação de um governo do qual o Eng.º José Sócrates é o primeiro responsável. Nada de novo nesta forma de atropelar a dignidade dos outros. Em democracia os processos valem tanto quanto os resultados. Não sou sindicalizado, concordo com as aulas de substituição, dou com prazer aulas de substituição, não fiz greve e, no entanto, não compreendo certas práticas.

2) Anunciam-se avanços sem se fazer uma ponderação minimamente séria de como decorrem as aulas de substituição no básico. Isso tem uma designação: fuga em frente, um vício de longa duração nas políticas educativas. Qualquer correlação entre melhorias substantivas na qualidade do ensino e a generalidade das medidas que o governo tem implementado, em especial as aulas de substituição, só mesmo se andássemos distraídos. A não ser que se considere que o problema do ensino é essencialmente orçamental. Mas se assim for preferiria viver numa república de contabilistas-governantes. Enquanto o centro da questão, a sala de aula, se mantiver como está (e não se prevê que mude com o rumo que as políticas tomaram), o que se «reformar» terá efeitos meramente laterais ou circunstanciais. Cá estarei daqui a meia dúzia de anos, se estiver vivo, para tentar explicar porque, uma vez mais, se falhou.

3) O governo tem-se mexido muito (reorganização da rede escolar, aulas de substituição, revisão da progressão nas carreiras, etc. – medidas que têm de ser tomadas, sem dúvida), mas foge dos problemas estruturais: indisciplina (não se vislumbra que o problema tenha sido assumido, tal como se teve de assumir o défice público, e que exista uma estratégia, boa ou má, para enfrentá-lo e, se calhar, teremos de esperar largos anos para, outra vez, se actuar tarde e mal), facilitismo das avaliações (enquanto o país insiste na incapacidade de discutir de modo sustentado e plural a questão dos exames nacionais no básico e no secundário porque uns quantos «especialistas» os desvalorizam, o governo reproduz medidas de promoção do facilitismo como o Despacho Normativo 50/2005), estruturas curriculares ineficazes (só não vê quem não quer).

4) Tal qual os populistas que falam «por cima» e atropelam as elites alegando que os interesses do «povo» estão em primeiro lugar, este governo insiste em falar «por cima» dos professores, encarnando a «vontade» dos alunos, dos encarregados de educação (com se não houvesse professores-progenitores-encarregados-de-educação nos mais de 100.000 profissionais) e da escola (cuidadosamente, ao menos, nessa palavra os governantes não ousam incluir os professores). Depois de marginalizados pelos discursos dos líderes sindicais, os professores de sala de aula são confrontados com uma nova versão: um governo que refinou e monopolizou o autismo estrutural do sistema. Nunca dei por um verdadeiro pluralismo na educação. Ora uns, ora outros.

5) Directa ou indirectamente, este discurso governamental ao referir apenas «os sindicatos» (e mesmo esses convinha discriminá-los) e ao omitir os professores, não estabelecendo uma distinção entre uns e outros (talvez porque, honestamente, não sinta legitimidade para tal), permite que socialmente se instale uma percepção pública que mete tudo no mesmo saco, numa área tão complexa quanto a do ensino (veja-se o artigo primário da autoria de Filomena Martins na SÁBADO de 23.02.2006, p.67). Além disso, a negação sistemática e mesmo obsessiva do papel social dos sindicatos (concorde-se ou não com eles), representados no simplismo retórico do primeiro-ministro (e de alguma imprensa) como «os maus da fita», em prol de um omni-representativo governo na área da educação, constitui uma óbvia deriva populista inimaginável num governo dito de esquerda se recuássemos um ano. A «burguesia, os ricos, os poderosos» foram finalmente descodificados: os sindicatos. Já nem sei se a esquerda que governa tem alguma coisa a ver com Marx.

6) Todavia, a sobranceria do primeiro-ministro e do governo tem muito a ver com uma oposição que, dia-a-dia, vai justificando o contrário daquilo para que existe: apesar de tudo, com esta oposição (não generalizo, mas refiro-me em concreto à área da educação), justifica-se a maioria absoluta do Eng.º Sócrates e a acção «notável» da ministra da educação.

(Gabriel Mithá Ribeiro)

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Toda a gente ligada à educação sabe que a decisão do Governo relativamente às aulas de substituição está ligada a um número que recentemente surgiu nos media: o de que a taxa de abstencionismo dos professores do ensino básico orça os 10%. Ora, sendo sobejamente evidentes os prejuízos que tal prática acarreta sobre a educação das crianças, das duas uma: ou o Governo, entidade abstracta que para o efeito teria de tomar a forma concreta de uma qualquer entidade inquisitorial e disciplinar, a puniria, ou criava mecanismos, similares aos já institucionalizados pelo costume em muitas Universidades, para que sejam os próprios pares dos abstencionistas a criarem uma moral menos transigente para com esse relaxe. Fazendo-os ocupar os tempos lectivos que os colegas abstencionistas abandonam. No fundo, trata-se de afirmar uma coisa muito simples e justíssima aos docentes: “faltem se quiserem, mas as crianças não podem ficar abandonadas e alguém tem de tomar o lugar dos faltosos”!
Evidentemente que as aulas de substituição não são a melhor solução para o abstencionismo de alguns docentes. A melhor solução seriam medidas punitivas fortemente dissuasoras de tal prática. Mas e o seu custo político? E a sua implementabilidade prática? Enquanto o relaxe for uma cultura dominante ou pelo menos tolerada, é difícil imaginar melhores soluções!
Misturar este problema com o da qualidade das salas de aulas ou com o facilitismo não ajuda nada. Cada problema de sua vez. Até por que se não começar por instaurar uma cultura de auto-exigência entre os docentes, nada se conseguirá realizar com eles.
A maioria dos portugueses apoia esta política. Por que é populista? Não, por que é cristalinamente necessária. Ou qual é a alternativa?
Pessoalmente, gostaria de acrescentar o seguinte: não pertenço ao clube do 1º Ministro nem a clube nenhum. E tanto se me dá que seja o Engº Sócrates como o Dr Marques Mendes a fazer o que é necessário na educação. Mas como nas últimas décadas ainda ningém se interessara em fazer coisa alguma nesta matéria, por mim, apoio! E comigo, segundo as sondagens, a maioria dos portugueses!

(José Luís Pinto de Sá)
*
Por outro lado, quero fazer uma observação relativa ao excelente texto do seu leitor Gabriel Mithá Ribeiro, que faz referência «facilitismo das avaliações». Quero apenas acrescentar que uma das causas desse facilitismo consiste em querer-se diminuir o insucesso escolar. Mas se analisarmos o conceito subjacente de «insucesso», o que se torna óbvio é que ter sucesso é passar de ano e não, como se poderia pensar, ter-se aprendido novos factos ou desenvolvido novas competências. Considero obscena esta noção de sucesso. E se a aplicássemos a outras áreas? Vamos medir o sucesso de um político unicamente pelo número de eleições que ganha, independentemente do modo como o fez e de como exerceu o cargo para que foi eleito? Vamos medir o sucesso de um presidente de um clube de futebol unicamente pelo número de campeonatos ganhos, sem pensar em eventuais subornos e outras falcatruas? Já agora, porque não medir o sucesso de um professor pelo número de alunos que não reprova? Parece-me que faria perfeitamente sentido, pela mentalidade em vigor.

(José Carlos Santos)
 


RETRATOS DO TRABALHO NA SERRRA DA ESTRELA, PORTUGAL


Pastores conduzindo um rebanho - Vila Soeiro / Guarda - região da Serra da Estrela, 2006.

(António Ruivo)
 


EARLY MORNING BLOGS 728

The Limerick Packs Laughs Anatomical

The limerick packs laughs anatomical
Into space that is quite economical.
But the good ones I’ve seen
So seldom are clean
And the clean ones so seldom are comical.

(Anónimo)

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Bom dia!

25.2.06
 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(25 de Fevereiro de 2006)


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Mais um Google: o Google Page Creator. As críticas têm sido negativas, mas para um amador vale experimentar.

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O modo como a comunicação social (exemplo típico: o relato épico-lírico de um jornalista da RTP no noticiário das 20 horas de ontem) está a tratar o crime cometido no Porto contra alguém que se encontrava na maior das solidões, da perda de si, o que também significa na margem mais absoluta da exclusão, é um típico exemplo de jornalismo de causas, ou seja, de não-jornalismo. Duvido que sequer sirva qualquer causa, serve uma determinada visão política do problema e da sociedade, a do Bloco de Esquerda. Penso aliás que é absolutamente contraproducente para uma sociedade que aceite a pluralidade das escolhas de vida com naturalidade, que é o que desejamos.

O problema é que não é isso de todo o que está em causa neste caso. O que está em causa são os mecanismos da exclusão, e esses não são apenas a homossexualidade, mas também a miséria, a droga, a marginalidade, de onde vieram criminosos e a vítima. A droga , por exemplo, não tem nenhum papel? Transformar este crime num instrumento para mais uma vez fazer legislação "politicamente correcta " sobre a "homofobia", é política, não é jornalismo.
 


RETRATOS DO TRABALHO NO ALENTEJO, PORTUGAL


Empilhamento da cortiça.

(João Sobral)
 


RETRATOS DO NÃO-TRABALHO NA FINLÂNDIA



Descrição: Bar de uma faculdade nos arredores de Helsinki, depois das cinco da tarde.

Apesar da faculdade estar aberta os funcionários do bar já não trabalham a essas horas, o bar no entanto permanece aberto. Nestas circunstâncias o funcionamento do mesmo é muito simples e da mesma forma um excelente exemplo de como as coisas em geral funcionam na Finlândia. O bar adopta um sistema de self-service em que o consumo é cobrado na base da confiança, ou seja cada um serve-se (sejam cafés bolos ou qualquer coisa ao dispor no balcão), anota num caderno o que apanhou, e mete a moeda num porquinho de loiça. E é já aqui ao lado, na Nokialand.

(Nelio Barros)
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Este sistema de self-service baseado na confiança é muito semelhante ao caso de uma empresa, descrito no excelente livro "Freakonomics", que coloca "bagels" em vários edifícios de escritórios da mesma forma:
sirvam-se, mas deixem aqui o dinheiro correspondente, confiamos.
Claro que há roubos de bagels, mas a percentagem de roubos é pequena e dá para a empresa ter um lucro aceitável. O curioso da história é que devido aos registos pormenorizados de vários anos o autor do Freakonomics (já traduzido para português) pode contar-nos factos tão interessantes como saber em que tipos de escritórios há mais roubos, que nas vésperas de feriados propiciadores de ansiedade, como o Dia de Acção de Graças e o Natal, há mais roubos do que na véspera de feriados neutros como o Dia do Trabalhador ou o Dia da Independência.

(Leonel Morgado)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM LISBOA, PORTUGAL


Colocação de um equipamento de ar condicionado no topo de um hotel em Lisboa, no dia 1 de Maio de 2004 (dia do trabalhador!).

(André Felício)
 


A FRAGILIDADE DOS PARTIDOS NACIONAIS



Quando analisamos a capacidade política dos partidos portugueses, no seu duplo sentido de "produção" de discursos políticos e de eficácia eleitoral, verificamos que ela se mantém a nível do poder local, e é quase inexistente na dimensão das grandes cidades e a "nível nacional". Duas observações já à cabeça: uma é que o que se diz a seguir não se aplica ao PCP, que é um partido distinto dos outros, e ao BE, em que a componente de agit.prop se sobrepõe à organização, mas apenas ao PSD e PS; a outra é que estamos a falar de partidos na oposição, em que a vertente governativa não potencia a acção partidária. Esta última objecção não é de fundo, visto que o poder derivado do acesso à governação não revela maior capacidade dos partidos a "nível nacional", mas oculta apenas as suas fragilidades. Resumindo e concluindo, o PS e o PSD só existem hoje como partidos locais, a nível nacional a sua presença é ténue e cada vez se torna mais débil.

Mesmo nas grandes cidades como Lisboa e Porto, as estruturas distritais e federais só existem como estruturas locais, agarradas às juntas de freguesia e à vereação das câmaras, irrelevantes enquanto organizações políticas para a maioria dos habitantes urbanos, que não têm com as suas autarquias qualquer relação de proximidade. Uma distrital de Lisboa do PSD ou uma federação do PS do Porto, dois exemplos de organizações que já tiveram efectivo poder, não contam hoje em quase nada para a formulação de políticas partidárias e são irrelevantes enquanto máquinas eleitorais, a não ser em sentido negativo. As organizações partidárias têm conseguido sobreviver enquanto órgãos de poder e decisão apenas ao nível da política de proximidade, perdendo cada vez maior poder quando nos afastamos desse círculo mais estreito, para dimensões em que os principais instrumentos de intermediação de influência política são os media modernos.

Uma das consequências desta situação é a crescente transformação dos partidos em máquinas do poder local e regional, com aumento da influência dos autarcas em toda a vida partidária, em detrimento da influência de outro tipo de instâncias mais perto do "nível nacional": deputados e órgãos centrais do partido que detêm cada vez menor autonomia em relação ao partido local. O conglomerado poderoso de interesses que é hoje o poder local resulta mais eficaz do que o poder de qualquer direcção nacional. Manuel Alegre, na sua campanha, quando falava do "medo", referia-se ao efeito deste poder local, dador de emprego, e estritamente controlado, sem alternativas e sem "ar", mais do que às prepotências do PS nacional contra a sua candidatura. Hoje, a política de proximidade deu uma nova dimensão a formas modernas de caciquismo e clientelismo político mais sofisticadas do que as do passado, pois há mais dinheiro, logo mais mecanismos de controlo.

Neste contexto, as direcções e lideranças nacionais de um partido de oposição são muito mais frágeis do que no passado, porque gastam uma parte importante do seu tempo a competir desigualmente com instâncias mais capazes de fidelizar o aparelho partidário e a ter que competir para o exterior num meio essencialmente mediatizado, para que não dispõem de instrumentos eficazes. Com quem conta e o que faz um líder de um partido político na oposição? Voltamos aqui aos dilemas que defrontam Marques Mendes e Ribeiro e Castro.

A mediatização da política valorizou desmedidamente o papel individual da liderança, em detrimento de órgãos colectivos. O líder é suposto "passar" bem na televisão e espera-se tudo dessa prova. É, desde logo, uma grande responsabilidade que recai sobre uma pessoa, alimentada pela espectacularidade e pelo populismo tendencial da sociedade mediática. Hoje isto considera-se quase como uma evidência, mas reportando-nos a líderes como Sá Carneiro, Freitas do Amaral, Álvaro Cunhal e Ramalho Eanes, que conduziram grande parte da sua acção política em períodos menos dominados pela televisão, percebe-se que há toda uma série de elementos de liderança que pouco têm que ver com "passar a imagem". A ascensão de Santana Lopes representa o movimento a contrário, mais conforme com os tempos de dominação mediática. A sua queda não contraria a tese geral.

Acresce que os órgãos próprios do topo dos partidos - comissão política, secretariado - foram normalmente eleitos em função da correlação das forças partidárias, como emanação do aparelho "de baixo", a que se junta um pequeno grupo de próximos do líder, que lhe são pessoalmente leais, mas que não chegam a fornecer consistência aos órgãos de direcção. Estes são cada vez mais federações de grupos e menos uma equipa coesa. Para além disso, são cada menos úteis como órgãos de aconselhamento, visto que as fugas sistemáticas de informação os torna inadequados a decisões importantes. A tendência é para as lideranças dirigirem o partido na base da conjugação entre um grupo de pessoas leais, um grupo dentro de um grupo, e outro tipo de órgãos informais destinados a dar o suplemento de "prestígio" e capacidade a órgãos formais que não os têm. Daí a proliferação de task forces, interiores, com um poder que não é escrutinado pelos órgãos partidários, e de "órgãos de prestígio" que não têm um efectivo poder na condução da política partidária. São tudo soluções de recurso e não resolvem o problema de fundo: dar aos órgãos formais a capacidade política e o prestígio público que eles não têm e fazê-los funcionar com discrição e reserva nas decisões delicadas e com influência enquanto "vozes públicas".

Vamos admitir que um líder deseje efectivamente unir o prestígio e a influência pública de uma direcção partidária com a sua legitimação formal, e vamos admitir que consegue fazer a verdadeira revolução que é inverter o tipo de escolhas aparelhísticas que são dominantes nos partidos. Encontrará então outro tipo de obstáculos: a completa falta de competitividade que têm as carreiras políticas, em todos os planos, a começar no simbólico, com carreiras profissionais, e a resistência mais que justificada a fazer política em democracia nos dias de hoje. Não é fácil convencer alguém que pela sua qualificação profissional é um alto quadro num banco a ser porta-voz da política financeira de um partido de oposição. A administração do banco, mesmo que ele dela faça parte, lhe dirá que é inconveniente. Não é fácil convencer um grande advogado a ser porta-voz em questões de justiça ou a dirigir um grupo de estudo sobre corrupção, sem que os seus colegas lhe lembrem que isso prejudica o escritório. Por aí adiante. A omnipresença do Estado, o seu carácter ainda muito clientelar, a fragilidade da sociedade civil em oferecer espaços alternativos, a má fama da vida política e a degradação das condições do seu exercício aparecem como um contínuo em relação à má qualidade dos partidos. Pode-se sempre argumentar que é possível começar de novo, formar gente nova e sem vícios, mas não é uma solução exequível a curto prazo e oferece as mesmas dificuldades.

Estas dificuldades são reais e só podem ser superadas através de uma requalificação da política, que passa não só por profundas mudanças nos partidos políticos, como também na forma de a fazer. São precisos novos instrumentos e novas formas que permitam esta qualificação das direcções "de cima", que só podem ser levadas adiante e ganhar credibilidade quando se defronta a dupla resistência da mediocridade e dos interesses instalados, coisas que os partidos deixaram crescer até um nível crítico. Sem isso, nem por baixo, nem por cima, os partidos conseguirão manter a influência cívica na sociedade.

(No Público de 24/2/2006)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM ARROIOLOS, PORTUGAL


Bordando tapetes.

(João Antunes)
 


EARLY MORNING BLOGS 727

As A Beauty I’m Not A Great Star

As a beauty I’m not a great star,
There are others more handsome by far,
But my face, I don’t mind it,
Because I’m behind it,
’Tis the folks in the front that I jar.

(Anónimo)

*

Bom dia!

24.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO NO SUL DE PORTUGAL


Demolição.

(António Filipe Meira)
 


COISAS DA SÁBADO: ÂNGELO DE SOUSA

Ângelo de Sousa

A abertura de uma grande exposição de esculturas de Ângelo de Sousa no Centro de Arte Moderna da Gulbenkian merece toda a atenção porque Ângelo é um artista difícil de arrumar. Alguns dos seus quadros têm um forte poder decorativo e há mesmo uma pequena peça de escultura em metal que faz parte dos objectos que a Loja de Serralves comercializa. Por outro lado, muitos dos seus desenhos e esculturas e alguns dos seus quadros fazem parte daquelas peças de arte contemporânea que só existem em museus e ninguém quer ter em casa. São rabiscos, são coisas feias, não valem nada. Qual “arte pobre”, qual minimalismo qual nada? “Eu também sou capaz de fazer aquilo”, diz o bruto que há em nós. Não pode não.

Nesta exposição percebe-se o que está por detrás de quase tudo que é “produto” nesta oficina: um trabalho de atenção às formas, minimal-repetitivo, risco a risco, folha a folha, traço a traço, cor a cor, lata a lata, plástico a plástico, néon a néon, para perceber o que está, o que há. A obra de Ângelo é uma daquelas que melhor corresponde à procura ideal da forma, uma ilustração da frase de Da Vinci da pintura como “coisa mental”. Quantas formas há? Pergunta cada escultura. Só a minha? Um milhão? Quantos materiais me fazem? Só este latão, este aço, este plástico, este vidro? Um milhão de materiais, um milhão de formas? São infinitas? Não sei. Ângelo enche o mundo de formas, como aliás muita da arte contemporânea, mas não procura a Forma, procura o Mundo. Ele sabe que não chega lá, mas esforça-se.
 


RETRATOS DO TRABALHO NO PORTO, PORTUGAL


Calceteiro nos passeios do Porto.

(Eduardo Moura)
 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(24 de Fevereiro de 2006)


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A ler Formas de Censura em Portugal no Pós-25 de Abril no irreal TV.

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Faz 40 anos que ouvimos esta frase sincopada "1,2,3,4,5 Minutos de Jazz", uma das melhores frases de abertura e título de um programa de rádio em Portugal. Os "cinco minutos" de jazz começavam logo no primeiro segundo em que José Duarte dizia "um". 40 anos é obra num país pouco persistente, em que tudo se gasta num instante, e nos media não dura um pico-instante.
 


RETRATOS DO TRABALHO EM PORTO SEGURO, BRASIL


Vendedor ambulante em Arraial d’Ajuda (Porto Seguro) – Brasil, em Fevereiro deste ano.

(Rui Negrões)
 


RETRATOS DO TRABALHO NO ALENTEJO, PORTUGAL


Tiragem de Cortiça.

(João Sobral)

(...) essa fotografia é uma imagem da minha infância passada num monte da serra algarvia e ainda agora parece que estou a ouvir a minha avó comentar com alegria, o descortiçamento dos sobreiros da nossa "fazenda". Dizia ela que eram as nossas ovelhas...

(Mário Estevam)
 


EARLY MORNING BLOGS 726

THE SECOND COMING


Turning and turning in the widening gyre
The falcon cannot hear the falconer;
Things fall apart; the centre cannot hold;
Mere anarchy is loosed upon the world,
The blood-dimmed tide is loosed, and everywhere
The ceremony of innocence is drowned;
The best lack all convictions, while the worst
Are full of passionate intensity.

(...)

( William Butler Yeats)

*

Bom dia!
 


RETRATOS DO TRABALHO DOMÉSTICO


Lavar a louça.

(F.)

23.2.06
 


(Escrito em trânsito, depois será integrado no texto final)
DÉCIMA LEI DO ABRUPTO SOBRE OS DEBATES NA BLOGOSFERA


A blogosfera não se consegue ver ao espelho.

OUTRA FORMULAÇÃO: A blogosfera tem em comum com os vampiros não se conseguir ver ao espelho.

NOTA 1: Os blogues que representam a Excepção a esta regra seguem Alice e entram pelo espelho dentro. Esses blogues jogam xadrez com a atmosfera. Nem sempre ganham.


22.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO EM CINFÃES, PORTUGAL


Lavrando a terra com uma junta de bois.

(José Rui Fernandes)

21.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO EM PORTUGAL


Trabalhadores numa estação de caminho-de-ferro na linha Porto-Lisboa.

(Eduardo Moura)
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: POEIRA DAS ESTRELAS

2-micrometer comet particle

Partícula dum cometa trazida pela Stardust para a Terra.
 


DEZ LEIS DO ABRUPTO SOBRE OS DEBATES NA BLOGOSFERA
(Versão 1.1)

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NOTA INICIAL: As Leis aqui transcritas não são nem Mandamentos, nem Regras, nem Instruções Morais, nem Ordens de Serviço, são Constatações, descrevem o modo como os debates na blogosfera se desenrolam. São genéricas e universais. Como todas as Leis dão origem a Excepções, que são elas próprias outras Leis que regulam as Excepções. Todas as Leis da blogosfera, dada a natureza do meio, só podem ser formuladas de forma irónica, ou seja, absolutamente verdadeira.

PRIMEIRA LEI DO ABRUPTO : Evitar discutir a Posição, procurar atacar a Contradição.

NOTA 1 : Ao se passar da Posição à Contradição o debate ganha uma dimensão ad hominem. A maioria dos debates na blogosfera são ad hominem, na tradição da polémica à portuguesa.

NOTA 2: A Contradição é sempre apresentada como uma fraqueza moral.

NOTA3: Se houvesse só Posições na blogosfera esta tinha um tamanho diminuto. A exposição das Contradições é o grosso da actividade da blogosfera. Os Insultos são outra parte importante.

NOTA 4: O número de comentários num blogue têm relação directa com a natureza da nota se esta for sobre uma Contradição (ad hominem) e inversa se for uma Posição. Num mesmo blogue, as notas que não atacam ninguém não tem comentários e as que atacam alguém estão cheias.


SEGUNDA LEI DO ABRUPTO : A blogosfera é um lugar de fronteira, onde impera a "lei da selva" e o darwinismo social, logo a intensidade da zanga e da irritação na blogosfera é muito superior à da atmosfera.

NOTA 1: A blogosfera não é um local aprazível para os espíritos amáveis.

NOTA 2: A ferocidade dos comentários está em relação directa com o seu anonimato mais o número de comentários produzidos por metro quadrado de ecrã / dia.

NOTA 3: Os comentadores anónimos na blogosfera são na sua maioria Trolls, na sua minoria Curiosos-sérios. A maioria dentro da maioria são Trolls com nick name, profissionais das caixas de comentários.

NOTA 4: O genuíno comentador anónimo da blogosfera desejaria não ser anónimo, mas muito conhecido. No entanto, tem medo de pôr o nome e, se o assinasse com ele, não teria coragem de escrever o que habitualmente escreve. O nick name é a solução para ter nome não o tendo. O comentador com nick name, deseja ao mesmo tempo ser anónimo e ter uma identidade como comentador, reconhecida inter-pares nas caixas de comentários.

NOTA 5: O comentador anónimo com nick name escreve compulsivamente em todas as caixas de comentários abertas que encontra, escolhendo de preferência as dos blogues com mais leitores.

NOTA 6: Os comentadores anónimos seguem em absoluto a PRIMEIRA LEI DO ABRUPTO.

NOTA 7: Os Trolls nas suas várias incarnações são o proletariado da blogosfera e os principais garantes da QUINTA LEI DO ABRUPTO.

NOTA 7: Os comentadores Curiosos-sérios têm uma vida curtíssima na blogosfera. São os "inocentes-utéis". Se continuarem inocentes acabam por fugir a sete pés. Os que não fogem perdem a inocência e ou abrem blogues ou tornam-se Trolls por impregnação do meio .



TERCEIRA LEI DO ABRUPTO : A esmagadora maioria dos temas, comentários, reacções, alinhamentos, posições é absolutamente previsível.


NOTA 1: Na blogosfera não há surpresas.

NOTA 2: A falta de previsibilidade é punida na blogosfera como Contradição (ver PRIMEIRA LEI DO ABRUPTO), ou como "deslealdade orgânica".


QUARTA LEI DO ABRUPTO : A blogosfera tem horror ao vazio.


NOTA 1: Na blogosfera está sempre a maior parte de cada um, o seu ego, que costuma ocupar um grande espaço. Ainda cabe o Super Ego e o Id. Logo, não há espaço para mais nada.

NOTA 2: A blogosfera é compulsiva. A blogosfera é obsessiva. Pode-se ficar doente de uma longa exposição à blogosfera

NOTA 3: Os blogues colectivos morrem por implosão, os individuais por cansaço.

NOTA 4: A nota anterior é enganadora. Os blogues nunca morrem, são fechados e abertos logo a seguir com outro nome. Um lugar de um blogue é sempre preenchido por outro do mesmo autor, quando é individual, ou do mesmo tipo quando é colectivo.

NOTA 5: Quando um blogue deixou de ter sucesso na opinião do seu autor, é morto por ele e aberto outro logo a seguir. O objectivo da morte anunciada é dar oportunidade ao seu autor de ler as necrologias em vida e saber a falta que faz. As necrologias em vida funcionam como massagem do ego.


QUINTA LEI DO ABRUPTO : A blogosfera é a Aldeia dentro da Aldeia Global, todos são vizinhos, todos sabem tudo de todos, todos zelam activamente para que se cumpra a regra principal da Aldeia: o igualitarismo tem que ser absoluto.


NOTA 1: Se eu faço também tu tens que fazer. Se tenho comentários também tu tens que ter. Se faço muitas ligações, também tu tens que fazer. Se eu tenho contadores também tu tens que os ter.

NOTA 2: A patrulha da igualdade é uma das actividades mais generalizadas na blogosfera.

NOTA 3: Na blogosfera há luta de classes.


SEXTA LEI DO ABRUPTO : Na blogosfera o lixo atrai o lixo.


SÉTIMA LEI DO ABRUPTO : O tribalismo é a doença infantil da blogosfera.


NOTA 1: Os blogues são grupais, precisam imenso de companhia.

NOTA 2: A blogosfera tem evoluído do amiguismo para o grupismo e deste para o tribalismo. Permanecem, no entanto, leis de desenvolvimento desigual.

NOTA 3: Os blogues atacam em grupo.

NOTA 4: As afinidades são muito frágeis na blogosfera devido ao ambiente ácido que corrói os elos normalmente muito débeis entre blogues e dentro dos blogues colectivos entre os seus autores.


OITAVA LEI DO ABRUPTO : O que vale na blogosfera tem que valer na atmosfera.


NOTA 1: Não basta ser capaz de respirar - no ciclo completo da respiração (inalação e exalação) - ácido, é preciso ser capaz de respirar ar.


NONA LEI DO ABRUPTO : O carácter lúdico dos blogues diminui à medida que a importância da blogosfera aumenta na atmosfera.


NOTA 1: O carácter lúdico dos blogues é cada vez mais afectado pela imposição de etiquetas e por uma crescente normatividade na blogosfera.

NOTA 2: Os blogues colectivos são mais propensos à normatividade do que os individuais, pela necessidade de se auto-gerirem.

NOTA 3: O carácter lúdico dos blogues diminui à medida que as agendas mediáticas se tornam dominantes. Na formulação dessas agendas há hoje um contínuo blogosfera-atmosfera.

(Continua)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM NISA, PORTUGAL


Bordadeiras.

(João Antunes)
 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(21 de Fevereiro de 2006)


___________________________

Novas no caso do 24 Horas que não deve ficar esquecido ou "normalizado": um artigo de Medeiros Ferreira ("Até prova em contrário, não gostei nada da rusga num jornal. Agora, ou se sabe tudo sobre a fuga de informação em causa, e sobre a segurança das escutas telefónicas, ou ficará disto o travo forte de uma intimação intimidante."), uma nota de JPH no Glória Fácil e a notícia do pedido de nulidade da busca feito pelos advogados do jornal.

*

A injustiça genética da beleza, o proletariado da fealdade e a propensão para o crime no Washington Post.

*

No Overheard in New York:
"Its Existence Preceded Its Essence

Woman #1: So she told me, "I think Simon de Beauvoir was so brave for a man, to write like that." Can you believe it?
Woman #2: Oh my god.
Woman #1: How can she get a PhD without knowing who Simone de Beauvoir was?

--NYSC, Madison & 36th

Overheard by: J-Ho"
 


RETRATOS DO TRABALHO NO PORTO, PORTUGAL


Recolha do lixo no Porto.

(Eduardo Moura)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM LANZAROTE - ILHAS CANÁRIAS, ESPANHA


Biólogos portugues e espanhóis em Lanzarote, em trabalho de campo nas zonas intertidais.

(G. Carreira)
 


EARLY MORNING BLOGS 725

Prince des joies défendues



Prince, ô Prince des joies défendues entendez-vous pas ce qu'on chante autour de vous ? « Les quatre coursiers trottent, les rênes flottent : quitter le mal pour le bien serait un nouveau délice ! »

Prince, ô Prince, votre perte est dénoncée. Songez à l'Empire ! Songez à vous !

o

Le Prince dit : Assez. Mauvais augures ! Je suis à l'Empire ce que le Soleil est au Ciel. Et qui donc s'en irait le dépendre ? Quand il tombera, moi aussi.

Mon trône est plus lourd que les Cinq Monts gardiens : il est couché sur les cinq plaisirs et le sixième. Viennent les hordes : on les réjouira.

L’Empire des joies défendues n'a pas de déclin.

(Victor Segalen)

*

Bom dia!

20.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO EM ALGÉS, PORTUGAL


Amola-tesouras num sábado de manhã em Algés.

(António Maltezinho)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM SABROSA - VILA REAL, PORTUGAL


Abrindo uma vala.

(Leonel Morgado)
É mesmo um retrato do trabalho em Portugal... ninguém usa capacete, o risco de derrocada e soterramento do operário na vala está presente, a mão de obra barata exclui a necessidade de automatizar práticas de trabalho.

(Carlos Pereira da Cruz)
 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(20 de Fevereiro de 2006)


___________________________

Um artigo do Financial Times muito hostil aos blogues , mas que vale a pena ser lido:
"No Modern Library edition of the great polemicists of the blogosphere to yellow on the shelf; nothing but a virtual tomb for a billion posts - a choric song of the word-weary bloggers, forlorn mariners forever posting on the slumberless seas of news."
*

Admirável mundo novo. Cito do Blogouve-se estas declarações sobre a TV Mais:
"Se aparecem na televisão e são reconhecidos pelos leitores, então também nós vamos falar deles, das suas vidas", resume Carlos Maciel, considerando que estas serão, a partir de agora, duas condições essenciais para que as "estrelas" figurem nas páginas da revista. A informação televisiva propriamente dita fica relegada para segundo plano, abrindo antes as páginas aos rumores semanais sobre casamentos (des)feitos, operações de beleza, paixões e desavenças dos mais glamourosos do País e do mundo (...)»
*


Boa ideia (ou aplicação de uma ideia) do Atrium: uma semana numa imagem. E que semana!
 


RETRATOS DO TRABALHO NO DOURO, PORTUGAL


Novas vindimas no Douro.

(Mário Negreiros)
 


EARLY MORNING BLOGS 724

Human Abstract


Pity would be no more,
If we did not make somebody Poor;
And Mercy no more could be,
If all were as happy as we;

And mutual fear brings peace,
Till the selfish loves increase;
Then Cruelty knits a snare,
And spreads his baits with care.

He sits down with holy fears,
And waters the ground with tears;
Then Humility takes its root
Underneath his foot.

Soon spreads the dismal shade
Of Mystery over his head;
And the Caterpillar and Fly
Feed on the Mystery.

And it bears the fruit of Deceit,
Ruddy and sweet to eat;
And the Raven his nest has made
In its thickest shade.

The Gods of the earth and sea,
Sought through Nature to find this Tree,
But their search was all in vain;
There grows one in the Human Brain.


(William Blake)

*

Bom dia!

19.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO EM LISBOA, PORTUGAL


Apanhando isco num sábado de manhã no Parque das Nações.

(António Maltezinho)
 


DEZ LEIS DO ABRUPTO SOBRE OS DEBATES NA BLOGOSFERA

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Nova versão em breve.
 


QUANDO CADA NUVEM TEM ALGUMA COISA A DIZER



O vento é forte.
 


QUANDO CADA NUVEM TEM ALGUMA COISA A DIZER


Dá nisto: as laranjas caem todas das árvores. Os limões aguentam melhor. Deve ser da acidez.
 


QUANDO CADA NUVEM TEM ALGUMA COISA A DIZER



Dá nisto: aguaceiros muito rápidos, violentos e curtos.
 


RETRATOS DO TRABALHO NA ICONOGRAFIA SOVIÉTICA


Caixa de fósforos da URSS.
 


RETRATOS DO TRABALHO EM NOVA DELI, ÍNDIA



A máquina, instalada no meu campus universitário, tem um assistente a tempo inteiro, 24 horas por dia, 365 dias por ano, faça frio gélido ou calor tórrido em Nova Deli. São dois funcionários que se revezam, sendo que à noite estendem uma pequena colcha para dormirem em frente à máquina. Há diversas razões que explicam este factor humano.

Primeiro, há repetidas e contínuas avarias, especialmente devido ao clima, forçando a utilização manual (o empregado tem a chave de acesso no bolso). Segundo, é raro alguém ter consigo troco exacto para pagar em moedas os produtos expostos (devido à inflação dos preços).
Terceiro, embora numa zona universitária, muitos dos utentes não são suficientemente literados ou simplesmente não têm paciência para seguir as instruções. Finalmente, ao receberem o dinheiro em mãos, em vez de este ser colocado na ranhura, os empregados têm uma fonte de rendimento adicional, desviando uma percentagem para um copinho de papel que se encontra escondido dentro da máquina de café branca (ao meio), sem conhecimento da empresa gerente. Utilizei esta "vending-machine" por várias dezenas de vezes ao longo dos últimos meses, mas até hoje não me foi possível uma única vez efectuar uma transacção com sucesso sem interferência do empregado, pelas razões acima expostas, ou variantes similares.

(Constantino Hermanns Xavier)
 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(19 de Fevereiro de 2006)


___________________________

Não é novidade mas continua a ser bizarro que todos os canais televisivos transmitam em directo uma cerimónia religiosa, respeitável por certo, mas cuja ocupação do espaço televisivo é excessiva em relação ao seu interesse público. Interesse público que tem como notícia, mas injustificável em horas e horas de directo simultâneo.

*

Já agora duas perguntas por curiosidade, e que os leitores não terão dificuldade em responder:

- nas actuais condições atmosféricas de vento muito forte, os helicópteros estão a actuar em condições de segurança? (Admito que sim, mas gostaria de saber mais.)

- lembrando-me eu da Morgadinha dos Canaviais e dos conflitos provocados pela proibição de sepulturas nas igrejas, que legislação permite o caso da Irmã Lúcia?

*

Mais um amigo do 24 Horas - António Barreto no Público:
"O ataque ao jornal 24 Horas é um exemplo flagrante. Protegidos pela lei, pois claro, um juiz, vários procuradores, a PJ, a PSP e a GNR assaltaram a redacção do jornal, confiscaram computadores e discos informáticos e entregaram notificações a vários jornalistas entretanto acusados de crime e constituídos arguidos. Como não se trata de um jornal benquisto pelas elites, o caso passou relativamente à margem dos grandes escândalos. Mas é um caso muito sério e grave.
(...)
É confrangedor o silêncio do Presidente da República, do Parlamento e do Governo. Escudados pela "separação de poderes" e pela "independência da justiça", esses órgãos de soberania revelam um comportamento condenável: há assuntos que não dispensam opinião e a que os mais importantes dirigentes políticos não podem ficar indiferentes. Seria bom que percebessem que os direitos dos jornalistas são instrumentais, isto é, garantem os direitos dos cidadãos e a liberdade de expressão e informação. É por isso que o caso é grave."
Assino por baixo. Já estão a ficar muitos os que se preocupam com o que se está a passar com este "inquérito" da PGR.
Com o caso "24 Horas", criou-se um precedente perigosíssimo. O facto de se tratar de um tablóide - de que, de resto, não sou leitor - é irrelevante. De agora em diante, nenhum dos media poderá considerar-se a salvo de operação semelhante. Ora, o direito de informar (indissociável do direito à protecção das fontes) pertence ao coração da democracia. Subscrevo consigo, portanto, o texto de António Barreto.

(Torquato da Luz)
 


RETRATOS DO TRABALHO NO PORTO, PORTUGAL


Trabalhando nas obras municipais no Porto.

(Adolfo Fundo)
 


EARLY MORNING BLOGS 723

THE WEATHER IN VERSE.


The undersigned desires, in a modest sort of way,
To make the observation, which properly he may,
To wit: That writing verses on the several solar seasons
Is most uncertain business, and for these conclusive reasons :

In the middle of the Autumn the subscriber did compose
A sonnet on November, showing how the spirit grows
Unhappy and despondent at the season of the year
When the skies are dull and leaden, and the days are chill and drear.

Perhaps you may recall to mind that, when November came,
No leaden skies nor chilly days accompanied the same ;
But the weather was as balmy as in Florida you'd find,
And that sonnet on November was respectfully declined !

With laudable ambition to prepare a worthy rhyme,
The writer wrote a Christmas song three weeks ahead of time ;
And there was frequent reference to the shap and piercing air,
And likewise to the cold white snow that covered earth so fair.

I scarcely need remind you that the Christmas did not bring
The piercing air and cold white snow of which I chose to sing :
'T was all ethereal mildness while for icicles I yearned,
And of course my frigid verses were with cordial warmth returned.

This very Spring I set to work — 't was on an April day,
And warm as June — I set to work and wrote an ode on May ;
The inspiration may have come in part from what I owed,
But while I sang of gentle Spring I swear it up and snowed !

And once, when dew inspired me a pastoral to spin,
It happened, when the poem was done, a dreadful drought set in ;
There was no moisture in the earth, which dry and dryer grew,
And the piece on dew came back to me with six cents postage due !

And for these conclusive reasons it is obviously plain
That verses on the weather are precarious and vain ;
And the undersigned would only add, so far as he can see,
The trouble's not the metre, but the meteorology !


(Marc Cook)

*

Bom dia!

18.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO NA ERICEIRA, PORTUGAL


Trabalhos nas arribas da Ericeira.

(Helena Monteiro)
 


SOBRE OS RETRATOS DO TRABALHO

A série de fotografias sobre o trabalho que aqui se tem publicado, contraria a muito pequena representação que tem o trabalho nos blogues. O mundo do trabalho, a não ser em determinadas funções profissionais do jornalismo ou da academia, ou nalguns blogues de mulheres, com o trabalho feminino doméstico, praticamente não aparece na blogosfera. Isso tem a ver muito com a composição social da blogosfera, traduzida também no mundo simbólico dos autores de blogues. É como no cinema, parece que ninguém trabalha.

Essas fotografias (quase todas dos leitores do Abrupto) valem pela representação do trabalho, na sua normalidade e na sua trivialidade, no quotidiano da esmagadora maioria das pessoas. Elas revelam também o olhar dos seus autores, muito nítido nalgumas fotografias turísticas, que mostram o Outro trabalho do resto do Outro mundo, como sendo uma curiosidade exótica. É também uma maneira de ver. Muitas, porém (como a dos jardineiros de Odivelas) revelam esse ritmo quotidiano quase invisível de milhões de pessoas. Aqui faz-se por ver.
 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(18 de Fevereiro de 2006)


___________________________

Novos descobrimentos: mais Marte.



*

O fim do Moby Dick esteve para ser diferente e a baleia para ser morta. Como é que seria o nosso mundo se o capitão Ahab sobrevivesse?

*

Assouline na La République des Livres transcreve uma entrevista de Ballard em que este fala das previsões falhadas da ficção científica. Não concordo com este julgamento de Ballard sobre Orwell (porque o 1984 é tanto sobre o estalinismo como sobre os media, e aqui Orwell percebeu muita coisa antes de tempo sobre a nossa "sociedade mediática"), mas vale a pena fazer este balanço:
"J'ai été influencé par Wells,Huxley et Orwell.Les prédictions faites par Huxley dans "Le Meilleur des mondes" et "Les portes de la perception" se sont révélées beaucoup plus justes que celles d'Orwell, dont "1984" brossait avant tout un tableau du stalinisme. En bon socialiste, il craignait que ce dévoiement du socialisme ne contamine l'Europe occidentale. Mais Huxley a su prédire des sociétés fondées sur l'uniformisation, l'évasion dans la drogue, le clonage, ainsi que l'idée d'exploiter le potentiel cérébral par l'usage d'hallucinogènes -une intuition prophétique. Pourquoi la Grande-Bretagne a-t-elle produit ces trois auteurs ? Sans doute parce qu'elle résiste au changement, et que ces écrivains se sont révoltés contre tant d'immobilisme".
*

Entre as ofertas à "fábrica" dos últimos tempos, destaco uma colecção magnífica de caixas de fósforos soviéticas, um excelente exemplo da iconografia comunista. O seu desenho é muito parecido com o dos selos da mesma época. Aqui vai um exemplo de uma série sobre monumentos, estátuas, o célebre tanque, as "casas da cultura" e os hotéis da Inturist:



*

É impossível deixar de pensar que há um elemento retaliatório na busca no 24 de Horas (será que dizer isto é crime?). Se é um crime o que o jornal fez, não foi um crime enviar as informações indevidas para o processo? Se é um crime o que o jornal fez, não têm os jornais e as televisões cometido o mesmo crime dezenas e dezenas de vezes, pelo menos desde que começou o processo Casa Pia? Pode-se sempre dizer que alguma vez a "justiça" deveria "funcionar", só que é um pouco estranho que só o faça contra um jornal que denunciou o que, para não sugerir outra coisa, foi uma negligência grave do Ministério Público. Por isso diz bem Eduardo Pitta no Da Literatura:
"Hoje levantei-me cedo. Fui ler os jornais e os blogues do costume. É distracção minha, ou não estão convocadas manifestações de solidariedade em frente ao 24 Horas? No momento em que, pela primeira vez em trinta anos de democracia, um jornal português é alvo de rusga policial, onde páram os estrénuos defensores da liberdade de expressão? Acaso supõem que ela é indissociável de uma imprensa livre? Que é feito dos blogues de causas? E da indignação bem-pensante? Eu percebo. O 24 Horas não é dos «nossos». Nós somos todos muito finos para nos preocuparmos com jornalismo marron. Mas e o senhor Presidente da República? Desta vez não considera que estejam em causa direitos fundamentais?"

*

Novos tempos (do New York Times):
"For the first time, a major publisher is offering a book online at no cost to readers, supported by advertising. HarperCollins is selling the book, "Go It Alone! The Secret to Building a Successful Business on Your Own" by Bruce Judson, through Mr. Judson's site, brucejudson.com. "
 


COISAS SIMPLES


André Kertész, Nature morte II
 


EARLY MORNING BLOGS 722

The world is too much with us; late and soon,
Getting and spending, we lay waste our powers:
Little we see in nature that is ours;
We have given our hearts away, a sordid boon!
This Sea that bares her bosom to the moon;
The Winds that will be howling at all hours
And are up-gathered now like sleeping flowers;
For this, for every thing, we are out of tune;
It moves us not—Great God! I'd rather be
A Pagan suckled in a creed outworn;
So might I, standing on this pleasant lea,
Have glimpses that would make me less forlorn
Have sight of Proteus coming from the sea,
Or hear old Triton blow his wreathed horn.


(William Wordsworth)

*

Bom dia!

17.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO EM ODIVELAS, PORTUGAL


Jardineiros.

(Pedro Oliveira)
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: EQUILÍBRIO

Dione, Prometheus, and Epimetheus in Saturn's ring plane

Dione, Prometeu e Epimeteu alinhados pelos anéis de Saturno. Luxo, calma e voluptuosidade.
 


(Escrito em trânsito, em más condições, para ser integrado no texto final da versão 2.0)

DEZ LEIS DO ABRUPTO SOBRE OS DEBATES NA BLOGOSFERA
Versão 1.0

NOTA INICIAL: As Leis aqui transcritas não são nem Mandamentos, nem Regras, nem Instruções Morais, são Constatações, descrevem o modo como os debates na blogosfera se desenrolam. São genéricas e universais. Como todas as Leis dão origem a excepções, que são elas próprias outras Leis. Todas as Leis da blogosfera, dada a natureza do meio, só podem ser formuladas de forma irónica, ou seja, absolutamente verdadeira.


SÉTIMA LEI DO ABRUPTO SOBRE OS DEBATES NA BLOGOSFERA

O que vale na blogosfera tem que valer na atmosfera.

NOTA: Não basta ser capaz de respirar - no ciclo completo da respiração (inalação e exalação) - ácido, é preciso ser capaz de respirar ar.

OITAVA LEI DO ABRUPTO SOBRE OS DEBATES NA BLOGOSFERA

Na blogosfera o lixo atrai o lixo, não sendo a inversa verdadeira.

16.2.06
 


LENDO / VENDO /OUVINDO(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)

(16 de Fevereiro de 2006)

___________________________

Tudo isto vai escrito em péssimas condições por causa de "mais uma corrida, mais uma viagem". Mas os tempos estão complicados e exigem escrita.

*

A ler sobre a "ocidentalofobia" ocidental, o artigo de Luciano Amaral no Diário de Notícias.

*

Um exemplo de um boato (intencional e dirigido) oriundo de um blogue habitual em lançar boatos: a ida de José Manuel Fernandes para Belém. No mesmo blogue há múltiplos exemplos do mesmo tipo de plantação de boatos.

*

Quando escrevi para a Sábado (número que saiu hoje) levantando a dúvida sobre se o inquérito que foi pedido à Procuradoria , não se teria desviado do objectivo explícito para se centrar no 24 Horas, não fazia a mínima ideia das buscas que justificariam plenamente essas palavras. A busca na redacção do 24 Horas abre uma nova página nas relações entre a PGR e os jornais, que eram, até ao processo Casa Pia, de quase colaboração. A história do Independente de Portas na sua cruzada contra os políticos, abrindo caminho para uma República dos Juízes á italiana, só foi possível pela transformação dos magistrados em justiceiros, função que a politização dos magistrados do Ministério Público e a cobardia do poder político facilitou. Com o processo Casa Pia tudo mudou. Por razões nem sempre muito nobres, as sucessivas fugas de informação revelaram claros abusos do poder, negligências e ambiguidades, que comprometiam os métodos da investigação. Depois, a partir daí, cada cavadela, sua minhoca. O caso revelado pelo 24 de Horas, em que é incontornável existir pelo menos negligência no tratamento da informação reservada que nunca deveria estar no processo, tornou-se a gota de água para toda a gente. Na realidade, como já não havia mais margem de manobra para desculpar a actuação da PGR, esta respondeu usando todos os seus poderes e virando uma página na responsabilização dos jornalistas. Que essa responsabilização era de há muito tempo devida, é verdade. Mas mudar a complacência para com a comunicação social nos seus abusos (e que não encontravam no sistema judicial uma protecção capaz porque os tribunais raras vezes protegiam os direitos ofendidos), num processo em que um elemento de retaliação pode sempre ser suspeito, coloca de novo a questão de liberdade de informação... E lá voltamos ao mesmo.

*

A auto-censura está a crescer exponencialmente na nossa sociedade. Já não bastava a história das caricaturas, começa-se agora a policiar o que se escreve. Eu próprio me pergunto sobre se o que escrevi atrás me leva a cometer algum crime que justifique qualquer busca, tão fluída está a fronteira da criminalização da opinião. Mas de uma coisa tenho a certeza: se eu não posso livremente criticar a PGR e os seus agentes, sem correr o risco de cometer algum bizarro crime que, mesmo que não me leve à condenação, me leve a viver uns tempos miseráveis e humilhantes, não há genuína liberdade de expressão.


15.2.06
 


EARLY MORNING BLOGS 721

Te Deum


Not because of victories
I sing,
having none,
but for the common sunshine,
the breeze,
the largess of the spring.

Not for victory
but for the day's work done
as well as I was able;
not for a seat upon the dais
but at the common table.


(Charles Reznikoff)

*

Bom dia!
 


DEZ LEIS DO ABRUPTO SOBRE OS DEBATES NA BLOGOSFERA
Versão 1.0

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PRIMEIRA LEI DO ABRUPTO SOBRE OS DEBATES NA BLOGOSFERA

Evitar discutir a Posição, procurar atacar a Contradição.

NOTA 1 : Ao se passar da Posição à Contradição o debate ganha uma dimensão ad hominem. A maioria dos debates na blogosfera são ad hominem, na tradição da polémica à portuguesa.

NOTA 2: A Contradição é sempre uma fraqueza moral.


SEGUNDA LEI DO ABRUPTO SOBRE OS DEBATES NA BLOGOSFERA

A ferocidade dos comentários está em relação directa com o seu anonimato mais o número de comentários produzidos por metro quadrado de ecrã / dia.

NOTA 1: O genuíno comentador anónimo da blogosfera tem um nick name, deseja ao mesmo tempo ser anónimo e ter uma identidade como comentador, reconhecida nas caixas de comentários.

NOTA 2: O comentador anónimo com nick name escreve compulsivamente em todas as caixas de comentários abertas que encontra, escolhendo de preferência as dos blogues com mais leitores.

NOTA 3: Os comentadores anónimos seguem em absoluto a PRIMEIRA LEI DO ABRUPTO.


TERCEIRA LEI DO ABRUPTO SOBRE OS DEBATES NA BLOGOSFERA

A esmagadora maioria dos temas, comentários, reacções, alinhamentos, posições é absolutamente previsível.

NOTA 1: A falta de previsibilidade é punida na blogosfera como Contradição (ver PRIMEIRA LEI DO ABRUPTO), ou como "deslealdade orgânica".

QUARTA LEI DO ABRUPTO SOBRE OS DEBATES NA BLOGOSFERA

A blogosfera tem horror ao vazio.

NOTA 1: Um lugar de um blogue é sempre preenchido por outro do mesmo tipo.

NOTA 2: Os blogues nunca morrem, são fechados e abertos logo a seguir com outro nome. A blogosfera é compulsiva.

NOTA 3: Os blogues colectivos morrem por implosão, os individuais por cansaço.

NOTA 4: A blogosfera é um lugar de fronteira, o Wild West, onde impera a "lei da selva" e o darwinismo social. Não é um local aprazível para os espíritos amáveis.

NOTA 5: A intensidade da zanga e da irritação na blogosfera é muito superior à da sociedade em geral (daí a SEGUNDA LEI DO ABRUPTO).

QUINTA LEI DO ABRUPTO SOBRE OS DEBATES NA BLOGOSFERA

O carácter lúdico dos blogues diminui à medida que a importância da blogosfera aumenta na atmosfera.

NOTA 1: O carácter lúdico dos blogues é cada vez mais afectado pela imposição de etiquetas e por uma crescente normatividade na blogosfera.

NOTA 2: Os blogues colectivos são mais propensos à normatividade do que os individuais, pela necessidade de se auto-gerirem.

NOTA 3: O carácter lúdico dos blogues diminui à medida que as agendas mediáticas se tornam dominantes. Na formulação dessas agendas há hoje um contínuo blogosfera-atmosfera.

SEXTA LEI DO ABRUPTO SOBRE OS DEBATES NA BLOGOSFERA

O tribalismo é a doença infantil da blogosfera.

NOTA 1: Os blogues são grupais, precisam imenso de companhia.

NOTA 2: A blogosfera tem evoluído do amiguismo para o grupismo e deste para o tribalismo. Permanecem, no entanto, leis de desenvolvimento desigual.


(Continua)
 


RETRATOS DO TRABALHO NA NAZARÉ, PORTUGAL



Vendedora de rua na Nazaré

(Carlos M. R. Franquinho)

14.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO EM BUENOS AIRES, ARGENTINA



Paseaperros em Buenos Aires

"Buenos Aires supports a legion of paseaperros, or professional dog walkers, who can some-times be seen with up to 30 canines on leash. They'll stroll through areas like Recoleta, Palermo's parks and even downtown with a variety of dogs ranging from scruffy mongrels to expensive purebreds, each of their tails happily a-waggin'.
Paseaperros are employed by busy or sedentary apartment dwellers who either can't or won't take the time to exercise their animais properly-and are willing to pay up to US$100 per month for this unique walking service. Since most paseaperros don't pay taxes, they can really 'clean up' in the city - figuratively speaking.
Every day, hundreds of thousands of canines deposit tons (literally) of dog shit and urine in the sidewalks, streets and parks of the capital. For this reason, city authorities may begin to regulate the profession by limiting dog walkers to 10 animals at a time, for example, and obliging them to carry a broom and bag to clean up after their charges. Some of these re-quirements are already law, but enforcement is nil."
(Lonely Planet)

(Alberto Costa)
 


RETRATOS DO TRABALHO NA ÍNDIA



Operários da indústria de calçado, India, Chennai, 2006.

(João Costa)
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: TROVOADA EM SATURNO

Screenshot from 'Lightning Sounds from Saturn' movie

 


RETRATOS DO TRABALHO EM PORTUGAL



Pesca da sardinha.
 


RETRATOS DO TRABALHO EM LISBOA, PORTUGAL


Trabalhando na redacção de um jornal.

(José Manuel Fernandes)
 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(14 de Fevereiro de 2006)


___________________________


Assino por baixo desta nota de Eduardo Pitta no Da Literatura:
"Faz hoje um mês o senhor Presidente da República falou ao país. Em síntese, disse que estavam em jogo «direitos fundamentais dos cidadãos», razão que o obrigara a exigir do procurador-geral da República um esclarecimento cabal, a prestar em «prazo curtíssimo». Estribado no prazo, o PGR adiou por três dias a ida à comissão parlamentar que o convocara. Afinal, o prazo do presidente tinha precedência. Passou um mês. Ninguém se lembra das listas da PT. Ninguém se preocupa com o prazo. Há quem argumente que o esclarecimento não era para nós, era para o dr. Sampaio. Ou que tudo não passou de um equívoco. Em qualquer dos casos, quem deve exigir um esclarecimento são os cidadãos cujos «direitos fundamentais» foram ofendidos, sem que se perceba porquê, e por quem."
*

O Adufe soma duas personagens bem apanhadas a esta questão das caricaturas: o Senhor Bom e o Senhor Senso, os "seus censores predilectos". Um deles ou os dois, escreve hoje no Diário de Notícias:
"Freitas do Amaral, na sua fala, limitou-se a ser sensato, defensor dos interesses nacionais e dos da Europa e nada do que disse colocou em questão os princípios fundamentais do nosso sistema de valores."
*

O nosso bom embaixador do Irão (o deles e não nosso, porque como as coisas estão é preciso fazer estas precisões) deu uma entrevista (conforme informação de José Carlos Santos) que passará
"entre as 16h00 e as 17h00 pela Antena 1 (...) onde ele afirma que é preciso rever a história do Holocausto e que, tendo visitado Auschwitz e Birkenau quando foi embaixador na Polónia, chegou à conclusão que teriam sido necessários 15 anos para incinerar seis milhões de seres humanos. Nessa entrevista, ele também afirma que a melhor reacção diplomática dentro da União Europeia ao caso dos cartoons foi a de Freitas do Amaral."
Eis uma importante vitória diplomática portuguesa, mérito do nosso MNE.

*

Afinal as declarações de Freitas do Amaral eram muito piores do que pensava. Aqui está um fragmento:
"O maior agressor temos sido nós. Para já não falar das Cruzadas, que vão longe mas que estão presentes como alguma coisa que se passou anteontem, para já não falar na colonização de África e de vários povos islâmicos e asiáticos, para já não falar da política de canhoneira seguida pela Inglaterra em relação a esses países, veja o que foi a estratégia seguida pela maior potência mundial no mundo árabe neste momento."
Esqueceu-se da fundação e da existência do estado de Israel, mas também foi (e é) uma "agressão" não foi, não é? Bin Laden de facto venceu. Venceu na política externa portuguesa.

*
vertical.tomb.ap.jpg


Grandes novidades arqueológicas: o primeiro túmulo egípcio intacto no Vale dos Reis a ser descoberto desde o de Tutankhamon, "King Tut" para os amigos; e um outro, na Grécia, do período logo a seguir ao reino de Alexandre, apenas com pequenos estragos e que parece ser o maior túmulo subterrâneo desde sempre descoberto naquele país.
 


EARLY MORNING BLOGS 720

Rien de trop

Je ne vois point de créature
Se comporter modérément.
Il est certain tempérament
Que le maître de la nature
Veut que l'on garde en tout. Le fait-on ? Nullement.
Soit en bien, soit en mal, cela n'arrive guère.
Le blé, riche présent de la blonde Cérès
Trop touffu bien souvent épuise les guérets ;
En superfluités s'épandant d'ordinaire,
Et poussant trop abondamment,
Il ôte à son fruit l'aliment.
L'arbre n'en fait pas moins ; tant le luxe sait plaire !
Pour corriger le blé, Dieu permit aux moutons
De retrancher l'excès des prodigues moissons.
Tout au travers ils se jetèrent,
Gâtèrent tout, et tout broutèrent,
Tant que le Ciel permit aux Loups
D'en croquer quelques-uns : ils les croquèrent tous ;
S'ils ne le firent pas, du moins ils y tâchèrent.
Puis le Ciel permit aux humains
De punir ces derniers : les humains abusèrent
A leur tour des ordres divins.
De tous les animaux l'homme a le plus de pente
A se porter dedans l'excès.
Il faudrait faire le procès
Aux petits comme aux grands. Il n'est âme vivante
Qui ne pèche en ceci. Rien de trop est un point
Dont on parle sans cesse, et qu'on n'observe point.

(La Fontaine)

*

Bom dia!

13.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO EM ROMA, ITÁLIA


Actores ensaiando uma peça no passeio lateral do Tevere (Tibre) Roma

(Tony Ventoinha)
 


RETRATOS DO TRABALHO NA TERCEIRA - AÇORES, PORTUGAL


Ordenha.

(Augusto Oliveira)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: UM TESTEMUNHO ARGELINO


O que se está a passar na Argélia tem um significado muito particular neste contexto da "Guerra das Caricaturas". Embora a Argélia não seja um país tão aberto e colorido para o nosso imaginário europeu, sobretudo porque não tem turismo, nem está vocacionado para tal, era no entanto um país onde se gozava de uma liberdade de expressão pouco comum nos países do Norte de África. Essa liberdade de expressão era visível quer nos jornais em língua Árabe quer nos jornais em língua Francesa que, sem receios criticavam Presidente, Governos, Ministros, políticas e legislação. O célebre Código de Família, em vigor no país, era regularmente alvo de duras críticas. Com as recentes informações que nos chegam sobre a detenção e destituição de jornalistas que usaram a sua liberdade de informar e esclarecer, temos que perguntar se algo também está a mudar naquele país.

(J.)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: GUERRA DE CIVILIZAÇÕES

Em 2001, um engenheiro de uma empresa portuguesa muito conhecida, de visita a um país onde os fundamentalistas islâmicos estavam em maioria, levou como prendas (para oferecer, em público, ao representante do seu Cliente) duas belíssimas garrafas de Vinho do Porto.

Atento aos problemas civilizacionais, ele fez questão de explicar que o «Vinho do Porto não é vinho» e que, por sinal, «o vinho tinto, se não for em excesso, até faz bem ao colesterol».

Quando Dezembro chegou, os seus superiores puderam minimizar os danos de imagem enviando, aos eventualmente ofendidos, cartões de Feliz Natal com um bonito presépio.

(C. M. Ribeiro)
 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(13 de Fevereiro de 2006)


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Já que o 11 de Setembro parece tão esquecido que já nem conta para as "agressões" de que fala o nosso MNE, vale a pena voltar aos 102 minutos trágicos que catorze mil pessoas viveram no World Trade Center, e que resultaram em 2749 mortos. Este livro, escrito por jornalistas do New York Times, baseia-se em entrevistas e transcrições telefónicas sobre o que aconteceu dentro das torres no meio do terror e da confusão, da valentia de alguns e da impreparação das autoridades para um evento daqueles em prédios com 400 metros de altura.

Li-o com um calafrio muito especial porque, um ano antes, em 11 de Setembro de 2000, vivi vários dias praticamente dentro do WTC, alojado no Marriot Hotel, tomando o pequeno almoço no Windows of the World, para uma reunião matinal, exactamente o mesmo que matou um número considerável de pessoas que lá estavam um ano depois, e jantando no mesmo restaurante com Nova Iorque ao fundo. Uma amiga minha trabalhava na loja do andar panorâmico - a mobilidade profissional americana salvou-a - e muitas vezes tinha ido à livraria Borders, uma excelente livraria, onde havia um café no segundo piso e se podia estar horas a trabalhar. Esta é uma geografia muito especial, fresca na minha memória em 2001, que me permitiu "ver" demasiado bem o que se passou.

Fotografia das destruições da Borders Books and Music.

*

A ler, via Bloguitica , o texto e um início de debate sobre a "guerra de civilizações", a partir do artigo de Huntington de 1993. Como se percebe que muita gente fala do assunto sem ter lido o artigo e muito menos o livro (de 1996), como aliás acontece com o "fim da história" de Fukuyama, o que se discute é o título, vale a pena lá ir e repesar os argumentos. As datas são muito importantes: Huntington escreveu o artigo original oito anos antes do 11 de Setembro, e onze antes do 11 de Março, mesmo antes dos momentos mais críticos da guerra na ex-Jugoslávia, já para não falar de todos os conflitos no Afeganistão, Iraque, etc. E, pode-se discutir a generalização, mas a tese central do argumento de Huntington merece muita atenção:

"It is my hypothesis that the fundamental source of conflict in this new world will not be primarily ideological or primarily economic. The great divisions among humankind and the dominating source of conflict will be cultural. Nation states will remain the most powerful actors in world affairs, but the principal conflicts of global politics will occur between nations and groups of different civilizations. The clash of civilizations will dominate global politics. The fault lines between civilizations will be the battle lines of the future."

*

Liberdades e terror, outra questão de que falaremos cada vez mais. Um típico liberal americano Nat Hentoff escreve sobre The War on Privacy no Village Voice. A citação que encabeça o artigo, do 1984 de Orwell, é cada vez mais certeira, para os EUA e para Portugal:

"There was, of course, no way of knowing whether you were being watched at any given moment. How often, or on what system the Thought Police plugged in on any individual wire was guesswork. . . . But at any rate they would plug in your wire whenever they wanted to. You had to live—did live, from habit that became instinct—in the assumption that every sound you made was overheard, and except in darkness, every movement scrutinized. "

*

A discussão sobre se o avião voa ou não voa, no último LENDO / VENDO começa a animar.
 


RETRATOS DO TRABALHO NA BIRMÂNIA



(Raúl César de Sá)
 


EARLY MORNING BLOGS 719

Sê tu a palavra


1.
Sê tu a palavra,
branca rosa brava.

2.
Só o desejo é matinal.

3.
Poupar o coração
é permitir à morte
coroar-se de alegria.

4.
Morre
de ter ousado
na água amar o fogo.

5.
Beber-te a sede e partir
- eu sou de tão longe.

6.
Da chama à espada
o caminho é solitário.

7.
Que me quereis,
se me não dais
o que é tão meu?


(Eugénio de Andrade)

*

Bom dia!

12.2.06
 


CÉU DO PORTO HOJE


(Jorge Aguiar)
 


ISTO ESTÁ BONITO



Será que ouvi mesmo bem? Será que ouvi Freitas do Amaral dizer, quando das cerimónias de Évora hoje de manhã com Aga Khan (esse sim, um genuíno moderado do Islão), que a culpa de tudo o que está a acontecer se deve às nossas "provocações" ocidentais? Não vi o texto em lado nenhum, nem na LUSA, nem nos jornais digitais, mas ouvi-o na RTP. Já começa a ser demais.

NOTA: Ouvi mesmo bem. Freitas do Amaral, o nosso Ministro dos Negócios estrangeiros afirma ipsis verbis: "Quem têm sido os maiores agressores dos últimos tempos somos nós". Depois sugeriu um campeonato de futebol entre muçulmanos e "ocidentais"...

A RTP repetiu as declarações (no telejornal da noite) truncando uma parte (que passara no telejornal das 13 horas) em que Freitas do Amaral enfatiza a responsabilidade da agressão, embora depois diga que algumas respostas a essas "agressões" são excessivas. É pena não haver uma transcrição das suas palavras, que , pelos vistos, não foram consideradas relevantes. Ou, talvez por ser domingo, faltam jornalistas na LUSA.

NOTA 2: Não escapa a ninguém que, no dia de hoje, o Presidente da República e o Governo (pela voz do MNE) disseram coisas radicalmente diferentes sobre a questão das caricaturas.
 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(12 de Fevereiro de 2006)


___________________________

Ouvindo The Legend of Sleeping Hollow de Washington Irving.

*

The Hitler Book. The Secret Dossier Prepared for Stalin, Londres, John Murray, 2005. O dossier que foi preparado pelo KGB sobre os últimos dias de Hitler poderia parecer pouco interessante e podia pensar-se que nada acrescentava aos rios de tinta escritos sobre esses dias do fim. Bem pelo contrário, o livro, escrito essencialmente a partir de testemunhos dos "de baixo", os criados, as ordenanças, os guarda-costas, as secretárias, aprisionados e interrogados pelos agentes da espionagem soviética, lê-se sem parar.

*

Novos descobrimentos: Titã em infra-vermelho.

*

Alimento para a cabeça:

"A plane is standing on a runway that can move (some sort of band conveyer). The plane moves in one direction, while the conveyer moves in the opposite direction. This conveyer has a control system that tracks the plane speed and tunes the speed of the conveyer to be exactly the same (but in the opposite direction). Can the plane take off?"


Discussão no The Straight Dope e no kottke.org.
Em relação ao problema que citou no seu blog, o avião descola, mesmo que a velocidade do tapete seja superior á do avião. O que conta é a velocidade do avião em relação ao ar, só o vento influencia esta velocidade, não o terreno. Um hidroavião descola mesmo com uma corrente contra, muito forte. No problema em questão o avião descolaria, parado no mesmo sítio, logo que a velocidade atingida fosse a de descolagem.

(José Gameiro)

*

Depende do aparelho e do vento.
No caso de um avião comum penso que não descola pois o avião está estacionário relativamente ao solo.
São as asas e o efeito sobre estas da deslocação do ar que sustentam o vôo.
No caso do tapete rolante a deslocação do ar nas asas não será suficiente para permitir a sustentação.
Há acção (motores) mas não há reacção (deslocação), que se traduz pelo movimento do aparelho que neste caso não existe. O facto de as rodas rodarem ao dobro da velocidade em nada altera a condição pois tudo seria igual se o avião estiver travado com os motores a trabalhar - não levanta; a menos que seja tipo foguete ou com descolagem vertical.

(J. Mineiro)

*

A discussão sobre se o avião voa ou não voa é uma discussão tipicamente masculina. Não pena natureza eventualmente científica do tema, mas pelo tipo de problema, raciocínio ou modelo de argumentação que envolve. (Deve ser por envolver motores, ou coisa parecida…) Eu, que vejo aviões a aterrar o dia todo, pergunto-me de onde vêm, quem trazem e vejo-os como parte da (minha) paisagem.

E, quando excepcionalmente, os vejo a partir, imagino que seja o vento que não está de feição, ou o destino que lhes impõe uma rota diferente. O efeito da passadeira, a mim parece-me pura má vontade ou partida do destino.

(RM)

*

Para um observador colocado fora da pista (referencial ar) que esteja a observar o fenómeno, imaginemos de lado, o movimento oposto entre o avião e a pista à mesma velocidade, com sentidos opostos, cria a situação relativa de ter o avião parado. Esta situação não é apenas uma sensação ou ilusão de o avião parecer parado, na verdade ele está mesmo parado para o referencial ar. Como tal, não se gera o fluxo de ar necessário para impulsionar o avião e obter assim a descolagem.

Se a velocidade da pista fosse superior no sentido contrário, como refere um leitor, nesse caso o avião começaria a andar em sentido contrário relativamente ao referencial ar, onde está colocado o nosso observador. Poderia até descolar, mas ao contrário, caso a aerodinâmica do avião o permitisse, o que obviamente não é o caso.

(Pedro Lima)

*

A aparente complexidade do problema do avião reside unicamente num subtil paradoxo do enunciado, que postula que, mesmo com força a impeli-lo para frente (motor ou turbinas), o avião permanecerá estacionário porque o tapete rolante se desloca a uma velocidade igual em sentido contrário.

Ora o erro está em fazer a analogia com um automóvel, em que a deslocação deriva das próprias rodas.

Num avião é indiferente a velocidade do chão em sentido contrário.

O motor puxa para a frente e o avião nunca chega a estar estacionário pois por mais "rápido" que o tapete ande num sentido oposto, a força das hélices ou turbinas aplica-se ao "ar" e é isso que o impele.

Este é o erro do enunciado, postula uma situação que é impossível de acontecer e que, como tal, induz uma discussão sem fim.

A resposta a um enunciado correcto é,obviamente, que o avião levanta voo.

Já agora, recomendo o problema de Monty-Hall, capaz de levar pacatos matemáticos e cientistas ao confronto físico para resolver a questão. Este problema tem sido utilizado para testar como as pessoas reagem quando são confrontadas com uma verdade incontornável, matemática, provada, mas que foge a tudo o que julgavam possível.

Veja lá não se inicie outro conflito sangrento por causa de uma questão teórica.

(Davide E. Figueiredo)
*

Novos quotidianos:
Domingo, Fevereiro 12, 2006 - O que eu já fiz desde as 8:40 .

.Fiz o pequeno-almoço de flocos de aveia e ovos estrelados
.Lavei louça, arrumei cozinha
.Arrumei quartos e fiz camas de lavado
.Fiz uma máquina de roupa e estendi-a
.Fiz outra máquina de roupa
.Ajudei Tiago com problemas de ângulos
.Ajudei Lucas com Lingua Portuguesa
.Dei uma volta pela Blogoesfera
.Procurei uns vocábulos difíceis na Internet para o trabalho
.Estou a dar banho ao Lucas
.Escrevi este post.
 


RETRATOS DO TRABALHO NA CHINA


Vendedor ambulante na China.

(Joana Lopes)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
TURISMO EM TERRAS DO ISLÃO



Matali, o guia touareg

Chegou a conduzir o Landcruiser da frente à porta do hotel de Tam (É assim que os locais chamam a Tamanrasset). Era alto, esguio e elegante nos movimentos. Cumprimentou-nos com poucas palavras, e dez minutos depois deixávamos a cidade. Disse não falar francês e ainda menos inglês, mas algumas horas depois tínhamos percebido que tudo o que dizíamos era objecto da sua atenção e que ele não só percebia tudo como ouvia tudo. Aliás, quer o seu sentido da visão, porque habituado a olhar sempre longe, quer o da audição, porque habituado ao silêncio, eram apuradíssimos. Via o que nenhum de nós via e ouvia o que nenhum de nós ouvia. Nunca tivemos longas conversas pois era parco no uso das palavras, como em tudo da sua vida. Estudou e formou-se como enfermeiro, casou e teve cinco filhos, mas percebeu que nunca conseguiria viver numa casa, numa rua, numa cidade. O deserto era a sua casa e para ele voltou, deixando a enfermagem, como guia, como príncipe. Uma felicidade contida habitava o seu rosto e o olhar tranquilo sobre as nossas dúvidas urbanas, que de repente surgem em pleno deserto, centrava-nos rapidamente no momento. Ficava sempre lisonjeado com o nosso espanto perante a imensidão e beleza difíceis de apreender, com as vezes que lhe pedíamos para parar e tirar fotografias, com os cumprimentos que tecíamos ao cozinheiro e às maravilhas que cozinhava saídas dos pequenos contentores do segundo landcruiser. (A água para o chá era sempre fervida num fogo de lenha, nunca no bico de gás).



”Les Catédrales”, Sahara, Sul da Argélia

Ao longo dos dias mostrou-nos paisagens que nunca sonhamos, rochas que nem imaginávamos, apontou-nos a liberdade e nas poucas palavras que dizia disse só gostar de dormir ao relento e que, mesmo quando estava em “casa” com a família, dormia cá fora, disse que se têm o hábito de tapar a boca é porque é dela que tanto mal sai, disse já ter conhecido pessoas tão diferentes vindas de países tão diversos e com vontades tão díspares. Ao fim do dia e de manhã cedo víamo-lo a rezar, um pouco afastado, sempre discreto e elegante nos movimentos. No penúltimo dia fizemos oitenta kilómetros em quatro horas para chegarmos lá cima: ao tecto do Sahara como ele lhe chamava.


Assekrem, 3000 m de altitude, Hoggar. Sul da Argélia

Há lá uma pequena comunidade de padres de Charles de Foucauld que eram conhecidos, amigos é mais correcto, de Matali que, na sua imensa sabedoria, se apressou a comunicar-nos que eles iriam celebrar missa dali a pouco tempo e que poderíamos assistir: os padres sorriram-nos timidamente, com certeza mais conscientes do nosso laicismo e das nossas poucas práticas religiosas, do que Matali, mas também eles sabiam que os bons convites nunca se recusam, e numa pequeníssima, simples e acolhedora capela ouvimos missa no tecto do Sahara.

No último dia pouco falávamos, e mal o carro pisou estrada deixando para trás as pistas do deserto, sentimo-nos envoltos numa nuvem cinzenta que nos apertava.

Um ano depois tinha na minha caixa de correio uma carta e um pacote vindos de Tamanrasset: Matali tinha feito um cadeado metálico, tal como tinha visto nos mercados de Tam e quis enviar-mo.

(J.)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
CONCORDÂNCIAS, DISCORDÃNCIAS E OUTRAS DÂNCIAS
(3ª série)



NOTA: Nos últimos dois dias mais de trezentas mensagens foram recebidas sobre este tema, sendo aqui publicada apenas uma pequena parte, com base nos critérios habituais. A não ser em casos excepcionais, esta série de correspondência terminará por agora, não por o assunto estar esgotado, nem pelo efeito do fácil "cansaço" mediático, que nos faz correr de uns temas para os outros de forma muito superficial. Há bem pouco de superficial no que estamos a discutir e será inevitável voltar ao assunto.

Os textos dos leitores estão publicados em ordem inversa à sua recepção e alguns textos enviados de fora de Portugal não têm pontuação.
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Não tenho o dom da palavra como o senhor, se o tivesse escrevia na língua de Camões (que desde pequeno tentei aprender), com engenho e arte, e tentava lhe mostrar que algo do que pensa não está totalmente correcto. Todavia, cá fica o discordar quando diz que estamos em guerra e estamos a perder. Ninguém está a ganhar e ninguém está a perder, excepto os radicais de ambos os lados. Sou muçulmano e inicialmente não dei nenhuma importância às caricaturas de alguém com turbante. Fechei os olhos, porque não queria, nem quero, ter essa imagem do Profeta Muhammad (abençoado seja o seu nome) na minha mente. Mas com todo o banzé que se faz à volta disso, não sei com que intenções, vejo-me forçado a manifestar com a liberdade de - será de resposta ou de imprensa? - a minha discordância quando pensa que a liberdade é total. Verá com o tempo que isso não corresponde à realidade e que existem limites. Não acredito que diga sempre o que pensa...acho eu. Não lhe quero roubar mais tempo, escrevo estas linhas para me afirmar como um cidadão pacífico e integrado na sociedade portuguesa ,mas que nem por isso deixarei de respeitar todos os Profetas. A terminar, devo notar-lhe que acho repugnante ter visto a caricatura do Papa com o perservativo colocado no nariz. Simplesmente sem palavras para mim num País maioritáriamente católico!

(Aboobakar Choonara)

*

Antes de mais nada, sou um cidadão português, não sou religioso, tenho muito orgulho naquilo que a nossa civilização europeia deu ao mundo a nível de valores e progresso e já vivi na Dinamarca. Por esses motivos, penso que pode haver algum interesse naquilo que eu diga acerca deste assunto que nos tem melindrado.

Em primeiro lugar, penso que a Escandinávia tem muitas lições a dar ao mundo, a todos os níveis, incluindo nas questões que dizem respeito à liberdade de imprensa.

Em segundo lugar, há que reconhecer que a Dinamarca é um país com muitas virtudes, mas com alguns defeitos, dos quais o racismo sobressai. É um país cujo governo é indirectamente apoiado pela D. Pia Kjersgaard, que mais não é do que uma versão dinamarquesa do Sr. Le Pen. É também um país onde as restrições à imigração chegam ao ponto de negar o direito de residência por motivos de reagrupamento familiar, mesmo no caso de estrangeiros casados com cidadãos daquele país. Sou amigo pessoal de uma cidadã dinamarquesa afectada por esta política.

Em terceiro lugar, o jornal que publicou os cartoons, o Jyllands-Posten, que é um dos três mais lidos no país, é identificado com os partidos que levaram a cabo este tipo de política. E uma das maiores comunidades estrangeiras na Dinamarca, sendo por esse motivo, uma das afectadas, é a muçulmana.

Em quarto lugar, apesar do contexto nacional em que este tipo de atitude ocorreu, o jornal representa-se a si próprio e não o país, sendo por isso injusto que a Dinamarca seja por isso condenada por esta situação.

Relativamente ao seu artigo, repudio veementemente a assumpção da guerra de civilizações e as consequências que o senhor não clarifica quais devem ser, mas que no seguimento do conteúdo desse seu texto, assumem um carácter de confrontação e ameaça.

Não penso que o que ocorreu em diversos países muçulmanos justifique esse tipo de declaração de guerra. Foi uma reacção de indignação contra uma atitude que se deveria ter sabido que era bastante provocatória e insensível relativamente a outra cultura. Evidentemente que a resposta à ofensa é excessiva. Mas se os protestos de rua, os cartazes com linguagem violenta, o queimar de bandeiras e algum vandalismo a que o próprio Ocidente já tem assistido por diversas vezes em manifestações contra a globalização é um motivo para essa guerra, então lamento dizer-lhe que nela estarei moralmente do lado do seu inimigo, uma vez que não é meu inimigo. Não pense, no entanto, que isso significa renunciar à civilização na qual nasci e cresci. Renuncio a um presumível escalar de violência que consideraria absolutamente inadmissível, com justificações tão pouco racionais como o assassinato que em 1914 levou à morte mais de 10 milhões de europeus.

(Nuno Pestana)

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Atravez do blog "an unsealed room" da Allison Kaplan Sommer no seu blog de 9 de fevereiro "nice Jewish girl" pude visionar o delicioso filme de 18 minutos, "The tribe" sobre o que e ser judeu nos Estados Unidos. Com um sentido de ironia e de sentido de humor este pequeno filme aborda alguns assuntos pertinentes nas discussoes de hoje. Visualmente e simplemente excelente.

A coragem de publicar a caricatura que mais reaccoes provocou e admiravel visto que o J. P. Pereira e uma figura publica e embora seja Portugal um local que favocere o anonimato, nao deixa de envolver risco pessoal.
Pensando bem seria um risco que eu estaria disposta a tomar? Deve ser uma questao que todos nos deveriamos colocar.

Gostaria de salientar o que para mim parece ser por demais obvio. A condicao da mulher mo mundo islamico e o facto de a Uniao Europeia nao tomar posicoes sobre essa realidade. Se fosse um outro qualquer grupo racico ou etnico as reaccoes seriam mauito mais assertivas. Admite-se que se utilize o relativismo cultural para denegrir e oprimir as mulheres. Nao necessito de pormenorizar sobre as diversas leis tiranicas aplicadas nao so nos pais de lei islamica mas nas sub culturas europeias. Assusta-me que a minha filha possa ser sujeita a leis tao contrarias a tudo porque eu tenho lutado, nomeadamente, a dignidade de todo o ser humano. sera que aqueles belos documentos adoptados pela ONU nada significam? A condicao da mulher no mundo islamico nao provoca semelhantes demonstracoes de repugnia. Lembro-me da impotencia que senti aquando do reinado dos Taliban no Afganistao. Lembro-me de ter tido na altura pensamentos menos generosos para com os fulanos barbudos que decidiram que mulheres nao podiam ter sequer tratamento medico, e lembro-me da atitude europeia. Temo que a nossa tolerancia seja tomada por medo. Temo porque me revejo nessa pessoa amedrontada que pode ser o editor de um qualquer jornal ou o cartoonista que com o sentido de absurdo dejesa somente questionar um valor ou uma crenca.

Compreendo porque os jornais americanos recusam publicar os desenhos. Seria possivelmente uma "provocacao" cujo preco poderia ser semasiado caro.
Outra coisa que nao percebo. Foi um jornal dinamarques que publicou os cartoons por isso o que tem os judeus ou o holocausto a ver com o assunto?
Enfim sao tantas as questoes, mas termino so acrescentando que recebi um mail de uma amiga minha em Portugal a manifestar a sua revolta com fundamentalismos e com o facto de estar farta de defender o indefensavel.
Sera que a tolerancia tem limites?
Peco desculpa pela falta de acentos.

(Manuela Silva)

*

Há poucos dias, José Pacheco Pereira escreveu: “Aproveitem, não vai durar muito. Cada vez se percebe mais que, também nós, estamos de novo em guerra.”
Não gostei da certeza com que ele falou do que para mim era só uma intuição vaga. Sou demasiado novo para ter vivido a guerra fria, e só comecei a aperceber-me da política depois da queda do muro de Berlim, e do colapso da União Soviética. Nunca como nos últimos dias tive um sentimento tão forte de perigo iminente, de inevitabilidade de guerra. É curioso, porque já se passaram os ataques de 11 de Setembro e 11 de Março, e as guerras do Afeganistão e Iraque. A vitória do Hamas e o problema nuclear do Irão deveriam ser mais significativos do que uma polémica acerca de “cartoons”.
Talvez este episódio tenha desenhado nitidamente as linhas de demarcação entre dois modos de pensar, fazendo sobressair os pontos em que ninguém está disposto a ceder; se os ocidentais são muitas vezes arrogantes, a intolerância de uma faixa do Islão torna-se cada vez mais evidente. Pior:
esta intransigência pode estender-se a grupos populacionais muito mais vastos do que se imaginava (ou do que eu imaginava), em ambos os lados.

Queria acrescentar duas notas:

Discordo em absoluto de qualquer pedido de desculpas dos governos europeus, pelas razões aduzidas inicialmente pelo primeiro-ministro dinamarquês, mas não considero supérfluo distanciar-me do cartoon com a bomba no turbante.
Interpretei-o como uma generalização com a qual não concordo (do mesmo modo que não fez sentido para mim, para dar um exemplo, a caracterização de "geração rasca" para designar a minha geração, há anos atrás). Admito que haja outras interpretações do "cartoon", mas este ponto é importante para dizer que não apoio a republicação dos desenhos apenas para afirmar a liberdade de expressão. Por outro lado, é óbvio que os "cartoons" se tornaram notícia, e é legítimo e natural que sejam publicados para ilustrar reportagens sobre o assunto.

Concordo com muito do que se diz no abaixo-assinado a que se refere no Abrupto, mas penso que podia ser mais conciso e evitar a tentação da hipérbole. Pedir desculpas pelo sucedido é apenas isso; não é pedir desculpas pela Magna Carta, por Erasmo, etc. Mais uma vez, este ponto parece-me relevante porque mesmo discordando de pedidos de desculpa, teria sido para mim perfeitamente normal e correcto que os governos europeus se distanciassem dos "cartoons", sem prejuízo do direito inalienável à sua publicação.

(Paulo Almeida)

*

Eu acho que chegamos a um momento de viragem, chegamos ao ponto em que a grande e vasta maioria dos europeus veem hoje George W Bush e a America, como um maior perigo que o radicalismo e terrorismo islamico. Existe hoje um odio tao profundo por Bush, que tudo o resto e' ofuscado: atentados em Madrid e Londres - culpa dos EUA, atentados do 9/11 - Os EUA estavam a pedi-las, atentados terroristas no Iraque - culpa dos EUA, cartoons Maome - culpa dos EUA.
Eu culpo os media por esta situacao, nao ha' que medir palavras, o conteudo de um noticiario da SIC, RTP e' quase um folhetim do PCP ou BE, nao existem contrapontos, existe apenas negativismo, o chamado "bota-abaixo" Bush e' hoje generalizado. Nao existem noticias sobre as coisas boas que estao a acontecer no Iraque e Afeganistao, nao existe defesa, apenas ataques baratos, com argumentos simplistas e gastos.
Talvez nos estejamos a esquecer de uma coisa: o nosso inimigo nesta guerra chama-se Bin Laden e Al Qaeda! Sao estes que voam avioes contra edificios, sao estes que poem bombas em comboios durante a hora de ponta. A Europa tornou-se passiva e tolerante a este inimigo, cega de odio pelos EUA, tornou-se tolerante 'a intolerancia.

Carlos Carvalho (Ottawa - Canada')

*

Apreciei a sua crónica “Mais vale Verdes que mortos”. Neste caso não pode haver meio-termo: Ou estamos do lado da liberdade de expressão, ou aceitamos que um bando de fanáticos religiosos (não importa de que religião…) passe a censurar todos os nossos actos. Infelizmente o Governo português, através do Ministro dos Negócios Estrangeiros, já optou: o nosso pequeno país prefere colocar-se de cócoras. E o problema é que há outros dirigentes europeus que também alinham em sujeitar-se a essa posição…

Como não quero viver numa Europa refém seja de quem for, nem aceito a vergonha da posição do nosso governo, enviei um fax de solidariedade para a embaixada da Dinamarca com a frase “Eu também sou Dinamarquês” e vou pendurar uma bandeira da Dinamarca na minha varanda. Se 300 milhões de europeus tomarem estas simples atitudes, ninguém nos fará viver de joelhos, por muito que os nossos governantes se ponham a jeito…

(José Basílio)

*

Absolutamente de acordo com a substância do texto de Ana Gomes no Público. Os "cartoons" são ofensivos. Quer dizer: talvez sejam. Nas nossas sociedades são os tribunais que o decidem, mas cada um de nós (incluindo Ana Gomes, o MNE, ou eu) pode ter a sua opinião. Se calhar até já começou o processo num tribunal dinamarquês e eu aqui sem saber.

Não me recordo de ouvir Ana Gomes dizer o mesmo quando António publicou o tal desenho do JP2 com o preservativo do nariz. Bem sei que há uma diferença entre o profeta e o JP2. Além disso, nessa altura, Ana Gomes não tinhas o mediatismo actual, por isso talvez eu não a tenha escutado. Mas será que nessa altura o pensou? Ou que o pensa agora?

Às vezes parece-me, mas posso estar errado, que a esquerda, ou melhor a esquerda da Ana Gomes, acha que a liberdade de expressão inclui ofender as maiorias, mas não as minorias. Reconheço até um certo mérito nessa posição de protecção dos mais fracos. É piedoso e cristão. Uups, ela é ateia.

(Pedro Costa Ferreira)

*

A quem aproveita, directamente, o que está a acontecer por causa dos cartoons?
Uma europa desorientada e com medo perante fanáticos religiosos bárbaros, é o cenário que qualquer extrema direita mais deseja: é neste tipo de pano de fundo que os discursos xenófobos musculados conseguem maior número de adeptos. Quando se apresentam como os únicos capazes de fazer frente à barbárie. O resto do discurso que deles se espera virá natural e rapidamente. > Se a ideia do jornal dinamarquês era provocar, conseguiram-no, certamente para lá do que imaginavam possível. Assustador ver o mundo inteiro cair facilmente em tão grosseira armadilha.

(Vasco Colombo)

*

O Ocidente caiu que nem um patinho…

O destaque que foi dado relativamente à questão das caricaturas foi exactamente ao encontro dos objectivos dos fundamentalistas. Os Media(?) fizeram o trabalhinho todo, e todos nós demos uma ajudinha.

Com a cultura que defendemos devíamos ter sido mais inteligentes e perspicazes. Era nossa obrigação termos visto para além do evidente.

Não falo em ignorar (que isso sim é que os teria posto a pensar - mais adequado: meditar - ), mas devíamos valorizar o que era realmente valorizável: o mínimo possível.

(Sofia Ávila da Silveira)

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Estou essencialmente de acordo consigo no que respeita à questao dos cartoons. No entanto, talvez seja também importante dividir a questao num ponto de vista de princípios, nisso estaremos de acordo, e noutro, diplomático. Afinal, qual é a linha divisória entre diplomacia e subversao dos nossos princípios fundamentais?
A propósito, no que respeita à sua limitaçao da liberdade de expressao. Diz que os limites existem quando ameaçam a integridade pessoal ou outras instâncias da vida democrática. Suponho que a liberdade de expressao sobre ideias e abstraçoes como religiao e naçao serao legítimas. Mas, julgo eu, nos EUA é proibido queimar a bandeira do país. É isso um atentado à liberdade de expressao?

(Pedro Oliveira)

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Só hoje, graças ao Courrier International, consegui ver as caricaturas dinamarquesas com tranquilidade e num tamanho legível. Depois de tudo o que li da parte de políticos, estadistas e comentadores em geral, sobre as ditas cujas, ficara a impressão de serem de mau gosto, xenéfobas, racistas e, obviamente, ofensivas. Devo dizer, e se calhar é falta de argúcia e sensibilidade minha, que não vi nada disso. Num caso vi um caricaturista a gozar com a própria iniciativa do jornal, noutro vi um suposto Maomé numa imagem sem contexto, caminhando com um burro preso pela corda; gostei particularmente da recepção que o profeta faz aos bombistas suicidas e achei uma boa imagem sobre o aproveitamento que o fundamentalismo islâmico faz da leitura do Corão a bomba oculta no turbante de Maomé: nestes dois casos parece-me óbvio que o objectivo da crítica não afecta minimamente a religião islâmica, muito menos as pessoas que seguem essa religião. A que me deixou mais dúvidas é a intitulada "identificação dum suspeito", porém, numa leitura atenta retiro a ideia oposta à xenofobia/racismo, ou seja, debaixo do turbante somos todos iguais na aparência, e vice-versa.

Desde ontem que tenho lido e ouvido sobre o tempo e o modo como esta polémica foi desenvolvida a ponto de se tornar numa crise internacional, com referência aos eventuais beneficiários e aos supostos objectivos. Depois do que atrás disse, fico maravilhado com o poder da propaganda e da manipulação, pois eu mesmo andei algum tempo sugestionado com a ideia de que se tratavam de caricaturas, no mínimo, ofensivas. E isto sou eu, português a viver em Portugal, sem ter tido acesso às ditas caricaturas na totalidade e reproduzidas em tamanho legível e legendadas numa lingua que eu conheça (embora aí a falha possa ser minha, ainda que procure ler diariamente jornais de referência como o Público e o JN, em papel ou na net).

Quanto às questões da liberdade, etc, etc, subscrevo inteiramente as suas opiniões e a de outros no mesmo sentido, era só o que faltava haver interditos a esse nível, e se houver quem se sinta ultrajado existem os tribunais, as campanhas de boicote, tantas outras formas de pressão.

Porém, ontem ouvi o ministro Freitas do Amaral justificar a tomada de posição do seu ministério. Pelo que percebi, há que dar o braço a torcer para não encostar os governos dos países de predominância muçulmana às posições radicais, coisa que farão por questão de sobrevivência. E porque atrás disso vem a questão do petróleo, claro. Porque o Choque de Civilizações pode se dar se não houver diálogo, etc, etc. Pois...

Creio que a Comunidade Europeia tem muito a reflectir sobre o modo como se integram os imigrantes, não só os islâmicos, na nossa sociedade. Assim como sobre o relacionamento com os países do mundo de influência islâmica, sendo o caso da Turquia verdadeiramente actual e exemplar para o futuro. E toda a carrada de problemas complexos associados à Palestina vs Israel, ao Iraque, ao Irão, etc, etc. Sem dúvida.

Mas fiquei preocupado ao aperceber-me como valores como a liberdade de expressão, pensamento e crítica, assim como a própria capacidade de rir, fazer rir ou deixar os outros rirem, não estão tão vivos no Ocidente como se supunha, pelo menos eu e mais alguns outros inocentes.

(Pedro Almeida)

*

Porquê ler os clássicos?
Também, talvez, porque muitos de nós descubram que eles nos ensinam que a liberdade é a nossa "invenção hesitante".D.Hume soube-o desde sempre.
Pace Hume.

"A intolerância de quase todas as religiões que sustentam a unidade de Deus é tão extraordinária como o princípio contrário dos politeístas. O implacável espírito tacanho dos judeus é bem conhecido. O maometanismo defende princípios ainda mais sangrentos e ainda hoje sujeita à danação, ou põe mesmo a ferro e fogo, todas as outras seitas. E se, entre os cristãos, os ingleses e os alemães abraçaram os princípios da tolerância, esta singularidade resultou da firme resolução do magistrado civil em oposição aos esforços contínuos dos padres e dos fanáticos"

David Hume - História Natural da Religião


*

No tempo de Thatcher e Reagan, não eram as vozes e os acampamentos montados contra os mísseis defensivos na Alemanha e os F-111 em Inglaterra tão sonoros? E não pareciam eles predominantes? E não tiveram afinal a pouca importância que tinham?
E por isso não consigo nem encarar seriamente nem considerar muito graves as posições de uma esquerda que só é nova no seu geral reaccionarismo. Não posso deixar de compreender que invoquem multiculturalismos, relativismos e nihilismos, que são os estribos que lhes sobram da clamorosa falência.
Neste caso dos cartoons, vem-me uma disposição optimista. Não é apenas por muitos blogs terem compreendido instantaneamente o que estava em causa e terem feito a defesa da liberdade sem parêntesis nem alíneas. É por ver que a compreensão da gravidade do caso suscitou saudáveis militâncias à direita e à esquerda e, sobretudo, por ver que pela primeira vez claramente, está a ser dito que se temos um problema de sobrevivência física com os «fanáticos», temos um problema de sobrevivência civilizacional com os «moderados». E ainda: se foi bem citado, fortalecemos hoje a ideia de que há um homem de coragem na presidência da Comissão Europeia.
Para além disso, e com toda a franqueza, que relevância ou peso específico terão pessoas como Freitas, ou Canas, ou muitos jornalistas que sempre foram parciais ou pusilânimes ou volúveis?

(José Cruz)

*

Se acreditasse na teoria da conspiração, diria que toda esta confusão teria sido resultado de uma pérfida maquinação do complexo industrial e militar dos EUA, com a colaboração cobarde das restantes democracias ocidentais, destinada a colocar a opinião pública ocidental a favor de uma posição forte contra o Irão (assim ultrapassando o manietar de mãos que resultou das dificuldades no terreno e do desastre de relações públicas do Iraque).

Infelizmente, não acredito. E seria mais simples fazê-lo, como é apanágio das teorias da conspiração.

Mas, mesmo que acreditasse, o facto de tal hipotética cabala ter sido tão bem sucedida no seu objectivo intercalar (isto é, ter suscitado a reacção intolerante e violenta de tantas comunidades muçulmanas) seria ainda assim um aviso para imensa preocupação...

Se quisermos manter a hipótese de manipulação, dos americanos (por absurdo) ou dos imãs, sírios ou iranianos (com muito maior probabilidade), a conclusão é que aquela encontrou terreno demasiado fértil para frutificar.
O amâgo das crenças - não apenas o contexto ou as circunstâncias - foi de molde a deixar-se incendiar com esse rastilho, ao invés de o apagar com bom senso, moderação e respeito.

(Artur Furtado)

*

«estão bem uns para os outros, os caricaturistas irresponsáveis e os fundamentalistas violentos, ambos só podem ser alvo da nossa condenação» (Vitalino Canas, deputado socialista português.)

Poderia colocar a data, local ou orgão de comunicação onde isso tenha sido dito/escrito? Convém que isto fique registado para a posteridade com todos os dados. Obrigado.

Ainda estou arrepiado, não acredito que um responsável político de um partido democrático com responsabilidade governativa possa dizer uma coisa dessas. Enfim, acredito, mas quem me dera que não fosse verdade, é demasiado infame.

(Jorge Filipe)

*

Uma frase que penso que resume toda a situação:

A diplomacia é que tem limites, não é a liberdade de expressão.


(Jorge Gomes)

*

Acabei agora de ouvir o nosso Ministro dos NE e fiquei mesmo muito triste.
Disse a seguinte frase na SIC-N "...estamos a fazer o jogo de Osama Bin Laden..."
Pois é, mas afinal quem está a fazer o jogo de quem???
O jogo dele ou deles, quem o faz são todos os governos europeus que pedem desculpa ao povo muçulmano por cartoons!
A nossa liberdade, conquistada com a dor de muitos está posta em causa, não por desrespeito algum, de caracter jurídico ou qualquer outra coisa, mas pelo medo. Medo! Este é o grande problema, com medo.

A liberdade dos povos ocidentais é tão insignificante ao ponto de cedermos á chantagem de alguns radicais islâmicos.
Segundo o nosso ministro Freitas do Amaral o remédio é estar calado.

Outro problema que ele coloca e não achei de bom tom foi dizer "...mas será que nós ocidentais não temos a inteligência...", referindo-se que estamos a fazer o jogo deles, caso alguém tenha a liberdade de expressar o seu pensamento de forma diferente e não convencional.

Segundo o nosso ministro, inteligência e liberdade de opinião é a mesma coisa.
Para ele quem é inteligente não pode discordar dele. É triste isso que se está a passar.

E para terminar, agora que alguns pediram desculpa como vai ser quando voltar a acontecer?
Para mim foi um erro muito grave o precedente que se levantou com esse pedido de desculpas.


(Bruno Teixeira)

*

Escrevo só para lhe dizer que concordo inteiramente com o que escreve em "Mais vale verdes do que mortos" e que tenho pena que a comunidade internacional se esteja a comportar desta forma cobarde, pretensamente diplomática. De nós, portugueses, não talvez não esperasse outra resposta tendo em conta a forma como nos temos comportado nestas questões num passado recente. Da comunidade internacional, sim esperava outra resposta, mais firme, mais digna.

A revolta dos muçulmanos, com uns meses de atraso, contra as caricaturas não me espanta num povo que começa por ser intolerante com os seus pares, em especial com as suas mulheres. Do que se vê diariamente nos jornais parece que são intolerantes e irracionais por princípio. Poderiam ter evitado a violência e a destruição de bens e propriedades alheias mas também parece que o confronto saudável e as manifestações pacíficas não fazem parte da sua prática diária.

Agora a reação da comunidade internacional, deixando sozinhos os autores das caricaturas, entristece-me e considero-a como um verdadeiro atentado contra a liberdade, a democracia e a dignidade de todos aqueles que acreditam nestes valores.

(Rita Camilo)

*

Andamos nós europeus tão preocupados com o imperialismo americano e com o "social-capitalismo" chinês que quando nos bate à porta a ameça islâmica logo nos colocamos de joelhos. Basta ver os apelos ao nosso bom senso e à nossa tolerância (!!??) lançados quer por políticos quer por editorialistas. Tudo isto vem a propósito do caso do jornal dinamarquês que publicou uns "cartoons" do profeta Maomé. Facto que desencadeou por parte das chefias religiosas islâmicas e de alguns estados árabes um ataque imediato quer ao governo dinamarquês ( e a outros onde entretanto também se publicaram os desenhos ) quer às respectivas representações diplomáticas, numa tentativa clara de condicionar a liberdade de expressão nos países democráticos do nosso continente. E aqui é que a "porca torce o rabo" ,pois esta atitude das chefias árabes e islâmicas não visa mais do que criar um ambiente de intimidação e condicionamento da nossa sociedade de forma a conduzir-nos à submissão. No fim de contas trata-se tão só e simplesmente da "forma de imperialismo mais intransigente" como diz V.S. Naipaul no seu livro "Beyond Belief" ( de 1998 ) : " A crueldade do fundamentalismo islâmico é que permite apenas a um povo - os árabes, o povo escolhido pelo profeta - ter um passado, e partilhar lugares, peregrinações e outras referências na terra. Estes lugares sagrados dos árabes têm de ser partilhados por todos os povos convertidos. Os povos convertidos têm de se despir do seu passado; aos povos convertidos nada é exigido a não ser a mais pura fé ( se é que tal coisa existe), o islão, a submissão." No actual caso ainda é pior , porque não sendo a Dinamarca um país convertido ao islão esse fundamentalismo tenta , desde já, que nos submetamos a um pensamento único criando um ambiente de medo. É que não estamos a falar de eventuais críticas ou ofensas de dirigentes políticos europeus ao Islão ou ao profeta Maomé! Estamos a falar de desenhos publicados por um jornal de um pequeno país europeu com uma democracia parlamentar e onde é possivel viverem diferentes comunidades étnicas e religiosas.Relembro a política de acolhimento dos paises nórdicos aos refugiados de todo o mundo. Quando o Presidente Iraniano apelou à destruição de Israel não me lembro de ouvir nenhum chefe religioso islâmico protestar. Muitos dirão que estou a exagerar. Talvez ! Mas convém saber travar as lutas políticas que temos pela frente e esta é uma delas. Com uma dificuldade adicional , a de que do lado islâmico pretendem-nos fazer crer que se trata apenas de opções religiosas e que nós ocidentais travamos uma guerra santa contra os "infiéis". Convém não cair nessa armadilha, pois sabemos que não é disso que se trata. Terminaria citando novamente Naipaul, na sua palestra de 1992 ( quão longe estávamos do 11 de Setembro ! ) dada no "Manhattan Institute " de Nova Iorque ( e traduzo livremente da edição inglesa da "Knopf" ) :
" A civilização universal demorou muito tempo a ser feita. Não foi sempre universal; não foi sempre tão atractiva como hoje. A expansão da Europa deu-lhe uma matriz racial, que ainda causa dor. Na Trinidad cresci nos últimos dias desse tipo de racismo. E isso talvez me tenha dado a possibilidade de apreciar as enormes mudanças desde o fim da 2ª Guerra Mundial, a extraordinária tentativa desta civilização para acomodar o resto do mundo, e todas as correntes de pensamento desse mundo."
Esta é a melhor resposta a dar quer aos fundamentalistas quer àqueles que pretendem que temos que pedir desculpas pelo facto de um jornal ter publicado uns desenhos.

(António Monteiro Pais)

*

Totalmente de acordo que não devemos desculpas a ninguém, era só o que faltava! Mas…

Nesse outro mundo, tolerância não significa o mesmo que para nós, religião não significa o mesmo que para nós e violência, liberdade, vida, morte, vingança, terrorismo e tantas outras, são palavras com outro significado. Nesse outro mundo as crianças aprenderam que se cortava as mãos aos ladrões, e se apedrejava quem se portava mal, nós aqui no mundo perfeito sabíamos que isso era horrível mas em nome da liberdade achámos que o melhor era deixar estar, é uma cultura diferente, dizíamos para justificar a nossa indiferença.

Se é inconcebível para nós a reacção dos radicais muçulmanos também é inconcebível para eles que alguém tenha desenhado o Maomé naqueles preparos.

É a guerra pois é! Mas vamos esperar para ver se as tais dezenas de anos de democracia nos ensinaram a fazer uma guerra com outras armas, uma guerra com caricaturas por exemplo.

(Rosa)

*

Acho a indignação nacional com a reacção troglodita dos muçulmanos absolutamente chocante.

O Ocidente invade-lhes os países, vende-lhes os recursos a amigos e afilhados, mata-lhes a população civil (sem qualquer provocação) e chama “danos colaterais” às dezenas de milhar de crianças mortas, apoia entusiasticamente o regime de apartheid israelita e as cleptocracias violentas que os oprimem e exploram, e depois chama-lhes selvagens.

As pessoas miseráveis fazem coisas miseráveis. É só isso.

E a nossa tolerância? Não terá limites também? Quantas pessoas é que pediram a cabeça do Herman José por causa de uma piada com a Ultima Ceia? Ou com o rei D. Afonso Henriques? Houve manifestações, abaixo-assinados e arruaças. Lembra-se?

(Filipe Castro, Texas, EUA)

*

Ainda a propósito da polémica acerca dos limites da liberdade de expressão proclamados pelo nosso MNE, aconselho a leitura deste comentário em que o autor nos diz, com toda a razão em minha opinião, que se não se pode criticar Maomé por isso ofender os sentimentos de milhões de pessoas, então também não se pode criticar Kim-Il-Sung, que na Coreia do Norte tem já estatuto divino e cujos ensinamentos são seguidos por milhões de coreanos. A ele, acrescentaria, por exemplo, David Koresh, esse mártir davidiano imolado pelo fogo no Texas, Charles Manson, que criou uma religião com 10 a 15 adeptos que o consideravam divino e cometiam atrocidades em seu nome ou o japonês Azahara, que ordenou aos seus seguidores o atentado com gás sarim no metro de Tóquio.

Pela mesma ordem de razão (e atendendo a que há liberdade de culto em Portugal e, supostamente, todas as religiões devem ser tratadas por igual perante a lei), se alguém fundar um partido político xenófobo e sexista, pode ser satirizado, mas se esse mesmo alguém invocar ser iluminado por Deus e fundar uma religião xenófoba e sexista, já não pode ser satirizado, porque isso ofende o mais profundo sentimento religioso dos seus seguidores.

Será a Astrologia uma religião? Pode-se criticar? E a Cientologia?

(Alexandre Fonseca)

*

* Que a reacção violenta e fanática dos que se sentiram ultrajados não nos roube a última réstia de lucidez: os dois argumentos com que “os de cá” querem justificar a publicação das caricaturas do Profeta, há que dizê-lo alto e bom som, estão viciados.

* “Que está em causa a liberdade de expressão...” Não está. Como não estará quando um editor decide “cortar” este ou aquele artigo. Porque a liberdade de expressão é um direito individual, não um dever editorial. Se fosse um dever editorial, o que tinham para dizer, então, os media a essa multidão que não tem modo nem jeito de ver alguma vez as suas opiniões publicadas? O que há a debater, sim, é o juízo de oportunidade que trouxe a público algo que, todos sabiam, iria ofender, directa, ostensiva e gratuitamente, as convicções religiosas de outros.

* “Que os Estados ocidentais são laicos, por princípio...” E são. Mas a questão não é essa, porque o referido princípio existe, unicamente, na esfera pública, e visa assegurar que nenhum crente, enquanto tal, seja objecto de discriminação por parte dos órgãos do Estado. Na esfera privada, maxime, no plano individual, dizer-se laico é, apenas, viver uma das muitas crenças em que a Humanidade vai sendo fértil – e saber que nunca se será prejudicado por isso. E os que, para se desresponsabilizar, vêm esgrimir um princípio de que, afinal, são meros beneficiários, mais não pretendem que reclamar-se de uma superioridade ética/civilizacional, ao arrepio desse mesmo princípio equalizador que insistentemente invocam.

* Que o cristianismo, e os seus símbolos religiosos mais sagrados, sejam também caricaturados, talvez com maior acidez ainda, isso só prova que a tolerância, entre nós, europeus, é uma virtude mal distribuída. O mérito de tanta serenidade pertencerá, por inteiro, à cultura cristã, e à memória sofrida de séculos e séculos de intolerância, de perseguições e de lutas sangrentas.

* Por último, os que invocam a liberdade de expressão fariam bem em reflectir na reacção que teriam caso aparecesse nos media uma ficção, uma simples ficção, que ofendesse de forma directa, ostensiva e gratuita os que lhes são queridos, ou aqueles cuja memória veneram. Porque, bem vistas as coisas, à liberdade de imprensa (e, não, de expressão) foi dado um uso que compete aos tribunais qualificar à luz, justamente, do princípio do Estado laico.

(A.PALHINHA MACHADO)

*

Sou Portuense mas vivo em Brasília há 6 anos. Sou agnóstico e liberal. Ontem passava pela pacata embaixada da Dinamarca e me perguntava porque no Brasil, onde vive uma extensa comunidade de origem Árabe, não houve manifestações agressivas de repúdio às famigerada caricaturas. Apenas se registraram declarações de lideres religiosos. Talvez seja porque essas comunidades são parte de um povo e de uma cultura que aceita a tolerãncia, sobretudo a religiosa, como parte essencial da relação entre os homens. Aqui, se alguém quiser cobrir o rosto para assistir a uma aula nenhuma lei ou ação o impedirá. Os Árabes são parte do tecido económico e social, encontram-se em todos os níveis sociais e não servem apenas como mão-de-obra barata. Nada disto explica ou justifica o que está a acontecer em muitos países muçulmanos. Só o atraso social e cultural em que esses países se encontram pode explicar a barbárie a que estamos assistindo, à semelhança de muitas outras tragédias de um passado recente. No entanto, serve, pelo menos em parte, para entender porque tantos Árabes que vivem na Europa permanecem no mesmo "mundo" intolerante, apesar de viverem em sociedades tão liberais.

Quanto à liberdade de expressão, os países Árabes parecem entender melhor as sociedades Européias do que os próprios Europeus. Quando eles ameaçam retaliar com caricaturas sobre o holocausto estão a reconhecer que sabem que a Europa é hoje uma sociedade pós-cristã (vale a pena ler o livro "The Right Nation" dos editores do "The Economist" nos EUA), um espaço onde as ofensas a simbolos religiosos são triviais. Essa é, aliás, uma característica que cada vez mais afasta a Europa de outras sociedades, nomeadamente a Americana. O que esses países sabem é que a publicação de caricaturas sobre o holocausto em, por exemplo, jornais Alemães, provocaria uma onda generalizada de indignação com consequências imprevisiveis. Vale a pena lembrar que na Europa do politicamente correto um candidato a comissário europeu teve de pedir para "retirar-se de cena" porque fez comentários desagradáveis sobre os homosexuais. Numa universidade Inglesa onde trabalhei há alguns anos, um laboratório foi destruído por activistas dos direitos dos animais, porque se suspeitava que estavam em andamento investigações com macacos. Imaginem um jornal Americano publicar caricaturas sobre as vitimas do 11 de Setembro após o atentado. Mau gosto inaceitável. Apenas quero com isto dizer que EM TODAS as sociedades existem limites, ainda que não legais, à liberdade de expressão e de ação. É evidente que para uma sociedade religiosa nada é mais ofensivo do que a falta de respeito por simbolos religiosos. Numa sociedade laica e liberal, as "sensibilidades" demonstram-se em outros temas. Um pedido de desculpa pelas caricaturas grosseiras nada mais é do que reconhecer o direito à diferença, que tanto reclamamos para nós próprios. Julgo que confundir isto com a necessária condenação da violência e intolerãncia que estão em curso é um equívoco.

(Vitor Salvador Picão Gonçalves)

*

No jornal que esteve na origem de toda esta barafunda (e que conseguiu, com 12 bonecos, o que Saladino não conseguiu com muitos anos de guerra!), pode ler-se hoje:

«Nunca, em nenhum momento, tivemos consciência da extrema sensibilidade dos muçulmanos (...) face a esta questão».

Ora eu convivi de perto com muitos deles (turcos, iranianos, argelinos, tunisinos, marroquinos e até congoleses) e sei que o problema está precisamente aí: na falta de sensibilidade e na falta de consciência da sensibilidade dos outros.

Como se compreende, uma das coisas que torna este assunto particularmente difícil de discutir é o facto de estar em causa algo que se aprende na infância e, quando se chega a adulto, ou se tem ou não se tem...

(C. Medina Ribeiro)

*

Há um aspecto que me parece merecer reflexão adicional relativamente a um exemplo que deu, o da proibição em alguns países de textos que negam a existência do Holocausto.

Não me parece que esse exemplo seja minimamente comparável com o das caricaturas. Trata-se de algo que se sabe perfeitamente que existiu e que teve o impacto que todos sabemos na vida particular de milhões e milhões de pessoas, provocando uma dor inimaginável por quem não viveu esse drama na pele. Entra portanto já no campo onde a lei limita a libertade de expressão para proteger o cidadão relativamente à sua esfera privada.

Acredito que ouvir negar o Holocausto seja uma violência literalmente insuportável para alguém que esteve em Auschwitz. Independentemente de outras razões que pudessem existir para permitir essa expressão, neste caso concreto elas têm menor peso do que o respeito que é devido às vítimas desta tragédia. Tratar-se-á porventura de ultrapassar ou não aquilo que uma pessoa, por mais racional que tente ser, é capaz de humanamente aguentar.

(Tiago Azevedo Fernandes)
 


EARLY MORNING BLOGS 718

Poema pouco original do medo


O medo vai ter tudo
pernas
ambulâncias
e o luxo blindado
de alguns automóveis
Vai ter olhos onde ninguém o veja
mãozinhas cautelosas
enredos quase inocentes
ouvidos não só nas paredes
mas também no chão
no tecto
no murmúrio dos esgotos
e talvez até (cautela!)
ouvidos nos teus ouvidos

O medo vai ter tudo
fantasmas na ópera
sessões contínuas de espiritismo
milagres
cortejos
frases corajosas
meninas exemplares
seguras casas de penhor
maliciosas casas de passe
conferências várias
congressos muitos
óptimos empregos
poemas originais
e poemas como este
projectos altamente porcos
heróis
(o medo vai ter heróis!)
costureiras reais e irreais
operários
(assim assim)
escriturários
(muitos)
intelectuais
(o que se sabe)
a tua voz talvez
talvez a minha
com a certeza a deles

Vai ter capitais
países
suspeitas como toda a gente
muitíssimos amigos
beijos
namorados esverdeados
amantes silenciosos
ardentes
e angustiados

Ah o medo vai ter tudo
tudo
(Penso no que o medo vai ter
e tenho medo
que é justamente
o que o medo quer)

O medo vai ter tudo
quase tudo
e cada um por seu caminho
havemos todos de chegar
quase todos
a ratos


(Alexandre O'Neill)

*

Bom dia!

11.2.06
 


QUANTAS CORES CABEM NESTE AZUL DO DIA DE HOJE?


(R.)
 


COISAS DA SÁBADO:
UMA BOA COLECÇÃO IGNORADA



Esta colecção de pequenos livros entre o ensaístico e o didáctico, da Imprensa Nacional é mais uma vez uma vítima da política absurda de promoção da editora do estado. Os seus livros não se encontram praticamente em sítio nenhum no mercado livreiro, e fora das livrarias da própria Imprensa Nacional e das Feiras do Livro são muito difíceis de encontrar. Não se percebe, os livros, como aliás outras edições da Imprensa Nacional (nem todas, porque há algum desequilíbrio editorial), são bem feitos e muitos deles, como os exemplos recentes sobre Sílvio Lima, Adolfo Casais Monteiro, Tomaz de Figueiredo, D. António Ferreira Gomes, são raros ensaios introdutórios sobre obras que estão ignoradas e que caminham para o esquecimento. Muito da nossa cultura contemporânea anterior ao 25 de Abril, em particular a que não era exclusivamente literária, mas sim crítica e ensaística, está por estudar. Trabalhos como os de Miguel Real e Carlos Leone têm encontrado nesta colecção um repositório “essencial” que faz jus ao nome.
 


RETRATOS DO TRABALHO EM ROMA, ITÁLIA


Vendedor de melâncias em Roma.

(Tony Ventoinha)
 


QUANTAS CORES CABEM NESTE AZUL DO DIA DE HOJE?


 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(11 de Fevereiro de 2006)


___________________________

No New Yorker sobre Maria Madalena.

*

Há duas razões muito claras que exigem a publicação das caricaturas como elemento informativo indispensável para a formação de opinião numa sociedade livre: uma, é perceber pela sua observação que elas estão absolutamente dentro daquilo que é o mainstream do desenho satírico típico da imprensa dos países em que há liberdade de expressão; outra, é perceber que só com um esforço de manipulação desproporcionado ( e intencional) elas podem ser consideradas ofensivas e blasfemas. Isto só se percebe bem vendo-as e nenhuma descrição as substitui. É aliás vendo-as que melhor se percebe o que está em causa. Talvez seja isso que muitos pretendem evitar.

*

Os perigosos caminhos da autocensura num importante artigo do LA Times criticando a atitude da imprensa americana (e do LA Times) ao não mostrar as caricaturas (salvo honrosas excepções): "those of us who inhabit this real world will continue to believe that the American news media's current exercise in mass self-censorship has nothing to do with either sensitivity or restraint and everything to do with timidity and expediency."
 


QUANTAS CORES CABEM NESTE AZUL DO DIA DE HOJE?


 


COMO ESTAMOS A FICAR

Como estamos a ficar ou os efeitos da censura, da autocensura, do medo, de não querer parecer mal, de não querer sofrer as consequências, de estar bem com todos, de aceitarmos uma polícia dentro de nós, para as palavras, para as ideias, para a fala, para o pensamento.


(Quino, bem lembrado pelo José Carlos Santos)
 


EARLY MORNING BLOGS 717

Poema de los dones


Nadie rebaje a lágrima o reproche
esta declaración de la maestría
de Dios, que con magnífica ironía
me dió a la vez los libros y la noche.
De esta ciudad de libros hizo dueños
a unos ojos sin luz, que sólo pueden
leer en las bibliotecas de los sueños
los insensatos párrafos que ceden
laa albas a su afán. En vano el día
les prodiga sus libros infinitos,
arduos como los arduos manuscritos
que perecieron en Alejandría.
De hambre y de sed (narra una historia griega)
muere un rey entre fuentes y jardines;
yo fatigo sin rumbo los confines
de esa alta y honda biblioteca ciega.
Enciclopedias, atlas, el oriente
y el occidente, siglos, dinastías.
Símbolos, cosmos y cosmogonías
brindan los muros, pero inútilmente.
Lento en mi sombra, la penumbra hueca
exploro con el báculo indeciso,
Yo, que me figuraba el paraíso
bajo la especie de una biblioteca.
Algo, que ciertamente no se nombra
con la palabra azar, rige estas cosas;
otro ya recibió en otras borrosas
tardes los muchos libros y la sombra.
Al errar por las lentas galerías
suelo sentir con vago horror sagrado
que soy el otro, el muerto, que habrá dado
los mismos pasos en los mismos días.
¿Cuál de los dos escribe este poema
de un yo plural y de una sola sombra?
¿Qué importa la palabra que me nombra
si es indiviso y uno el anatema?
Groussac o Borges, miro este querido
mundo que se deforma y que se apaga
en una pálida ceniza vaga
que se parece al sueño y al olvido.


(Jorge Luis Borges)

*

Bom dia!

10.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO EM S.MIGUEL - AÇORES, PORTUGAL


Mulheres empacotando chá da Gorreana.

(Tony Ventoinha)
 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(10 de Fevereiro de 2006)


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Como é um assunto que interessa aos blogues e para se ir mais longe do que a célebre sopa do José Rodrigues dos Santos, veja-se Ed Park, "Word Salad" sobre Dana Carroll, On Sex and Intercourse in Contemporary Fiction,no Village Voice.

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As cenas absurdas geradas no parlamento regional da Madeira, com a aprovação de um pedido do PSD local de verificação da sanidade mental de um deputado do PS, deveriam ser criticadas sem tibiezas pelo PSD nacional. Não é uma questão menor, é uma questão institucional que tem a ver com o abuso de poderes de uma maioria parlamentar. Como se pode exigir mais autonomia, quando se arrasta a instituição parlamentar regional para o máximo ridículo, tornando-a alvo da merecida chacota nacional?

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Um bom sinal sobre o movimento de repulsa pela chantagem contra a liberdade de expressão é que ele é transversal, ultrapassa algumas dualidades simplistas que se pretendem impor como absolutas na mecânica política, como a de "esquerda / direita". E isso dá-lhe força, como se vê na lista dos signatários do abaixo-assinado que, desde ontem, circula na Rede e que é, até agora, o mais significativo movimento de protesto pelo que se está a passar.

(Nota à margem: os estudiosos do futuro podem também encontrar ali uma amostra do contínuo que, dos blogues aos jornais e à academia, explica o novo papel dos blogues e da Rede, e a emergência de mecanismos de "influência" intelectual e política diferentes dos do passado, assentes apenas na imprensa tradicional.)

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Hoje, se alguma réstia de genuíno amor pela liberdade ainda existisse na bancada parlamentar de um partido que tem sempre a boca cheia dela, o PS, (e eu penso que existe) haveria (haverá) protestos sonoros contra a vergonhosa intervenção de Vitalino Canas, que, não se esqueça, falou em nome do Grupo Parlamentar de que é dirigente.

Já vi que nos blogues a enormidade não passou despercebida, mas ainda estou à espera do que dizem os deputados do PS, e dos editoriais dos jornais. Amanhã se fará o balanço dessas vozes. Veremos.

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Há qualquer coisa de estranho nesta notícia do Público de hoje, ou então faltam elementos noticiosos relevantes, para se compreender o que se passou na manifestação junto da Embaixada da Dinamarca:
"No final da manifestação, já com poucas pessoas no local, apareceu um homem com uma bandeira com um símbolo de extrema-direita (uma cruz celta), que foi prontamente levado pela polícia."
Que lei é que este homem violou? Estava a provocar distúrbios? A provocar os manifestantes? Punha em causa a "ordem pública"? Gostava de saber.

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Multiculturalismo do melhor: daqui a cinco dias comemora-se o dia de John Frum no Vanuatu.
 


EARLY MORNING BLOGS 716

Anti-Profanity


I do not swear because I am
A sweet and sober guy;
I cannot vent a single damn
However hard I try.
And in viruperative way,
Though I recall it well,
I never, never, never say
A naughty word like hell.

To rouse my wrath you need not try,
I'm milder than a lamb;
However you may rile me I
Refuse to say: Goddam!
In circumstances fury-fraught
My tongue is always civil,
And though you goad me I will not
Consign you to the divvle.

An no, I never, never swear;
Profanity don't pay;
To cuss won't get you anywhere,
(And neither will to pray.)
And so all blasphemy I stem.
When milk of kindness curds:
But though I never utter them -
Gosh! how I know the words.


(Robert William Service)

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Bom dia!

9.2.06
 


ISTO ESTÁ BONITO



«As agressões simbólicas e materiais a Estados e cidadãos europeus merecem certamente a nossa repulsa, nada legitima esse actos hediondos, estão bem uns para os outros, os caricaturistas irresponsáveis e os fundamentalistas violentos, ambos só podem ser alvo da nossa condenação»

(Vitalino Canas, deputado socialista português.)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM LISBOA, PORTUGAL




Manutenção/reparação geral do elevador do Lavra; Lisboa em ano de Expo.

(Paulo Gouveia)
 


MAIS VALE VERDES DO QUE MORTOS



Eu pensei que as coisas estavam melhores do que o que estão, mas, mais uma vez, se percebe como há apenas uma fina película entre a civilização e a barbárie. Película que estamos a deixar romper com a maior das displicências. Devia desconfiar que é assim porque os sinais estão por todo o lado. Mas a gente acredita, quer acreditar, que algumas dezenas de anos de democracia consolidada (na maioria da Europa) e duas centenas de anos desde a revolução americana e francesa tinham consolidado a liberdade como princípio. Mas não é, não é suficiente, como se vê.

Estamos em guerra e estamos a perder. Estamos a perder, antes de tudo, porque ainda não percebemos que estamos em guerra. A retórica olimpiana, de um mundo "multicultural", de uma "comunidade internacional" eficaz, assente na lei e na Realpolitik moderada, ofusca-nos e impede-nos de ver o que está à nossa frente. Muitos sublimam as fraquezas, transformando-as num arremedo de "diplomacia" que não é senão contemporização e complacência, outros têm medo e estão dispostos à servidão, outros minimizam o que acontece para não quebrar o mundo ideal em que vivem.

Estamos a perder por dentro, o que é pior. A crise das caricaturas dinamarquesas é disso o melhor sinal. Mortos e feridos, atentados, violências, destruição de embaixadas, expulsão de estrangeiros, muitos deles os dadores de solidariedade, intolerância exaltada e absoluta, e nós, os visados, arrastamo-nos pela culpa. A UE gaguejou, no limite do pedido de desculpas, e Portugal, pela voz do ministro dos Negócios Estrangeiros, foi ainda mais longe do que o pedido de desculpas, condenou os caricaturistas e calou-se face à violência absurda e orquestrada que passa por ser "a rua árabe".

A comunicação social que costuma ser hiper-sensível à questão da liberdade de expressão, muitas vezes de forma puramente gratuita e corporativa, para encobrir os seus abusos, está numa de "respeito", de "contexto", de "bom senso", de "bom gosto". Encontram-se mil e um pretextos e mil e uma desculpas para se não ser claro: é o jornal dinamarquês que é dúplice e se recusou a caricaturar Cristo, é o jornal dinamarquês que é racista e antiárabe e encomendou as caricaturas de forma provocatória, é Sousa Lara, Abecasis, e as cenas à volta do filme sobre a Virgem Maria, é o abaixo-assinado contra a caricatura de António do Papa com o preservativo no nariz, é tudo e mais alguma coisa. Estamos a falar do mesmo? Quero lá saber se o jornal dinamarquês é respeitável, equilibrado, sensato, equidistante do islão e da cristandade, quero lá saber se o New York Times não passou as caricaturas, ou se a SIC e a RTP as mostraram veladas e à distância! O que eu quero saber é que se o valor da liberdade, e da sua forma especial, o da liberdade de expressão, não está em causa nestes eventos, então não sei o que é a liberdade.

Pergunta-se (sinistra pergunta nos dias de hoje, que mal se formula culpabiliza os dinamarqueses): é a liberdade de expressão absoluta? Não, não é. Tem limites na lei na democracia, tem regras mínimas, para proteger outras liberdades e outros direitos. Regras mínimas, aliás habitualmente violadas sem consequência, para proteger a dignidade dos indivíduos, a sua intimidade, a sua personalidade, o seu direito de não ser caluniado. Mas são regras para os indivíduos, não são nem para religiões, nem comunidades, nem crenças, nem para a "blasfémia". Mesmo assim, o abuso destes limites é comum, justificado pelo "interesse público", e é raríssimo ver a comunicação social a discutir tão voluntariamente os seus limites no "bom senso" e no "bom gosto", quanto mais no "respeito" e muito menos no "contexto". Ainda bem, vivemos com esta realidade, não é perfeita, mas é melhor do que o seu contrário. Por isso repito a mesma pergunta: é a liberdade de expressão absoluta neste caso? É. Ou é absoluta ou não é.

De novo, insisto, não quero saber se houve intenção de ofender (e depois?), de fazer propaganda anti-islão (e depois?), de ser simplista na representação do "martírio" (e depois?), de rebaixar Maomé (e depois?) de associar o islão ao terrorismo (e depois? É proibido?). É acaso proibido representar Deus-pai como um velho lúbrico como faz Vilhena e Crumb, e Cristo como um alegre imbecil como fizeram os Monty Python? É que se não é para defender este direito de se exprimir no limite das nossas crenças, a liberdade não serve para nada. É que também convém não esquecer que a nossa liberdade foi conquistada exactamente aqui, contra a intolerância religiosa. A essência da liberdade, tal como a entendemos, é a liberdade do outro, de escrever, desenhar, pintar, representar, filmar aquilo com que não concordamos, aquilo que consideramos ofensivo, de mau gosto, insensato, mesmo vil e nojento. Esta é a nossa concepção de liberdade, a liberdade de dissídio, do dissent, que, como tudo no mundo, não nasceu da natureza mas de uma história cultural, política e civilizacional que cada um escolhe e deseja como quer. E eu quero esta, porque não tenho nada a aprender sobre a liberdade com a Síria e o Irão, com o Egipto e a Arábia Saudita, com o Hamas e o Hezbollah, com a "rua árabe", nem com aqueles que se "indignam" contra os desmandos do "Ocidente, porque são contra os EUA, ou contra a guerra no Afeganistão e no Iraque, contra Israel, e estão órfãos do mundo a preto e branco do comunismo, nas suas várias versões, mesmo as de Toni Negri e do Le Monde Diplomatique.

A maior das falácias é achar que é a religião que está no centro destes eventos (e se fosse? O que é que mudava?), mas claramente uma recusa política da democracia e uma recusa cultural da tolerância, da liberdade, das diferenças, e uma recusa social e cultural em viver em sociedades em que as mulheres não façam parte do património dos homens. Estes não são problemas que devamos interiorizar como sendo nossa culpa, são problemas do mundo árabe e persa, são problemas do islão. Enquanto as sociedades maioritariamente muçulmanas se recusarem a separar o Estado da religião, a tolerar as outras religiões e em particular o agnosticismo e o ateísmo, a tratar de outro modo as mulheres, estes problemas são problemas de poder e de conflito, uma guerra nas formas novas que tem hoje.


Esta é a chantagem que nos é feita e a que estamos a ceder. E se no fim disto tudo eu pedir ao PÚBLICO que ilustre o meu artigo com uma das caricaturas, uma das que penso ser absolutamente defensável como caricatura, a de Maomé com o turbante-bomba, o que é que acontece? É uma provocação gratuita? Não é, é a ilustração ideal para o que digo, não só pela imagem como sobre tudo o que ela suscita. Mas já se levantam todos os problemas, de autocensura, de risco, de pensar duas vezes. Nunca se sabe se alguém pega no PÚBLICO e o associa aos outros jornais "blasfemos" e me dita uma fatwa. É pouco provável, mas convém pensar duas vezes. E é nesse pensar duas vezes que está a autocensura, e a censura, e a efectiva diminuição das nossas liberdades.

Voltamos aos tempos de "mais vale vermelhos do que mortos", revistos agora para outra cor, para "mais vale verdes do que mortos". Ficam os muçulmanos ofendidos? Não deviam, porque têm sempre uma maneira de responder a esta situação: serem os primeiros a manifestar-se pela liberdade dos dinamarqueses, pelo seu direito de caricaturarem o profeta, como muitos cristãos marchariam, como cidadãos, pelo direito de se caricaturar a Igreja, o Papa e Deus, em nome da liberdade que prezam no "reino de César".

(No Público de hoje.)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM S.MIGUEL - AÇORES, PORTUGAL


Recolha de chá da Gorreana.

(Tony Ventoinha)
 


EARLY MORNING BLOGS 715


The Mole of Hadrian

Tout le parfait dont le ciel nous honore,
Tout l'imparfait qui naît dessous les cieux,
Tout ce qui paît nos esprits et nos yeux,
Et tout cela qui nos plaisirs dévore :

Tout le malheur qui notre âge dédore,
Tout le bonheur des siècles les plus vieux,
Rome du temps de ses premiers aïeux
Le tenait clos, ainsi qu'une Pandore.

Mais le destin, débrouillant ce chaos,
Où tout le bien et le mal fut enclos,
A fait depuis que les vertus divines

Volant au ciel ont laissé les péchés,
Qui jusqu'ici se sont tenus cachés
Sous les monceaux de ces vieilles ruines.

(Joachim du Bellay)


*

Bom dia!
 


ABAIXO-ASSINADO: COMO UMA LIBERDADE



Como acontece sempre não se concorda com tudo, mas concorda-se no essencial, logo assina-se. Dou a minha assinatura a este abaixo-assinado que tem o tom certo.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
CONCORDÂNCIAS, DISCORDÃNCIAS E OUTRAS DÂNCIAS
(2ª série)




NOTA: Os textos dos leitores estão publicados em ordem inversa à sua recepção.

Escrevo-lhe sobre esta questão porque julgo compartilhar consigo um valor fundamental: um grande amor às liberdades individuais.

Ora, estando estas em causa, quero, desde já, manifestar o meu total apoio à posição por si manifestada no “Abrupto” acerca da questão dos “cartoons” dinamarqueses. Uma disposição que foi reforçada pela inacreditável nota enviada à Comunicação Social pelo MNE, cujo teor (do estilo “o respeitinho é muito bonito”) seria, com toda a certeza, subscrito por qualquer membro de um governo de Salazar. Algo que vem, aliás, na linha da igualmente lamentável entrevista do primeiro-ministro ao “Expresso”. Confesso que, em ambos os casos, tive vergonha de ser português.

Entrando, agora, na questão em apreço, esta merece-me as seguintes reflexões:

1 – O caso dos “cartoons” é, antes de mais, uma questão de liberdade de expressão e de crítica. Para mim, estas constituem os fundamentos de qualquer democracia, pelo que toda a limitação que lhes seja imposta por via administrativa constitui, em minha opinião, um atentado à essência de qualquer regime democrático. Logo, considero extremamente perigoso o discurso que a tenta minimizar, contrapondo-lhe e acentuando a ideia dos “limites”, da “responsabilidade”, do “bom senso” e quejandos. É que sabemos sempre como começam as restrições mas não sabemos como acabam. Assim, se, agora, elegermos o religioso como interdito (deixando de poder fazer críticas explícitas às diferentes religiões), sob o pretexto que isso ofende sentimentos profundos, então, em breve haverá novos “tabus”. Por exemplo, não se poderão caricaturar os presidentes do FC Porto, Benfica e Sporting porque ofende os sentimentos de milhares de adeptos? Ou os dirigentes sindicais de qualquer classe profissional, porque isso é ofensivo para todos os seus membros? Ou, pior ainda, o Presidente da Republica ou o primeiro-ministro, porque são símbolos nacionais?

É certo que há um limite para a nossa liberdade: a liberdade dos outros. Mas a crítica aos comportamentos, hábitos, costumes ou convicções de outrem (por muito violenta ou mordaz que seja) não constitui um atentado à sua liberdade. E, se alguém se sentir difamado ou ofendido, pode sempre recorrer à via judicial para obter uma eventual reparação. Daí que afirmar (como fez o MNE) que os “cartoons” constituem um atentado à liberdade religiosa é, no meu entender, totalmente absurdo.

A liberdade de expressão e de crítica (mesmo para os nossos inimigos) constitui a principal força moral das democracias. Aqueles que defendem a criação de interditos deveriam recordar a exemplar sentença do Supremo Tribunal dos EUA, que absolveu o pornógrafo Larry Flint de uma acusação que lhe foi movida por um grupo de cristãos fundamentalistas.

2 – Apesar de defender o diálogo de civilizações e de entender que todas as culturas têm aspectos positivos e negativos, entendo que o relativismo cultural não é absoluto (sob pena de negação do conceito). Para mim, tem como limite o respeito pela dignidade da pessoa humana em todas as dimensões, ou seja, pelas três gerações dos Direitos Humanos. Estes são valores universais, que respeitam tanto a portugueses ou ingleses como a africanos, árabes ou chineses. Ou seja, não posso admitir, em nome do respeito pelas culturas alheias, que se tolerem práticas como a mutilação genital feminina ou os chamados “crimes de honra”.

3 – Coerentemente com os princípios democráticos que defendo, reconheço aos muçulmanos o direito de se sentirem indignados com as caricaturas de Maomé. Por isso, é perfeitamente legítimo que respondam à letra com “cartoons” anti-ocidentais e que se manifestem na rua contra o que consideram uma ofensa à sua fé. Mas não posso admitir que recorram à violência contra representações diplomáticas e consulares e que ameacem de morte os “cartoonistas” dinamarqueses e os directores de órgãos de informação ocidentais que reproduziram os “cartoons”. E, muito menos, que pretendam impor, às nossas sociedades livres, abertas e laicas, as mesmas restrições que existem na maioria das sociedades islâmicas.

4 – É precisamente por viverem em sociedades não livres (onde a Comunicação Social é rigorosamente controlada pelo Estado e não existe uma verdadeira separação de poderes) que as populações muçulmanas são facilmente manipuladas por aqueles a quem interessa acirrar os ânimos. Na verdade, não entendem que a publicação das caricaturas num jornal dinamarquês não responsabiliza, em nada, o governo da Dinamarca. E que, se pretenderem alguma reparação, terão de interpor uma acção num tribunal dinamarquês, obviamente independente do executivo do país.

5 – Por outro lado, embora eu entenda que a religião e cultura muçulmanas devem ser respeitadas, há que ter em conta que só merece respeito quem respeita os outros. Ora, se há quem não respeite outros povos e culturas são os radicais islâmicos. Nos jornais árabes, são frequentes as ofensas aos judeus, tendo um deles chegado ao ponto de caricaturar Anne Frank na cama com Hitler (!...); os “taliban” destruíram os dois Budas de Bamian (Afeganistão), património da Humanidade; são frequentes, em países muçulmanos (ou onde existem fortes comunidades islâmicas), os ataques a igrejas, sinagogas, templos hindus e budistas. Isto sem falar dos atentados da Al-Qaeda (Nova York, Madrid, Londres, Istambul, Bali) ou dos ataques dos radicais tchechenos a escolas (!...), hospitais (!...) e teatros na Rússia. E que dizer da “fatwa” contra Salman Rushdie, da perseguição à escritora feminista bengali Talisna Nasreen ou do assassinato do realizador holandês Theo Van Gogh? Perante esses lamentáveis acontecimentos, não se viram nas ruas, em sinal de protesto, as turbas ululantes que se vêem hoje!

6 – Na actual crise, há a salientar as hipocrisias, oportunismos, cinismos e cobardias de diferentes actores nas sociedades ocidentais. Assim, a hipocrisia é notória da parte de alguns sectores da direita católica, que tanto se indignaram com a caricatura de António (o preservativo no nariz do Papa João Paulo II), e que se arvoram, agora, em grandes defensores da liberdade de expressão; o mesmo se pode dizer de alguma esquerda “politicamente correcta”, que, então, tanto criticou a intolerância da Igreja Católica e que, hoje, mostra compreensão pelas acções dos islamistas radicais, acusando os “catoonistas” de racismo e xenofobia. Oportunista é a reacção do Vaticano e de outras igrejas que procuram aproveitar a “boleia” para impor restrições à crítica religiosa. Cínica e hipócrita foi a primeira posição da Administração Bush, que mal disfarçou a sua satisfação por ver a UE “queimada” no mundo árabe e islâmico. Cobardia foi o que mostraram os governos europeus, alguns dos quais se apressaram a pedir desculpas por algo de que não tinham qualquer culpa!...Nesse particular, Sócrates e Freitas do Amaral pareceram “um Chamberlain e um Eden da quarta divisão”.

7 – Claro que toda esta crise está refém de um determinado contexto político, onde avultam a vitória do Hamas nas eleições palestinianas, a situação no Líbano e o dossiê nuclear iraniano. Daí o facto de os “cartoons” terem sido publicados em Setembro e só agora rebentar a crise. A primeira colocou sob pressão os regimes árabes ditatoriais e corruptos (sejam monarquias mais ou menos teocráticas, sejam ditaduras laicas e seculares). Este caso deu-lhes, em primeiro lugar, o pretexto para se aproximarem das massas populares e tentar retirar espaço aos seus opositores islamistas. Em segundo lugar, constitui uma advertência ao Ocidente, que, para evitar a subida dos islamistas ao poder em futuras eleições democráticas (algo que apareceria cada vez como mais indesejável), estaria condenado a manter os actuais regimes. Alguém acredita que, na Síria, um dos Estados mais autocráticos da região, a polícia não consiga controlar uma manifestação? Aqui, existiu, claramente, uma tentativa do regime sírio de aproveitar a situação para recuperar a influência perdida no Líbano. No caso do Irão, será uma forma de a ala radical do poder teocrático (liderada pelo presidente Ahmadinedjad) mobilizar a população, ao associar as pressões ocidentais contra o nuclear a uma campanha anti-islâmica do Ocidente.

8 – Independentemente dos contextos, há algo que reputo de essencial: a liberdade de expressão é um valor essencial da democracia. Como tal, não é negociável, muito menos sob pressão dos seus piores inimigos. É chegada a altura de dizer “Basta!”. Temos de abandonar o “politicamente correcto” e deixarmos de fingir que não existe um problema entre nós e o mundo islâmico. Ele existe e vamos ter de encará-lo de frente. Com espírito de diálogo e sempre com intuitos pacifistas, mas sem medos e sem cedências em pontos essenciais. Face às tibiezas dos governantes, parece ser altura de as suas sociedades civis dos países europeus mostrarem, por todos os meios democráticos e pacíficos ao seu alcance, que as ameaças não nos intimidam e que estamos dispostos a defender as nossas liberdades.

(Jorge Martins)

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O seu argumento foi o de que eram os países mais contrários à guerra no Iraque que mais “mas” punham a propósito das caricaturas de Maomé. Não me parece que seja verdade. Foi Straw e a administração americana quem mais disseram que eram contra a publicação das caricaturas. De onde poderei retirar que eles foram contra a guerra do Iraque? Permita-me esta correcção, porque não me parece completamente tonto lembrá-lo.

A verdade é que Straw também disse que a Turquia é um grande país europeu. Donde posso concluir que neste jogo de espelhos é natural que num mundo governado por palhinhas e arbustos sejam naturais estes tipos de confusões.

Como vejo que no seu blog tem uma visita a esse maravilhoso país asiático que ministros analfabetos se lembraram de qualificar de europeu percebo que um ou outro sofisma escapa insindicado na comunicação social.

Perdoe-me mais uma vez este incómodo, mas parece-me o que falta no espaço público não é saber de cálculo tensorial nem do Theravada, mas uma elementar instrução primária. Um jornalista mais avisado de lógica ter-lhe-ia chamado a atenção para o paralogismo.

(Alexandre de Castro Brandão de Melo e Veiga)

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A avaliação, à luz dos acontecimentos recentes, de uma eventual compatibilidade entre islão e liberdade de expressão, que conduz, aliás, à análise daquilo que o liga às raízes do terrorismo, desenrola-se, normalmente, com grande desconhecimento das fontes canónicas, das fontes fundamentais estruturantes do islão. Deve-se isto, frequentemente, quer a omissões deliberadas por parte dos clérigos muçulmanos perante os não crentes quer a pura e simples ignorância dos não muçulmanos. Ora, para se abordar um assunto como este com um mínimo de critério, é necessário algum conhecimento dessas fontes: corão, sira (biografias de Maomé), hadith ou sunna (relatos pormenorizados, coligidos por muçulmanos pios, com base em, pelo menos, três testemunhos da vida e ditos do respectivo profeta).

Para quem se der a esse trabalho, nomeadamente através da consulta de bases de dados islâmicas (por exemplo), é rápida a conclusão de que Maomé foi muito pródigo em ordens de assassinato de todos aqueles que se lhe opuseram.

O primeiro assassinato por ordem de Maomé, de que encontramos descrição nas fontes islâmicas, foi o de uma mulher, viúva, de nome Asma, que compôs versos satirizando o autoproclamado profeta. Uma situação em muito semelhante àquela com que actualmente nos deparamos. Maomé desafiou os seus seguidores a assassinarem a mulher que o afrontou no terreno da ironia. Quem respondeu ao desafio foi um discípulo cego chamado Umair. O devoto apunhalou-a enquanto esta dormia amamentando o seu bebé. Segundo os relatos, ao ouvir isto, Maomé exclamou: «Vede um homem que assistiu o Senhor e o seu profeta. Chamai-lhe não cego, mas antes Umair “o vidente”.

De muitos mais assassinatos às ordens de Maomé se encontra descrição nos hadith.

Alguns exemplos, em tradução directa a partir da colectânea de Al Bukhari, tal como constam da referida base de dados islâmica:

Volume 4, Livro 52, Número 259:

Narrado por Abu Huraira:

O Apóstolo de Alá enviou-nos numa missão (i.e. missão armada) e disse: “se encontrardes fulano e sicrano, queimai-os a ambos com fogo”. Quando estávamos prestes a partir, o Apóstolo de Alá disse: “ordenei-vos que queimásseis fulano e sicrano, e ninguém senão Alá pune com o fogo, portanto, se os encontrardes, matai-os”.


Volume 4, Livro 52, Número 265:

Narrado por Al-Bara bin Azib:

O Apóstolo de Alá enviou um grupo dos de Ansar a Abu Rafi. Abdullah bin Atik penetrou na sua casa durante a noite e matou-o enquanto ele dormia”

Volume 4, Livro 52, Número 270:

Narrado por Jabir bin 'Abdullah:

O Profeta disse: “Quem está disposto a matar Ka'b bin Al-Ashraf, que ofendeu deveras Alá e o seu Profeta?” Muhammad bin Maslama disse: “Ó Apóstolo de Alá! Queres que eu o mate?” Ele respondeu afirmativamente. Assim, Muhammad bin Maslama dirigiu-se a ele (i.e. Ka'b) e disse: “Esta pessoa (i.e. o Profeta) encarregou-nos de pedir por caridade”. Ka'b replicou: “Por Alá, cansar-vos-eis dele”. Muhammad disse-lhe: “Temo-lo seguido, portanto desagrada-nos abandoná-lo antes de assistirmos ao fim da sua missão”. Muhammad bin Maslama continuou a conversar com ele desta forma até que encontrou oportunidade para o matar.

Volume 8, Livro 82, Número 795:

Narrado por Anas:

O Profeta cortou as mãos e os pés dos homens da tribo dos ‘Uraina e não cauterizou (os seus membros a esvair-se em sangue) até que por fim eles morreram.

Estes hadith de Al Bukhari são fontes incontornáveis e incontestáveis do islão. Nenhum muçulmano pio pode ou deve ignorá-las. Não nos esqueçamos que, no islão, Maomé é considerado como o máximo exemplo de vida, o homem mais perfeito que jamais caminhou ou caminhará sobre a terra.

Atente-se também no que diz o corão. Por exemplo:

Sura 9, versículo :5 :"Mas quando passarem os meses de interdição, então combatei e matai pela espada todos aqueles que associam outros deuses a Alá onde quer que os encontreis; cercai-os, assaltai-os pela força, esperai-os com toda a espécie de emboscadas...”.

De igual modo, a sura 47, versículo 4: “Quando encontrardes os infiéis, cortai-lhes a cabeça, até fazerdes grande matança entre eles”.

A sura 9, versículo 29, afirma: “fazei a guerra contra aqueles que tomaram conhecimento das escrituras e não acreditaram em Alá, ou no dia do juízo, e que não proíbem o que Alá e o seu apóstolo proibiram... até que paguem tributo”.

A sura 5, versículo 33, ordena: “a recompensa daqueles que combatem Alá e o seu Mensageiro, e espalham a desordem sobre a terra, é apenas a de que devem ser mortos, ou crucificados, ou terem as suas mãos e pés amputados em lados opostos...


Na sura 48, versículos 16-17, lê-se que todos os que morrem “a combater na guerra do Senhor (Jihad)” são ricamente recompensados, mas aqueles que batem em retirada são dolorosamente castigados.

A matança, por decapitação, dos cerca de 600-700 homens da tribo judia dos Banu Kuraiza de Medina, que se haviam rendido às tropas de Maomé, oferece um dos primeiros testemunhos da prática destas suras e preceitos corânicos. Repare-se que, segundo os relatos, a matança durou todo o dia, do raiar ao pôr do sol, e Maomé assistiu e orientou, imperturbável, as operações que se desenrolaram na praça principal da cidade. Até ficar com sangue pelos artelhos, segundo o ufano cronista. Deu, depois, ordens que as mulheres e crianças dessa tribo fossem reduzidas ao concubinato e à escravatura.

Quanto ao tratamento a dar às mulheres não muçulmanas cativas, atente-se neste hadith, também de Al Bukhari:

Capítulo 22, Livro 8, Número 3371:

Abu Sirma disse a Abu Sa'id al Khadri (que Alá se agrade dele): “Ó Abu Sa'id, ouviste o Mensageiro de Alá (a paz desça sobre ele) referir-se ao al-'azl [coito interrompido]? Disse ele: “Sim” e acrescentou: “Fomos em expedição com o Mensageiro de Alá (a paz desça sobre ele) contra os de Bi'l-Mustaliq e capturámos algumas mulheres árabes esplêndidas, e desejávamo-las, pois sofríamos da ausência das nossas mulheres (mas ao mesmo tempo) também desejávamos obter resgate por elas. Por isso, decidimos ter relações sexuais com elas observando o 'azl (retirando o órgão sexual masculino antes da emissão de sémen para evitar a concepção). Mas dissemos uns aos outros: “estamos a praticar um acto enquanto o Mensageiro de Alá se encontra entre nós, porque não perguntar-lhe?” Interrogámos, portanto, o Mensageiro de Alá (a paz desça sobre ele), que disse: “não tem importância alguma que o façais dessa forma ou da outra, pois todas as almas que tiverem de nascer daqui até ao Dia da Ressurreição hão de nascer”.

Ou no Capítulo 22, Livro 8, Número 3373:

Abu Sa'id al-Khudri (que Alá se agrade dele) relatou: “Fizemos cativas algumas mulheres e queríamos praticar o 'azl com elas. Perguntámos então ao Mensageiro de Alá (a paz desça sobre ele) o que fazer, e ele disse-nos: “Na verdade, fazei-o, na verdade, fazei-o, na verdade, fazei-o, mas a alma que tiver de nascer daqui até ao Dia do Julgamento há de nascer.

Como se vê, para Maomé, a violação de cativas pelos muçulmanos é livre e nada importa que seja feita com coitus interruptus ou de outra forma.

Tudo isto demonstra a fortíssima ligação, desde a origem, entre islão e terrorismo.

A questão, para os muçulmanos, não é a da opção entre fundamentalistas e moderados, que é em larga medida uma ficção ocidental, mas saber se o islão é capaz de pensar criticamente estas suas fontes e de as rejeitar. Só isto permitirá que o islão aceda a uma civilização de respeito pelos direitos humanos, de respeito pela dignidade do homem, caso contrário será sempre uma poderosa força para degradação humana.

Eis aquilo a que os muçulmanos devem dar resposta: «Aceita ou não aceita estas passagens, partes indesmentivelmente integrantes do Islão mas merecedoras de severo exame e crítica? Rejeita-as no seu conteúdo? Não rejeita? Condena ou não condena os referidos actos de Maomé?»

Só a resposta a estas questões permitirá aferir do grau de moderação de um muçulmano e do seu respeito pela restante humanidade.

Talvez que o primeiro assunto a tratar por um muçulmano, a propósito do islão, que traduzido literalmente significa “submissão” e não “paz”, como nos querem fazer crer, seja o de dar resposta à questão do quantum de submissão compatível com a humanidade do homem.

Sinto-me com todo o direito a criticar, violentamente se necessário, com ironia e sarcasmo se me apetecer, todos estes e quaisquer outros aspectos do islão e da vida do seu profeta, Mafamede. Um cartoon é apenas uma forma condensada de crítica. Assistem-lhe os mesmos direitos que ao discurso verbalizado. Como tal, não vejo como se possa cercear legalmente, seja de que forma for, o exercício do direito a caricaturar, quando este exercício não contém em si nenhuma violência que não seja o furor da indignação da consciência. Não tem validade alguma o argumento de que isso pode ferir susceptibilidades. Essa é a própria essência da liberdade de expressão.

É extremamente infeliz, vergonhoso, que pessoas com responsabilidades representativas do Estado português, um Estado que se quer democrático, civilizado e respeitador dos direitos humanos, como é o caso do Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, não o consigam entender.

Por este andar, quais os livros a lançar ao fogo? Quais as páginas da literatura a apagar? As do humor virulento dos dadaístas? As da ironia surrealista? Cesariny? O’Neill?... Ou talvez Camões?... Gil Vicente?...

Pode-se compreender que quem viveu e conviveu, tranquila e refasteladamente, com o regime de Oliveira Baltazar tenha pouco apreço pelas liberdades próprias de um Estado democrático respeitador da dignidade humana, que junte, até, a sua voz ao coro ululante de protestos dos filo-fascistas contra a liberdade de expressão. Não custa perceber que aos nostálgicos de totalitarismos para-estalinistas, caso de alguns representantes de partidos comunistas e de mais alguns, cause engulho a livre expressão de ideias e de ideais.

Mas tais fenómenos são de molde a repugnar profundamente toda e qualquer pessoa que preze a liberdade, alicerce da dignidade do homem.

Porque é muito triste assistir à capitulação da civilização perante a barbárie.

(Manuel Barros)

*

A sua, como a de todas as que têm aparecido na televisão, concepção de liberdade parece-me pouco profunda. não é por acaso que se tem utilizado «liberdade de expressão» em vez de «liberdade». Aqui ocorre o mesmo que entre a «justiça social» e a justiça»: inconscientemente altera-se-lhes o termo por motivos que agora não importa aprofundar...

O que tenho para lhe dizer é o seguinte: a liberdade é essencialmente uma conquista do sujeito e adquire-se pelo saber. Se eu souber, por exemplo, o que é uma alimentação saudável, melhoro as possibilidades de evitar a servidão da doença. A ignorância é, portanto, o maior inimigo da liberdade e o saber o seu maior amigo.

Pôr a «liberdade de expressão» como algo de fundamental e sagrado parece-me algo de pessoas que não são livres...

Se lhe interessar, pode aprofundar o assunto no prefácio da tradução portuguesa do "Ensaio sobre a Liberdade" de Stuart Mill.

(Luis Barata)

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"Os sentimentos religiosos devem ser respeitados e a liberdade de expressão não pode ser confundida com liberdade de provocação, contudo há que respeitar os outros se queremos ser respeitados. Foram muito poucos os dirigentes ou religiosos muçulmanos que condenaram a destruição das estátuas centenárias de Buda, no Afeganistão, em 2001 (pelos fanáticos Talibã) e em termos de provocação religiosa a história das caricaturas é incomparavelmente menos grave do que a destruição de monumentos seculares. Também não me recordo de nenhum comunicado do MNE Português condenando essa destruição, mas deve ser falha minha."

(P.Bandeira)

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Tal como a generalidade dos os ocidentais, também a mim me parecem exageradas e absurdas as imagens dos protestos muçulmanos por causa daquilo que é para nós um simples cartoon.

Mas pensando melhor, nós nunca nos conseguimos posicionar completamente dentro do ponto de vista dum muçulmano para saber o quanto a sua sensibilidade pode ficar ferida por causa duma brincadeira deste género.

Quando oiço falar da tradição de liberdade de expressão no mundo Ocidental, penso que neste momento ninguém se está a lembrar do que pode provocar a muitas consciências ocidentais, por exemplo, uma brincadeira deste tipo mas alusiva ao tema do nazismo. Sabemos que na Alemanha, e noutros países europeus, são proibidas certas manifestações neo-nazis. E também me lembro do escândalo provocado por um símbolo nazi que o príncipe Harry da Inglaterra exibiu inconscientemente, há uns meses atrás, numa festa de estudantes. Ora, o mesmo tipo de ofensa podem sentir os muçulmanos por esta provocação a um "simples" símbolo religioso e isso nunca será completamente compreendido por uma mente ocidental.

Mas acredito que o que está em causa no exagero destas manifestações, só se pode explicar por duas coisas: pela manipulação que alguns grupos radicais estão a levar a cabo, aproveitando-se da situação, mas também seria interessante fazer uma análise que as relacionasse com o mesmo tipo de fenómeno de revolta que aconteceu recentemente por toda a França, desta vez está à escala mundial. Os motivos de fundo podem ser o choque, cada vez maior, entre interesses ocidentais e as comunidades islâmicas, mas que pouco têm que ver com motivos religiosos.

(Sergio Pinto)

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Neste outro continente onde me encontro, o debate é de outra natureza. Já em Guerra, o presidente (encontro-me nos Estados Unidos) apela ao diálogo e ao respeito. Não se publicam os cartoons na imprensa escrita porque se assume que há acesso automatico a internet. No país da primazia da liberdade de expressão, a imprensa escrita teme por demais as represálias. Assume-se que a liberdade de expressão é para opiniões extremas e para ocasiões de ódio.
A moderacao e a auto censura imperam nos media, mais por medo de represalias economicas do que por outro qualquer motivo. Os americanos acham europeus um povo estranho, que geralmente “do not put their money where their mouths are”. Parece ser verdade se esquecermos as licões de historia. Mas eu sou dum tempo que leu sobre as batalhas de Dom Afonso Henriques, das campanhas das Cruzadas , do Império Ottomano, das conquistas de Alexandre o Grande. Na continuidade da história se encontra o ponto fulcral para o qual nos dirigimos. Nao esqueçamos o passado para prever o futuro. Os dias límpidos, de optimismo e de crescente euforia passaram. A encruzilhada da Guerra estará no horizonte?

PS mais uma vez, obrigada pelas diversas visoes que apresenta...conto cada vez mais com a riqueza que e uma visao, secular intelectual , europeia e tao diferente do que neste momento reina na net e media...medo ou arrogancia...

(Manuela Silva)

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O debate sobre os cartoons dinamarqueses está um verdadeiro turbilhão, cada vez mais impenetrável. No Abrupto e outros locais, falta alguma sistematização das inúmeras intervenções.
Posso estar enganado, mas parece-me que ninguém analisou o contexto em que os desenhos foram publicados lá no jornal da Dinamarca. Segundo entendi do que disse Marcelo Rebelo de Sousa na RTP, a publicação foi um acto deliberado e ostensivo de provocação aos muçulmanos locais, foi uma expressão de um movimento dinamarquês racista e xenófobo a que o jornal dará habitualmente cobertura.
Ora, a lei da Dinamarca dá aos muçulmanos locais o direito de accionarem um processo judicial contra o jornal que os ofendeu. Então, porque é que eles não usaram esse direito?
Será que na Europa estamos a fazer, junto das comunidades não europeias que vivem connosco, a necessária pedagogia acerca dos direitos que lhes assistem?
E será que as organizações que representam essas comunidades estão verdadeiramente motivadas para accionar esses direitos dos seus representados? Ou será que,na verdade, representam outros interesses mais obscuros? Ou que têm objectivos menos confessáveis?

Por outras palavras: o aumento do racismo e da xenofobia organizados, o crescendo do ódio de parte a parte, em plena Europa da liberdade e da tolerância, no seio da civilização mais evoluída do Mundo - estas questões é que, digo eu, deviam ser o primeiro motivo da nossa preocupação e o centro do debate.
Mas parece que não é isso que se está a debater – parece que se está a fugir a essas questões. Discute-se o que se passa nos países islâmicos, não se discute o que se passa debaixo dos nossos narizes.

(Joaquim Jordão)

*

Há alguns anos, enquanto fazia um interrail com mais dois amigos, visitei o Museu de Arte Moderna em Helsínquia. A minha capacidade de avaliar a arte contemporânea é muito limitada, pelo que apenas posso seguir o meu instinto. Uma das obras que figurava era um quadro onde figurava Jesus Cristo a ser sodomizado pelo Rato Mickey. Isso mesmo. Eu não conseguia deixar de achar piada àquilo, embora deva confessar que me deixava também desconfortável e que era de um certo mau gosto. Mas a provocação tinha piada.
Os meus dois amigos que estavam comigo (e que tinham andado comigo durante vários anos num colégio católico) achavam o quadro uma vergonha, uma coisa sem nenhum sentido artístico, uma simples provocação reles e gratuita que não nos elevava em nada.
Na altura ri-me. Mas ao comparar a sua reacção com os dias de hoje não posso deixar de sentir uma certa nostalgia por um tempo em que a vida espiritual era entendida, quase unanimemente como algo de individual e pessoal, e as discussões que envolvessem a sua exteriorização se podiam resumir a uma questão de gosto artístico. Era quanto muito a vida espiritual que estava em causa, nunca a política, como é hoje.

O episódio dos “cartoons” é a melhor demonstração do carácter profundamente político desta guerra, tal como a guerra fria não se resumiu apenas a uma simples questão geopolítica de interesses divergentes, como uma certa esquerda pretende apresentar agora a segunda metade do século XX.
Nesse tempo também foi difícil saber onde estava a “verdade”. Mas para aqueles que hoje não se sentem seguros para assumir o que é a “verdade”, resta-nos a consolação de que embora não possamos saber o que é verdade com toda a certeza, podemos saber o que é mentira.
Determinar e provar constantemente o que é uma e outra é o desafio político do início deste século, e um estímulo para quem gosta de Política. Mas não deixa de ser “difícil viver em tempos interessantes”.

(João Lopes)

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Também cá dentro da nossa Europa existem bolsas de obscurantismo. A Grécia continua a ser um estado não laico, regime que o governo de direita ( ND) tende a perpetuar. Refiro-me às acusações de blasfémia que poderiam ter dado pena de prisão a um cartoonista austríaco por ter feito humor com a figura de Jesus Cristo.

O autor foi ilibado mas a acusação existiu num estado da UE.

(João Lencart e Silva)

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Começo por dizer que estou profundamente chocado pela forma como alguns dos leitores do Abrupto aconselham a que a liberdade de expressão tenha limites impostos "por alguém"...
Mais me espanto quando as "forças de esquerda" defendem de uma maneira assustadora de que os cartoons da polémica não deviam ser publicados.
Como Pacheco Pereira disse, liberdade de expressão, ou se tem ou não se tem, não podem existir zonas cinzentas, nem qualquer expressão "sim, mas...".
Uma questão continua a martelar na minha cabeça, durante meses ouvimos PS e PCP defenderem que era preciso lutar contra o "bicho-papão" da direita, e depois quando todos esperávamos uma reacção condizente ao caso das caricaturas de Maomé, o MNE de um governo socialista, vem dizer que os cartoons não deviam ser publicados, no que foi secundado por dirigentes do PCP...

(César Silva)

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Concordo com este seu texto, mas não posso deixar de o corrigir, pois o JP vende 150.00 cópias num país de 5.000.000 de pessoas.

Tem havido muita desinformação em relação ao jornal. Trata-se de um jornal com um a orientação de centro-direita, mas nunca extremista ou xenófobo como alguns comentadores têm dito.

(Bruno Ricardo Pais)

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Sobre o comentário do leitor C. Medina Ribeiro:

O caso do Ministro Carlos Borrego e da triste piada sobre os diabéticos mortos por ingestão de alumínio é um belo exemplo daquilo que se discute. O Ministro não podia ter agido pior, ao contar essa anedota. Não por achar que a liberdade de expressão tenha determinados limites, mas sim porque, no humor, há sempre que ter em conta o contexto em que se produz qualquer tipo de material pretensamente engraçado. Da mesma forma que é de extremo mau gosto contar uma anedota sobre a morte num funeral, ou sobre nazis e judeus a familiares de vítimas do Holocausto, também o Ministro deveria ter estado calado. A isto chama-se bom senso. Isso nada tem a ver com liberdade de expressão. O Ministro foi demitido por motivos políticos (era insustentável a sua manutenção no cargo depois desse caso), e não por ter violado qualquer lei.

Ou seja: o humor tem que ser, necessariamente, enquadrado, por uma questão de sensibilidade e respeito para com aqueles que, verdadeiramente, se possam sentir magoados pelo seu teor. No entanto, não é nada disso aquilo que se passa neste caso das caricaturas de Maomé. A não ser que seja o próprio profeta a interpôr um processo contra os jornais que publicaram o cartoon e contra o cartoonista, mais ninguém se pode sentir ofendido.

É por isso também que discordo da nota nº 1, do leitor Medina Ribeiro. O artigo do Código Penal que referiu nunca se poderia aplicar ao caso em questão. As caricaturas não ofendem qualquer pessoa nem dela escarnecem em função da sua crença. Aquilo que acontece, infelizmente, é que temos um sem número de pessoas, largamente manipuladas (quantos daqueles que atacam as embaixadas viram, verdadeiramente, o cartoon?), e que se identificam com as práticas terroristas. Ora, esses, são exactamente aqueles que menos ofendidos podem estar com o cartoon. A insinuação pode, quando muito, indignar aqueles muçulmanos que repudiem o terrorismo e que não aceitem as inúmeras insinuações de ligação do islamismo ao terror, mas nunca aqueles que se mandam embombados contra as paredes de edifícios públicos. Esses devem, isso sim, sentir-se justamente representados pelo cartoon, e na figura de um inexistente Maomé bombista.

Aquilo que envergonha o islamismo e os maometanos, como referia recentemente uma edição jordana, são as notícias de palestinianos a explodir com autocarros, em Israel e na Palestina.

Todos temos o direito à indignação, por tudo aquilo que, na imprensa ou na rua, nos ofenda, e que consideremos despropositadamente agressivo. É essa a contrapartida válida da liberdade de imprensa, de expressão e de opinião. Se alguém tem o direito de defender ideias que nos ofendam, também nós temos o direito de, nos mesmos moldes, as repudiar. O único limite à liberdade de expressão é a difamação, e aí existem os tribunais para a julgar.

É triste vermos que o continente onde estas conquistas custaram tanto sofrimento - e o país onde estas conquistas são tão recentes - a vergar-se rapidamente ao medo do fundamentalismo, e a pôr descaradamente na gaveta tudo aquilo que torna a vida na Europa em algo minimamente vivível.

(Artur Vieira)

*

Toda esta questão relativa aos cartoons dinamarqueses deu-me uma enorme vontade de reler "O Nome da Rosa". Se bem se lembra, nessa obra notável de Umberto Eco disserta-se, entre outros temas, sobre os nefastos efeitos da comédia e do riso, supostamente contrários aos desejos e ensinamentos de Deus. A personagem do "venerável Jorge" recorre mesmo a vários assassinatos para evitar a disseminação de textos e iluminuras de cariz satírico e cómico que não seriam do agrado da sua ortodoxa doutrina cristã.

Estava-se, então, na Idade Média e no tempo dos hereges quando muitos corpos humanos alimentavam fogueiras em nome da fé cristã. Felizmente, nestas terras europeias, tais tempos desapareceram e existe, hoje, uma cultura de tolerância e liberdade que em muito veio beneficiar a vida e a consciência dos homens. Infelizmente, passados oito séculos, ainda existem pessoas de outras terras e culturas que ainda pensam que a censura, a ignorância e o medo são o melhor para as pessoas que para elas olham com veneração e respeito.

(Uma pequena interrogação: Não será precisamente para manterem esse poder e estatuto, baseado apenas na fé, que certos líderes religiosos guardam para si toda a informação, verdade e interpretação teológica e condenam quaisquer manifestações de dúvida ou de evolução doutrinária?)

Os líderes católicos também foram responsáveis pelo atraso intelectual dos fiéis, mas isto passou-se há mais de sete séculos. Por alguns senhores fundamentalistas ainda quererem viver e manter os seus povos na Idade Média, teremos também nós, ocidentais, que retroceder no tempo e abandonar princípios que se tornaram, para nós, invioláveis e que tanto custaram a conquistar?

Se esses fundamentalistas preferem viver sem liberdade de pensamento e expressão, sem margem para críticas e sob o jugo de uma lei religiosa arcaica e draconiana que tudo vê e controla com os olhos da fé islâmica, muito bem. Agora, não nos venham obrigar a partilhar essa mesma visão do Mundo. Meus caros amigos: Já passamos por lá! Não gostámos e felizmente evoluímos! A Liberdade é um bem do qual não estamos dispostos a abdicar ou a fazer concessões, por muito que vos incomode!

P. S.: Acabei de ler o comunicado do ministro dos Negócios Estrangeiros e como deve de adivinhar discordo frontalmente. Se alguma posição oficial deveria de ter sido tomada seria exacatamente a contrária. Qualquer coisa como: "Lamentamos muito que ficassem ofendidos mas, devido a uma coisa chamada liberdade de expressão, nenhum Estado é responsável ou controla as opiniões emitidas pelos seus cidadão. Por esta razão, lamentamos, ainda, as coléricas manifestações e os violentos ataques despropositados e gratuitos a embaixadas de países europeus cujo único crime é o de não possuírem censura. Se desejarem, enviaremos os necessários diplomas legais para que possam protestar e contestar no local e modo adequados: um processo judicial no tribunal!"

(Tiago Rodrigues Alves)

*

As caricaturas publicadas de Maomé levantam, além das diversas questões já vistas no seu blog, pelo menos uma outra que julgo merecer alguma reflexão. Antes de a referir devo esclarecer que simpatizo com muito do que tem sido dito acerca da intolerância dos muçulmanos e até de alguns aspectos da religião islâmica.

Mas quero falar da liberdade de imprensa. Contrariamente ao que muitos afirmam, não tem um valor absoluto. E aí estão as leis que regulam essa liberdade em todos os países democráticos. Em geral, e isto decorre do exercício mais geral da liberdade cívica, não é possível, e os prevaricadores susceptíveis de serem penalisados, insultar outrem. Os exemplos de indivíduos que se sentem insultados pela imprensa portuguesa são inúmeros, e com frequência os tribunais aplicam multas aos jornalistas e directores de jornais por esses factos.

Se um indivíduo não pode ser insultado, é um facto, eu pelo menos não conheço, que se pode insultar um grupo de pessoas sem qualquer perigo de o jornalista ser penalisado. Foi exactamente isto que aconteceu agora. Com ou sem razão, é indiferente para o argumento, os muçulmanos sentiram-se ofendidos e reagiram em consequência. Não sou ingénuo quanto a essas formas de indignação. O que quer apenas afirmar, ou melhor questionar, é saber porque razão não se pode insultar um indivíduo, mas se pode insultar um grupo de pessoas?

De resto veja-se que a imprensa em geral é muito cuidadosa com certos grupos, que procura não ofender, p.e. os homossexuais, o que aliás me parece bem. Haverá alguém que afirme existir alguma espécie de autocensura? Penso que não. Mas é um facto que este grupo em especial não é vilipendiado, como não são outros grupos ( professores, juízes, estudantes, funcionários públicos, militares, empresários, etc). E no entanto as notícias dos últimos dias poderiam ser uma fonte inesgotável de caricaturas. Se não existem é porque provavelmente há um certo consenso social em relação a estes grupos que restringe efectivamente o uso da tal liberdade de imprensa.

Neste contexto os muçulmanos parecem não beneficiar deste privilégio. Eu penso que seria preferível que o fossem.

(Calado Lopes)

*

As respostas publicadas nos seu blog têm sido interessantes a vários níveis. Noto contudo que mesmo os comentários mais sóbrios insistem demasiado nos aspectos do confronto do nós contra o eles. Os desenhos estão a ser atacados pelo mundo fora não por serem racistas mas sim por serem blasfemos. Não há nós nem eles, apenas liberdade ou falta dela.

O impacto na cultura desta submissão dos governos é um dos pontos que me toca mais, quem se atreveria hoje em dia a representar "Le fanatisme, ou Mahomet le prophète" de Voltaire?

Eu não quero ter que ler o Inferno de Dante, ou o Paraíso perdido de Milton, ou ver os quadros de Bacon, às escondidas, só porque são blasfemos. Basta ver os problemas que a ciência enfrenta no outro lado do oceano com o fundamentalismo religioso (o mais recente é a celeuma do Big-Bang na própria NASA).

(Jorge Filipe)


(Continua)

8.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO EM ISTAMBUL, TURQUIA


Limpeza de cabines telefónicas / Venda de bandeiras.

(Paula Alexandra Almeida)

7.2.06
 


DEZ ANOS DE COMMAND & CONQUER












Saiu hoje. É pena não ser um jogo novo, mas a compilação de dez anos de Command & Conquer, o meu jogo favorito, será bem-vinda.
 


NOTÍCIA TRISTE

O encerramento da Sampaio Ferreira & Cª de Riba de Ave, uma fábrica que conheci bem dos meus tempos de antigamente.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
CONCORDÂNCIAS, DISCORDÃNCIAS E OUTRAS DÂNCIAS
(Actualizado)



NOTA: alguma correspondência enviada de fora de Portugal não tem acentos. Corrigi um ou outro caso, mas continua a haver missivas não acentuadas.

Ontem no prós e contras a meu ver foram ditas por verdades tamanhas mentiras.
Vamos aos argumentos.
Quando se afirma que a liberdade de expressão está acima de qualquer (direito de) indignação pelo o que é publicado, estamos a inverter o sentido da liberdade.
Quando se afirma que a liberdade de expressão custou muito sangue, estamos afirmar que a partir desta conquista tudo é viável...
O meu problema e, o nosso problema é limitar a liberdade. Ao dizermos que a minha liberdade termina onde começa a liberdade do outro é dizer que nas nossas sociedades ocidentais a liberdade conquistou-se à custa da afirmação do ego e do alter e, acima de tudo, pelo respeito do outro.
Porque se afirmamos que podemos usar a liberdade, mesmo que isso provoque sofrimento ao outro (falta de respeito pelas suas convicções) em nome do valor da liberdade então, no limite, a indignação dos árabes para com as embaixadas ocidentais, pode ser uma expressão da sua liberdade.
Isto para dizer que todo valor terreno (liberdade) tem limites. Estes estão quando o projecto que cada um faz ou uma sociedade em direcção ao bem
(liberdade) provoca sofrimento no outro.
Assim, não compreendo como poderei ser livre se o queme possibilita ser livre atenta contra o alter.

(José Carlos Lima)

*

Uma coisa é a defesa do multiculturalismo e a especificidade de cada cultura/religião. Outra é a aceitação de fundamentalismos. E multiculturalismo, neste caso, não é apenas a aceitação de valores culturais muçulmanos por parte dos ocidentais, como muitas vezes se coloca a questão para não ferir susceptibilidades e para dar o ar de que somos tolerantes. E há que meter na cabeça que a religião muçulmana - ou os estados religiosos muçulmanos - não se pode sobrepôr a uma garantia que já existe há algum tempo no mundo ocidental, independentemente do que é dito sobre essa mesma religião. No entanto, o direito a defenderem-se e mostrar o seu desagrado também existe e está consagrado institucionalmente, e se o quiserem fazer, podem-no fazer. Mas não é isso que está a acontecer.

E se há coisa que por vezes muita gente não quer perceber é que existe liberdade de expressão, ponto. E aqui não pode haver cedências, independentemente de que se ache de mau gosto os cartoons. Pessoalmente, acho que alguns desses cartoons são de uma falta de senso e perfeitamente ridículos. E sou da opinião que da primeira vez que foram editados no jornal dinamarquês, houve um propósito político bem claro.
Contudo, independentemente de gostar ou não, de estar de acordo ou não, o que não posso criticar é um aspecto fundamental, que é o direito de publicarem aquilo que quiserem. Lembro-me da famosa frase de Voltaire: "Senhor, sou contra tudo o que vossa senhoria disse, mas defenderei até a morte o seu direito de dize-la"

Finalmente, pode-se discutir a forma de resolver este problema. Se por um lado temos a resolução através do apelo ao bom senso e a diplomacia como forma de apaziguar a fúria fundamentalista, por outro - e se estivermos dispostos a pagar um possível preço (ocorre-me de momento um aumento do petróleo e um ou outro atentado terrorista) - a solução passa pela publicação maciça dos cartoons em todos os jornais ocidentais durante um certo tempo, como forma de protesto e mostrar que a liberdade de expressão existe. Será uma provocação, sem dúvida. Mas ambas as vias são possíveis e aceitáveis.

(Tiago André Pereira)

*


O tema já é velho mas, numa sociedade globalizada como é a nossa actualmente, o problema desencadeado pelas caricaturas de Maomé (que incendiaram o mundo islâmico - qualquer coisa como 1300 milhões de pessoas!) faz-nos recordar que há certos temas que devem ser objecto de cuidados acrescidos, especialmente quando se pretende usá-los para fazer humor.

Aliás, foi precisamente essa a opinião manifestada há dias por Raúl Solnado na TSF quando, juntamente com António Feio e Ricardo Araújo Pereira respondeu à questão que Carlos Pinto Coelho colocou: «Pode fazer-se humor com tudo?».
Enquanto os dois mais jovens defenderam que sim, Solnado foi prudente e socorreu-se de um exemplo que - mal ele sabia! - pouco depois viria a revelar-se perfeitamente apropriado: «Com a religião é preciso cuidado...» - pois é algo que mexe com o «sagrado», terreno altamente melindroso em que o nosso direito de fazer humor pode facilmente esbarrar com o direito que os crentes têm de não ser agredidos nos seus sentimentos mais profundos.
Tudo dependerá, também, da assistência, pois uma graçola que, contada à mesa do café, faz rir três pessoas, pode, se publicada num órgão de informação de grande audiência, revelar-se explosiva.

Há uns anos, e devido ao excesso de alumínio na água, vários diabéticos morreram num centro de hemodiálise em Évora, facto esse que inspirou Carlos Borrego, à altura ministro do Ambiente, a contar em público uma anedota segundo a qual se podia obter alumínio reciclando os mortos.
Foi demitido, mas é bem possível que tenha pensado (como agora oiço dizer em relação ao caso que está a dividir o mundo) que apenas estava a exercer o seu sagrado direito de liberdade de expressão de pensamento. Imagino que tenha sido também o que pensavam os adolescentes que há dias, em Lagos, andavam a fazer graffitis em residências, lojas e monumentos... até serem detidos pela PSP.

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Nota 1- O nosso Código Penal prevê pena de prisão para quem cometa «ultraje por motivo de crença religiosa, quem PUBLICAMENTE ofender pessoa ou dela escarnecer em razão da sua crença ou função religiosa por forma adequada a perturbar a paz pública». No entanto, no caso em apreço, o recurso aos tribunias não teria qualquer efeito, visto que o pretenso crime não parece sê-lo no país onde foi "cometido".

Nota 2 - O jornal dinamarquês em causa recusou-se em tempos a publicar caricaturas de Cristo... porque seriam ofensivas.

Nota 3 - Neste caso não é possível o velho argumento «Gostavas que te fizessem o mesmo?» porque a nossa noção de "valores" está de rastos.
Veja-se, em Portugal, o achincalhar do Hino e da Bandeira - neste caso, até Mário Soares se permitiu "martelar" o Escudo, para fazer dele um coração foleiro - perante a total passividade do povo...

C. Medina Ribeiro

*

O
El Pais dá conta de que um diário Iraniano vai publicar cartoons sobre o Holocausto. Isto sim é uma provocação, porque não se trata de retratar a actualidade, mas sim enveredar numa lógica pueril de contra ataque. Já para não falar da manobra pouco subtil para meter Israel ao barulho.

De qualquer forma, como seria de esperar, nada que não estivesse já feito em países em que a liberdade de expressão é um direito consagrado, e que uma simples pesquisa no google images pode facilmente desvendar. Entre muitos outros aqui está um exemplo.

(Jorge Gomes)

*

Um testemunho da Dinamarca (sem acentos):

Eu resido na Dinamarca (...) Em relação a polémica do Cartoon: esta situação é ainda mais inaceitável para quem conhece essas minorias árabes, nao-integradas, sem desejo nenhum de o fazerem e com a sua arrogância alimentada pela intransigência religiosa e a humilhação que sentem por, lá no fundo, se sentirem inferiores.


Esta questão veio levantar uma série de questões sobre nós próprios e sobre os muçulmanos:


1)Há uma ideia, de génese anti-americana, dos árabes serem vitimas. Não são. São sociedades improdutivas que se sustentam do petróleo, que Alá foi tão generoso em lhes dar a quase exclusividade, não lhes dando no entanto o engenho de inventar o automóvel. Sem Ocidente, a "Arábia" não seria a sociedade desenvolvida que nos vendem, seria sim algo muito primitivo. A Palestina ser pobre e Israel rico nao é prova de exploração mas sim de diferenças entre as duas culturas.


2)As recentes manifestações, tanto em Franca, como as de agora, vêem mostrar que a religião não só não permite o desenvolvimento das sociedades, com impede a integração destas pessoas quando emigrantes, criando tensões ainda maiores. Veja-se que são alguns dos muçulmanos emigrados na Dinamarca que promovem o actual conflito. A Dinamarca é dos, senão o, pais no mundo mais generoso para emigrantes, dando-nos possibilidades, apoio e oportunidades diferenciadas. Um exemplo: como emigrante tenho aulas (de qualidade) de dinamarquês de graça, a sala ao lado está cheia de dinamarqueses aprendendo italiano ou português à sua custa (e é bem caro).


3)A nossa liberdade de expressão, quão fundamental é? Se é tão fundamental assim, porque continuamos a não permitir escritos que mencionem diferenças entre povos, entre sexos, ou generalizadoras? Porque não permitimos a livre expressão ideologias a que chamemos "nazis"? Apesar de entender o ideal humanista que limita a liberdade de expressão, toleramos o comunismo, e não foi por isso que ficámos comunistas e que a revolução aconteceu. Se calhar estará na altura de revogar estas limitações.


4)O que é um cartoon? Bem, a verdade é que um cartoon é uma invenção ocidental para satirizar subjectivamente e assim fugir aos mecanismos de controle objectivos (leis) que nós implementamos na nossa sociedade. Suponho que terá nascido para fugir à censura. Não faz o mesmo sentido para um muçulmano, onde um líder pode decidir subjectivamente o que é mau ou não. Tomemos por exemplo o cartoon do Maomé de turbante explosivo. Por palavras, seria algo que relacionaria concerteza Maomé com atentados, os muçulmanos com terroristas. Na realidade, a descrição do dito cartoon poderia ser contra as nossas próprias leis que limitam a liberdade de expressão. Ja para a sociedade islâmica, um desenho é pior que as palavras.
No entanto, e embora isto tenha que ser levado em conta, este argumento não serve para desculpar os árabes, porque nos pedem que usemos a nossa "bondade" para eles, enquanto as suas sociedades usam de maldade para nós (vejam os cartoons abaixo, publicados em países árabes).

É o velho argumento de mulher ocidental que ande de calcoes e cabelo descoberto num pais arabe está a violar os costumes dos locais e deverá por isso ser violada vs a àrabe que tem o direito de nao mostrar a cara num país ocidental. Temos de ter cuidado e não dar tiros no pé.

5) Este último ponto é mais distante da polémica, mas parece-me extremamente importante. É acerca do que define a boa integração de emigrantes, que não é um tema lateral, mas sim central nesta polémica.
Postulo sem provas mas da observação que o que define a boa integração de um novo povo é a quantidade de elementos negativos no povo hospedeiro. Visualizando o que digo, imaginemos que desenhamos uma curva, de forma gaussiana, que representa a "boa cidadania", crescendo esta da esquerda para a direita. Um grupo de emigrantes árabes tem bons e maus, e se o desenharmos neste gráfico vai também gerar uma curva gaussiana ou parecida. Imaginemos agora dois povos hospedeiros, podendo estes ser o Inglês e o Dinamarquês. No povo inglês, há muitos alcoólicos, homens que não trabalham, vivem da segurança social, batem na mulher, berram com outros, e se envolvem em cenas de pancadaria com regularidade. Esta é a cauda da curva do povo inglês, do lado esquerdo da curva. Entram agora os imigrantes. A curva destes estará compreendida na do povo inglês. Os piores dos imigrantes talvez sejam tão maus cidadãos como os locais que referi, os melhores também não ultrapassarão o povo hospedeiro. Assim, não há razoes para grande discriminação, nem diferenciação económica, e não há tanta tensão entre locais e imigrantes.

Olhando agora para a Dinamarca, temos uma situação diferente. Comparada com a curva do povo inglês, a da Dinamarca está deslocada para a direita. Pelo menos na cauda da má cidadania. Na realidade, nao ha maus cidadãos neste pais. Não há violência. Não há crime. Assim, quando os imigrantes chegam, embora muitos se comportem como os locais, todos os novos maus cidadãos serão imigrantes. Isto gera ressentimentos justificados.
É verdade que nem todos os árabes são maus cidadãos, mas também é verdade que se não houvesse árabes, não haveria maus cidadãos (tal ja não é verdade em Inglaterra. Assim, sou de opinião que não são nem as politicas de esquerda, nem a generosidade do povo hospedeiro que dita a boa ou má integração. Muito pelo contrário, é a quantidade de maus elementos no povo hospedeiro).
Da mesma forma, vai haver um fosso económico entre os referidos "maus cidadãos" e o resto da população. Junte-se a isto os dinamarqueses serem dos povos mais evoluídos no mundo, e as suas qualidades não serem fáceis de perceber, para gerar entre os árabes uma grande humilhação e ressentimento, que vai alimentar a conversa da "discriminação" e os sentimentos religiosos.
A única forma de um árabe tem de se sentir "importante/superior" num destes países é, ou abandonar os ensinamentos dos seus pais e tentar imitar a civilização superior onde está, ou acreditar na religião que lhe garante ser superior por não beber álcool, bater na esposa, e afins...

(Rodrigo Gouveia de Oliveira)

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Se por um lado é compreensível a reacção do lado de lá quanto às caricaturas publicadas num jornal dinamarquês, do lado de cá só é compreensível esta reacção se usarmos na nossa análise a palavra MEDO. E se me pedissem para escrever um título que representasse os últimos acontecimentos, parafraseava José Gil e imediatamente escrevia Ocidente, hoje: O medo de existir, o medo de falar, o medo de ser livre.

Há duas análises possíveis em espaços diferentes. Do lado de lá, este foi um pretexto para encetar uma espécie de guerra religiosa entre dois lados profundamente antagónicos quanto ao modo de ver o mundo. Porém, o motivo não é puramente religioso mas sobretudo (ou talvez unicamente) político. Mas o modo de acção é que é religioso, primeiro porque lhes dá, na sua perspectiva, uma causa. Segundo, porque nessa causa tem de haver um inimigo e nós cumprimos quase na perfeição esse papel. Do lado de cá, as reacções dividiram-se entre aqueles que teorizam e filosofam sobre o conceito abstracto de liberdade de expressão e, dessa forma condenam a publicação dos cartoons, e aqueles que mantém a sua convicção de um mundo livre de censura, livre de fantasmas, simplesmente livre. Se por um lado devemos preocupar-nos com as reacções do lado de lá, é do lado de cá que precisamos de fazer um esforço muito grande de forma a compreendermos o que se passa nesta Velha Europa. E eu, muito honestamente, talvez pela minha tenra idade, não o consigo fazer sozinho.

Por outro lado, não deixa de ser curioso que, talvez culpabilizada pelo seu passado igualmente fanático e sanguinário, a Igreja Católica não tenha tido qualquer pudor em condenar a publicação dos cartoons. E talvez tenha sido a opção mais responsável, como gostam agora de dizer. Mas isso não implica que tenhamos de nos vergar perante o dogma. E já que falei em dogma, permita-me que diga que o conceito de liberdade religiosa é, per si, discriminatório. Senão vejamos. Eu sou ateu. Não acredito nem milito qualquer religião. Logo, para mim, a minha liberdade é desprovida de qualquer conspurcação dogmática. Partir do princípio que a liberdade religiosa se sobrepõe à liberdade de expressão, é discriminar-me, é discriminar todos aqueles que são ateus ou agnósticos, como preferirem.

O dogmatismo leva os homens a matarem-se mutuamente. François Jacob dizia que nada é tão perigoso como a certeza de se ter razão, que nada causa tanta destruição como obsessão duma verdade considerada absoluta. F. Jacob tem razão quando diz que, historicamente, todos os massacres foram cometidos por virtude, em nome da verdadeira religião, do nacionalismo legítimo, da política idónea, da ideologia justa; em suma, em nome do combate contra a verdade do outro. Tudo estaria bem se nos confortássemos com as nossas verdades e não fizéssemos questão de impô-las uns aos outros a qualquer preço. Tudo estaria bem se, do lado de lá, rezassem a Alá e do lado de cá rezassem ao Deus cristão. Tudo estaria bem se vivêssemos num mundo perfeito.

Mas não vivemos num mundo perfeito. E esta retracção do ocidente serviu apenas para mostrar o medo que revolve as nossas entranhas desde o 11 de Setembro e serviu também para mostrar que nos tornámos submissos e incapazes de lutar pela nossa liberdade. Perdemos esta batalha e devemos envergonhar-nos disso. Desta vez, o terrorismo não precisou de sair de casa. E o efeito foi precisamente o mesmo. O MEDO.

Vale a pena citar Agustina Bessa-Luís, in Antes do Degelo:

«O medo é o que impede que tudo o que chega às mãos dos homens não se torne em sua propriedade. Basta produzir uma impressão que não se pode explicar, inserindo no medo o desconforto da culpa. É assim que milhões de pessoas podem ser pastoreadas nas ribeiras da paz por muito poucas. E nas trincheiras da guerra por outras tantas, senão as mesmas.»

(Ricardo S. Reis dos Santos)

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(sem acentos)

Tive acesso ao seu blog e li algumas considerações sobre o assunto das caricaturas do jornal dinamarques. Sou filha de portugueses emigrados e vivo em Paris onde nasci. Em Franca sou sem duvida francesa, em Portugal sou uma portuguesa diferente. Gracas ao imenso esforco de meus pais consegui licenciar-me à ENST e tenho um emprego ainda provisorio como muitos estudantes aqui em Franca. O primeiro emprego esta dificil por todo o lado.
O que lhe queria exprimir da minha visao do que representa o Islao para quem, como eu, viveu durante muitos anos lado a lado com musulmanos e beurs. O que eu vivi nunca esquecerei, sei da forma de vida das minhas amigas musulmanas sempre reprimidas, das mães delas, pessoas de segunda categoria porque tiveram a infelicidade de nascerem mulheres e ainda sei dos apoios do estado frances as familias musulmanas. Meus pais nunca tiveram um apoio que fosse e minha educacao foi paga com o trabalho dos dois.
Ha um todo pequeno detalhe que todo o mundo parece nao ver ou nao querer ver, mesmo os que agora acham mal que alguem caricature o Islao sem perceber como se faz o Islam dos nossos dias. A leitura estreita do Islao a situacao das mulheres musulmanas est, para dar um exemplo, medieval.

Vou tentar traduzir bem algumas passagens do livro da musulmana Irshad Manji "Musulmane mais Libre": " Em Franca, os Musulmanos perseguiram na justica um escritor que declarou que 'O Islam era a religiao mais estupida do mundo'. Aparentemente tratava-se de uma incitation ao odio racial. Estamos aqui capazes de fazer valer os nossos direitos - coisa que na maioria dos países islamicos nunca poderiamos fazer. Mas este frances fez mal em escrever que o Islam precisava de crescer? Que pensar do incitamento ao odio aos judeus no Corao? Os Musulmanos que invocam o Coran para justificar o antisemitismo não deveriam, também, serem perseguidos pela justice? Ou seria ainda 'repression violenta'? O que faz que nos estamos no nosso bom direito de o que o resto do mundo seja racista? Com a nossa piedade sobre nos mesmos e os nossos silencios ostentatorios, nos, Musulmanos, conspiramos contra nos mesmos. Estamos em crise e queremos arrastar o mundo inteiro com a nossa crise." mais adiante: "Mesmo no Ocidente ensina-se correntemente aos Musulmanos que o Corao est a ultima manifestacao da vontade de Deus, que suplanta a da Torah e a do Novo Testamento. Como manifestacao ultima, o Corao est o texto 'perfeito' - que nao pode ser questionado, analisado ou interpretado. Ele nao pode ser senao acreditado." agora repare nesta parte: "O Corao lembra aos Musulmanos que eles nao sao Deus. E por consequencia os homens e as mulheres fariam bem de serem justos nos direitos que exigem uns a outros: (...) 'Honrem as vossas maes que vos carregaram. Deus observa-vos sempre.' O que parece estranho est que no mesmo capitulo - algumas linhas na frente - o Corao inverte completamente a corrente: 'Os homens tem autoridade sobre as mulheres porque Deus fez os homens superiores as mulheres e porque os homens gastam as suas riquezas para as sustentar. Deus fez as mulheres obedientes... Quanto as mulheres de quem duvidem da obediencia, castiguem-nas, ponham-nas a dormir em camas separadas e espanquem-nas.'"

Por mais incredulos que fiquemos, estas passagens do Coran nao sao inventadas. E isto que as mulheres e os homens Musulmanos aprendem nas suas vidas religiosas. Muito mais poderia eu aqui deixar sobre o Islao tal como ele e vivido no dia a dia. Seja no Ocidente, seja no Oriente.

Nao me ficara bem dizer o que lhe vou dizer: mas esta religiao não me merece respeito nenhum.

Desculpe ter-lhe tomado tanto tempo e ainda desculpe mais o meu mau portugues mas os portugueses de Portugal nao sabem do que falam, a maioria, quando fala do Islao. Essa realidade nao a vivem no dia a dia. Os que vivemos na Europa, sobretudo em Franca ou Belgique ou Alemanha sabemos bem do que falamos.

Recomendo a todos o site desta Musulmana escritora Irshad Manji.

(Guiomar Almeida)

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A ver se percebo...
Certa esquerda quer discutir e investigar o holocausto?!
Certa esquerda até tenta compreender as atitudes dos radicais extremistas muçulmanos que, entre outras coisas, proibem as mulheres de ter acesso a carta de condução e andar de cara destapada?!
Certa esquerda coloca em causa a liberdade de publicação livre de cartoons sejam eles sobre que tema for?!
Certa esquerda tenta explicar, à luz de anacronismos sociais, o que é fanatismo puro e simples?!
Certa esquerda ao tentar explicar que até pode haver razões e tal para o fanatismo tresloucado, coloca-se inevitavelmente numa discussão que, logo à partida, é desculpabilizante de comportamentos fascisantes?!

Mas isto é esquerda?!!

Pensei que era extrema direita...

(Paulo Duarte)

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Na maioria dos casos, as pessoas teem-se limitado a debater aquilo em que o Ocidente tem razao e uma evidente superioridade: a liberdade de imprensa e de expressao; e as liberdades democraticas, em geral.

Aquilo de que se fala menos e' o seguinte: que a actuacao (politica, economica e militar) dos paises ocidentais no Medio Oriente e na Asia Central e' tudo menos consentanea com esses valores que inventamos e que sao, na minha opiniao convicta, universais.

Agora, se o que esta' de facto em causa nesta cacofonia mediatica e' a liberdade de expressao e de imprensa, entao parte da solucao comecaria pela realizacao de um debate livre. Nesse debate, os muculmanos ou os emigrantes oriundos daquela regiao do Mundo, teriam a oportunidade de expor livremente os seus pontos de vista, explicar as suas razoes de revolta (se for esse o caso) em relacao ao Ocidente, e poderiam ver as suas opinioes testadas e confrontadas de modo critico e veemente por outros (ocidentais ou nao); e' evidente que as nossas razoes, ambiguidades e inconsistencias tambem seriam criticadas. Assim, sim, estariamos a considerar de forma seria o problema da liberdade de expressao e de imprensa, as dificuldades e as oportunidades relativas 'a coexistencia pacifica entre as civilizacoes.

Caso contrario, podera' ficar a suspeita que se esta' a assistir a uma mera encenacao... mesmo nas vesperas do seguimento da questao nuclear do Irao ao Conselho de Seguranca.

(Miguel Preto)

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Mas a publicação dos desenhos não foi um acto oficial de algum país. Os desenhos foram publicados por jornais independentes de distribuição nacional. É uma extrapolação imensa querer analisar esse acto fora do contexto próprio. Os protestos surgem na alegação de que esses desenhos violam o que está nos textos sagrados muçulmanos. Mas podemos imaginar o direito recíproco de um dinamarquês, à luz dos textos dos direitos do Homem, de se revoltar com os maus tratos infligidos ‘legalmente’ às mulheres muçulmanas.

A revolta incide sobre a particularidade de se ter representado o profeta (acto proibido pelo alcorão) mais do que qualquer outra inferência politica. Se em vez da imagem se tivesse publicado, no mesmo jornal, um artigo de opinião em que a certa altura o autor dissesse «o profeta Mahomet instiga o terrorismo» (em dinamarquês) ninguém daria por nada. O absurdo é alguém querer que o resto do mundo funcione pelas suas regras.
Imaginando que na minha religião eu tinha a forte convicção de que me era permitido amar e servir um só Deus. Estariam por isso todos os muçulmanos, por respeito à minha crença, proibidos de ter a sua vida normal e amarem o Deus deles? A vida normal de um dinamarquês passa pela sua liberdade de expressão. Faz sentido que alguém de um país longínquo venha ditar-lhe novos costumes?

O que faz sentido é se algum dinamarquês muçulmano (ou não) se sentir ofendido instruir um processo por abuso da liberdade de expressão ao outro dinamarquês. O que faz sentido é qualquer dinamarquês muçulmano (ou não) compreender que vive num país onde é possível ridicularizar qualquer religião, incluindo a sua. Se não gosta só tem duas hipóteses: ou muda de país ou espera mais um pouco que os muçulmanos invadam a Dinamarca.

(Nuno Galvão)

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Estou fascinado pela quantidade de pessoas eminentes que têm escrito nos últimos dias, no âmbito do caso dos cartoons dinamarqueses, que não se deve caricaturar o sagrado. Não me tinha apercebido de que tal ideia está tão espalhada na nossa sociedade e, em particular, nas nosas elites. Só me resta saber onde estavam essas pessoas quando o cartoonista Sam publicou o livro «Ai Jesus», inteiramente constituído por caricaturas de Jesus crucificado. Ou quando esteve em exibição a comédia «Dogma», onde Deus era caricaturado (e representado por Alanis Morissette!). Ou quando esteve em exibição o filme «Bruce, o todo poderoso», onde Jim Carey caricaturava a abertura do Mar Vermelho por Moisés... «abrindo» uma tigela de sopa de tomate! Ou, é claro, quando José Saramago publicou «O evangelho segundo Jesus Cristo».

Ou será que só podemos caricaturar os valores sagrados da nossa cultura mas não os das outras?

(José Carlos Santos)

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Exmo. Sr. Engº. Ângelo Correia,

Acabei neste preciso momento de ver o programa "Prós e Contras" em que o Sr. participou e não posso deixar de lhe manifestar a mais profunda indignação pela sua atitude, que não podendo acreditar que se deva a superficialidade ou ignorância, só posso considerar profundamente manipuladora, tentando evitar uma discussão, assaz pertinente e urgente, sobre a natureza do Islão, o que quer que isso seja e quaisquer que sejam as suas multiplicidades, que existe na prática e é invocado como legitimação dos maiores actos de desumanidade, a par com a famigerada solução final nazi, alguma vez vistos.

Neste sentido há alguns comentários que tenho de lhe fazer chegar:

- Já pondo de parte o ridículo de tentar fazer crer que os muçulmanos chegaram à península com Averróis e outros homens sábios de igual e inquestionável valor, a recitarem os clássicos da antiguidade e não pela força das armas, acho lamentável que o Sr. que o invocou e muito bem, como uma figura património da cultura universal do Homem, não tenha referido as perseguições que ele sofreu na Andaluzia, feitas não por cristãos muito pouco instruídos, mas precisamente por islâmicos fundamentalistas religiosos que o perseguiram e o impediram de continuar, de desenvolver e de difundir a sua obra.

Mais, esta obra, aquando das perseguições que ele e a sua família sofreram e que os obrigaram a fugir, sobreviveu às fogueiras em que os seus livros foram queimados, apenas pelas cópias feitas e contrabandeadas, a tempo, pelos seus discípulos.

Ou seja, Averróis é um exemplo de um muçulmano, homem de paz, de saber e de cultura, que foi perseguido (por muçulmanos), apenas por ter essas ideias de tolerância, de desenvolvimento e de busca do saber, pelo mesmo tipo de fanático religioso que está na origem do que hoje faz os apelos ao assassinato por delito de opinião, aos atentados e as manipulações de massas que estivaram na origem do programa em que o Sr. participou.

Se ainda hoje encontramos os fanáticos é muito pertinente perguntarmo-nos, ao não encontrarmos “os Averróis”, se foram ou não os fanáticos, que ganharam a guerra, que existe desde o início, dentro do Islão, pelo seu controlo. Se um conjunto de povos ou de culturas, que em dada época foram fonte de desenvolvimento cultural e científico da Humanidade, ao preservarem e desenvolverem (!) o conjunto de saberes em que se alicerçaram as revoluções intelectuais que estão na origem do que de melhor e de mais desenvolvido hoje existe no mundo, da democracia à ciência, se estes povos e estas culturas se tornaram e são hoje em dia tão próximas do cultural e cientificamente estéreis, tão violentas e tão contrárias ao desenvolvimento individual e colectivo, onde o que se faz é feito quase sempre com o risco da própria vida de quem o faz, onde mesmo sobre esses seus grandes homens do passado se podem encontrar “comentários oficiais” sobre o valor da sua obra mas muito mais dificilmente a obra em si, é extraordinariamente pertinente perguntarmo-nos se “os Averróis”, de há muito a esta parte, não serão, internamente, impedidos de existir no Islão.

O cineasta egípcio Youssef Chahine, em 1997, em “O Destino” (uma obra de arte e não um documento histórico, concedo-lho), ao usar precisamente estes factos da vida de Averróis como uma metáfora para o que se passa hoje em dia nos mais moderados países do Islão, levanta precisamente esta questão (e durante quanto tempo mais e onde poderá levantá-la?).

Devo acrescentar que desculpabilização grosseira que fez destes povos e destas culturas, ao fazê-los objectos inocentes de perfídias externas que os ultrapassam sempre e impedem de agir como a todos os outros se exige, por ser simultaneamente um atestado de menoridade intelectual e civilizacional, deveria ser, como a Dra. Fátima Campos Ferreira lhe tentou fazer ver, a maior das ofensas. Muito maior do que quaisquer caricaturas. Concedo-lhe também que assim o não sentirão os visados, mas então também isso deve ser motivo de preocupação e reflexão. Haverá um qualquer conjunto de povos disposto a, auto-desculpabilizando-se permanentemente, agir como um qualquer adolescente borbulhoso, achando que tudo lhe pertence, a tudo tem direito, tudo lhe tiram e de nada é responsável?

Para além de os líderes religiosos muçulmanos dinamarqueses terem levado não as doze caricaturas publicadas mas quinze, de ter sido uma das não publicadas que, apresentada como tendo sido publicada, levantou mais do que todas polémica (a de Maomé com cabeça de porco a que eu nunca consegui ter acesso, precisamente por não ter sido publicada), para além de ser passados meses e quando se passa o que se passa no Irão e na Palestina, que os líderes locais fazem aparecer esta questão, para além da conivência de estados islâmicos com os distúrbios, as caricaturas em si, podem e devem ser discutidas.

Em particular gostaria de discutir duas:

-a das virgens que se acabaram no céu, alusão à crença completamente abstrusa de que por se matarem assassinando outros, seriam, aqueles rapazinhos a quem as regras da sua sociedade em geral e a prática da poligamia em particular, impede uma saudável vivência da sexualidade, recompensados com 70 virgens, cada um, no céu. Recuso-me a discutir muito a ideia de fazer os outros crerem que terão no céu aquilo que lhes negamos na Terra, se se matarem por nós, assassinando outros e dando-nos com isso poder. Sinto como demasiado abstruso sequer equacioná-lo seriamente (e no entanto nunca vi que essa ideia invocada em nome do Islão gerasse manifestações de indignação, mais do que circunstanciais comentários, no mundo islâmico).

A razão por que a quero discutir é porque eu próprio já fiz esse comentário inúmeras vezes, perante a risada geral dos conversados. Diga-me uma coisa: Também eu devia ter pensado melhor? Também eu não tinha o direito de o dizer? Também eu tinha de me calar? E os conversantes? Poder-se-iam rir ou não?

- mais significativamente gostaria de discutir a caricatura de Maomé com turbante em forma de bomba. Não diz que todos os muçulmanos são terroristas, mas acho muito difícil interpretá-la sem admitir que os há que o são e que o são em nome do Islão. Mas isso é inquestionável porque de facto, actos terroristas inqualificáveis foram cometidos por muçulmanos reivindicando fazê-lo em nome da sua fé.

Se o islamismo se advoga ser uma religião de paz, porque não suscitaram estes actos imensa indignação entre os muçulmanos? E porque não há-de haver moderados que interpretem esta caricatura não como uma ofensa gratuita a todos os muçulmanos mas como havendo outros muçulmanos que apresentam o Islão, mesmo que contradizendo-o com a sua prática, como terrorista?

Por honestidade digo-lhe já que esta caricatura não suscitou um mim interpretação tão benévola para com o islamismo, mas por que carga de água isto não é uma possibilidade admissível? Será que o islamismo é tão moralmente superior que nada do que seja feito em seu nome, pelos seus crentes, o poderá alguma vez manchar?

Mais porque é que as caricaturas provocam muito mais manifestações de indignação aos moderados do que os assassinatos em massa feitos em nome da sua fé? Será o assassinato dos outros menos relevante do que as ofensas a mim? Para os muçulmanos o mundo divide-se entre muçulmanos e não muçulmanos e a uns e a outros aplicam-se leis diferentes? Um moderado, como o imã da mesquita de Lisboa sente-se mais próximo do caricaturista ou do que apela à morte deste? Não estou a dizer que não condene o apelo à morte, estou a perguntar se, por absurdo, se visse obrigado a ter de escolher entre cometer uma daquelas que certamente considera serem duas indignidades, qual delas seria, para ele, menos grave?

Dá sempre a ideia de que o que quer que se entenda que se tenha feito a um muçulmano é sempre mais grave do que o que quer que se faça a um não muçulmano. E isso por a diferença na manifestação de indignação por parte dos moderados, aparecer como desculpabilizante para com os actos dos radicais, que matam em nome da fé que se diz comum a ambos.

Assim faz todo o sentido perguntar-se, uma vez que o Islão faz a hierarquização das pessoas face à sua crença religiosa (1º os muçulmanos, depois os crentes no Livro, dos quais primeiro vêm os cristãos e depois os judeus, depois os animistas e penso que depois os que não professam qualquer religião), se isto é ou não assim? Se é ou não “mais grave incomodar um crente do que matar um infiel”? Se mesmo repudiando os fanáticos, os moderados se sentem ou não mais próximos deles do que das suas vítimas, sejam elas quem forem, precisamente por partilharem religião muçulmana com os agressores?

É meu desejo e esperança que não, mas desejos são desejos, esperanças são esperanças e as realidades constroem-se e se se discutirem talvez se construam realidades melhores.

Estas questões podem pôr-se, devem-se pôr-se face a tudo o que tem acontecido e a caricatura faz todo o sentido ao suscitá-las. Ela é pelo menos uma interrogação e se será ou não uma afirmação, depende da resposta a questões como as acima e duma discussão que se pode fazer, precisamente com os moderados como o Sr. imã da mesquita de Lisboa e que o Sr. quis impedir. Sentir-me-ia muito mais tranquilo hoje se tivesse ouvido finalmente sem rodeios a discussão destas questões e não evitá-las, transferindo responsabilidades, desculpabilizando, como o Sr. hoje fez e como ontem fez o prof. Marcelo Rebelo de Sousa, no seu exercício semanal de tirar médias para tentar agradar sempre a todos (mostrando mesmo ignorância ao afirmar que Maomé é deus para os muçulmanos!).

Como se não bastasse ainda teve de ir buscar Israel e de fazer afirmações que intelectualmente o deveriam envergonhar (que fique já esclarecido que tenho tanto sangue judeu - e muçulmano - como qualquer outro, anónimo, português).

Comparar Israel com o Irão, com um Irão que tem uma ditadura fanatizante como aquela, que tem um presidente que afirma para todo o mundo o ouvir, que quer riscar o estado de Israel do mapa, é indesculpável.

Israel é, desde logo, uma democracia, na terra milenar de um povo, um país com todo o direito a existir, onde uma parte significativa dos cidadãos é muçulmana (cidadãos, têm os mesmos direitos!), criado em 1948 por resoluções da ONU, reconhecido internacionalmente com excepção dos países vizinhos muçulmanos que o tentaram aniquilar, que sofreu já nestes 57 anos, três tentativas de destruição e de invasão.

Tem armas nucleares (originalmente fornecidas pelos franceses contra a vontade dos americanos) como parte fundamental da defesa dum povo, cercado por outros, apostados e, na prática comprometidos, em destruírem-no e que nunca as usou para iniciar qualquer agressão. Nada comparável com um estado fanático, fanatizante, suporte moral e logístico de vários movimentos terroristas, cujo presidente entende como auto-promoção a negação do holocausto e o anúncio da intenção da utilização de armas nucleares para a destruição de Israel. A comparação é completamente abstrusa.

Mas se quiser envolver a questão entre Israel e os países muçulmanos pelo menos aprofunde o assunto e não o faça duma forma que sugere o acto de quem sacrifica outro, pensando assim ficar de bem com o agressor.

Ou seja, falemos da Palestina. Simultaneamente com a criação do estado de Israel, foi pela ONU criado um estado palestiniano. Estranhamente (será?) esta solução foi recusada pelos países árabes tentando negar a existência a Israel. Quanto mais não fosse por Arafat ter, na prática, rejeitado o último acordo de paz, em que todas as suas reivindicações eram atendidas, com excepção do controlo total sobre Jerusalém (também era o que mais faltava!), mas em que ainda assim esta cidade ficava com um controlo dividido pelos dois estados, se vê que é precisamente aqui que reside o cerne da questão (Arafat ambicionava ficar conhecido na História como o conquistador de Jerusalém).

Jerusalém é a terceira cidade mais sagrada para os muçulmanos. Porquê? Meca, Medina é fácil ver que fazem todo o sentido. Mas Jerusalém? Porquê? A mais de 2000 kms de Meca…Porque a tradição muçulmana pretende que Maomé, depois de morrer e antes de ascender aos céus terá ido a Jerusalém, encontrar-se com Moisés e Cristo, para que estes lhe dissessem que a religião dele era a religião verdadeira e que eles teriam apenas preparado a sua vinda.

É com base nisto que Jerusalém é sagrada para os muçulmanos, o que é uma crença legítima como qualquer outra, desde que permaneça no domínio da fé. A partir do momento em que pretenda ser razão de legitimação de apropriação territorial do coração de outras religiões é, completamente, indefensável. Imagine-se o que seria se uma qualquer nova religião invocasse o mesmo relativamente a Meca e a Maomé.

Em face disto é ou não legítimo pensar-se que o Islão, que mais uma vez trata esta questão em bloco, vê na posse de Jerusalém, uma questão de supremacia da sua religião? E que os judeus são um alvo a eliminar por se recusarem a ceder a terra onde já há milhares de anos estavam as suas raízes?

É isto inevitável? Países mais moderados como o Egipto (onde um presidente foi por isso assassinado), ou a Jordânia, depois de lhe terem feito a guerra, assinaram a paz e estabeleceram relações com Israel, mas a questão palestiniana, em que os palestinianos já várias vezes preferiram continuar a guerra a poder construir o seu estado em paz e lado a lado com Israel, continua a ser tratada em bloco pelo mundo islâmico e apresentada como algo que os une e tantas vezes como justificação do terrorismo.

E agora? Um muçulmano, um moderado, sente-se mais próximo do presidente do Irão, que ambiciona riscar Israel do mapa, ou dos israelitas ameaçados por tarados como esse? (será aceitável que qualquer um de nós se sinta mais próximo dos nazis do que dos judeus, por ser o povo alemão maioritariamente cristão? Ou chama-se a isso xenofobia?).

E qual a posição dos moderados face a tudo isto, quando os radicais que cometeram actos terroristas como os 11 de Setembro e de Março (e muitos outros, mesmo em países muçulmanos e contra muçulmanos) apregoam nos textos que publicam que pretendem que o Islão domine o mundo? (certamente na forma de Islão que lhes convém).

Não será altura de tudo isto indignar muito mais os moderados do que as caricaturas? Gerarem muito mais protestos os actos assassinos dos que professam a mesma religião do que as opiniões dos que professam outras ou nenhumas?

O Sr., ao ir demagogicamente invocar e embrulhar Israel no triste episódio das caricaturas, ao aceitar que a suposta retaliação caricatural da liga árabe seja como foi e tendo como alvo os judeus (querem ver que a Dinamarca e os seus caricaturistas são judeus israelitas?) prestou um péssimo serviço à verdade e à seriedade e tentou mais uma vez culpabilizar Israel e os judeus pelos problemas que existem com o fundamentalismo muçulmano. Atitude tão frequente (e que nos devia envergonhar a todos) na Europa.

Considero que todo o seu discurso e atitude foi esta noite uma manipulação, uma tentativa de não discutir a realidade, uma tentativa de ocultar divergências e problemas. Divergências e problemas que se não forem assumidos, mais tarde ou mais cedo, se nos imporão e nesse caso isso significará a mais cruel, desumana, brutal e extensa guerra jamais vista.

São precisos dois para dançar o tango e para fazer amor, mas basta um para começar a guerra. Os radicais muçulmanos há muito que a fazem, primeiro aos outros muçulmanos que consideram traidores ao Islão e depois a todos os não muçulmanos. Ultimamente declararam guerra total a todos os infiéis. Nesse sentido pode passar-se muito bem sem as caricaturas, mas não sem a discussão e a reflexão que a reacção à sua publicação está a gerar.

(Vítor Paulo Vajão)

*

"A história das caricaturas dinamarquesas é extremamente simples e começa e acaba numa linha: é uma questão de liberdade. Ou há, ou não há.

O que é novo e precupante são as toalhas de palavras e justificações que começam a ocultar o que devia ser absolutamente simples e onde qualquer palavra a mais é demais."

Antes de mais, a liberdade deveria ser também bom senso.

(José Von Barata)

*

Juro que adorava saber qual foi a sua reacção quando surgirem problemas parecidos com estes em Portugal.

Gostava de saber se o seu raciocínio na altura foi tão esquemático quando os católicos se insurgiram, por exemplo, contra O Evangelho segundo Jesus Cristo ou a rábula que o Herman José fez da última ceia de Jesus Cristo. Há muita gente agora indignada contra os muçulmanos que na altura tomaram partido da Igreja.

(Mário Azevedo)


*

Ainda a propósito das caricaturas de Maomé e da generalidade dos comentários que li no "Abrupto", o que me parece é que não está em causa o querermos manter e até lutar pela liberdade de expressão - conquista não definitiva, como se sabe. Ninguém de senso defenderá que ela ceda perante interesses menores. Mas não devemos ser tão arrogantes na preservação desse direito que o queiramos "impor" às massas do islão. E é isso que julgo que transparece nalgumas das observações a esse propósito. A nossa civilização (ainda tão novinha...!) não é transponível por nosso desejo para todo o mundo por muito vantajosa que se possa apresentar.


(Fernando Barros)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM VILA NOVA DE GAIA, PORTUGAL


Enchendo um molde de uma escultura na Fundição Lage.

(Ana Carvalho)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM HAVANA, CUBA


Corte de cabelo, Fevereiro de 2005.

(Joana Marques)
 


INTENDÊNCIA

Continuo a receber muito correio com CONCORDÂNCIAS / DISCORDÂNCIAS. Será publicado em breve, com base no único critério habitual nesta casa, o de ter argumentos, o de contribuir para a discussão, independentemente do "lado". No Abrupto a opinião dos leitores vai para a primeira página, não vai para os comentários e é editada pelo autor. É um critério, haverá outros.
 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(7 de Fevereiro de 2006)


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Querem um exemplo pelo absurdo do mundo em que estamos, nem por isso tão absurdo como parece? Um exemplo de como daqui resulta censura e medo? Vamos admitir que um dos dois participantes no Prós e Contras de ontem, que disseram o que havia a dizer (António e Vasco Rato), face aliás a uma coligação de interesses, confusionismo, multiculturalismo que infelizmente é hoje o pão nosso de cada dia (não é blasfémia dizer isto?), o caricaturista António se lembra de fazer uma caricatura do Profeta, a pretexto dos eventos actuais. Aliás, a caricatura de Maomé com um turbante-bomba é o mesmo tipo de estrutura metafórica dos desenhos de António, só que pior desenhado. O António chega ao Expresso e entrega a caricatura. Soam sirenes de alarme, porque o jornal se sente “responsável”, o que, dito em linguagem terra a terra, significa que o jornal tem medo das consequências. O Expresso é mais importante do que o obscuro jornal dinamarquês e pode sempre haver alguém que se lembre de singularizar a caricatura de António como um exemplo de blasfémia infiel. O que é que o Henrique Monteiro faz? Não está em causa a qualidade da caricatura. Publica-a, censura-a porque os tempos estão difíceis? O governo desaconselhará, discretamente. E se a publica, vamos ter a bandeira portuguesa no chão e o António a ter que se esconder como os caricaturistas dinamarqueses, a que uma comunicação habitualmente tão solidária, deixa sozinhos nos seus riscos?

É exactamente por estas coisas que o que está em causa é a liberdade de expressão, a nossa, como a entendemos, a única que existe no mundo, a que nos custou muito sangue, aquela sem a qual perdemos a identidade e os valores. E está em causa pelo mesmo mecanismo que no passado dizia que mais vale sermos “vermelhos do que mortos”.

*

Que a comunicação social precisa de pensar a sua “responsabilidade”, estamos todos de acordo. Que quase sempre se recusa a fazê-lo, bradando à censura e ao interesse público ou do público, também é habitual. Que nunca teria esse discurso “responsável”, com a veemência com que tem agora, se do outro lado estivesse a Igreja, ou uma qualquer instituição ocidental, também me parece sustentável, por ausência de exemplos a contrario. Por tudo isto, agora que se está inteiramente no domínio da liberdade de expressão, num quadro cuja legitimidade me parece inquestionável (olhem para as caricaturas, gostem ou não delas como caricaturas, e vejam se elas não são o mesmo tipo de humor que Deus-Pai, Deus-Filho, Papas, governantes, eminências, são sujeitos todos os dias?), a conversa sobre a “responsabilidade” é , para não dizer outra coisa, sinistra.

*

No meio de uma imprensa que se descobriu "responsável" (*) e que directa ou indirectamente culpa os caricaturistas e o jornal dinamarqueses, salomonicamente colocando no outro prato da balança os excessos da "rua árabe", (o que traduzido do politicamente correcto significa que só culpa os dinamarqueses), valha-nos o artigo de hoje no Público de Teresa de Sousa:
"Há um problema sério no mundo islâmico de percepção do mundo ocidental, que a globalização e o terrorismo islamista, com a resposta da "guerra ao terror", vieram agravar. Há um sentimento real de frustração e de humilhação em relação ao Ocidente e essa é uma questão que preocupa muito justamente a Europa, onde vive hoje uma larga minoria islâmica. Essa preocupação está na base dos seus esforços para promover a tolerância e a compreensão entre civilizações, bem como das suas políticas de cooperação e de ajuda ao mundo árabe. Mas ceder à chantagem e à ameaça, contemporizar e justificar a demência fundamentalista antiocidental ou o arbítrio e a brutalidade de alguns regimes árabes será sempre a melhor forma de alimentar as suas ideologias e de manter aprisionadas as sociedades que dominam.
Haverá uma forma de racismo mais ultrajante do que a nossa complacência? A aceitação de que os valores que entendemos como universais são afinal fruto exclusivo da nossa cultura e da nossa riqueza, não são valores a que podem aspirar e pelos quais têm o direito de lutar todos os povos do mundo? Haverá melhor forma de alimentar a islamofobia no Ocidente do que considerar justificáveis os actos dementes e de violência contra o Ocidente?
É preciso mudar os termos da discussão e pôr fim de uma vez por todas ao politicamente correcto."

(*) Exemplos de hoje, com sublinhados meus:

José Luis Ramos Pinheiro no Correio da Manhã (sem ligação).

António José Teixeira no Diário de Notícias:
"Não há dúvida de que a democracia suporta a falta de sensibilidade e de bom senso e que a liberdade de expressão "é absoluta e não é negociável", como disse o primeiro-ministro dinamarquês. Tal como devem ser absolutamente condenáveis as reacções violentas do mundo islâmico. Não podemos ainda ignorar que alguns imãs aproveitaram as caricaturas para internacionalizar o conflito e criar ambiente de resposta ao "ódio" ocidental. O Irão e a Síria agradecem o pretexto. Mas estas verdades exigem também que se tenha a lucidez de criticar com veemência todos e quaisquer actos humilhantes ou xenófobos. Não podem proibir-se para não nos igualarmos ao obscurantismo despótico, mas devem merecer crítica frontal. O combate da liberdade exige inteligência. A humilhação em nome da liberdade é uma caricatura trágica da nossa civilização."
Eduardo Prado Coelho no Público:
"Quando os caricaturistas dinamarqueses deformam a imagem de Maomé estão, em primeiro lugar, a pôs em causa a dimensão do sagrado. Independentemente do facto de ser Maomé, devemos pôs a questão: é legítimo caricaturar o sagrado?
Em princípio, o sagrado está acima de tudo o mais, e em particular acima das caricaturas, sejam elas quais forem. Aquilo que é sempre uma degradação dos traços poderá estar sujeito à arma visual? Estou convencido de que não, e, mesmo sem ser crente, acredito que o religioso é demasiado importante para que as pessoas façam sobre ele caricaturas. E isto envolve Maomé. Estamos perante questões que põe problemas essenciais. As imagens matam e e o religioso não pode morrer. Pelo menos, não deve."

6.2.06
 


RETRATOS DO TRABALHO EM PORTUGAL



Pesca da sardinha, ao largo de Vila do Conde.
 


ESTES DIAS


Estamos banhados em dias belíssimos, claros, frios, luminosos. Não há detalhe que não se destaque, e uma espécie de prematura primavera percorre as árvores, as grandes percursoras. Bem sei que há muito ruído, muita fúria, muito sturm und drang, uma enorme nuvem de palavras por todo o lado.

Já olharam lá para fora, lá para cima, lá para o lado, onde tudo é recorrente, menos o tempo que nos faz a nós? Já olharam para a luz destes dias, fora do tumulto dos noticiários, da zanga e do azedume dos blogues, fora da escravidão dos ecrãs? Vale a pena. Aproveitem, não vai durar muito. Cada vez se percebe mais que, também nós, estamos de novo em guerra. Nas trincheiras da Flandres era assim, nas margens do Bug, a caminho de Treblinka, eram belos os dias.

Fico-me pela simplicidade, como os simples. É que tudo é verdadeiramente simples, nós é que complicamos. Vou ler Thoreau. Escapismo? Não, comprometimento com as coisas simples.
 


COISAS QUE FORAM SIMPLES


Inscrição na fachada do Liceu (agora Escola Secundária) Alexandre Herculano no Porto, que comemora o seu centenário.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: MAIS SOBRE OS PARTIDOS



A propósito da “lenta dissolução dos partidos” gostaria de deixar alguns comentários. Para que se entendam algumas das coisas que digo em seguida informo que tenho 42 anos, tinha portanto 11 anos no 25 de Abril.

Num regime democrático os partidos são inevitáveis. De facto, os partidos são a forma organizada de grupos de cidadãos, partilhando referências ideológicas comuns, intervirem na sociedade. São as “corporações da cidadania”, na medida em as restantes formas de organização colectiva têm fatalmente uma base que não é partilhável pelo universo de todos os cidadãos. Os partidos são o fórum correcto para reunir no seu seio pessoas com interesses e origem diferentes, mas com uma visão comum da sociedade e da forma de a organizar e gerir. Repare-se que os próprios movimentos de cidadania mais não são do que partidos em estado embrionário e que, para terem efectiva capacidade de intervenção na sociedade terão, mais cedo ou mais tarde, que se constituir formalmente como tal. Nesta perspectiva o problema não são os partidos. O problema em Portugal é um problema de qualidade, qualidade dos protagonistas.

A geração que actualmente lidera os partidos de poder (PS e PSD) fez-se adulta nos 10 a 15 anos subsequentes ao 25 de Abril. Os membros activos e líderes dos partidos foram formados no pós 25 de Abril no seio das juventudes partidárias, dedicando grande parte do seu tempo e empenho à actividade política em detrimento da actividade escolar e do empenhamento na obtenção de formação superior de qualidade. Estamos pois em presença de uma geração muito experiente no mundo da “política partidária”, no pior sentido da expressão, mas, de forma geral, muito mal preparada académica e profissionalmente. Se este problema é evidente nas estruturas partidárias nacionais é então gritante e perfeitamente confrangedor nas estruturas regionais.

Mas então e os outros? Os espertos e aplicados que andaram a estudar toda a vida em vez de organizarem festas na Associação de Estudantes para angariar fundos para a concelhia? Bem, esses acharam que valia mais a pena investir em carreiras profissionais sólidas e estão agora no topo do nosso tecido empresarial. E estão tranquilos. Estão tranquilos porque por um lado a democracia não tem alternativa e, por outro lado é sabido que há um preço a pagar por ela. O preço a pagar é admitir um nível razoável (entenda-se suportável economicamente) de corrupção e alguma ineficácia de funcionamento do sistema. E assim, como não há riscos óbvios e imediatos para o regime e o preço tem sido suportável, não houve até aqui razões ponderosas que levassem os melhores desta geração a intervir, tanto mais que a intervenção necessária terá que ser feita através dos partidos e implica necessariamente correr riscos e sujar as mãos. Os riscos fundamentais são os que estão associados à exposição mediática e o sujar das mãos é a necessidade de expurgar o partido em que se intervenha.

A dúvida que se coloca é saber se saberemos reconhecer os sinais de perigo para o regime, a tempo de intervir. De facto, a degradação sucessiva do desempenho dos partidos de poder, pode levar ou ao colapso económico, o que está obviamente longe de se antever de imediato, ou, muito mais grave, à criação de condições para o florescimento de tendências extremistas e populistas que, aproveitando as regras do próprio regime democrático, poderão pô-lo directamente em causa. Veja-se o que se está a passar em Itália, em que claramente a democracia, não a formal mas a substancial, está em risco.

O que há a fazer é pois aderir aos partidos, reunindo grupos de cidadãos disponíveis para, partindo das estruturas locais, promover uma melhoria global do nível médio do militante partidário. Leva tempo, é difícil, mas brevemente será inadiável ...

(Alexandre Candeias Portugal)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM VENEZA, ITÁLIA


Trabalhos de construção civil em Veneza.

(Marco da Cruz)
 


EARLY MORNING BLOGS 715

Siren


I became a criminal when I fell in love.
Before that I was a waitress.

I didn't want to go to Chicago with you.
I wanted to marry you, I wanted
Your wife to suffer.

I wanted her life to be like a play
In which all the parts are sad parts.

Does a good person
Think this way? I deserve

Credit for my courage--

I sat in the dark on your front porch.
Everything was clear to me:
If your wife wouldn't let you go
That proved she didn't love you.
If she loved you
Wouldn't she want you to be happy?

I think now
If I felt less I would be
A better person. I was
A good waitress.
I could carry eight drinks.

I used to tell you my dreams.
Last night I saw a woman sitting in a dark bus--
In the dream, she's weeping, the bus she's on
Is moving away. With one hand
She's waving; the other strokes
An egg carton full of babies.

The dream doesn't rescue the maiden.


(Louise Glück)

*

Bom dia!
 


SÓ PARA SE PERCEBER AS DIFERENÇAS: A CONTROVÉRSIA DO "PISS CHRIST"





Na Wikipedia:
"Piss Christ is a controversial photograph by American photographer Andres Serrano. It depicts a small plastic crucifix submerged in a glass of the artist's urine. Some have suggested that the glass may also contain the artist's blood. The piece was underwritten by the National Endowment for the Arts, which offers support and funding for projects that exhibit artistic excellence.

The piece caused a scandal when it was exhibited in 1987, with detractors accusing Serrano of blasphemy and others raising this as a major issue of artistic freedom. On the floor of the United States Senate, Senators Al D'Amato and Jesse Helms expressed outrage that the piece was supported by the National Endowment for the Arts, since it is a federal taxpayer-financed institute.

Serrano produced other similar works to much less controversy; Madonna and Child II (1989), for example, in which the subject is similarly submerged in urine, is not nearly so well known as "Piss Christ".

Piss Christ is often used as a test-case for the idea of freedom of speech, and was described in the journal Arts & Opinion as "a clash between the interests of artists in freedom of expression on the one hand, and the hurt such works may cause to a section of the community on the other."
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: CONCORDÂNCIAS



Depois de ter publicado o conjunto de cartas, mensagens e comentários de discordância, que, insisto, foram a esmagadora maioria de missivas recebidas, desde ontem tenho vindo a receber correspondência noutro sentido. Aqui ficam as "concordâncias".

*

O grande problema, o problema suicidário do Ocidente é ele mesmo não querer entender que a democracia e a liberdade foram invenção sua, que a relativação, o escrutínio e o respeito pela diferença foram invenção sua e que o metadiscurso no plural assim como a superação de uma estrita teo-semiose também foi invenção sua (como sabemos, o Mu´tazilismo e outras escolas reformadoras do Kalâm, i.e. da filosofia escritural islâmica do séc. IX, duraram muito pouco tempo e não chegaram sequer a esboçar o que, a partir de final de seiscentos, viria a ser modernidade a Ocidente). Hoje em dia, a sobreposição massificadda e mediática de planos e a relativação sem limites (nem valores) conduz a inferências em que o sentido acaba por diluir-se. Daí que muita gente diga, com se repetisse a mais pura invisibilidade de um slogan: se os EUA têm poder nuclear, por que não o há-de ter o Irão? Tenho dito: apoio a sua sucinta mas clara posição.

(Luis Carmelo)

*

Temos de ter cuidado com as susceptibilidades muçulmanas porquê? Quero dizer "nós" enquanto sociedade.
Porque eu posso chocar-me com os desenhos, posso achá-los horríveis, posso querer chamar nomes ao autor - mas é essencial que ele possa publicá-los e que eu possa dizer sobre eles o que entendo - essa é a questão fundamental.
Como é que se pode comparar caricaturas publicadas numa sociedade democrática com propaganda anti-semita? De resto, talvez fosse bom começar a lembrar que o problema da Alemanha nazi não foi a propaganda anti-semita, foi o Holocausto. Não é a mesma coisa. A menos, claro, que se ache também que o Mein Kampf devia ter edição proibida. Há quem ache...

Três notas finais.
Uma. O que pretende Rosa Barros da Costa dizer com "Se os Judeus, nessa altura tivessem reagido como agora o fizeram os muçulmanos, talvez se tivesse evitado o Holocausto"? Acha que os judeus deviam ter feito atentados suicidas nas ruas de Berlim?
Duas. Há um ror de anos, a senhora Tatcher mobilizou os dinheiros públicos que odiava gastar para proteger da ira religiosa Salman Rushdie.
Evidentemente, há quem tenha achado o gesto da senhora Tatcher uma rematada estupidez.
Três. Há alguns anos, a propósito de contracepção e prevenção da SIDA, António publicou no Expresso uma caricatura de João Paulo II com um preservativo no nariz. Haveríamos nós de ver os cristãos queimarem embaixadas portuguesas por esse mundo fora, e até, quem sabe, Pinto Balsemão também? (E note-se: eu compreendo e partilho a ideia do Papa - mas daí a achar que o Papa não é caricaturável vai uma enorme distância.) Nestes dias tenho recordado as palavras de Kennedy em Berlim, há 40 anos. A única resposta decente a este assunto é dizermos: TAMBÉM NÓS SOMOS DINAMARQUESES.

(Luis Teixeira Rodrigues)

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Pegando em MRS ontem à noite e no leitor que refere o caso da chaminé em França, num estado de direito quem se sente ofendido tem a via dos tribunais para ver reparada a ofensa e não a via de queimar bandeiras, atacar embaixadas e ameaçar de morte tudo e todos. E VPV já relembrou a quantidade de “ofensas” que têm sido escritas sobre Cristo e Deus. Eu sou ainda mais radical. Quem não promove o estado de direito, quem apoia terroristas, etc. não tem o direito de exigir seja o que for dos estados direito. E independentemente da fé em si é bom não esquecer que a maioria dos lideres Islâmicos em países Islâmicos não têm promovido a democracia, mas sim as ditaduras religiosas. O pedido de desculpas da governo dinamarquês é ridículo. Num estado de direito o governo não é responsável pelas atitudes dos jornais publicado no país, isso é nas ditaduras, incluindo as muçulmanas. Mas toda a esta subserviência tem uma causa: A DEPEDÊNCIA DO PETRÓLEO. Tudo o resto é acessório.

(Miguel Sebastião)

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Onde estão as vozes todas de indignação quando se goza repetidamente com a imagem de Buda, de Krishna e até do próprio Cristo?
Liberdade significa a possibilidade de se dizer, escrever e mesmo, porque não, desenhar o que se pense e se sinta, sem qualquer censura de lápis azul ou de qualquer outra cor. Não me surpreende que o fundamentalismo islâmico se insurja, pela sua POLÍTICA e não pela sua FÉ - devo frisar -, mas surpreende-me que num continente onde tanto se luta pelas liberdades individuais de cada um se tenha este estilo de reacções como vi dos seus caríssimos leitores.
Indigna-me, espanta-me, surpreende-me que não se perceba que não há intenção no cartoon de ofender fé alguma, apenas de salientar um facto político.

(Jorge Vassalo)

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Eu confesso que a reacção dos seus leitores não me surpreendeu. Muitas pessoas acreditam que se pode manter um regime democrático impondo limites à liberdade de expressão. Para um europeu estes são dias muito tristes, mesmo o governo dinamarquês aparenta ceder. Que raio de democracias são as nossas?

Confesso que me envergonha o facto de os governos ocidentais apresentarem desculpas e reiterarem o respeito pela religião ou religiões. Os governos não têm nada que respeitar religiões, devem tolerar aquelas que são compatíveis com os direitos humanos, e sobretudo zelar para que elas se mantenham fora das práticas governativas. Não me espantava nada que alguém viesse a propor leis anti-blasfémia na UE.
Esta cedência dos governos ocidentais é curiosa, estou a ver a Divina Comédia a ser afastada das salas de aula, e sobretudo as pinturas que mostram detalhes do Inferno de Dante a serem escondidas.

ps Pode parecer paradoxal, mas incomoda-me muito mais o email daquela sua leitora que compara estas caricaturas à campanha anti-semita na Alemanha dos anos 30. É obsceno e monstruoso. Sobretudo quando se constata que o que se passa é exactamente o oposto, estes grupos estão a perseguir activamente aqueles que discordam com eles e a querer abafar a liberdade de expressão noutro país através de manifestações que incluem ameaças de morte e actos de violência. A maioria daqueles que se manifestam não são vítimas de nada, são potenciais algozes.

(Jorge Filipe)

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Quero dizer-lhe que apoio totalmente as suas palavras. É uma questão de liberdade, neste caso de imprensa.

Posso perceber alguns comentários mais desludidos e amargurados, mas não posso aceitar de todo duas coisas :

– Que a minha liberdade de expressão seja posta em causa. Os mais velhos no nosso pais lembram-se do que era isso, e é normamente o principio do fim da liberdade de uma nação de um povo ou de um país.

– A resposta por parte dos paises/populações a estas caricaturas é um pouco exagerada. E parece-me ser motivada politicamente, não sei com que intuito.

(Mário Coimbra)

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Também a mim me doeu o estômago quando li o correio dos seus leitores.

Também eu acho, ou melhor isto não é uma questão de opinião, é uma questão de cerne da democracia, também eu sei que a liberdade de expressão é fundamental.

Qualquer limitação a esta liberdade só pode vir do indivíduo, mas não pode e não deve existir qualquer limitação exterior ao indivíduo – a limitação é a boa consciência ou civismo de cada um.

As caricaturas não saíram (parece-me) na 1ª página do jornal dinamarquês, o assunto remete-se a Setembro passado, os católicos já não incendeiam nem embargam produtos de outros países por motivos religiosos e sim estão no seu direito, como aliás os muçulmanos, de irem para a frente de qualquer assembleia nacional manifestarem o seu desagrado. Seria grossa sobranceria queremos que os muçulmanos modificassem as suas crenças, mas não podemos nós modificar as nossas para lhes agradar, degradando pelo caminho aquilo a que demorámos séculos a chegar – uma democracia avançada – espero eu.

Parafraseando Max Bickford (Richard Dreyfuss na fabulosa série que passou há cerca de 2 anos no 2º canal) – praticamos democracia avançada quando toleramos que se manifestem publicamente grupos de pessoas cujas opiniões nos revolvem o estômago, cujas opiniões são contrárias ao próprio cerne da democracia que lhes permite manifestarem essas opiniões.

Devemos ser firmes nesta convicção, não vacilar.

(Maria Baldinho)

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Primeiro trata-se logo de um jornal europeu e dinamarquês (uma daquelas democracias que nos estão sempre a dizer que são quase perfeitas). Se o jornal tivesse sido americano, haveria mais gente a justificar a não publicação dos desenhos do que o contrário.
Depois, uma coisa é sentir-se ofendido, outra é ameaçar tudo em todos em nome dessa ofensa. Eu entendo perfeitamente que qualquer pessoa se possa sentir ofendida no que respeita aos seus credos. Já não acho legitimo ( inadmissível) que se possa incendiar, partir, querer matar tudo e todos que não concordem com isso. Mas imaginemos que tinha sido caricaturado Jesus Cristo. E a igreja tivesse dito que ofendiam a igreja e os seus acólitos. Apenas com estes actos lá teriamos nós os artigos da esquerda bem pensante que a Igreja era intolerante, fundamentalista, que tinha saudades do Torquemada, do Salazar, etc etc etc. Mas não, como foram os "coitadinhos" dos muçulmanos, já tudo é permitido...
Pior ainda é o medo. A sensação que tenho de medo colectivo é bastante grande. Parece-me que os jornais portugueses que mostraram as imagens fizeram-no num misto de coragem com medo. Sinto que reflectiram muito, muito mesmo se as deviam publicar ou não. Posso estar enganado, mas pelo menos esse misto de medo-coragem reflecte-se pelos jornais e televisões.
O pior de tudo é este relativismo: se justificarmos, se legitimarmos actos como invasões e queima de embaixadas, ameaças ao nosso mundo ocidental como o vivemos hoje, estamos cada dia a alimentar o monstro. Até que um dia....

Apenas um episódio: o meu avô é uma pessoa profundamente católica. Quando um dia o jornal "expresso" publicou o célebre cartoon do Papa com o preservativo, deixou de comprar o semanário e escreveu uma carta a protestar. Até hoje. É esta a diferença entre dois mundos. Uma em que nos podemos sentir ofendidos e respondemos civilizadamente, e outra em que não há espaço para a critica. Pacheco Pereira tem razão. Ou há ou não há liberdade. O resto é retórica, demagogia e populismos.

(Filipe Figueiredo)

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Como sou um leitor seu à muitos anos gostaria de lhe transmitir em relação ao caso das caricaturas um ponto de vista não referido:- Os desenhos têm piada.
Não percebo porque é que o argumento do mérito artistico não é colocado, não são propriamente rabiscos sem o mínimo sentido estético.
Têm sentido de humor, acutilância, traço, nervo...são arte.
Se perdemos o nosso sentido de humor e capacidade de rirmos com católicos, islamitas, xintoistas, budistas e todos os daístas estamos a capar a nossa liberdade.

PS: Coloque um imagem do José Vilhena para chatear os moralistas.(*)

(Gonçalo Carvalho)
(NOTA de JPP: Vilhena tem muitas caricaturas de Deus-Pai e de Cristo.)

5.2.06
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: DISCORDÂNCIAS



Estas são algumas das mensagens que leitores do Abrupto me enviaram sobre a questão das caricaturas dinamarquesas. São representativas da esmagadora maioria da correspondência recebida. Raras vezes comento o que os leitores, que comigo "fazem" o Abrupto, entendem dizer, em particular quando exprimem opiniões diferentes da minha. Neste caso, discordo, discordo de todo, com o que dizem. Anoto apenas a minha surpresa com a facilidade com que são postos em causa valores que sempre pensei serem parte fundamental da nossa visão civilizacional da sociedade, aceitando-se uma relativização que, penso, põe em causa o cerne desses valores. O nosso entendimento de liberdade, de expressão e opinião, tem no centro o direito de os outros se exprimirem com toda a liberdade, mesmo que isso nos ofenda. É o direito de os outros dizerem aquilo que mais nos choca, que quem ama a liberdade defende acima de tudo. Não há relativização possível para este critério, o único que está em causa face a desenhos satíricos que são, em última razão, desenhos políticos. A maior das mistificações está em se pensar que estamos perante uma questão religiosa, quando se está perante uma questão política.

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Relativamente ao seu post no Abrupto, do passado dia 3 de Fevereiro do corrente,(o post das 14.32) permita-me discordar, vivamente de si, quando afirma, relativamente à questão das caricaturas dinamarquesas que e passo a citar"é extremamente simplese começa e acaba numa linha: é uma questão de liberdade. Ou há ou não há".
Confesso-lhe que me senti absolutamente desiludida por esta afirmação vinda de uma pessoa com a sua formação filosófica, quando conhece o estatuto ôntico da liberdade. Como sabe esta questão ultrapassa qualquer questiúncula filosófica, porque afecta algo que está para além do bem e do mal, do certo e do errado, do verdadeiro e do falso. O que está em causa são princípios e valores, abraçados por um bilião e meio de pessoa, que traduzem uma absoluta Fé em Deus. Além disso, qualquer meio de comunicação social credível tem um estatuto editorial, em que fundamenta as linhas orientadoras das suas publicações. Quando se insinua algo de falso num orgão de comunicação social, quem é visado tem o direito de recorrer às vias legais para defender o seu bom nome.
O que acontece aqui é que o bom nome do profeta (saw) foi posto em causa, assim como os princípios e fundamentos do Islão, situação perigosíssima, associada a uma absoluta falta de informação sobre o que é ser-se muçulmano/a. Perante a publicação de injúrias e difamações, camufladas de sátira inocente, só se poderia assistir ao levantamento das populações muçulmanas contra o que se passou, com todas as situações perigosas e condenáveis que surgem associadas a estas situações.
A publicação destes cartoons só é comparável à propaganda anti semita perpetrada pelo regime nazi, na Alemanha, nos passados anos 30, do século XX, que culminou no Holocausto. Se os Judeus, nessa altura tivessem reagido como agora o fizeram os muçulmanos, talvez se tivesse evitado o Holocausto.

Como muçulmana, como cidadã portuguesa, como europeia, sinto-me ultrajada por se conotar liberdade com tais práticas.

(Rosa Barros da Costa)
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Relativamente a este tema, discordo profundamente de si. É evidente que o direito de livre expressão e o direito de imprensa são, em qualquer Estado democrático que se preze, fundamentais e não devem ser tocados. Mas isso significa abuso? Se me permite uma analogia com o mundo jurídico, se alguém tem um direito – qualquer que ele seja – tal não significa que possa usá-lo conforme queira e bem lhe apeteça. Se o fizer, deixa de ser um uso legítimo e passa a ser um abuso de direito. Porventura, saberá como esta figura nasceu e começou a ser aplicada: em França, no século XIX, a propósito do uso da propriedade privada e das relações de vizinhança. O Sr. A não gostava do seu vizinho, B, e decidiu “prejudicá-lo” construindo uma chaminé tão alta que lhe fazia sombra o dia inteiro, impedindo-o assim de gozar o sol. Alegadamente, fê-lo no uso legítimo de um direito – o de propriedade – até aí de forma indiscutível. Só que os tribunais consideraram que tal uso era ilegítimo, porquanto lesava um direito alheio.

Ora, na questão das caricaturas, há uma coisa que me faz profunda espécie: que sobranceria é a nossa (católicos, agnósticos, ateus, etc.) para tentarmos impor os nossos valores a uma cultura por sinal milenar que deveria, no mínimo, merecer-nos respeito? Ontem mesmo o José Manuel Fernandes deu a resposta quando deu o exemplo de não se fazer uma 1.ª página de um jornal com uma imagem pornográfica. Porquê? Porque ofende os nossos valores e a nossa sensibilidade. Não se passará a mesma coisa com a publicação de imagens do Profeta Maomé? Se para si ou para mim a sua publicação não é ofensiva, também terá que o não ser para os muçulmanos? Que direito à livre expressão se sobrepõe ao respeito que nos deve merecer outras crenças e formas de vida?

O problema é que hoje em dia não se acredita em nada. Ao ver na SIC-N a entrevista do João Adelino Faria e da Ana Lourenço ao Sheik Munir, fiquei chocado quando o primeiro, a certa altura, perguntou se o Sheik não considerava desmedida esta reacção do mundo islâmico, vista que se tratavam apenas de “desenhos” (sic)!!

Sem discutir que os muçulmanos devem, em muitos aspectos, “abrir” a actualizar as suas crenças, considero que esta iniciativa do mundo ocidental apenas tem o efeito contrário e não ajuda a pacificar a coexistência entre os dois mundos.

(Rui Esperança)

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Basta ler a Constituição, o Código Penal e Lei de Imprensa, sem mencionar uma infinidade de literatura jurídica sobre o assunto, para compreender que a liberdade de imprensa, a liberdade de expressão, a liberdade artística e todas as liberdades têm limites. Têm limites jurídicos, têm limites morais e têm limites de bom senso.
Mas, para compreender isto, é preciso não ser tão fundamentalista como os outros fundamentalistas. Ser fundamentalista é recusar o outro, recusar ouvir, recusar pensar, recusar conceder.
O que há entre o Islão e o Ocidente não é um conflito de culturas, nem um conflito de religiões: é um conflito de estupidezes.
Todas as terras, todos os povos, todas as religiões têm os seus estúpidos. Quando eles dominam, é uma estupidez.
É um estupidez provocar e agravar uma situação que já não é boa.
Que Deus - o mesmo Deus dos judeus, dos cristãos e dos muçulmanos - nos acuda, e faça cair do Céu, como o maná na Biblia, um bocadinho de inteligência.

(Pedro Pais de Vasconcelos)

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Li o seu post sobre a publicação das fotos dinamarquesas e eu, que muito gosto de o ouvir e ler, não o comprendi. Acha que a liberdade existe em absoluto?

(M.J. C. Moreira)

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Parece-me que a questão não é tão simples como a põe. A liberdade tem o seu pendant, como o direito: acaba aonde começa o do outro.

(Monika Kietzmann)

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Juro que adorava saber qual foi a sua reacção quando surgirem problemas parecidos com estes em Portugal.

Gostava de saber se o seu raciocínio na altura foi tão esquemático quando os católicos se insurgiram, por exemplo, contra O Evangelho segundo Jesus Cristo ou a rábula que o Herman José fez da última ceia de Jesus Cristo. Há muita gente agora indignada contra os muçulmanos que na altura tomaram partido da Igreja.

(Mário Azevedo)

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"A história das caricaturas dinamarquesas é extremamente simples e começa e acaba num linha: é uma questão de liberdade. Ou há, ou não há."
No contexto actual é mais do que "uma questão de liberdade" é também uma questão de bom senso. Num clima "conflituoso" como aquele em que vivemos (Ocidente) com o mundo islâmico (mais fundamentalista) era de esperar. Ou é ignorância ou insensatez.

(Conceição Soares)

*

Acho que toda a gente já se esqueceu dos casos equivalentes cá no Burgo. Lembram-se das manifs de católicos à porta das amoreiras por causa da Sagrada Família com uma alface no lugar do menino? É certo que não se incendiaram bandeiras nem se dispararam tiros, mas seria bom que todos tivessemos a noção que se trata de um tema que não é simples, ao contrário do que você diz. E que todos pensassemos um pouco na velha máxima "não faças aos outros o que não gostas que te façam a ti"

(João Paulo Telo)

*

«A história das caricaturas dinamarquesas é extremamente simples e começa e acaba NUMA LINHA: é uma questão de liberdade. Ou há, ou não há».

A realidade não é assim tão simples pois, nas relações humanas, há OUTRAS LINHAS, que não são PARALELAS mas sim CONCORRENTES:

Toda a gente sabe que «a nossa liberdade termina onde começa a dos outros», e «a liberdade de não ser insultado» é - alguém tem dúvidas? - uma delas.

Acresce que, normalmente, um conflito desses se resolve nos tribunais mas, neste caso, isso não será possível.

NOTA: Eu vivi de perto a realidade de três países muçulmanos (Marrocos, Tunísia e Argélia) e vejo que, neste caso, há uma dose de insensibilidade que ultrapassa (em quantidade e qualidade) o que eu julgaria ser possível hoje em dia.

(C. Medina Ribeiro)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM PORTUGAL HOJE, DOMINGO, DIA DE DESCANSO





Pequeno almoço dos feirantes em S. João da Corveira, Carrazeda de Montenegro, Trás-os-Montes. Hoje de manhã, à primeira luz, num chão coberto de gelo.

4.2.06
 


COISAS SIMPLES


Edward Ruscha, Us
 


EARLY MORNING BLOGS 714

Samuel Gardner

I who kept the greenhouse,
Lover of trees and flowers,
Oft in life saw this umbrageous elm,
Measuring its generous branches with my eye,
And listened to its rejoicing leaves
Lovingly patting each other
With sweet aeolian whispers.
And well they might:
For the roots had grown so wide and deep
That the soil of the hill could not withhold
Aught of its virtue, enriched by rain,
And warmed by the sun;
But yielded it all to the thrifty roots,
Through which it was drawn and whirled to the trunk,
And thence to the branches, and into the leaves,
Wherefrom the breeze took life and sang.
Now I, an under-tenant of the earth, can see
That the branches of a tree
Spread no wider than its roots.
And how shall the soul of a man
Be larger than the life he has lived?


Dow Kritt

Samuel is forever talking of his elm --
But I did not need to die to learn about roots:
I, who dug all the ditches about Spoon River.
Look at my elm!
Sprung from as good a seed as his,
Sown at the same time,
It is dying at the top:
Not from lack of life, nor fungus,
Nor destroying insect, as the sexton thinks.
Look, Samuel, where the roots have struck rock,
And can no further spread.
And all the while the top of the tree
Is tiring itself out, and dying,
Trying to grow.


(Edgar Lee Masters)

*

Bom dia!
 


OBSERVAÇÕES PÓS-PRESIDENCIAIS



Não se ouviu até agora uma única palavra de crítica, reflexão, análise, seja lá o que for, por parte daqueles que patrocinaram ou deram cobertura à aventura de Mário Soares. O que todos eles estão a fazer é a bater em Alegre numa última manifestação de mau perder. O tardo-soarismo acha que não tem qualquer responsabilidade no que aconteceu, mesmo no resultado de Alegre.

3.2.06
 


UMA DAS MINHAS CASAS FAZ CEM ANOS


lá estarei para comemorar.
 


RETRATOS DO TRABALHO EM PORTUGAL


Limpador de janelas.

(Afonso Azevedo Neves)
 


BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES
(3 de Fevereiro de 2006)


___________________________

A história das caricaturas dinamarquesas é extremamente simples e começa e acaba numa linha: é uma questão de liberdade. Ou há, ou não há.

O que é novo e precupante são as toalhas de palavras e justificações que começam a ocultar o que devia ser absolutamente simples e onde qualquer palavra a mais é demais.

*

Novos problemas (da BBC News) :

"Libraries have warned that the rise of digital publishing may make it harder or even impossible to access items in their collections in the future. Many publishers put restrictions on how digital books and journals can be used. Such digital rights management (DRM) controls may block some legitimate uses, the British Library has said. And there are fears that restricted works may not be safe for future generations if people can no longer unlock them when technology evolves. The British Library spends £2m of its £16m annual acquisitions budget on digital material, mainly reference books and journals. "
 


RETRATOS DO TRABALHO EM PORTUGAL



Ao ver as fotos que tem colocado do trabalho em Portugal, lembrei-me que aqui, no Arquivo Fotográfico Municipal da Figueira da Foz, temos uma quantidade de imagens relativas ao tema muito interessantes.Junto envio uma imagem relativa às Marinhas de sal de Lavos de 1942.

(Guida Cândido)
 


CRISTIAN BARBAROSIE / ANCA-MARIA TOADER
POEMAS PROIBIDOS DA ROMÉNIA DOS TEMPOS DE CEAUSESCU


1

Lá fora está um gelo,
A minha casa está um gelo.
Abro a janela e grito:
"Agradeço ao Partido amado,
por me ter treinado !"

(Anónimo)

NOTA: Poema que circulava na altura de boca em boca.

2

Alexandru Andries - Drácula blues

Na corte do voivoda há grande reunião,
Estão fidalgos sentados, e alguns de pé estão, Analisam problemas, discutem o que incomoda, o que não vai bem; Em lugar de honra, sentado, está o próprio Drácula, O fidalgo Velea chama a presença e faz a contagem.

Levanta-se Basil e diz: "Meu Voivoda,
Estamos bem com a produção de cereais e de carne, Ultrapassámos a planificação na indústria de resíduos E fui informado que já ninguem rouba; "Na produção de paus para empalar, Meu Voivoda, somos os primeiros no mundo Até ultrapassámos os americanos, sem receio, podemos dizê-lo!"

"Mas existem problemas mesmo na industria de paus!"
Levanta-se e diz o fidalgo Sulea Trepe.
"Já não temos madeira de plátano, a produção está parada desde óntem, E o carvalho, Dom Empalador, guardámo-lo para fidalgos, Por isso proponho que se façam os paus de madeira de ameixoeira!
Haverá menos bêbados e a madeira é razoavelmente boa ..."

"É uma boa proposta", diz Drácula, "Proponho que a partir de amanhã comece a produção com madeira de ameixoeira!
Que tudo corra bem, o pau de empalar que fique bom Que não desprezem o projecto de design, Que o pau seja esbelto, que satisfaça o cliente Que fique a condizer com o clima e o ambiente, Que enviem elementos do quadro para especialização, A poupança de madeira que não fique esquecida, Por um projecto judicioso que eliminem qualquer sofisma Do modo a que os pau resistem até em caso de sísmo!"

3

Alexandru Andries - Mercearia blues

Abriu a mercearia ao lado da minha casa ...
As prateleiras estão todas vazias,
A loja está cheia de gente !

Passada meia hora chega a carrinha,
Não sabemos o que trouxe, pois entretanto faltou a luz.

Ficamos todos na bicha duas horas e meia, Nós temos BIs, eles pedem passaportes !


NOTA - Nos anos 80, a capital Bucareste era melhor abastecida do que o resto do país. Como consequência, muitas pessoas se deslocavam frequentemente para a capital, com o único objectivo de comprar comida. Para contrariar este fenómeno, as autoridades introduziram a medida de em Bucareste apenas venderem alimentos a pessoas com residência na capital, pelo que era exigida a apresentação do BI. Quanto a passaportes, ninguém tinha, claro.

(Traduções originais)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM BUDAPESTE, HUNGRIA


A caminho do trabalho, Budapeste, 2002

(Paulo Azevedo)
 


EARLY MORNING BLOGS 713

La passe




Deux mondes s’abouchent ici. Pour ici monter, quels obstacles ! quelle refoulée des caravanes ! quels gains répétés ! quels espoirs !

M'y voilà, dis-tu ? Souffle. Regarde : à travers l'arche de la Longue-Muraille, toute la Mongolie-aux-herbes déploie son van au bord de l'horizon.

C'est toutes les promesses : la randonnée, la course en plaine, l'ambleur à l'étape infinie, et l'évasement sans bornes, et l'envolée, la dispersion.

*

Tout cela ? Oui. Mais regarde une fois en arrière : l'âpre montée, le rocailleux désir, l'effort allègre et allégeant.

Tu ne le sentiras plus, la Passe franchie. Ceci est vrai.

(Victor Segalen)

*

Bom dia!
 


BIBLIOFILIA: CAPAS DE POLICIAIS


2.2.06
 


A LENTA DISSOLUÇÃO DOS PARTIDOS - FICÇÕES DE BAIXO



Era uma vez um partido político no Reino do Volfrâmio. Era e não era. Era porque era, mas também não era. Confuso, não é? Era um híbrido, meio partido político, meio outra entidade nova que se estava a formar, mutante. Um monstro pois, mas um monstro que não era único. Todos os partidos políticos do chamado Arco Constitucional do Reino eram idênticos, mais coisa, menos coisa.

Comecemos por analisar o que acontece "em baixo", no rank and file partidário, para depois irmos "para cima". Imaginem um dirigente de segunda linha desse partido, o chefe da organização num distrito, numa "província", numa região. À sua frente tinha uma débil máquina eleitoral, e uma corporação, agrupando os responsáveis políticos cujas carreiras eram reguladas pelas regras internas do partido, quase todas não escritas, e que se relacionavam num sindicato de interesses, esse sim poderoso.

A parte da máquina eleitoral era cada vez menos importante e a organização era mais eficaz para outros fins e objectivos do que para obter votos numa eleição. Funcionava para garantir a prova de vida do partido, como factor de identidade para meia dúzia de velhos militantes que tinham "amor à camisola" e já estavam por tudo. Os "idealistas", os que estavam "passados", os que era preciso "renovar" como diziam os "jovens", que tinham normalmente como programa garantir a "renovação geracional", ou seja, retirar aos mais velhos todos os cargos que eles ainda podiam manter, ou todos os obstáculos que colocassem a serem eles sozinhos a mandar.

O que era fundamental numa eleição eram as campanhas eleitorais, para que, gastando-se dinheiro, se alimentasse parte da corporação, que obtinha assim, em períodos de campanhas eleitorais, lucros excepcionais. Obtinha-os do lado dos financiamentos, quase todos feitos por debaixo da mesa e fora do controlo das leis, e que permitiam que alguma coisa ficasse pelo caminho. Mas igualmente importantes eram as oportunidades de despesas eleitorais, sempre exigidas como necessárias, mesmo quando era evidente que não havia qualquer correlação entre o dinheiro que se gastava e os resultados eleitorais. As despesas alimentavam muitos burocratas da corporação, que eram intermediários para compras de bens e serviços, "brindes", marketing, publicidade, tipografias, cartazes, fotografias, salas, cantores, grupos rock, carros e camionetas. Antigos funcionários do partido tinham saído dessa condição para criarem "empresas amigas" que obtinham essas contratações em períodos eleitorais e não só, e que forneciam, a preços acima do mercado e com qualidade inferior, os mesmos serviços que antigamente eram oferecidos ou pela militância gratuita ou pela actividade profissional. Pelo caminho ficava muita coisa: "jovens" que recebiam uma "gratificação" pela militância, paga por outros "jovens" que nunca tinham tido na mão tanto dinheiro para pagar a "equipas" cuja existência e actividades não eram controladas por ninguém. "Pais" que apareciam à porta das sedes para receber o "trabalho" dos filhos que tinham "andado na campanha com o compromisso de serem pagos", e entretanto desaparecera o dinheiro. Numa campanha distrital em que se gastou uma grande fortuna, no fim nem um prego sobrou. Por singular coincidência, todos os bens comprados eram perecíveis, ou desapareceram por milagre no dia seguinte: computadores, impressoras, telemóveis, etc., etc.

O que é que se esperava desse dirigente de segunda linha? Que ganhasse eleições? Longe disso, ganhar eleições era um resultado superveniente, que muitas vezes trazia complicações reforçando a independência do dirigente em causa, fazendo-o escapar ao controlo da burocracia corporativa. Esperava-se que actuasse da melhor maneira para gerir as carreiras políticas que dele dependiam, que alargasse o campo da empregabilidade para cada um e a sua família, fizesse um upgrade dos empregos e, em tempos infaustos, que não os perdesse. Esperava-se que fosse o chefe do sindicato de dentro, não o intérprete das esperanças de fora.

Havia nos livros do partido uns milhares de militantes, mas efectivamente estes não existiam como tal. Em cada secção do partido existiam cem, duzentos, mil inscritos, de que nem dez por cento frequentavam as sedes e as reuniões, e metade destes eram membros da nomenclatura partidária. A esmagadora maioria dos membros que apareciam como pagando cota efectivamente não as pagavam, mas sim o presidente da secção ou o presidente dos "jovens" que os tinham como massa de manobra eleitoral. O pagamento colectivo de cotas era uma maneira de manter o controlo político de secções, federações e distritais, ou de inflacionar o número de militantes para garantir mais poder de negociação e mais delegados em congresso. Numa secção, o número dos militantes habitual eram oitenta, mas na véspera de cada acto eleitoral duplicava pela mão do presidente, que depois os fazia desaparecer até à próxima vez. Assim poupava nas cotas e garantia a reeleição, ao mesmo tempo que atrasava as filiações novas, que metia numa gaveta.

Havia casos em que os militantes nem sequer existiam, eram "fantasmas". Moravam todos numa única casa, para terem uma concentração numa secção quando era útil em termos de sindicato de voto "ganhar" aí as eleições. Falava-se de um talho, ou de um número numa rua que era um tapume, e onde "moravam" dezenas de militantes. O controlo dos cadernos eleitorais e dos registos de filiação, das listas de mailing e outras, eram essenciais para manipular eleições. Havia métodos sofisticados e primitivos. Uma vez um responsável dos "jovens" foi descoberto a assinar delegações de voto em série, cometendo o pequeno erro de o fazer em relação a um militante que entretanto tinha ido para a Austrália e deixado de dar notícias. Foi apanhado na falsificação, mas essa pequena circunstância não lhe impediu continuar uma carreira dentro do partido sem qualquer sobressalto. Aliás, nenhuma destas malfeitorias, conhecidas de todos e comentadas ao sabor das amizades e inimizades, tinha qualquer papel nas carreiras militantes.

Embora o partido fosse único, havia uma feroz competição entre três grupos organizados, que se aliavam, se separavam, se fundiam e distinguiam conforme as circunstâncias: os "jovens", os "trabalhadores" e os adultos. Através de mecanismos de inerências de voto, era possível potenciar a representação. Os adultos eram na sua maioria os que estavam lá como se aquela fosse a sua família, eram os do "amor à camisola", ou outros nunca lá iam a não ser quando se lhes pedia para ir votar no amigo, no familiar, no colega. Alguns eram antigos "jovens" e mantinham mecanismos a que chamavam de "solidariedade geracional", ou seja, organizavam-se entre si para manter uma transumância do poder à medida que iam dos "jovens" para adultos.

(Continua)

*

Sem partidos políticos, sem representação das "partes" políticas e ideológicas, não há democracia representativa, a única que conheço que existe como democracia. Mas destas máquinas de interesses e carreiras não precisamos. O autor é ingénuo e pensa que há partidos fora deste estado dos partidos no Reino do Volfrâmio? Pensa, o que pode ser a maior das ingenuidades.

(No Público)

*
Depois de ler o seu artigo lembrei-me, ainda, do livro de Anthony Sampson, Who runs this place?
"...(hoje) entram nos partidos como numa associação e vão subindo na hierarquia, sem necessitarem de outros conhecimentos. O resultado é um "paradoxo": quanto mais profissionais são os políticos menos representam os comuns eleitores. Os partidos deixam de representar ideais fixos, antes são uma coligação temporária de interesses...
"

Anthony Sampson, Who runs this place?: the anatomy of Britain in the 21st century, Ed. John Murray, 418 pg, 2004

(Nuno de Matos)

*

1.A realidade estatutária ao atribuir aos Presidentes das Distritais o poder de indicar os candidatos para deputados, para orgãos autárquicos, para empresas públicas, autárquicas e mesmo lugares da administração pública apurou uma raça que luta pela vida. Pela sua vida. Obviamente vencedora sobre os que trabalham e estão na politica por contributo civico e ideológico.

2. Assim a vida partidária reduziu-se à luta pelas distritais. Esta luta começa no controle das Secções. Apoia-me que eu te apoio agora e no futuro. Na lista do Eng.Carmona estão todos os Presidentes das secções de Lisboa do PSD.

3. Assim uma revisão estatutária para promover a regeneração do Partido precisa de retirar aqueles poderes às distritais.

4. Quanto às quotas é muito simples. Que o ter as quotas pagas deixe de ser uma exigência para se poder votar. Em contrapartida quem tiver as quotas por pagar ao fim de dois anos deve receber um aviso para as pagar em quinze dias, passados os quais deixará de ser, administrativamente, militante do partido.(Podendo eventualmente ser colocado num ficheiro de simpatizantes)

(António Alvim)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: MAU AMBIENTE



No seguimento de seu pertinente comentário de ontem na SIC-N relativo a eventuais contrapartidas ambientais para os previstos novos projectos que se avizinham para o Pais, penso ser extremamente oportuno que tome conhecimento da situação relativa ao controlo das emissões atmosféricas em fontes fixas industriais. De facto partir o passado dia 23 de Janeiro de 2006 uma portaria (em anexo) isenta cerca de 95% das empresas do Pais do cumprimento dos valores limites de emissão (VLE) e do autocontolo das suas emissões, dado o exagero que os caudais massicos minimos admissiveis passaram a ser .Embora provavelmente seja leigo nestas questões poderá verificar que com esta nova Portaria as empresas podem emitir sem qualquer tipo de problema e sem necessidade de autocontole (apenas um vez de 3 em 3 anos, que obviamente vão dar bem...) os seguintes valores:

Monoxido de carbono .120 Kg/dia por fonte(chaminé)
Particulas 12 Kg/ dia. chaminé
Dioxido de enxofre: 48 Kg/dia.chaminé
Oxidos de azoto: 48 Kg/dia .chaminé
Compostos organicos volateis: 48kg/dia. chaminé
etc.

E não, não me enganei ao referir kilos/dia, sendo que o que talvez seria de esperar nestes áreas seriam gramas ou miligramas/dia !......
Mais grave é o facto desta portaria ter sido elaborada (encomendada?) no governo de Nobre Guedes e um ano depois e embora alvo de contestações de empresas do sector com conhecimentos das reais e graves implicações da sua aplicação, nada tenho sido alterado nem nos tenha sido sequer dada a possibilidade de expormos o nosso ponto de vista neste claro retocesso ambiental contra tudo o que seria de esperar neste momento!


(Pedro Silva)
 


INTENDÊNCIA

Actualizada a nota OS NOVOS CONSERVADORES.
 


RETRATOS DO TRABALHO EM PORTUGAL


Trabalho na construção da Seca do Bacalhau em Lavadores V. N. de Gaia, nos anos quarenta.

(Francisco Bernardo)
 


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(2 de Fevereiro de 2006)


___________________________


Manuel Pinto no Jornalismo e Comunicação sobre o "caso Teresa e Lena":
"Desenvolvimentos desta linha de pesquisa vieram chamar a atenção para o facto de que, também a montante, o poder de agendamento se pode exercer. Ou seja, as fontes, por efeitos da sua crescente organização e profissionalização, ou em consequência de se terem socializado nos valores-notícia do jornalismo dominante, encontrariam, cada vez mais, formas de influenciar e marcar a agenda mediática.
O "caso Teresa e Lena" constitui, nos tempos mais recentes, um dos melhores exemplos desse poder de agendamento. E tem todos os ingredientes para pôr um certo jornalismo a salivar. Foi pensado para isso e vai seguramente conseguir o que projectou. Veremos."

*

Vidas e obras (neste caso obra): Harper Lee que escreveu To Kill a Mockingbird e que, gregarious for a day, aparece uma vez por ano.

*

As relações (ou a ausência delas) entre a filosofia ocidental e a oriental neste muito interessante artigo da Prospect:
"Kumarila claims that something that is called an "I" exists, established by the fact that an I is constantly present in thinking. Sankara, however, argues that this only shows that there is subjectivity —the presence of consciousness—not that there is an object named "I." The apparent existence of an objective self is an illusion, created by the logic of the grammatical use of "I" in language.

Strange names, certainly. Strange thoughts? Anybody who has read philosophy in the west will not think so—provided that Kumarila (7th century) is replaced with Descartes (17th) and Sankara (8th) with Kant (18th). The point is not the polemical one about whether it was Indians or Europeans who had these thoughts first (the ancient Greeks and early Islamic thinkers are also in the running). The point is not that the Indians deserve study because they thought like Europeans. The point is simply that, for many reasons, the Indian thinkers are unknown to contemporary western philosophy, and are likely to remain so. The same is true of Chinese thinkers."
*

Mistério dos blogues: estes dois, que apareceram a saudar a neve, continuam lá em baixo divertidos, ou param quando não os vemos? E nunca se cansam?

*

Bom, bom:
Post parido a meias com o JPH ( e mais uma data de gente)

-Com quantas mulheres já estiveste?
-Visits ou page views?
(No Mau Tempo no Canil, e com Mozart)
 


RETRATOS DO TRABALHO NO BANGLADESH



No passado mês de Novembro tive a oportunidade de regressar um mês à Índia e ao Bangladesh como bolseiro da Fundação Oriente para fotografar e registar os "desmantelamentos de barcos" de grande porte nas praias. É um problema gravíssimo a dois níveis: social e ambiental. Neste momento preparo um artigo para ser publicado na revista da Fundação Oriente que descreve exactamente toda esta problemática, ou melhor, o trabalho publicado será fotográfico - o artigo será complementar para a percepção das imagens.

Junto envio fotografias minhas referentes a este trabalho, que fazem parte do "lote" revelador do fenómeno socio-ambiental do shipbreaking [mais especificamente nas praias de Chittagong, no Bangladesh] tão desconhecido por estes lados. Estas fotos já foram apresentadas na televisão [na :2] em Janeiro, num programa sobre os bolseiros da F. O. e para além disso também estão online no meu blog nos arquivos do mesmo mês.

Ver também
Post publicado no meu blog de arquitectura.

(Pedro Duarte Bento)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM MOÇAMBIQUE



Ntaluma, um escultor Makonde (Norte de Moçambique).

As esculturas Makonde são bastante elaboradas e interessantes e são normalmente vendidas a turistas e coleccionadores.

(Jaime Machado)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: TUDO É NOME DE BLOGUE

- Mãe, Mãe como é que é o pretérito mais que perfeito do verbo CUMPRIR?

- Não sei. Deixa-me pensar, o pretérito perfeito é eu cumpri, o imperfeito eu cumpria ... mas o mais que perfeito não estou a ver ....

- E eu esqueci-me da gramática na escola.

- Huuummm e se fôssemos ao Google?

- Aposto em como não dá nada. Ou é um nome de um blogue.

- Vamos ver ....

... dez segundos: olha, olha: É "Eu cumprira"!

- Vês? A internet é o máximo, podemos aprender TUDO!

- Ó Mãe podíamos fazer um blogue os dois, chamado "Pretérito mais que perfeito", um blogue para miúdos e graúdos! Eu escrevia palavrões e a Mãe escrevia sobre o Sócrates! E ganhávamos imenso dinheiro!

(R.)
 


COISAS SIMPLES


David Smith, Carta
 


EARLY MORNING BLOGS 712

Class-Mates

Bob Briggs went in for Government,
And helps to run the State;
Some day they say he'll represent
His party in debate:
But with punk politics his job,
I do not envy Bob.

Jim Jones went in for writing books,
Best sellers were his aim;
He's ten years younger than he looks,
And licks the heels of Fame:
Though shop-girls make a fuss of him
I do not envy Jim.

Joe Giles went in for grabbing gold,
And grovelled in the dirt;
He, too, looks prematurely old,
His gastric ulcers hurt:
Although he has a heap of dough.
I do not envy Joe.

I've neither fame nor power nor wealth,
I fish and hunt for food;
But I have heaps of rugged health,
And life seems mighty good.
So when my class-mates come to spend
A week-end in my shack,
With lake and wood at journey's end
--They envy Jack.


(Robert William Service)

*

Bom dia!

1.2.06
 


OS NOVOS CONSERVADORES



É-me bastante indiferente esta polémica sobre o casamento para homossexuais, que não penso que toque nada de importante quer no que se adquiriu de tolerância na sociedade, quer no que não se adquiriu. E aqui tolerância é o direito de cada um viver como entende.

Mas, poucas coisas conheço mais conservadoras do que reivindicar o “casamento” para os homossexuais. Nem mais nem menos do que o “casamento”, essa sobrevivência na lei do mandamento cristão-católico. Se a reivindicação fosse feita à Igreja, para um acto religioso por parte dos crentes, ainda se entendia. Mas exigi-lo ao Estado, dá como resultado reforçar-se ainda mais a centralidade da instituição “casamento” nas relações afectivas, e isso parece-me conservador, para não dizer outra coisa. O que é que se espera no “casamento” que não se tem na união de facto? A obrigação contratual de “fidelidade”?

Sou avesso a que o Estado legisle muito sobre intimidades, afectos e modos de vida. Isto de se valorizar a diferença, de se andar a dizer “todos diferentes, todos iguais”, só tem sentido quando de facto valorizamos a diferença e não quando queremos que se normalize a sociedade, se mate a diversidade. E quanto aos argumentos legais, se é assim, então por que não se aceita a poligamia na ordem jurídica? Mormons e muçulmanos não têm direito à sua visão do mundo? Podem ser discriminados por razões religiosas? Não é contra a Constituição?

*

Há dias, as duas lésbicas que pretendem casar-se foram entrevistadas por um canal de televisão e, no decorrer da entrevista, uma delas deu como motivo para se quererem casar o desejo de terem os mesmos direitos que os casais heterossexuais. Por sua vez, a sua leitora Ana Mouta enviou-lhe um e-mail com uma lista de direitos dos casais que não estão em vigor no caso das uniões de facto.

O que me impressiona nestes dois casos é que só se discutam os direitos ao mesmo tempo que se ignoram totalmente os deveres. Mas num casamento também há deveres. Com efeito, o Código Civil declara que «[o]s cônjuges estão reciprocamente vinculados pelos deveres de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência». Ou será que o que se pretende aqui é que as uniões de facto tenham os mesmos direitos que o casamento mas nenhuns deveres?

Nada tenho contra o casamento entre homossexuais, desde que se trate efectivamente de um casamento, ou seja, com os mesmos direitos e deveres que o casamento entre heterossexuais.

(José Carlos Santos)
*
Parece-me completamente errado atribuir às uniões de facto uma quase equivalência ao casamento. O que é que fazem duas pessoas que querem viver juntas sem os compromissos, direitos e deveres inerentes ao casamento? Por este andar já nem sequer podem optar por uma união de facto, pois ficam automaticamente quase casados! Não se podem tratar aos adultos como crianças. Quem não se casa tem obrigação de saber que a sua situação é, por definição e segundo a lei, menos "estável" do que quem resolve "assinar os papéis". Tal como num contrato de outra espécie qualquer, a informalidade tem vantagens e inconvenientes. Deixemos as pessoas escolherem o que querem para si, sem lhes tentarmos impingir um quase-casamento à força de uma lei super-protectora.

(Tiago Fernandes)
*
Quando diz, no post "Os novos conservadores", "O que é que se espera no “casamento” que não se tem na união de facto? A obrigação contratual de “fidelidade”?", posso dar-lhe alguns exemplos:
-O direito de visita, enquanto familiar, nos hospitais e nas prisões; -Direitos sucessórios, nomeadamente a possibilidade de herdar património comum; -As actuais leis de imigração portuguesas são restritivas dos direitos. A União de Facto não é útil, pelo menos de forma directa, para os processos de legalização, visto que a Lei das Uniões não prevê o direito ao reagrupamento familiar; -Da mesma forma não está previsto o reconhecimento em Portugal de uniões de facto celebradas noutros países, nem sequer no âmbito da UE; -A forma de pôr fim à União de Facto não está regulamentada.
(Fonte: Portugal Gay)

O conceito de "casamento civil" não é mais do que uma "união de facto" com todos os direitos, não tem nada de conservador.

(Ana Mouta)
*

Já Foucault defendia que os homossexuais deviam aproveitar a situação em que se encontravam para construírem "relações outras", em que as relações de poder/resistência encontrassem novas dinâmicas. Poderiam assim criar transformar uma limitação que sobre eles pesava numa oportunidade mais ou menos revolucionária. A ideia é apelativa e tem muitos seguidores no seio do que hoje se chama "queer theory".

Mas nem todos os gays serão assim tão revolucionários. A maioria será até tão conservadora quanto aqueles que os cercam, pois é nessa comunidade que a sua felicidade é, ou não, possível. Não admira portanto que queiram aceder de pleno direito às mesmas instituições que lhes são apresentadas como normativas. Ora em Portugal ninguém quer aceder ao direito de ser poligâmico, pela simples razão de que esse direito não existe para ninguém, logo o princípio da igualdade não é violado.

(Octávio Gameiro)
 


RETRATOS DO TRABALHO NA INDONÉSIA


Estivadores em Jacarta. "O descarregamento de teca do Bornéu no velho porto de Sunda Kelapa, onde ainda abundam estas fantásticas "escunas de Macassar".

(Madalena Ferreira Åhman)

 


OUVINDO GATES



hoje de manhã. Gates demorou quinze segundos a chegar ao tema principal. O tema foi a propaganda da Microsoft, precedida de um anúncio publicitário em filme. Ele faz muito bem, vende o que tem para vender. Nós é que somos muito provincianos, tratando a sessão de publicidade como uma conferência.
 


RETRATOS DO TRABALHO EM PORTUGAL





Trabalho na oficina de restauro do Museu Nacional de Machado de Castro, em Coimbra, actualmente encerrada para remodelação mas sempre em trabalho de manutenção. (2005)




Operárias da Medinfar, em Condeixa-a-Nova. (2006)

(Paula Alexandra Almeida)
 


DE REGRESSO

muito em breve. A caminho.

© José Pacheco Pereira
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