ABRUPTO

12.11.06
 


NUNCA É TARDE PARA APRENDER:
O HOMEM QUE DEU BOA FAMA AOS ANDRÓIDES


Philip K. Dick, O Andróide e o Humano, Lisboa, Vega, s.d.

Pouca gente como Philip K. Dick tem tão grande arte dos títulos. Não há nenhum que não apeteça ler de imediato - esta é a arte. Flow My Tears, The Policeman Said, How To Build a Universe That Doesn't Fall Apart Two Days Later, Do Android Dreams of Electric Sheep? (que conhecemos pelo filme Blade Runner), We Can Build You, The Pre-Persons e muitos outros.

*
Um excelente prefácio de Jorge Martins Rosa. Três ensaios de Dick, sob a forma de conferências feitas em convenções de ficção científica. O primeiro, e mais interessante, dá o título ao livro. A diferença entre o primeiro texto e os outros tem a ver com uma espécie de epifania onírica do autor, que marca um antes e um depois. Eu prefiro o antes (o ensaio de 1972, depois várias vezes revisto), a meditação sobre nós em carne e nós em metal como se fosse carne, e os elementos distópicos das tecnologias, a página sobre os "phone phreaks" tão certeira sobre o mundo dos telemóveis, em vez de sonhos e visões que dão, por regra, origem a má filosofia e a muito misticismo.

*
"My theme for years in my writing has been, "The devil has a metal face." Perhaps this should be amended now. What I glimpsed and then wrote about was in fact not a face; it was a mask over a face. And the true face is the reverse of the mask. Of course it would be. You do not place fierce cold metal over fierce cold metal. You place it over soft flesh, as the harmless moth adorns itself artfully to terrorize others with ocelli. "
 


BIBLIOFILIA: GRANDES CAPAS

 


TESTEMUNHOS E OPINIÕES DOS LEITORES DO ABRUPTO SOBRE AS GREVES 6



A verdadeira greve dos professores seria, não estar ausente, mas cumprir as regras que o Ministério exige “stricto senso”.

Assim, os professores estariam na escola as horas semanais exigidas.

Claro que não poderiam trabalhar a preparar aulas, corrigir testes ou estudar, porque não têm gabinetes disponíveis e ninguém consegue concentrar-se numa sala de professores onde os sucessivos intervalos são 15 minutos de imperiosa e barulhenta descontracção, ou corridas esbaforidas de 5 minutos de fecha porta, desce escadarias, atravessa o pátio, sobe escadarias, troca o livro de ponto e despacha as pernas para atravessar de novo o pátio e trepar novas escadarias de um outro bloco do edifício, isto enquanto consulta rapidamente e em equilíbrio precário as suas notas sobre o que deve ser a aula seguinte..

Também seria impossível usar os computadores, numa média de 5 para setenta professores (com sorte). Quando se acaba de reformatar o programa que antes tinha sido usado por um colega e se começa um trabalho, descobre-se que estão dois professores em pé, à porta do cubículo, à espera de que acabemos. Impossível a concentração.

Claro que também que sucederiam cenas como esta:

- Setôra, arranja um bocadinho para falar comigo!!! Os meus pais nunca têm tempo!

- Setôra, o meu dente está a cair!

- Setôra, o Zé bateu-me…

E a resposta seria – “Meu filho, não posso fazer nada. Tenho muita pena mas o meu horário acaba dentro de 25 segundos.”

Depois iríamos para casa e olharíamos sem stress os materiais e instrumentos que durante anos pagámos do nosso bolso, desde computadores e impressoras (esses, valha a verdade, com alguma redução no IRS) os dossiers, as rimas de papel, os livros, dezenas e dezenas de livros, os Cds, as canetas, os acetatos, etc, etc (todos estes sem qualquer desconto no IRS). Nada para ali fazer, o nosso horário estaria cumprido. Poderíamos até despachar toda aquela tralha que durante tantos anos nos obrigou a pagar uma casa maior.

………………………

É no entanto impossível fazer esta greve. Nenhum verdadeiro professor seria capaz disso. Nenhum verdadeiro professor quereria dar aos seus alunos o exemplo de incumprimento de tarefas, nenhum verdadeiro professor deixa de consolar e ajudar um aluno aflito, sejam quais forem as horas para que será obrigado a atrasar a sua saída do local de trabalho.

Portanto, tendo-lhe sido impossível fazer uma parte importante do seu trabalho na escola durante as horas obrigatórias de presença, enfrenta em casa mais 2, 3 ou 4 horas de papéis, computador o caneta vermelha. Se, de estafado, não consegue, olhará o fim-de-semana como a salvação. Os fins-de-semana já eram a salvação dos professores, em muitos casos. Temo é que agora deixem de ser tempo suficiente antes de se ir para o hospital.

(Margarida Ribeiro)
 


IMAGENS POLITICAMENTE INCORRECTAS 5


Desenhos de Stuart no Sempre Fixe antes da pedofilia...
 


LENDO
VENDO
OUVINDO

ÁTOMOS E BITS

de 12 de Novembro de 2006


Eu não posso dizer que há dias em que me reconcilio com os jornais, porque estou sempre "conciliado" com eles. Mas há dias muito nãos, e dias assim-assim e às vezes dias sim. Hoje há coisas muito sim, outras curiosas e outras pedagógicas.

*

Muito sim: no Público dois textos, um de António Barreto e outro do Provedor (ambos sem ligação). António Barreto explica o Congresso do PS:
Como várias vezes aconteceu, com o PS e o PSD, estamos em pleno no congresso do governo. Qualquer semelhança com um congresso de partido é coincidência. Eleito à maneira "à coreana", Sócrates bem merece uma Epifania. É o que terá. Na sala, reina a paz. O partido não está feliz, mas gosta de ser governo.
e como o PS acaba sempre por desfazer, empurrado pela necessidade, o que fez, empurrado pela clientela e a ideologia. No meio ficam enormes custos para o país.
Os socialistas desfazem tudo o que fazem. Sempre foi assim. Empregos públicos a mais. Privilégios para as corporações. Facilidades na saúde. Desperdício na educação. Obras públicas sem controlo. Laxismo nas autarquias. Desorganização da justiça. Auto-estradas sem portagem. Muito e de tudo. Abriu e fechou maternidades e escolas. Nacionalizou e reprivatizou empresas e sectores económicos. Hostilizou e seduziu os mesmos capitalistas. Perturbou e namorou a Igreja. A lista é longa. O que hoje é virtude, ontem foi pecado mortal. O que hoje é proibido, amanhã será obrigatório. O PS esteve em todas as revoluções e reformas, tal como em todas as contra-revoluções e contra-reformas. É o mais contorcionista de todos os partidos portugueses. Chegou quase sempre tarde à compreensão de algumas necessidades: resistiu à revisão constitucional, à privatização da economia, à liberalização do mercado, à regionalização e à criação do referendo, mas, quando chegou, viu-se logo como o campeão das novas causas. A história das propinas escolares e das taxas moderadoras da saúde é uma história triste de acrobacia, de adiamento e de desperdício. A história da reforma da Segurança Social é uma história exemplar de irresponsabilidade e demagogia. O que os socialistas adiam sai caro ao país.
(...) Perigosamente reduzido a um partido alicerçado na Administração Pública, com sólidas bases ancoradas nos sistemas educativo, de saúde e autárquico, o partido e o governo vêem-se agora obrigados a reduzir efectivos, despedir, congelar recrutamentos, diminuir vencimentos, baixar as pensões e cortar nos privilégios colaterais. Mais uma vez, desfaz o que fez. Se persistir, até ao fim do mandato, nas políticas que tem anunciado, terá de ir muito mais longe e prestará, talvez, insignes serviços às finanças públicas.
Mas deixará destroçada a sua clientela, os seus militantes, as suas bases e o seu eleitorado. Pelo contrário, se, como é hábito, não for tão longe quanto é necessário e enveredar pela demagogia prévia ao segundo mandato, tornará inúteis os sacrifícios actuais e voltará a deixar em crise o Estado social. Ou, mais simplesmente, o Estado.
Leia-se todo que vale muito a pena.

*

Exemplar do que deve ser um Provedor, é Rui Araújo do Público. Iniciando uma resposta às queixas de Miguel Sousa Tavares sobre o modo como foi tratada a questão do seu "plágio", Rui Araújo "grelha" os jornalistas do Público como nos filmes americanos fazem os Internal Affairs, a polícia da polícia. Faz bem, deve haver tanto receio de um Provedor nos jornais, como confiança na sua defesa de jornalistas injustamente atacados por leitores e grupos de pressão. Aqui vai para amostra uma primeira conclusão:
É óbvio que "qualquer informação, anónima ou não, pode ser investigada e pode vir a resultar numa notícia". O problema é que as jornalistas (e até contrariamente ao que elas próprias defendem na sua resposta) não cuidaram de investigar o cerne de toda esta questão, isto é: se sim ou não houve plágio.

As jornalistas dizem, por outro lado, que tentaram "encontrar um exemplar do livro de Lapierre e Collins "Freedom at Midnight"" e logo a seguir que "a notícia é sobre um escritor que vendeu 270 mil exemplares ter decidido processar um anónimo que o acusa de plágio - editorialmente, é incontestável que isto é notícia. O centro da notícia não é o plágio, mas a queixa."

Se a notícia era de facto a queixa e não o plágio - como pretendem - qual a justificação para procurar o livro? Não será esta uma forma de reconhecer implicitamente que a queixa é uma consequência e não a causa? E como explicam terem avançado com a notícia sem terem lido o livro quando consideravam importante consultá-lo?
De novo, vale a pena ler tudo.

*


Muito não. Curioso politicamente este muito socialista editorial de João Morgado Fernandes no Diário de Notícias que, neste caso, pode ser lido todo em linha e que conclui assim:
Confirmada a sonolência do PS - não apareceram alternativas globais, mas também não há a reter uma única ideia sobre educação, saúde ou função pública -, confirmada a sonolência da oposição (veja-se o debate do Orçamento do Estado), Sócrates e o Governo voltam a ficar confrontados com o essencial: o país e as inadiáveis reformas dos vários subsistemas do Estado. Que, independentemente de acertos e rectificações de tom, a maioria reconhece estarem no rumo certo. (Sublinhados meus)
"Rumo certo", manter o rumo" é a frase-chave actual da propaganda governamental e é interessante encontrá-la validada num editorial de um jornal. Já agora, que "maioria" é esta que aparece sem qualificação, a das sondagens, a das manifestações, a dos "portugueses" no sentido teresa-guilhermiano do termo?
 


EARLY MORNING BLOGS

908 - Peekabo, I Almost See You

Middle-aged life is merry, and I love to lead it,
But there comes a day when your eyes are all right but your arm
isn't long enough to hold the telephone book where you can read it,
And your friends get jocular, so you go to the oculist,
And of all your friends he is the joculist,
So over his facetiousness let us skim,
Only noting that he has been waiting for you ever since you said
Good evening to his grandfather clock under the impression
that it was him,
And you look at his chart and it says SHRDLU QWERTYOP, and
you say Well, why SHRDNTLU QWERTYOP? and he says one
set of glasses won't do.
You need two.
One for reading Erle Stanley Gardner's Perry Mason and Keats's
"Endymion" with,
And the other for walking around without saying Hello to strange
wymion with.
So you spend your time taking off your seeing glasses to put on
your reading glasses, and then remembering that your reading
glasses are upstairs or in the car,
And then you can't find your seeing glasses again because without
them on you can't see where they are.
Enough of such misshaps, they would try the patience of an ox,
I prefer to forget both pairs of glasses and pass my declining
years saluting strange women and grandfather clocks.

(Ogden Nash)

*

Bom dia!

11.11.06
 


RETRATOS DO TRABALHO NA GOLEGÃ, PORTUGAL


Venda de pão.

(R.M.)
 


TESTEMUNHOS E OPINIÕES DOS LEITORES DO ABRUPTO SOBRE AS GREVES 5



Parece que a conquista do poder, ao mesmo tempo que tende a apagar as ideologias, vai compensando isso com uma maior personalização no exercício do político, tanto maior quanto mais forte for o peso da votação. O efeito, pelo menos em Portugal, vem sendo o de revelar os «instintos genéticos» (no sentido familiar e social) dos líderes por tal «carga genética» se transferir quase directamente para a sua acção política. Assim como a origem social do Prof. Cavaco Silva o fez valorizar o «self made man», o Eng.º António Guterres acabou bloqueado pelo seu piedoso berço católico, e agora o Eng.º José Sócrates não disfarça que vem de uma família cujo atributo essencial são «as posses» (ou simplesmente a riqueza). A felicidade e auto-elogio do Primeiro Ministro pelas suas «reformas» talvez se devam ao facto de no seu subconsciente ter atingido o nirvana dos «detentores do capital e/ou dos meios de produção» (sei que recorro ao marxismo-leninismo primário, do qual nunca padeci, mas os tempos que correm fazem milagres) ao conseguir colocar os pobres e as classes médias uns contra os outros. É a subversão completa da luta de classes, crença que sustenta o estado social, mesmo que estivesse (e cada vez mais) apenas subjacente. A versão que se vai tornar para nós recorrente nos próximos anos é a da oposição entre funcionários públicos e funcionários do sector privado. Portugal entrou assim de modo abrupto no problema social do século XXI. Há, por outro lado, sintomas interessantes na modelação dos discursos públicos (basta ler o seu blog a propósito das greves): parece que os funcionários públicos não pagam impostos e quando vão às repartições ou ao hospital, quem os atende reconhece-os instintivamente e confere-lhes tratamento privilegiado, como se houvesse uma «sociedade dos públicos» e outra «sociedade dos privados». Mas as ideologias sempre foram assim, pois simplificam, às vezes de modo radical, a complexidade do real. O que o mundo mudou. Incrível é que isto venha da «esquerda» que assim enterra a luta de classes na versão «vertical» marxista e inaugura outra «horizontal» que permite aos que podem «tirar o corpo de fora». Resistirão as utopias da coesão social e da igualdade? Vivem-se tempos interessantes.

(Gabriel Mithá Ribeiro)

*

Já que a conversa parece estar a desviar-se para a justificação das greves em geral, ocorre-me recordar as teorias recentes do ideólogo João Bernardo sobre como o modelo actual de greve é uma forma de luta completamente anacrónica. Segundo ele, a greve vista como paralisação de actividades e ausência do local de trabalho é uma reminiscência da velha greve operária da grande fábrica, em que essa era com efeito a única forma de parar a produção, por natureza organizada e ultra-disciplinada. Os consumidores não davam por nada e só o capitalista era penalizado.

Na nova economia de serviços, tal tipo de greve só prejudicaria os consumidores, que se viram contra os grevistas. Por conseguinte, defende ele, a forma de luta a adoptar deverá ser a continuação da produção dos serviços, eventualmente acompanhada de propaganda junto dos clienes/consumidores, de forma a manter o seu apoio, mas... não cobrando pelos mesmos! Assim, de facto, só o patrão seria prejudicado!

Baseia-se João Bernardo na experiência da greve da Carris de 1969, que decorreu dessa maneira (prestação do serviço mas ausência de cobrança), e onde por sinal a organização marxista-leninista de que Bernardo era dirigente teve algum papel, mas claro que a extrapolação directa não é em geral possível por que os condutores da Carris são dos raros trabalhadores que são simultaneamente cobradores. No entanto, Bernardo sugere adaptações: por exemplo, que os professores estejam nas escolas mas, em vez de darem o programa lectivo definido pelo Ministério, dêm programas alternativos...

Acho imensa graça a estas ideias “criativas” de João Bernardo, mas é claro que são pueris e na prática tão contra a própria greve como o patronato. As escolas, por exemplo, e como diz Medina Carreira, são entre nós e antes de mais uns locais onde a maioria dos alunos e professores tem de estar fechada até ao fim da tarde, e pouco importa à maioria dos pais que lá se ensine ou não, desde que desempenhem o seu papel de depositárias dos filhos, ou seja, de creches...
No entanto não deixa de ser verdade, penso eu, que a greve como se fazia antigamente nas fábricas vira hoje o público consumidor contra os grevistas da economia de serviços e pouco prejudica os patrões. No Estado, por exemplo, até ajudam a reduzir o défice público...

(Pinto de Sá)

*

Falando da função pública, parece estar encontrado o bode espiatório para o estado da nação... Todo bom português anda agora, mais do que nunca, com a mira no preguiçoso e sugador de recursos comuns que mais não faz que nadar em regalias e previlégios! A ignorancia não é desculpa para tudo, ou melhor a ignorancia não é desculpa (sem mais). Sou funcionário do estado e (surpresa) contribuo mais para o erário público que os funcionários com categoria equivalente no sector privado (em percentagem e atendendo ao facto de que não me chega nada por baixo da mesa). Por vezes dou comigo a imaginar se todos esses malandros saissem da função pública e fossem trabalhar para o sector privado. Se, na minha área (a Saúde), tudo entrasse na alçada do poder privado... Podem ter algumas certezas: Eu trabalharia o mesmo; receberia mais ao fim do mês; provavelmente descontaria menos!; com a veemente convicção de que o português comum (o do salário minimo e pouco mais) teriam muito menos hipóteses de serem servidos por um serviço de qualidade e principalmente em situação de igalidade, repito igualidade de tratamento. Acabem lá com o funcionalismo público numa prespectiva redutora, mandem todos os serviços para o sector privado... Por mim tudo bem! Posso pagar um seguro de Saúde razoável! E o resto dos portugues? Quando ouvirem: não fazemos a sua cirurgia ou o seu tratamento porque o seguro não cobre e o estado também não, vá morrer longe! Falo com conhecimento de causa tanto do sector público como do sector privado.

Já agora digam lá, quais as regalias do funcionário público, que ainda não as vi...

(Filipe Martins)

*

(...) Falava eu com um catedrático de Coimbra sobre a greve geral última, quando fico a saber que Carvalho da Silva, o sindicalista, estava a prepara a tese de Mestrado em Sociologia. Não sei se a propósito, ou se seria a tese em si que versava sobre o tema, o Professor abordou a teoria da possibilidade de estarem as greves previstas para acabarem. Isto é que se estaria a pensar em encontrar formas de luta ( igualmente de pressão, penso) para encontra arternativas, uma vez cito" as greves são ideias do Séc XIX e é preciso renovar as formas de reivindicar. Estará a greve fora de moda?

(José João Canavilhas)

*


SOBRE OS FUNDAMENTOS DA GREVE E DOS PRIVILEGIADOS, julgo ser necessário descer ao caso concreto, até para as pessoas melhor perceberem do que estamos a falar.

Considere-se…

Um curricula:

Curso do secundário em humanidades com média final de 18 valores. Provas de entrada na Universidade com 19,1 e 18,5 valores (História e Filosofia, respectivamente). Licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra aos 22 anos, com 14 valores. Pós-graduado em Direito das Empresas pela mesma Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Curso de estágio pela Ordem dos Advogados com média de 16 valores. Titular do Curso de Estudos Avançados em Gestão Pública (pós-graduação), pelo Instituto Nacional de Administração (num total de 2000 pessoas que concorreram, ficou em 3.º lugar), o qual finalizou com 16 valores, curso esse que lhe possibilitou entrar na função pública. Mestre em Gestão Pública, pela Universidade de Aveiro, com distinção. Mestrando no Mestrado em Direito Público/Administrativo pela Universidade Católica de Lisboa.

Um desempenho profissional, na função pública:

Obteve a classificação de Muito Bom e de Excelente com o novo sistema de avaliação (SIADAP), nos últimos 4 anos, num organismo com mais de 2000 funcionários – note-se que nos termos do SIADAP, apenas 5% do total dos funcionários pode ter excelente…

Contributo para o interesse público/cidadão do meu desempenho profissional:

No âmbito de diversos projectos de simplificação e de reestruturação regulamentar, procedimental e organizacional por mim apresentados e superiormente aprovados (antes mesmo do SIMPLEX), foram alcançados os seguintes resultados: diminuição de 3 anos para 8 meses do tempo total de um determinado licenciamento; diminuição de 12 meses para menos de 1 mês de mais de 9 processos administrativos internos de resposta ao cidadão; redução em mais de 50 % da totalidade das reclamações dos utentes/cidadãos; ..etc, etc. (com o SIMPLEX 2006 (e também do próximo de 2007), no âmbito de dois projectos/planos por mim apresentados, o organismo esteve representado em mais de 10% da totalidade das medidas, tendo concretizado 95% das mesmas).

Retribuição:

Salário? 1100 euros líquidos.

Descontos? 300 euros de IRS todos os meses (retenção na fonte, porque no final do ano fiscal acabo sempre por pagar mais +/- 700 euros, o que dá à volta de 4000 euros anuais) + 200 euros referentes à Caixa Geral de Aposentações e à ADSE.

QUESTÃO: SOU UM PRIVILEGIADO?

Antes de ser funcionário público, exercia a advocacia: em termos líquidos, anuais e médios, auferia cerca de 3 vezes mais do que actualmente, e pagava sensivelmente menos de metade dos actuais descontos. Antes de ser advogado, tive também outras experiências profissionais, onde mais de metade do meu salário era por mim recebido fora da minha folha de vencimentos (o mesmo acontecia com os demais funcionários e colaboradores).

Em resposta à pergunta e para quem considere que sim, sou um privilegiado, pois bem, eu também…, tanto assim que estou neste momento à espera de autorização superior para sair, o que espero que aconteça até ao final do presente ano (apesar de saber que o Secretário de Estado leva +/- 2 meses para decidir…).

Algumas precisões:

1. Na Administração Pública 47,7% dos trabalhadores têm um nível de escolaridade superior (v.g. Médicos, Enfermeiros, Juízes, Professores), enquanto no sector privado a percentagem de trabalhadores com formação superior é inferior a 13,7%;

2. Em comparação (feita por profissões/qualificações), as remunerações praticadas na Administração Pública são significativamente inferiores às remunerações praticadas no sector privado. Tomando como base tudo aquilo que o trabalhador recebe, a diferença para menos na Administração Pública, quando comparado com o pago no sector privado, varia da seguinte forma por profissões: Grupo "Técnico": entre -188% e -156%; Grupo "Técnico profissional": entre -75% e -46%;

3. O total de descontos em 2007 na FP vai ser 11,5%, enquanto no privado vai ser de 11%;

4. Mais de 33% do total de trabalhadores entraram para a Função Pública nos últimos 15 anos através dos Gabinetes Ministeriais, Cargos de Direcção e Agências ou Unidades de Missão (todos de escolha política), primeiramente através de contratos de prestação de serviços e de tarefa (v.g. avenças) e sequentemente através da sua integração dos quadros por via legislativa ou através de concursos públicos orientados.


Para quem gostar de aprofundar estes temas para além do banal, do barulho e da “propaganda”, sugere-se, entre muitos, os seguintes:

- Alves, A. e Moreira, J. M., (2004), O que é a Escolha Pública? Para uma análise económica da política, PRINCIPIA, Publicações Universitárias e Científicas, Cascais.

- Bauby, P., (1998), Reconstruire l’Action publique. Services publics, au service de qui?, Syros, Paris.

- Bonwitt, B., (1989), “Reforme de l’administration publique: des missions aux objectives”, Revue Internationale des Sciences Administratives, vol. 55, n.º 2, pp. 255-275.

- Bjorkman, J. M., (2003), Health Sector Reform – Measures, Meddles and Mires, Institute of Social Studies, The Hague, The Netherlands.

- Boyne, G., Jenkins, G. e Poole, M. (1999), “Human resource management in the public and private sectors: an empirical comparison”, Public Administration, vol. 77, n.º 2, Summer, pp. 407-420.

- Cabral, M. V., Silva, P. A. e Mendes, H., (2002), Saúde e Doença em Portugal, Imprensa de Ciências Sociais, Viseu.

- Campbell, D. e Stanley, J., (1963), Experimental and Quasi-experimental Designs for Research, Houghton Mifflin Company, USA, Boston.

- Canotilho, J. J. e Moreira, V. (1985), Constituição da República Portuguesa Anotada, 2ª edição, Coimbra Editora, Coimbra.

- Corte-Real, I., (1995), O Livro de Modernização Administrativa: 1986-1995, Lisboa, Secretariado de Estado de Modernização Administrativa.

- Denhardt, V. e Denhardt, R., (2003), The New Public Service: serving, not steering, M. E. Sharpe, New York.

- Egeberg, M., (2003), “How bureaucratic structure matters: an organizational perspective”, in B. G. Peters e J. Pierre (eds.), Handbook of Public Administration, Sage Publications, London.

- Harrison, M., (2002), “Can competition transform public organization? European attempts to revitalize hospitals trough market mechanisms”, in E. Vigoda (ed.), Public Administration, An Interdisciplinary Critical Analysis, Marcel Dekker, Inc., New York.

- Hayek, F., (1977), O Caminho para a Servidão, Teoremas, Lisboa.

- Heeks, R., (2002), “Reinventing government in the information age”, in R. Heeks (ed.), Reinventing government in the information age, International practice in IT-enabled public sector reform, Routledge, London.

- Hood, C., (1995), “The “new public management” in the 1980’s: variations on a theme”, Accountig, Organization and Society, vol. 20, n.º 2/3, pp. 93-109.

- Hood, Christopher (1991), “A public management for all seasons”, Public Administration, vol. 69, n.º 1, Spring, pp. 3-19.

- Howorth, C., (1997), “Can we explain recent developments in British health policy as the product of a general crisis in the welfare states’ of modern market economies”, in http://www.sun.rhbnc.ac.uk/~uhtm005/nhs.htm.

- Mintzberg, H., (1979, 1999), Estrutura e Dinâmica das Organizações, 2ª Edição, Publicações Dom Quixote, Lisboa.

- Moreira, V. (2003), “Sebenta Direito Administrativo” para a disciplina Fundamentos Jurídicos, do Curso de Estudos Avançados em Gestão Pública (CEAGP), 3ª edição Mouzinho da Silveira, INA, Oeiras.

- Morris, D., (1998), “Moving from public administration to the public management”, In: Micheal Hunt e Barry O’Tolle, Reform, Ethics and Leadership in Public Service, Hants, Ashgate Publishing Limited, cap. 4, pp. 55-66.

- Mozzicafreddo, J., (2005), Interesse público e funções do Estado – Dinâmica conflitual da mudança. Comunicação no âmbito do III Colóquio Internacional Interesse Público, Funções do Estado e Reforma da Administração, do curso de mestrado em Administração e Políticas Públicas do ISCTE, Abril de 2005.

- Mozzicafredo, J. e Gomes, J. S., (2001), Administração e Política, Oeiras, Celta Editora.

- Mozzicafredo, J., Gomes, J. S. e Batista, J. S. (2003), Ética e Administração – Como modernizar os serviços públicos?, Oeiras, Celta Editora.

- Mozzicafreddo, J., (2000), Estado-Providência e Cidadania em Portugal, Celta Editora, Oeiras.

- Mozzicafreddo, J., (1998), “Estado, modernidade e cidadania”, in J. Leite Viegas e A. Firmino da Costa (orgs.), Portugal, que modernidade?, Celta Editora, Oeiras.

- Peters, B. G., (2001), The Politics of Bureaucracy, Routledge, London.

- Peters, B. G. e Pierre, J., (2003), «Introduction : The role of public administration in governing», In B. G. Peters e J. Pierre (eds.), Handbook of Public Administration, Sage Publications, London.

- Peters, B. G. e Savoie, D. J., (1993), Reinventing Osborne e Gaebler: Lessons from the Gore Commission, Canadian Centre for Management Developement.

- Pollitt, C. e Bouckaert, G., (2000), Public Management Reform: a comparative analysis, University Press, Oxford.

- Pollitt, C., (2003), The Essential Public Manager, Maidenhead, Open University Press.

- Rosenbloom, D., (1998), Public Administration. Understanding management, politics and law in the public sector. McGraw-Hill Companies, Inc, New York.

- Rouban, L., (2000), «Introduction – Le service public en devenir: la mondialisation, l’Europe et les ruptures socials», in Luc Rouban (dir.), Le Service Public en Devenir, L’Harmattan, Paris.

- Stewart, J. e Walsh, K. (1992), “Change in the management of public services”, Public Administration, vol. 70 (winter), pp.499-518.

- Teixeira, C. (2003), “Atitude dos funcionários face à modernização da administração pública”, in Juan Mozzicafreddo, João Salis Gomes e João S. Batista, Ética e Administração, Oeiras, Celta Editora, Cap. 4, pp. 47-79.

- Warin, Philippe (1997), Quelle Modernisation des services publics? Les usagers au cœur des réformes, Paris, La Décourverte.

- Wright, V. (2000), “Blurring the Public-Private Divide”, in B. G. Peters e D. J. Savoie (eds.), Governance in the Twenty-first century: revitalizing the public service, Canadian Centre for Management Development, McGill-Queen’s University Press, Montreal e Kingston.

(Daniel de Sousa)
 


IMAGENS POLITICAMENTE INCORRECTAS 4

Os desenhos de John Kent no Guardian e no Sunday Times foram violentamente atacados pelos grupos feministas, que contribuiram para o silenciar. Este é do tempo do PREC e Varoomshka encontra o nosso general Otelo que a coloca atrás das grades por delito de opinião.
 


LENDO
VENDO
OUVINDO

ÁTOMOS E BITS

de 11 de Novembro de 2006


Recordações de um mundo perdido no Almanaque republicano.

*

http://images.bestwebbuys.com/muze/bookmed/24/0801443024.jpg Para o Passado/Presente e a sua "construção da memória " este livro: Richard H. Armstrong, A Compulsion For Antiquity: Freud And The Ancient World (Cornell Studies in the History of Psychiatry) .

É um livro “convoluted", complicado, mas brilhante:
"To sum up so far, long before Freud, the ancient archive was a space of synaesthetic interaction in modern European thought, a realm of imaginary freedom and eros tied to highly valued norms of culture—which continues to fascinate even the post-modern mind, to judge from the amount of work on ancient sexuality produced in the wake of Michel Foucault. For Freud as for many thinkers in the nineteenth century, historical consciousness is itself an expression of freedom, even when it bears an admixture of other determinants and ought not to be exaggerated into a basis for radical free will. The exposure of unconscious motives in one's fascination with the ancient archive does not lead to a dismissal of this fascination as mere projection; for Freud, it rather establishes a genuine psychological connection, the discovery of a common unconscious ground that expands the import of research, intensifies its power, and validates its outcomes."
 


COISAS SIMPLES


(Levitan)
 


EARLY MORNING BLOGS

907 -L'homme et son image

Un homme qui s'aimait sans avoir de rivaux
Passait dans son esprit pour le plus beau du monde:
Il accusait toujours les miroirs d'être faux,
Vivant plus que content dans une erreur profonde.
Afin de le guérir, le sort officieux
Présentait partout à ses yeux
Les conseillers muets dont se servent nos dames:
Miroirs dans les logis, miroirs chez les marchands,
Miroirs aux poches des galands,
Miroirs aux ceintures des femmes.
Que fait notre Narcisse? Il se va confiner
Aux lieux les plus cachés qu'il peut s'imaginer,
N'osant plus des miroirs éprouver l'aventure.
Mais un canal, formé par une source pure,
Se trouve en ces lieux écartés:
Il s'y voit, il se fâche, et ses yeux irrités
Pensent apercevoir une chimère vaine.
Il fait tout ce qu'il peut pour éviter cette eau;
Mais quoi? Le canal est si beau
Qu'il ne le quitte qu'avec peine.

On voit bien où je veux venir.
Je parle à tous; et cette erreur extrême
Est un mal que chacun se plaît d'entretenir.
Notre âme, c'est cet homme amoureux de lui-même;
Tant de miroirs, ce sont les sottises d'autrui,
Miroirs, de nos défauts les peintres légitimes;
Et quant au canal, c'est celui
Que chacun sait, le livre des Maximes.

(Jean de la Fontaine)

*

Bom dia!
 


TESTEMUNHOS E OPINIÕES DOS LEITORES DO ABRUPTO SOBRE AS GREVES 4



A minha mulher, educadora do ensino especial (miúdos deficientes), desta vez não fez greve. A escola dela funcionou. Eu não fiz greve, na Universidade, que me pareceu estar a trabalhar “as usual”. O meu filho, estudante universitário noutra escola, também teve as aulas todas, e a minha filha (12º ano) notou a falta de alguns professores, mas teve aulas de substituição, na sua ausência.

E no entanto, o descontentamento é geral, no ensino. Porquê, então, esta greve suave?
Uma causa será o custo económico dela, como notou um leitor seu. Outra, o facto de os Sindicatos estarem algo descredibilizados. Mas eu acho que há outra causa mais séria: o anúncio de que boa parte dos docentes vai para o desemprego no próximo ano, e que os que ficarem vão ter de se esforçar muito para ascenderem de escalão remunerativo. Há medo. E a noção de que as grandes lutas ainda estão para vir, agora que ninguém se vai reformar em breve. Talvez me engane, mas palpita-me que 2007 vai ser um ano de brasa!...

Mas fora da função pública, um taxista que o é há 32 anos, disse-me ontem que os privilégios dos funcionários públicos eram um escândalo, antes das novas leis. E contou-me o mesmo tipo de histórias do seu leitor Manuel Castelo Branco. Quererá ele nivelar por baixo? Nos EUA, li ontem numa revista, o horário médio semanal de trabalho de um engenheiro é de 46 horas (cá, varia entre as 35 e as 40)... e em geral, ainda que a produtividade média horária do trabalho norte-americano não supere a norueguesa ou a alemã, acontece que o número médio de horas de trabalho per capita é lá muito superior. Claro que por outro lado, os ritmos de vida no litoral brasileiro ou em Moçambique, por exemplo, são de uma falta de stress invejável (“qualidade de vida”, diz-se). O que não se pode é ter o melhor desses dois mundos...

(Pinto de Sá)

*

Diz o Sr Fernando Reis, que fica chocado com a "reacção de uma parte significativa da população que tem sido ouvida nos órgãos de comunicação". Refere ainda que "Essas pessoas que acusam...são em muitos casos, as mesmas que aceitam trabalhar em más condições, com salários muito baixos, e com poucas ou nenhumas regalias sociais." Diz ainda o Sr Fernando Reis que estas pessoas vêem "Privilégios", onde ele vê apenas "Direitos".

Fico impressionado com o raciocínio. Só está na situação de ter um trabalho em más condições, mau salário e nenhumas regalias, as pessoas que o aceitam. Esquece-se que essas má condições decorrem essencialmente da situação económica do país, onde há pouco emprego gerado, levando as pessoas a ter que aceitar o que aparece. Os patrões menos escrupulosos, percebendo a aflição do empregado em manter o emprego que lhe permite um mínimo de sobrevivência, permitem-se explorá-lo como entendem, não havendo força sindical ou tribunal que lhe valha. É óbvio que para estes trabalhadores, as vantagens da função pública são obscenas, porque são obtidas em parte à custa daquilo que ele desconta todos os meses.

Os "direitos" do Sr Fernando Reis são os deveres de desconto dos trabalhadores que ele critica por não compreenderem a posição dos funcionários públicos. E o trabalhador sente-se obviamente injustiçado por, com o seu dinheiro, darem aos outros aquilo de que ele não usufrui. Chamar a isto "inveja" é, no mínimo, uma provocação irreflectida. O dinheiro que é pago aos funcionários públicos tem origem nos impostos que todos pagamos. É nosso dever e direito garantir que seja gasto com o melhor índice de aproveitamento possível e benefício prático dos cidadãos pagantes. Não é o que tem acontecido. O desperdício abunda, as perdas são enormes e parece que, muitas vezes as formalidades só existem para justificar uns quantos empregos pagos com dinheiro que seria mais útil noutros lados. Nem que fosse no bolso de onde saiu.

Se a crise diminui os empregos disponíveis, os salários e as condições de trabalho, logo, o rendimento do Estado proveniente dos impostos, porque é que os trabalhadores da administração central continuam como se nada se passasse, montados nos seus "direitos" inalienáveis? A crise é só para alguns?

( Lá fora passa um carro do lixo, em abstinência da greve, que todos na rua agradecem concerteza. Já neste trabalho, por exemplo, acho que não há privilégios. Apenas algumas vantagens que tentam compensar um trabalho em condições extremas, a que poucos se sujeitam, mas que aproveita a todos nós).

(Pedro Malheiros Fonseca)

*

Sou uma funcionária pública que fez greve ontem, dia 9 de Novembro. Hoje não aderi. E não o fiz porque considero que a decisão de fazer greve não pode, de forma alguma, correr o risco de poder estar associada a uma maneira expedita de conseguir um fim-de-semana prolongado.


Num país como Portugal, em que é fundamental aumentar a produtividade, entendo que o acto de fazer greve deverá ser reflexo de uma atitude cívica responsável, de recurso extremo, face a uma situação de manifesta gravidade.

Mas, de facto, é muito grave o que se está a passar na Função Pública, tanto mais que não se pode considerar o “fenómeno Função Pública” como extrínseco à própria realidade da sociedade portuguesa.

Se é certo que, por natureza, e tendencialmente, se oferece resistência à mudança, a verdade é que a gravidade de que falo nada tem a ver com a reestruturação dos Serviços da Função Pública, enquanto tal.

Todos os que querem que Portugal cresça qualitativamente sabem o quanto é necessário alterar o sistema de funcionamento de grande parte destes Serviços.

A gravidade advém do facto de não ser possível, em qualquer tipo de serviço – seja público ou privado –, mudar no sentido da melhoria e do desenvolvimento, se essa mudança não se basear no rigor, na objectividade e na eficácia, princípios fundamentais numa gestão orientada para o sucesso.

O novo sistema de avaliação dos funcionários públicos (Sistema Integrado de Avaliação da Administração Pública) é, apenas, uma ferramenta de gestão que, como qualquer outra, pode ser bem ou mal usada.

Ter a ferramenta é importante, mas não é suficiente. É necessário assegurar a sua boa aplicação. E isso nem sempre está a acontecer.

Infelizmente, são do meu conhecimento casos concretos, nos quais, com comprovada falta de isenção, são atribuídas classificações de insuficiente na decorrência de razões que nada têm a ver com o desempenho do funcionário, visando a sua saída da instituição e seu o possível desvio para os chamados supranumerários.

- A lei prevê que os funcionários que se sentirem injustiçados possam recorrer da classificação de que foram alvo – dirão muitos.

Mas, voltando à objectividade dos casos concretos, acrescentarei:

- Sim, sem dúvida, recorrerão aqueles funcionários cujo perfil seja suficientemente forte para resistirem ao processo de desencorajamento de que vão ser alvo, quando após dois ou três contactos, paralelamente à garantia de poder recorrer – que ninguém nega – vão ouvir falar de coisas como “se tiver coragem”, “se estiver disposto a enfrentar possíveis represálias”, ou, pura e simplesmente, “se for capaz de entrar num processo de grandes desigualdades de poder”: de um lado o funcionário; do outro o dirigente de topo da instituição, que, em algumas situações, é o próprio avaliador, ou mesmo o membro do Governo competente, que, amiúde, terá nomeado aquele.
Recorrerão, ainda, os que não se deixarem entorpecer pelas anestesiantes e recorrentes expressões “não se pode fazer nada”, ou “o melhor é mudar para outra instituição”.

Não há boa gestão sem sistema de avaliação. É preciso avaliar para poder melhorar.
È preciso associar o reconhecimento do mérito a quem trabalha bem e penalizar quem tem um mau desempenho. É compreensível que quem não cumpra, de forma adequada, as suas funções, deva ser dispensado. Só assim poderá haver mudança qualitativa na Função Pública.

Qualquer pessoa entende isto. Mais, qualquer pessoa de bem o deseja.

Mas o grave é que, infelizmente – como acima referi –, há casos que mostram que a realidade é bem diferente. E se é óbvio que seria abusivo, e até injusto, tomar a parte pelo todo, também não é verosímil que aquilo que conheço seja apenas um caso singular, ou a tal excepção à regra.

Neste texto, a palavra “infelizmente” é recorrente.

Na verdade, pela primeira vez, na minha já muito longa vida de funcionária pública, é de um modo infeliz que convivo com o meu quotidiano profissional, não só por aquilo a que venho a assistir ultimamente, dia após dia, mas porque receio pelo amanhã de um país em que é possível, em democracia, e no seio das instituições do Estado, utilizar de modo perverso uma ferramenta de gestão – a classificação –, não para o desenvolvimento e para a mudança qualitativa, mas antes para actos vexatórios que atentam contra um dos valores mais sublimes: a dignidade do indivíduo.

E se a prática de tais actos já é grave, mais grave ainda é a sua impunidade, indiciando uma sociedade dormente, que já perdeu a capacidade de se indignar.

(F. P.)

*

Com ou sem greves, (as quais eu não acredito uma vez que trabalhei mais de 45 anos numa firma privada, ali passei o 25 Abril, o sector a que pertencia chegou a fazer várias greves, mas eu não) acho que já vai sendo tempo de deixar de branquear o funcionalismo público, no que se refere a privilégios. Senão vejamos: em 1959, com 17 anos de idade, comecei a trabalhar numa determinada empresa e nessa altura tinha um grande amigo, da minha idade, que começou igualmente a trabalhar no funcionalismo público. Em 1989, isto é, com 30 anos de serviço o meu amigo, na altura com 47 anos, reformou-se e nessa altura foi-lhe atribuído uma pensão igual a 100% do seu último ordenado. Eu tive de trabalhar até 2004, e isto porque resolvi fazer uma pré-reforma, e na altura tinha 63 anos de idade, quarenta e cinco anos de descontos e mesmo assim fui penalizado na minha reforma em 0,5% porque aos 55 anos faltava-me 6 meses para atingir “x” tempo de descontos. A minha reforma foi calculada na base da média dos melhores 10, dos últimos 15 anos de salários. Além disso, não pude dispor de um sistema especial de saúde (ADSE) como o meu amigo.

Mas o mais irritante é que, durante os meus 45 anos de trabalho eu mensalmente descontei, para a Segurança Social, 11% do meu salário e a firma onde prestei serviço, 23,75% também daquele salário, para o mesmo fim, o que quer dizer que ambos descontamos 23,75% do meu salário em cada mês. O patrão do meu amigo, esse não descontou um centavo, mas no fim o meu amigo tem muito melhor reforma do que eu.

Afinal, será que o funcionalismo público estará assim tão mal ? E se assim é, porquê no tempo de António Guterres somente, entraram 100.000 novos funcionários públicos? Serão todos masoquistas ?

(Manuel Castelo Branco)

10.11.06
 


A DIFERENÇA ENTRE UM QUIOSQUE E A BLOGOSFERA

Se eu olhar para um quiosque de jornais como muita gente olha para os blogues, o que eu vejo é isto: Maria, O Jornal do Crime, A Mãe Ideal, Novenas Milagrosas, Lux, VIP, Nova Gente, Maxman, o Borda de Água, Público, Flash!, Única, 24 Horas, Nova Cidadania, TV Guia, TV Mais, Ana, Teleculinária, MM, Saúde, Record, Atlântico, A Bola, Autosport, Correio da Manhã, O Diabo, uns títulos em ucraniano, o Guia Astrológico, Os Meus Livros, Cosmopolitan, Prevenir, Sporting, Blitz, Guia Astral, Mini-Recreio, Activa, GQ, Diário de Notícias, Selecções...

Se abrir as folhas ao acaso, como se consultar blogues ao acaso, coisas sinistras estão sempre a cair de dentro das folhas: notícias falsas, especulações, falsidades anónimas, plágios, voyeurismo, egos à prova de bala, ignorância, erros, invejas, ajustes de contas, presunção, arrogância, esquemas diversos, banha da cobra, cobras. Há gente que fala com Deus e gente que namora o Diabo, há quem coma a namorada, como o Dr. Lecter, há o professor Karamba, e há umas meninas para todos os gostos, há extraterrestres, boatos, insinuações, muita "informação" anónima, pornografia strictu sensu, pornografia intelectual, quartos à hora, hotéis à noite, etc., etc. Uma selvajaria, o Mundo Cão, o Faroeste, os baixos fundos, o jet set, um conde, o tatuador, a tatuada, a esposa, o marido, a amante, o escroque, o bondoso, o franciscano e o tolo...


Ah! Diz-me uma voz, mas estás a misturar tudo! Pois estou, é como fazem os que falam dos blogues misturando tudo, como Miguel Sousa Tavares e Eduardo Prado Coelho fizeram recentemente para se defenderem (o que é legítimo) de acusações e falsificações anónimas. É verdade que os jornais e revistas têm responsáveis e não são como as cartas anónimas, ou os blogues que funcionam como cartas anónimas, mas quando os primeiros transcrevem os segundos ficam iguais. No caso do Miguel Sousa Tavares, o que falhou foi a imprensa tradicional, que aceitou citar fontes anónimas, sem um julgamento de mérito. A notícia não é que um blogue anónimo acuse Miguel Sousa Tavares de plágio, a notícia é que Miguel Sousa Tavares cometeu plágio, se o tivesse cometido, e aí o autor da notícia devia fazer o seu próprio julgamento e só publicar caso esse julgamento fosse que sim. Não sendo, o blogue é como uma carta anónima, incitável e inaceitável. Foi isso que falhou e hoje em dia falha cada vez mais, porque a comunicação social escrita precisa de pretextos para violar as regras de que se gaba como sendo distintivas e, na Internet, encontra-os com facilidade, entrando depois facilmente na selvajaria. Está lá no computador, para milhões verem, por isso está "publicado", logo posso citar e levar a sério, sem ter responsabilidade.

O mal não está nos blogues em si, está na nossa incapacidade para ler e escrever blogues, como para ler e escrever jornais com uma decência mínima. O problema é mais comum do que se pensa, embora seja verdade que as pessoas se sentem mais impotentes para se defenderem da Internet do que no mundo da comunicação social tradicional, mas o que é crime cá fora é crime lá dentro.

Mas a reacção aos blogues, selvagens, inúteis, desviadores da atenção, perdulários do nosso tempo, oculta-nos muita coisa de interessante que está a passar-se diante dos nossos olhos e que não percebemos porque os vemos tão misturados como o Jornal do Crime está com o Público no quiosque de jornais, ou como se o Público para falar de ciência citasse o Guia Astrológico como fonte. Os blogues são apenas uma das pontas do mundo novo em que já estamos, uma pequena ponta, mas tão reveladora que mesmo estes episódios lesivos de Miguel Sousa Tavares (acusado de plágio) e de Eduardo Prado Coelho (que tem um texto falso a circular na Rede) são dele sinal. Ora nunca ninguém disse que era o Admirável Mundo Novo, a não ser os utopistas que pensam que as tecnologias mudam o mundo sem o pano de fundo das sociedades onde elas existem.

Vamos admitir, o que não me custa nada, porque até acho que é verdade, que mais de 90 por cento do que está na blogosfera é lixo. Temos em seguida que convir que também 90 por cento do que está nos quiosques é lixo, a julgar pelo nosso quiosque. Não é por aí que se faz a diferença. Para isso é preciso olhar com um pouco mais de atenção quer para os 90 por cento de lixo, quer para os 10 por cento sobrantes, porque, tendo muita coisa em comum, têm também diferenças importantes. Para se perceber o que está a mudar no conjunto do sistema comunicacional temos que analisar o lixo e o luxo na Rede.

http://www.johnbreslin.com/blog/wp-content/20051221a.pngO lixo nos blogues, como antes (e agora) o lixo na Rede têm muito de comum com o lixo nos diários pessoais, nos jornais locais, nos boletins de paróquia, nas rádios locais, nos panfletos partidários, nas cartas anónimas, na pequena, grande e média comunicação social, nessa imensa voz entre sussurrada e gritada que nos acompanha sempre, na maioria dos casos como pura estática, lixo escrito, lixo dito, lixo visto. Mas tem diferenças interessantes como esta que não é meramente quantitativa: mais indivíduos falam na Rede do que alguma vez falaram em jornais, revistas, diários, cartas anónimas ou assinadas.

O número espantoso dos milhões de blogues, com o seu crescimento exponencial, é um fenómeno radicalmente novo. Estes milhões de pessoas que escrevem na Rede, em nome próprio, com pseudónimos ou anonimamente, são uma manifestação da principal característica das sociedades pós-industriais, as que nasceram em espaços urbanos dominados por serviços, pela produção, distribuição e consumo de informação - são sociedades de massas, onde impera o que antigamente se chamava "psicologia de massas". São ainda poucos, mas são o primeiro destacamento, o destacamento loquaz, o que anuncia o que aí vem, os que ocupam o espaço público com as suas vozes no mesmo movimento com que um centro comercial se enche quando abre as portas às 10 da manhã, ou o prime time das novelas fica habitado das suas audiências, ou as praias do Algarve e os estádios de futebol se enchem.
http://www.school-for-champions.com/science/images/noise-white.gif
Essas pessoas falam porque têm alguma coisa a dizer? Acrescentam alguma coisa ou são elas mesmo um sinal de cacofonia? Depende como se vê a questão: elas têm alguma coisa a dizer porque querem dizer alguma coisa - essencialmente que existem e que são elas que vão mandar, que são elas que já mandam. O que têm a dizer não é novo, é ruído, é pobre, é insignificante em termos culturais, estéticos, criadores, mas é a voz que fala cada vez mais alto, a voz que se ouve, a estática gerada pelas multidões e que exige ser ouvida nas sondagens, nas pseudo-sondagens dos telefonemas para dizer sim ou não, nas audiências da televisão, a que não quer esperar, não quer delegar, não quer aprender, não quer sofrer. Quer tudo e já, e só não o tem porque os "políticos" a enganam e desviam.

O número dos blogues significa que também, pouco a pouco, as massas das sociedades de massas chegam à Rede como nunca antes chegaram aos jornais ou chegam hoje à televisão. Trazem com elas aquilo que antes, nos primeiros parágrafos deste texto, chamei "selvajaria": não querem mediações, que são o poder do passado, o poder dos intelectuais, o poder dos antigos poderosos. Querem democracia "participativa", não querem democracia representativa, não querem saber de nada que possa significar privilégio dos sábios, ricos e poderosos. Não prezam a intimidade e a privacidade, porque no seu mundo não existem e não são valores, não prezam a propriedade porque a têm pouco, são anti-intelectuais, combatem todos os que parecem atentar ao seu igualitarismo funcional e punem-nos na Rede como gostariam de os punir cá fora: "é bem feito" é a expressão que mais se ouve por todo o lado. Miguel Sousa Tavares é "arrogante", o "povo" acusa-te de plágio; Eduardo Prado Coelho mandaste na intelectualidade durante muito tempo, leva lá com um texto falso para aprenderes que aqui somos todos iguais! Por bizarro que pareça, tudo isto foi escrito em linha, quer em caixas de comentários, as furnas da Internet, quer nos blogues anónimos e ignorados, os degraus superiores do Inferno.

É por isto que os blogues são interessantes, porque se move ali um monstro, que existe bem fora dos electrões. Esse monstro fala - nos blogues e nos jornais - e nós não o queremos ouvir porque ele nos coloca em causa, coloca em causa o lugar que ocupamos. Ele luta ali pelas suas regras próprias e não pelas que tomamos por adquiridas e, desse ponto de vista, convém conhecê-lo muito bem. É por isso que se aprende mesmo com os 90 por cento de lixo na blogosfera. E aprende-se ainda melhor se olharmos para o 10 por cento que não é lixo, porque para essa parte da Rede irá migrar uma parte mais dinâmica do espaço público, que conhece melhor o monstro e que já fez a prova do monstro.

Tratar os blogues como um quiosque dos jornais indiferenciado é deitar fora o menino com a água do banho. Vamos em seguida falar dos 10 por cento, número optimista, eu sei.

(No Público de 9 de Novembro de 2006)
 


TESTEMUNHOS E OPINIÕES DOS LEITORES DO ABRUPTO SOBRE AS GREVES 3



Quem me conhece sabe que, por princípio, defendo os trabalhadores e os seus direitos. Sabe ainda que me bato pelo lugar-comum segundo o qual os funcionários públicos e os serviços públicos são medíocres. É ainda capaz de saber que acho que os últimos Governos têm vindo a tratar mal os funcionários públicos, fazendo-os perder poder de compra, há anos sucessivos.
Esta situação é suficiente para que eu entenda que os trabalhadores do Estado têm legitimidade para recorrer à greve. Só que, pelo que atrás expus sobre os lugares-comuns nesta matéria, defendo que os funcionários públicos têm de tentar ganhar a simpatia da generalidade da opinião pública. Para isso, dependem muito daquilo que os sindicatos que os representam decidam.

O problema é que uma parte substancial dos sindicalistas são, eles sim e não os trabalhadores que dizem defender, medíocres. É gente que se perpetua há décadas no trabalho sindical e que já não trabalha há largos anos no emprego de origem. São pessoas que, deste modo, têm uma vida muito mais descansada do que quando tinham chefes e patrões a quem prestar contas. Agora limitam-se a fazer o que manda o controleiro partidário que os dirige de cima. E quem os dirige quer agitação social a todo o custo. Não entende as greves como uma forma de pressão negocial, entende-as apenas como braços-de-ferro para demonstrar uma suposta influência social. É por isso que convoca greves para perto dos fins-de-semana. Deste modo, aumentam a adesão aos protestos: aderem os trabalhadores conscientes e aqueles que apenas querem ter um fim-de-semana prolongado. Assim, não se ganha a simpatia da opinião pública. Pelo contrário, isolam-se os grevistas, que até têm razão para reivindicar. Ficam isolados e são apontados a dedo pelo cidadão comum, um cidadão que vê a greve - e com alguma razão - apenas como uma desculpa para a criação de uma ponte de São Martinho.

Já era tempo de os sindicalistas defenderem realmente aqueles que representam e de convocarem greves para o meio da semana. É que ganhar a opinião pública é meio caminho andado para vencer as justas reivindicações. Só desvaloriza isto quem vê nas lutas laborais apenas um pretexto para uma agenda política mais ou menos oculta.

(José Carlos Gomes)

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O que me choca mais neste momento de contestação, é a reacção de uma parte significativa da população que tem sido ouvida nos órgãos de comunicação. Para lá de qualquer possível estratégia de apoio ou contestação à greve, é inegável que cada vez mais pessoas são contra as greves.

Uma das razões mais apontadas para esta posição é a ideia de que os funcionários públicos são privilegiados, têm emprego garantido, salários altos, e reformas boas. Bem, a questão das reformas, agora que são aos 65 anos e foram reduzidas em valor, já não se ouve tanto. Mas a ideia de que há funcionários a mais, de que estes não trabalham, ou que trabalham mal, e que ganham de mais, é muito generalizada.

Porque me chocam estas opiniões? Porque revelam um desconhecimento enorme da realidade. Da realidade dos funcionários públicos, dos serviços públicos e da sua organização, e dos direitos dos trabalhadores. Essas pessoas que acusam, a meu ver injustamente, os trabalhadores da administração públicos de tudo o que consideram mau, são em muitos casos, as mesmas que aceitam trabalhar em más condições, com salários muito baixos, e com poucas ou nenhumas regalias sociais. Desta forma, tendem a conceber os direitos sociais como privilégios. Isto é muito preocupante...

Na medida em que revelam um pessimismo generalizado, uma inveja latente, uma noção de que os direitos são privilégios e não direitos, de que todos devem sofrer como eles sofrem, estas opiniões são perigosas. Não para os funcionários públicos, que parecem estar condenados a continuar a perder poder de compra e direitos, mas para a generalidade dos trabalhadores por conta de outrém. Isto revela uma submissão e uma subserviência ao poder económico, que acaba por se generalizar e diminuir, se não extinguir, direitos que eram considerados, até há pouco tempo, fundamentais.

Não me parece ser este um bom caminho. Puxando os funcionários públicos para baixo, toda a sociedade portuguesa vai ser puxada para baixo, e vamos assistir, já estamos a assistir, a um aumento da diferença entre ricos e pobres, ou seja, ao enfraquecimento das classes médias. Isto é mau para o colectivo, por bom que seja para os empresários, proprietários de riqueza e de bens de produção.

Será que vamos ser todos empresários? Será que vamos todos ter empregados a trabalhar para nós, e a quem vamos pagar o mínimo possível?

Mais uma vez a hipocrisia leva a melhor. O mesmo povo que tem um dos índices mais altos de posse e utilização de telemóveis, e de outros bens não essenciais, reclama agora uma justiça social nivelada por baixo, como se isso fosse bom para todos. Hiprcrisia perigosa, digo eu, porque vai calcar ainda mais o nível de vida dos portugueses, de todos, incluindo os funcionários públicos. Será que os não-funcionários públicos ganham alguma coisa com isso? Tenho a convicção que não, mas ficam felizes com esta vingaçazinha, do português "toma lá que é para não pensares que és melhor que eu...eu estou mal mas tu também ficas."

(Fernando Reis)

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Aqui vai um testemunho relativo à adesão à greve dos funcionários da Administração Pública. Eu própria, e vários colegas, aderimos à greve no passado mês de Outubro tendo inclusive participado na manifestação que se realizou no mesmo dia. No meu caso, em 23 anos de serviço na AP, foi a primeira vez que fiz greve e participei numa manifestação desta índole.

Por razões de ordem financeira – o respectivo desconto de um ou dois dias no salário – decidi que não tenho condições de o fazer. Anoto que sou técnica superior e estou no topo da carreira. No meu serviço, desta vez também ninguém fez greve.

Na escola do meu filho os professores fizeram greve no dia da greve apenas da greve dos docentes. Ouvi, esta semana, alguns professores referirem que também não o poderiam fazer por razões de ordem financeira. Curiosamente ontem a escola funcionou normalmente, hoje fechou por adesão à greve por parte dos funcionários. Manifestamente organizaram-se para a fazer só num dia.

Há aqui matéria para os sindicatos reflectirem sobre a sua estratégia.

(Rosa Barreto)

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Vamos lá então a um testemunho pessoal sobre greves:


Nos idos anos de 1975/76 fiz parte de uma comissão de trabalhadores de uma empresa sediada no distrito de Setúbal, cujo patrão se havia ausentado abruptamente para o Brasil, tendo o governo intervido na empresa nomeando uma comissão administrativa para a gerir. A este tipo de empresas se chamavam de intervencionadas.
Na época a Intersindical decretou uma greve no sector com intuitos meramente politicos e intimamente ligados aos interesses estratégicos do PCP e nós, comissão de trabalhadores, que não éramos nem de perto nem de longe uns “amarelos”, resolvemos “furar” a greve, exactamente pelas suas raízes e motivações e pensando únicamente no interesse particular da empresa, que se debatia com dificuldades económico-financeiras, não podendo por isso desperdiçar uma hora que fosse da sua produção.

Hoje ainda me pergunto, se o patrão estivesse na gestão da empresa se assim teríamos pensado e agido ?

Não dependerão muitas greves mais de quem está no lado contrário do que do interesse imediato de quem as faz ?

(JCB)

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Sugiro-lhe alguma decência. Verifico mais uma vez que recai no hábito de lançar uma discussão com premissas mais que contestáveis. Assim costuma fazer a manipulação, que não está em qualquer raciocínio lógico que siga depois, mas no estabelecimento das premissas, que são colocadas com tal rapidez e eloquência que a audiência as toma por verdadeiras. Com isto ponho em causa a sua afirmação absoluta: "as greves têm hoje má imprensa e má fama". Sem me propôr desconstruir a frase em si, o que obrigaria a um trabalho espartilhado de moderação (para explicar que "nem tanto ao mar nem tanto à terra") sugiro-lhe que leia o que os blogs do João Morgado Fernandes e do Eduardo Pitta dizem sobre o assunto.

(João Machado)
 


NUNCA É TARDE PARA APRENDER:
PERCEBER O PAPA COMO UM ALEMÃO MUITO ESPECIAL - UM CATÓLICO BÁVARO (UM PLEONASMO TÍPICO)

http://www.somlivre.pt/capas/682785.jpgJeanne Perego, A Baviera de Joseph Ratzinger

Há um ano nunca compraria este livro, fosse qual fosse o seu mérito. Nunca tive muita curiosidade pelas biografias dos papas contemporâneos, antes de serem papas. Os trajectos dos papas italianos pareciam-me típicos da ascensão burocrática da institucional igreja, suporte do Vaticano.Quando eles deixaram de ser italianos, interessei-me mais, mas, como João Paulo II era polaco, uma mistura entre a história da Polónia e do Solidariedade pareciam-me chegar. Como de costume, há aqui muita ignorância, mas a verdade é que também não havia curiosidade.

Com Joseph Ratzinger as coisas são diferentes. O interesse que o papa me suscita é intelectual e cultural, não é religioso per se. Traduz um movimento, que penso ser mais vasto, de reflexão identitária sobre a Europa, sobre as raízes civilizacionais da nossa história do "Ocidente", como sinal da espécie de kulturkampf que simultâneamente o fundamentalismo muçulmano e o seu terrorismo apocalíptico, denso de atitudes culturais e civilizacionais, e o chamado "multiculturalismo" trouxeram aos nossos dias. Ora, apercebemo-nos agora (de novo, a ignorância...), que o papa Bento XVI foi um dos intelectuais que com mais importância e influência pelo seu papel em muitos documentos da Igreja, tratou destas questões em termos teológicos, filosóficos, históricos e culturais.

http://content.answers.com/main/content/wp/en-commons/thumb/c/cf/250px-MarktlamInn.jpg

O papa é alemão, bávaro, e isso conta. O catolicismo bávaro, verdadeiramente católico-apostólico-romano não é igual aos outros catolicismos nacionais. É bem diferente do nosso tão proclamado catolicismo, mais popular do que burguês, anticlerical, inculto, mais fiel do que piedoso, mais temeroso do que crente, mais social do que cultural. Coisas da história e da geografia. É o que este livro nos mostra, a abrir com uma foto de Ratzinger cardeal com um copo de cerveja, na mais tímida e hierática postura imaginável, mas mesmo assim possível. E ao olhar o retrato dessas pequenas vilas e aldeias da fronteira com a Áustria, limpas, sólidas, prósperas, em que a torre da igreja é sempre a primeira coisa que se vê de longe, cheias de conventos, mosteiros, faculdades de teologia e seminários, percebe-se um comunitarismo piedoso, que nos é bastante alheio. The image “http://www.dw-world.de/image/0,,1557550_1,00.jpg” cannot be displayed, because it contains errors.Depois as fotografias dos Ratzinger, a casa, os dois irmãos padres para orgulho da família, tudo nos aponta para um catolicismo calmo e consolidado. Muito da biografia de Ratzinger pode ser explicado pelo choque dessa placidez antiga, com o Mundo que encontrou lá fora, o mundo da laicidade agressiva da Europa feita por Napoleão, o mundo das perturbações de Maio de 68, tão importantes para a viragem conservadora do peritus progressista do Vaticano II.
 


TESTEMUNHOS E OPINIÕES DOS LEITORES DO ABRUPTO SOBRE AS GREVES 2



Segue como opinião uma vez que o testemunho me está interdito:

Esta greve é irrelevante e não alterará nada de fundamental na política do governo.
Ela é feita básicamente porque o espaço de actuação dos sindicatos deixou há muito de existir na economia real (privada). No meu caso ela não me afecta em nada, pelo contrário, o trânsito matinal até me facilita e encurta o tempo de deslocação para o trabalho.
Dois dias sem escola também não é assim tão importante: afinal de contas os miúdos não estão a aprender nada na escola. Para eles são dois dias em que as brincadeiras na escola são substituídas por brincadeiras em casa dos amigos.
É uma greve de ricos e não de pobres. Apenas a fazem aqueles que têm o emprego garantido até à reforma.
Ao ouvir alguns banqueiros, funcionários públicos, professores,médicos e enfermeiros a queixarem-se tanto , chego à conclusão de que este governo deve estar a fazer alguma coisa acertada.
O resto do país trabalha,mas esse já não tem acesso às televisões.
Pode acontecer que o "resto" seja apenas residual...uma descoberta que não me surpreenderia.

Seguirei com algum interesse qual vai ser a lógica distintiva entre "opinião" e "testemunho" . Simples curiosidade de um velho leitor do Abrupto.

P. S. (salvo seja) : não sou, nem nunca votei socialista.

(João Costa)

*

Sobre a credibilização dos sindicatos e das greves e suas causas:

1) Porque será que as greves são sempre coladas a fim de semana / feriados?

2) Os sindicatos não estão suficientemente modernizados p/ perceberem que isso só agrava a má imprensa e a má fama de que gozam?

3) Será que se por exemplo as greves em toda a função publica não abrangessem serviços essenciais / urgentes como a saúde e as escolas (exceptuando em ambas partes puramente administrativas), o impacto da mediático da greve seria menor? Tal não daria um maior credibilização à greve?

4) E que tal se os trabalhadores em greve comparecessem nos seus locais de trabalho, envergassem um sinal qualquer de estão em greve e não trabalhassem (não necessitam de fazer manifs e erguer grandes cartazes). Isto não reforçaria o sentido da luta e esvaziaria a má fama de que “as greves são só para terem fins de semana prolongados”? Além disso permitiria aos trabalhadores resolver qualquer situação urgente que surgisse nos seus serviços, dando uma imagem muito mais positiva da respectiva luta.

Declaração de interesses: não sou funcionário público nem sindicalizado. São meras achegas de quem está de fora

(Miguel Sebastião)
 


AS NOSSAS NOVAS PAISAGENS


7h e 25m da manhã, junto a Videmonte, Guarda.

(J. Guerra)
 


PARA SE PERCEBEREM OS MECANISMOS PARTIDÁRIOS
E OS HOMENS QUE NELES MANDAM



Um homem chamado Miguel Coelho ataca um homem chamado Nuno Gaioso, num clássico da acusação aparelhística: culpado de excesso de protagonismo.

A concelhia socialista de Lisboa anunciou hoje a retirada da confiança política ao vereador Nuno Gaioso Ribeiro, a quem convida a demitir-se, depois das críticas feitas a Manuel Maria Carrilho. A decisão do secretariado do PS-Lisboa surge na sequência da publicação, na edição de ontem do “Diário de Notícias”, de uma entrevista na qual Nuno Gaioso Ribeiro acusa o líder da vereação socialista de ter na autarquia um comportamento político "irresponsável, ausente e displicente".

"Embora reconhecendo o direito à crítica, quando ela for construtiva e apresentada nos órgãos próprios, o que não aconteceu, não podemos permitir que um manifesto caso de vaidade pessoal se transforme num facto criado sem nenhuma correspondência com a realidade", lê-se num comunicado emitido pela concelhia.

No comunicado, o secretariado do PS-Lisboa adianta ter decidido, por unanimidade, retirar a confiança política ao vereador Nuno Gaioso Ribeiro e, em consequência, "convidá-lo a demitir-se do cargo que exerce em nome do PS". Também por unanimidade, a concelhia reiterou a sua confiança em Manuel Maria Carrilho, manifestando-se solidária com o vereador.

(...) "O Secretariado do PS-Lisboa só pode entender estas declarações do vereador Gaioso Ribeiro como fazendo parte de uma estratégia pessoal de afirmação – à custa de quem o escolheu e defendeu como candidato – mesmo que para tal prejudique deliberadamente a eficácia das decisões e deliberações dos órgãos legítimos e condutores da afirmação política do PS em Lisboa".
Sublinhados meus. Depois disso, tiraram-lhe o gabinete.

*

É um homem que se chama Pedro Duarte que decide sobre um homem que se chama Rui Rio. Hoje não o recandidataria:

- Se hoje houvesse eleições, e teria de ser feita essa avaliação, Rio seria candidato?

- Objectivamente, hoje não. (Entrevista ao Jornal de Notícias.)

*

Um dos mais graves problemas dos partidos está aqui retratado: as pessoas que os aparelhos produzem e que só têm vida no espaço público pelo seu poder dentro deles. Sócrates e Marques Mendes só ganhariam se dissessem preto no branco que nos partidos que dirigem não há lugar para estas atitudes, até porque ambos são suspeitos de virem desta massa. Faço a ambos a justiça de considerar que já perceberam que não é com estas pessoas nem com estas atitudes que se credibilizam os partidos.
 


TESTEMUNHOS E OPINIÕES DOS LEITORES DO ABRUPTO SOBRE AS GREVES



As greves têm hoje má imprensa e má fama. Fazem parte das coisas que estão fora de moda. Há muitas razões para isso ter acontecido, incluindo a estatização dos sindicatos, que se tornaram um apêndice orgânico do estado do "modelo social europeu" e perderam independência na sua acção. Com o "modelo" em crise, os sindicatos do "modelo" (socialistas) e os que se colaram ao "modelo" (os comunistas) entraram também em crise. No caso português, há também uma grande partidarização dos sindicatos, com a CGTP e a UGT dependentes de estratégias dos partidos. Acresce que uma comunicação social "económica", que funciona como porta-voz das empresas e dos gestores, por sua vez igualmente politizados como se vê pelos seus "Compromissos", conseguiu uma hegemonia interpretativa, hoje ao lado dos interesses do Governo, que oculta outros elementos importantes para julgar o que se passa.

Mas tudo isto não deve impedir-nos de estar atentos à greve da função pública e a outras greves simultâneas, não as tratando como movimentos sociais ultrapassados e “fora de moda”. Por aqui pensa-se que é importante, numa sociedade democrática, a existência de instituições de mediação, sem as quais a democracia representativa fica enfraquecida. Os sindicatos são uma dessas instituições. A produção de "equilíbrio social", quase sempre via conflitualidade social, aberta ou latente no processo negocial, é um mecanismo que se pode inserir nos checks and balances de uma sociedade democrática. Ora, uma das características da pulsão para a chamada "democracia participativa", no meu ponto de vista uma degradação demagógica da democracia, é para a destruição dessas mediações. Por isso, seja qual for a concordância que se tenha com os objectivos das greves, elas não serão aqui desvalorizadas. Podem ser discutidas, podem ser contestadas na sua razão, podem pôr-se em causa os seus objectivos e oportunidade, mas a experiência de fazer greve é uma experiência cívica que não pode ser ignorada.

Apela-se por isso aos leitores do Abrupto para que, durante o dia de hoje, enviem testemunhos (opiniões também, mas os testemunhos terão prioridade) sobre o que se está a passar. De quem entendeu fazer greve, de quem entendeu não a fazer, de quem é por ela prejudicado, de quem não estando no universo dos sectores em greve assistiu a episódios da greve. Seguindo as regras habituais, serão aqui publicados.

*
O secretário de estado, João Figueiredo, faz lembrar o ministro da informação iraquiano, Mohammed Saeed Al-Sahhaf. Os seus 11,7% de adesão à greve da função pública hoje (9.11.2006), por exemplo, na educação, querem dizer que a escola está aberta, apenas com um ou dois funcionários. Um deles na portaria. Os professores entram, estão nas escolas, não podem ir às salas de aula porque os pavilhões estão fechados. Ficam confinados à sala de professores e ao café em frente da escola. Os alunos não podem entrar no recinto escolar por falta de pessoal. Mas a escola funcionou e não houve greve! Pelo que se passou hoje, amanhã os alunos nem se preocuparão em levantar-se a horas. Não quer dizer que tomo como líquidos os 80% de adesão referidos pelos sindicatos. Mas...

(Gabriel Mithá Ribeiro)

*

Como se sabe, o Governo precisou de uma eternidade para saber quantos funcionários públicos existem; no entanto, no primeiro dia de greve da função pública, bastou-lhe um par de horas para saber que a percentagem de aderentes foi de 11,74%. Assim sendo, vale a pena passar adiante da recorrente anedota que são os números díspares esgrimidos por governos e sindicatos e, desta vez, matutar apenas no rigor do valor apresentado.

A mim, pelo menos, faz-me lembrar um director de uma empresa - que eu em tempos conheci - que, face aos orçamentos que os seus técnicos lhe preparavam, dava sempre uns retoques, transformando, por exemplo, 1 milhão de contos em 1.000.000.000$10

Dizia ele que, com isso, mostrava aos clientes como a empresa era rigorosa a fazer orçamentos - e nunca ninguém teve coragem de lhe dizer que ele era alvo da chacota geral - dizendo-se, no meio, que padecia do "Centesi... Mal".

(C. Medina Ribeiro)
 


EARLY MORNING BLOGS

906 - Henri quatre

Henri quatre
Voulait se battre
Henri trois
Ne voulait pas
Henri deux
Se moquait d'eux
Henri un
Ne disait rien.

(Anónimo)

*

Bom dia!

9.11.06
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: MIL CORES

Saturn's rings

nos anéis de Saturno.

Uma verdadeira imagem extra-terrestre ou seja uma imagem, uma paisagem, que nunca tinhamos visto.
 


INTENDÊNCIA

Actualizada a nota A FRAGILIDADE DE TUDO e LENDO VENDO OUVINDO ÁTOMOS E BITS de 7 de Novembro de 2006.
 


RETRATOS DO TRABALHO EM LISBOA, PORTUGAL


Construindo a árvore de Natal da Praça do Comércio .

(António Pedro)

8.11.06
 


COISAS SIMPLES / COISAS MUITO COMPLICADAS



Ivan Aivazovsky, Mar Negro

7.11.06
 


LENDO
VENDO
OUVINDO

ÁTOMOS E BITS

de 7 de Novembro de 2006


Para quem tem dúvidas sobre a governamentalização da RTP, o telejornal de hoje deve ser visto muito atentamente. Para quem está sempre a pedir exemplos, e a quem se está sempre a dar exemplos que depois não se quer discutir, o telejornal de hoje é um excelente exemplo. Hoje foi o dia do debate parlamentar sobre o OE. Até aos primeiros minutos tudo esteve bem: o debate foi animado e permitiu uma peça dinâmica de contraditório. Por ela se pode ver que o debate não correu muito bem ao Primeiro-Ministro, mas isso não é em si relevante, só viria a favor da síntese televisiva. O problema é o que acontece depois, mais um Momento-Chávez perfeito.

À saída. O Primeiro-Ministro é perguntado sobre declarações de Jardim, reduzidas ao estilo do som que morde ou seja, depuradas de argumentos, a favor da frase bruta. Aí a culpa é só de Jardim que se põe a jeito pelo modo como fala. Até aqui muito bem, era um facto novo e tinha sentido perguntar, naquelas entrevistas de porta de saída, o que o Primeiro-Ministro pensava. O problema é que, depois dos 15 segundos que são relevantes para a resposta, seguiu-se uma longa exposição de vários minutos, uma imensidade de televisão que desequilibra totalmente a reportagem, em que, num discurso limpo, se repetem pela enésima vez argumentos conhecidos das teses governamentais sobre o OE.

O Primeiro-Ministro acaba assim, sem nunca ter sido interrompido por uma corte de jornalistas silenciosos (pelo menos da RTP), por repetir sem contraditório o que acabara de dizer dentro da sala, reforçando nessa fala límpida tudo o que o governo queria dizer. Do ponto de vista jornalístico não há aí nada de novo, e é isso que é favorecer a propaganda do governo. O Primeiro-Ministro faz o seu papel, debita o seu spin, os jornalistas da RTP, que não o interromperam ou não reduziram a peça aos poucos segundos iniciais, é que não estão a fazer o deles.

Quando estiver em Rede este telejornal das 20 horas de hoje, vale a pena ver e que cada um julgue por si.

*

Um bom exemplo de privatização e do princípio consumidor / pagador :
"O Teatro Art"Imagem não está sozinho (...) O movimento Juntos pelo Rivoli vai lançar uma campanha de recolha de fundos que incluirá um leilão de obras de arte e um concerto com músicos do Porto. Os eventos ainda não têm data marcada, mas o objectivo está definido: somar os 20 mil euros de que aquele grupo teatral se viu privado, depois de ter recusado subscrever a cláusula do protocolo que o impedia de criticar o município."
(hoje no Público.)

*
Enquanto estudante e profissional da indústria da comunicação tenho seguido com bastante interesse as opções editoriais dos jornalistas que trabalham nos noticiários da RTP. Tenho a felicidade de poder debater este tema com um grupo de amigos que não têm qualquer formação ou interesse particular pelo jornalismo, mas que, enquanto espectadores atentos, facilmente chegam às mesmas conclusões que eu: há muito que os jornalistas-editores da estação televisiva pública não tinham tão pouco para fazer entre as 18 e as 21. E provavelmente durante o resto do dia, no que respeita à composição do noticiário.

Ontem tive oportunidade para ver abertura do telejornal. Fiquei atento até aos 15 minutos. Durante esse período fiz uma amadoríssima análise de conteúdo, em tempo real, das peças que passaram. A sua análise já esclarece um pouco sobre o que se passou, mas gostaria de acrescentar apenas mais alguns dados, pistas sobre a forma como a informação da RTP parece estar altamente condicionada pelo crivo dos gabinetes de comunicação governamentais:

- O noticiário abriu com o anúncio de Sócrates sobre o aumento da inspecção fiscal da banca. Durante a peça, foi possível ver, durante mais de 2 minutos, o Primeiro-Ministro num permanente auto-elogio e promoção das medidas governativas que têm obtido resultados positivos. A referência ao aumento da inspecção fiscal da banca surgiu apenas numa pequena frase de José Sócrates, sem qualquer contextualização ou desenvolvimento da aplicação da medida. Curiosamente, uma pequena referência ao tom do PM na resposta às interrupções no seu discurso provocadas por elementos exaltados dos partidos de oposição, (algo como "Caros deputados, com gritaria não fazem valer os vossos argumentos") teve a mesma duração.

- O contraditório foi mau demais: O PSD teve o destaque óbvio, mas nessa peça, cerca de dois terços do tempo foi dedicado à polémica "Madeira", que merecia referência mas não o destaque principal. Os restantes partidos foram remetidos a pequeníssimos excertos dos seus líderes, com a intervenção do CDS/PP a remeter-se exclusivamente às SCUT, o PCP ao discurso contra "o grande capital" e o Bloco de Esquerda à polémica entre Louçã e Sócrates relativa à redistribuição do auxílio financeiro a deficientes. E de novo com grande destaque para a resposta do PM, no seu registo deselegante, autoritário.

- Conclusão: não tivemos a oportunidade de ver e ouvir a opinião da Oposição sobre a nova medida do Governo, que teve destaque de abertura do noticiário e acabou por ser, apenas, uma mediática referência numa diminuta frase do PM. Já na SIC e TVI os telespectadores puderam ouvir especialistas do CDS e do PSD a defenderem a sua posição relativamente à medida, bem como o comentário de Miguel Sousa Tavares sobre o debate do Orçamento de Estado. O necessário contraditório para que a informação seja isenta e cumpre a sua função: informe a opinião pública sem a direccionar para uma determinada corrente de pensamento.

- Seguiu-se a "entrevista" a Sócrates, com o seu monólogo habitual - o referido "Momento-Chávez". E sem qualquer contraditório ou pergunta da jornalista.

Trata-se de uma questão que nos afecta a todos - estudantes, jornalistas, professores, políticos, cidadãos - por se tratar da estação pública, de dinheiro que é de todos, de uma mensagem que deveria ser para todos. E que parece ser produzida à medida de alguns, para reduzir a amplitude de análise e pensamento de quem vê as notícias sem um olhar crítico, constante. Por isso quis deixar este pequeno apontamento, um pequeno contributo (sem ambição ou tratamento científicos) para o debate.

(Guilherme Pires)

*

Devo começar por lhe dizer que não me encontro nos defensores deste governo, nem tão pouco da RTP. Mas acho que devemos procurar ser justos nas nossas apreciações e não embarcar em campanhas como a que V.Exª quer protagonizar: a de que a RTP tem favorecido o governo. Vejo os telejornais e, sinceramente, não me parece haver nada de comparável com o que consta que se passa na Venezuela. Pelo contrário. O que dizer, por exemplo, da forma com que ontem o telejornal abriu lançando a ideia de que "o governo declarou guerra aos bancos"? para todos concluirmos que este governo é conflituoso com todos os sectores; o que pensar daquele spot que começa assim:"Ganhou o não no referendo..."?sendo afinal uma notícia do anterior referendo ao aborto do tempo de Guterres. Dois exemplos apenas. Mas já agora outro:Então o senhor não acha vergonhosa a "entrevista" que foi feita no Canal Dois pela jornalista de serviço à Ministra da Educação? Será aquilo uma entrevista? Bastava olhar para os olhos da entrevistadora, de que agora não me recorda o nome, para se ficar com a ideia de como a senhora detestava, ou mesmo odiava, a ministra. No final da pretensa conversa a jornalista tem o desplante de fazer a sua apreciação pessoal sobre os casos quentes do Ministério da Educação não ligando nenhuma, absolutamente nenhuma, importância às declarações da Ministra. Bem esta queria acrescentar no fim algumas palavras, mas a jornalista, do alto do seu poder, alegou que não havia tempo. Só havia de facto tempo para a sua opinião pessoal. A forma como essa entrevista decorreu diz bem da falta de educação da pivot, para além de constituir uma lição de como não se deve entrevistar seja quem for - amigo ou inimigo.

Não acho, pois, que o senhor tenha razão. Tenho a lamentar o facto de um homem inteligente, independente quanto baste, e observador muitas vezes arguto que dá gosto ler, tome algumas posições tão parciais como a que constitui objecto desta crítica. Com que objectivo?

(Fernando Barros)
 


LUZ DO PORTO



Hoje, quase agora.

(Gil Coelho)
 


A FRAGILIDADE DE TUDO

Fora de Lisboa, como em Lisboa, tudo é frágil. Chove, falta a luz, vão-se as estradas, desaparecem o telefone e a Internet em todas as bandas. Para quem trabalha em linha, não se pode trabalhar. Durante 24 horas sumiu o telefone e a Internet por estes lados, a menos de setenta quilómetros de Lisboa, como se fosse o Burkina Faso. Até aí poder-se-ia aceitar o que se passa como mal menor, outros sofrerão mais, com as casas inundadas, sem transportes. Agora o que não se pode aceitar - para além do tempo infinito que tudo demora - é a desresponsabilização que as empresas de telecomunicações, supostamente na vanguarda de todas as tecnologias, ostentam face aos problemas dos seus clientes. Os "call centers", para garantirem a sua mão de obra baratíssima, reduzem os procedimentos ao nível do formulário para imbecis, com mecanismos tão rígidos que nos momentos de crise não servem para rigorosamente nada.

O serviço da ADSL.pt para clientes profissionais então é a suprema ironia: fornece um número de telefone para avarias que não pode ser acedido pelo telemóvel, o único que funciona quando as linhas avariam, e ainda pede que se diga o que se está a ver no écrã de um computador que obviamente está ao lado de um telefone morto. Já desconto o facto de durante parte do dia, o serviço responder que não podia tomar conta das reclamações porque estava o sistema "em manutenção" e face à insistência de que ao menos anotassem a avaria, a resposta ser um irritado "já disse que o sistema está em baixo, telefone noutra altura".

E que tal a PT, ou qualquer outra operadora, pelo menos para as assinaturas profissionais, ser obrigada após um prazo razoável para corrigir a avaria, a ressarcir o cliente dos custos da interrupção? Tenho a certeza que o serviço melhoraria de imediato e as empresas seriam mais dedicadas a servir os seus clientes...

*
Está cheio de sorte! Aqui por Penalva do Castelo, distrito de Viseu, foram mais de 200 cortes no abastecimento de energia em apenas 45 dias. No dia 20 de Outubro, entre as 14 e as 15h foram mais de 20. As consequências são as conhecidas: aparelhos queimados, mesmo as UPS. Dizem-nos que são "picos de energia" e que a "solução" é colocar um "descarregador de sub tensão" no quadro eléctrico. Só que o aparelhinho custa 250,00€.

Quanto à PT e ao ADSL subscrevo por baixo tudo o que escreveu. No meu caso foram 8 dias sem telefone e ADSL. E porque meti "cunha". A previsão era de 2 semanas (de 20 de Outubro a 3 de Novembro). Ao que parece por causa das cheias em Leiria e Pombal. Tive de ir trabalhar para Viseu em casa de um amigo...

Se quiser mais pormenores basta ler a reportagem no "Jornal do Centro" da próxima sexta-feira 10 de Novembro.

(António Vilarigues)

*

Sobre o pequenino texto que tem o título em epígrafe, muito directo e verdadeiro, gostaria de acrescentar o seguinte, se permite: Há dias faltou, em algumas zonas de Lisboa, menos de uma hora de energia. "Caiu o Carmo e a Trindade ...", soaram sinetas de alarme, noticiários em pânico, título de primeira página. Há duas ou três semanas, estive entre 4 e 5 horas sem energia (e isto acontece várias vezes por ano!). "No pasa nada ...". Espera e aguenta.
Há em Portugal gente de 1ª, 2ª e 3ª. Há tratamento diferenciado para os utentes de um mesmo país.
Pode ser "natural", acredito. Para quem teve a desdita, de escolher morar "longe" de Lisboa, sofre consequências.

(Rui)

*

Nunca percebi muito bem porque é que a PT não oferece aos seus assinantes a possibilidade (alternativa) de receberem as Listas Telefónicas em CD pois, mesmo que não fizesse qualquer desconto por esse facto, pelo menos os ganhos ecológicos seriam consideráveis. Claro que, quanto ao custo envolvido, as actuais listas em papel não devem constituir qualquer problema (antes pelo contráro), pois quem as consulta é porque tenciona fazer chamadas, e é através destas que o investimento é amortizado.
E foi por isso que fiquei perplexo quando soube que o Serviço de Informações» (o velhinho «118») passou a ser pago. É como ir a um restaurante e ter de pagar, além da refeição, a consulta da lista!
NOTA: Esta analogia veio da associação-de-ideias com o facto de as pessoas se referirem à PT como sendo a Portugal Tele... Come.

(C. Medina Ribeiro)

6.11.06
 


INTENDÊNCIA

Actualizadas as notas O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: TLEBS DE NOVO , e LER, ESCREVER, CONTAR, VER TELEVISÃO E PESQUISAR EM LINHA - VOLTANDO À WIKIPEDIA com comentários de leitores.
 


CONTRA A PENA DE MORTE



logo contra a execução de Saddam. Sem nenhum "mas".
 


IMAGENS POLITICAMENTE INCORRECTAS 3



"O princípio da sabedoria está no temor a Deus."

Do Ecclesiasticus na Vulgata: Initium sapientiae timor Domini et cum fidelibus in vulva concreatus est et cum electis seminis creditur et cum iustis et fidelibus agnoscitur ...
 


LER, ESCREVER, CONTAR, VER TELEVISÃO E PESQUISAR EM LINHA
- VOLTANDO À WIKIPEDIA



(Continuação das notas sobre a Wikipedia.)

A comparação dos artigos da Wikipedia com os artigos de revista e com os jornais pode fazer-se, muitas vezes com vantagem para a Wikipedia, mas não me parece que seja a comparação correcta. A questão com a Wikipedia não é apenas saber se esta é mais ou menos "correcta" no seu conjunto do que a informação disponível noutras fontes. É saber como é que o erro, a falsificação, intencional ou não, são detectados, corrigidos ou evitados, num texto que aparece como sendo de referência.

Os artigos de uma enciclopédia pretendem ter um estatuto de referência pelo que a sua comparação tem que ser feita com textos com o mesmo estatuto e não com artigos de jornais.
Esta comparação foi feita entre a Wikipedia e a Enciclopedia Britannica para as entradas sobre ciência pela revista Nature, com resultados favoráveis para a primeira. Este estudo foi veementemente contestado pela Britannica e recebeu uma contra-resposta da Nature.
Não há maneira de escapar ao problema da validação científica no julgamento da Wikipedia e isso levanta o problema da edição das entradas na enciclopédia e coloca em causa o método "democrático" dos "grandes números" de colaboradores corrigindo-se uns aos outros. Os problemas adensam-se nas áreas das ciências humanas e nas áreas mais periféricas, logo menos escrutinadas, da Wikipedia, como é o caso da parte portuguesa. O problema parece-me insolúvel quanto se trata de questões muito controversas, cultural, religiosa e politicamente sensíveis.

No momento em que a Wikipedia se torna cada vez mais uma fonte para os trabalhos escolares, e para a citação em linha de curto fôlego, ela revela de forma muito interessante todos os problemas das novas literacias que são necessárias para trabalhar na Rede. Literacias ligadas à pesquisa e recolha de informação deveriam fazer parte de qualquer aprendizagem escolar desde o básico. Ler, escrever, contar, ver televisão e pesquisar em linha, são as literacias básicas do dia a dia de hoje. Todas, e todas ao mesmo tempo.

A Wikipedia é uma grande realização da Rede, compreende nas suas páginas uma imensa quantidade de informação, mas padece de problemas estruturais, que decorrem do seu modelo. Como muitas vezes acontece, o que lhe permitiu o sucesso é o que a torna doente. O debate sobre o projecto da Wikipedia é um dos que está no centro dos problemas da Rede enquanto "fábrica de informação", e um dos debates do imediato futuro.

Continuaremos.

*

Um exemplo. Outro dos artigos proposto para os melhores da Wikipedia portuguesa é o artigo sobre a "Oposição à ditadura". Como o artigo sobre o PCP ele suscita as maiores reservas. No seu conjunto ele tem erros factuais, mas acima de tudo propõe uma visão da história essencialmente ideológica, interpretativa politicamente. No início do artigo, uma fotografia de Cunhal de um lado e de uma foice e o martelo do outro, mostram bem a intencionalidade política do texto, com a agravante em termos de legibilidade de ter sido corrompido por tentativas de introduzir um vocabulário valorativo com outras origens (p.e. "a Acção Revolucionária Armada (ARA), apoiada e criada pelo PCP, e as Brigadas Revolucionárias (BR) se revelaram como uma importante forma de resistência contra o sistema colonial português, praticando actos terroristas e atacando principalmente o Exército e as suas bases militares", sublinhados meus a vermelho).

Os problemas de estilo narrativo, que são fundamentais nas entradas em matérias de ciências humanas, e em história em particular, colocam o texto ao nível das piores redacções escolares infantis, como pode ver aqui:
A oposição foi muito importante para a História de Portugal visto que ela contribuiu bastante para acabar a ditadura, acabando assim a repressão, a guerra colonial e o isolamento. Muitos intelectuais e pessoas importantes, como Humberto Delgado, Álvaro Cunhal, Norton de Matos, participaram na oposição e contribuíram muito. A oposição sofria muito com as perseguições e repressão da PIDE, a polícia política do Estado Novo, por isso ela optou pela clandestinidade. Muitos opositores foram forçados a exilar-se para o estrangeiro e alguns até foram assasinados pela PIDE, como o General Humberto Delgado.
Não é preciso ir mais longe do que a caracterização de um único período da história da oposição (1926-1943) onde se somam os erros factuais, uns a seguir aos outros, as omissões, entre as mais flagrantes o papel da guerra de Espanha, com a versão desvalorizadora da oposição anarquista e republicana, que faz apenas nascer a oposição eficaz com os comunistas e, dentro dos comunistas, com a direcção de Cunhal:
* Oposição fraca, desorganizada e violenta.

No princípio da ditadura, a oposição era desorganizada, era dominada por concepções anarquistas que privilegiavam a acção violenta, radical e armada.

Os republicanos democráticos organizaram e comandaram várias revoltas como as de 1927, 1928 e 1931 e tiveram lugar no Porto, Lisboa, Setúbal, Açores, Madeira e Guiné, mas todas elas fracassadas.

A revolta de 1934 que foi organizada pelos comunistas e operários que tentaram opôr-se à corporativização dos sindicatos, teve lugar na Marinha Grande, mas esta revolta, como as outras, fracassou.

Em 1935, os nacionais-sindicalistas, liderados por Francisco Rolão Preto (um integralista, defensor do Corporativismo e fundador do Movimento Nacional-Sindicalista, um movimento católico da Direita fascista, fundado em 1933 e proibido por Salazar em 1934 devido aos seus discursos anti-salazaristas), tentaram uma revolta ("tentativa de revolta do navio Bartolomeu Dias e do destacamento militar do Quartel da Penha de França") para derrubar o Estado Novo, em 1935, mas esta fracassou-se. Preto e alguns dos seus apoiantes nacionais-sindicalistas teve de exilar-se para Espanha.

Em 1938, um grupo de anarco-sindicalistas tentaram assassinar Salazar, o "Chefe", quando este se dirijia para a missa mas ele conseguiu escapar ileso."
A vermelho estão sublinhados os erros, quer factuais quer de classificação e caracterização. O resto do artigo é do mesmo género.

*
Não consegui deixar de esboçar um pequeno sorriso ao ler os seus comentários sobre a entrada que refere na Wikipedia.

Se a entrada tem do seu ponto de vista erros pode:

1 - Aceder à página da Wikipedia e alterar o seu conteúdo

2 - Criar uma página de discussão onde poderá colocar as suas reservas face ao conteúdo do mesmo.

E assim que vive a Wikipedia: alterações e discussões.

E assim nasce uma enciclopédia com 3,5 milhões de entradas em 205 idiomas e dialectos.

Na versão inglesa existem 1.469.342 entradas e 6.277.941 de outras páginas como páginas de discussão onde os diferentes utilizadores podem trocar pontos de vista sobre os conteúdos das entradas (na versão portuguesa existem 194.011 entradas e 516.818 outras páginas).

Estas estatísticas mostram o carácter avassalador do projecto Wikipedia que apenas é possível porque existe a Internet e pessoas dispostas a colaborar sem custos num projecto cujo objectivo último é criar uma base de conhecimento universal e de acesso gratuito.

Este projecto baseia-se em 2 pilares sendo um contratual e o outro
tecnológico:

1 - Licença GNU: esta licença nasceu em 1991 com o advento do software livre. Em termos básicos, esta licença afirma que todas as alterações realizadas por alguém a algo que está afectado por uma licença GNU também ficam do domínio público. Ninguém pode reclamar como suas as alterações que realiza a algo que já é do domínio público.

2 - Tecnologia Wiki: a Wikipedia assenta numa plataforma Wiki que não é mais que uma aplicação de gestão de conteúdos adaptada a portais colaborativos.
Todos podem alterar os conteúdos desse portal logo é importante ter um gestão de versões onde todas as alterações efectuadas são registas e existe sempre a possibilidade de colocar um artigo num estado anterior ao da sua modificação (como acontece nos casos em que as páginas são vandalizadas).

Os seus pontos de vista sobre a Wikipedia fazem-me lembrar as discussões sobre o software livre. Steve Balmer da Microsoft caracterizava esse software como um cancro porque não tinha qualidade. A semana passada, numa jogada magistral, a Microsoft assina com a Novell um contrato para uma melhor integração do Windows com o Suse Linux da Novell (ver aqui.)

Outros exemplos do "cancro" do software livre podem ser apontados como o Firefox e o OpenOffice.

A Wikipedia vive dos mesmos princípios que estão no software livre e que provaram ser os ingredientes para uma receita de sucesso.

Eu sei as razões porque o Dr. Pacheco Pereira tem de dizer mal da Wikipedia.

A primeira é porque a Wikipedia veio mostrar que o saber não é propriedade de uma meia dúzia de pessoas que têm acesso fácil aos meios de comunicação tradicionais (como televisão) e que por isso podem brilhar. A Wikipedia mostra que existem milhares de Pachecos Pereiras tão bons ou melhores que o original Pacheco Pereira.

Em 2ª lugar atinge as suas fontes de rendimento. A elite intelectual vive de se ter de pagar para aceder ao saber (compra de um livro, de um jornal ou de uma enciclopédia). A Wikipedia é algo que vai atingir algumas dessas fontes de rendimento.

Mas como em tudo na vida nada é garantido. Pode dormir em paz, Dr. Pacheco Pereira, porque a Wikipedia tem a sua sobrevivência sempre em risco quer seja pela falta de voluntários para escrever artigos ou pela falta de donativos que são a única fonte de rendimento deste projecto.

(Daniel Nunes)

*

Convenhamos. Nem tudo é perfeito. A Wikipédia, como qualquer outra coisa inventada por nós, tem os seus prós e os seus contras. A minha opinião vem a seguir. Obviamente conspurcada dos prós e contras da minha própria existência intelectual.

Como prós destaco:

- consulta rápida, fácil e gratuita;

- utilidade do hipertexto;

- não há impressão do erro e após a sua detecção permite uma rápida correcção.

É inegável a facilidade e a universalidade de consulta da Wikipédia. As enciclopédias de papel são demasiado caras e demasiado portáteis. O hipertexto é também de extrema utilidade que permite, no imediato, relacionar temas, nomes, palavras, conceitos, teorias. Por outro lado parece-me interessante que não haja a impressão do erro. Numa enciclopédia em suporte de papel o erro imprime-se e a sua detecção é mais difícil (o nosso estado de alerta para o erro de uma enciclopédia popular, por acharmos que é uma espécie de bíblia, está praticamente adormecido) e a sua correcção fica sujeita à edição de um novo volume, o que demora muito tempo e quase sempre tempo demais. Neste particular, a Wikipédia assume vantagem porque permite a rápida correcção do erro.

Como contras destaco:

- o anonimato dos colaboradores;

- as entradas raramente estão finalizadas;

- uso do espaço para fins sociais perniciosos.

O anonimato dos colaboradores é potencialmente crítico. E digo potencialmente porque não considero que esta questão se coloque entre os que sabem tudo e os que sabem nada, sendo os primeiros os "colaboradores das enciclopédias clássicas" e do outro os "colaboradores da Wikipédia". Isto levanta uma questão interessante e que tem a ver com a acreditação das enciclopédias. Não tendo as enciclopédias clássicas (a partir de agora refiro-me desta forma às enciclopédias em suporte de papel) bibliografia, os seus créditos são obtidos pelo nome da editora ou instituição que a edita e pelo coordenador dos volumes. Espontaneamente associamos uma enciclopédia clássica a um trabalho feito por gente que sabe tudo, vulgarmente conhecidos por especialistas. A Wikipédia seguiu o mesmo caminho, procurando credibilidade através do nome, algo que facilmente conquistou. Mas começa a haver um maior cuidado no apoio bibliográfico das entradas o que pode ser uma vantagem para a Wikipédia.

Repito. É um erro muito grande partirmos do princípio que esta questão se coloca entre os que sabem tudo e os que sabem nada. Até porque as enciclopédias clássicas, ditas de referência, também incluem erros e em proporções não muito díspares daquelas que apresenta a Wikipédia. Vejamos um exemplo. Num comentário à obra "Vida de Aristóteles" de António Pedro Mesquita, o José Pacheco Pereira escreveu que «(...) O que nela se aprende não é apenas sobre Aristóteles, mas também sobre a fábrica de uma biografia antiga, as fontes, os textos, os boatos, os fragmentos, as querelas de autoria e de identificação, as versões próximas ou longínquas ao original. Este aspecto, sem desmerecer a qualidade da própria biografia, ensina-nos muito sobre como se investiga a partir de uma realidade que os anos fragmentaram, dispersaram e corromperam, e isso diz-nos muito sobre o que o tempo e a história fazem a uma obra e à memória de um homem.» O mesmo problema ocorre com o neurologista português António Egas Moniz. As fontes secundárias foram-se produzindo com base noutras fontes secundárias (num total despreza pela fontes primárias, quanto mais não fosse para verificar a veracidade da informação) e dessa forma fomos assistindo ao longo do tempo a uma deformação da realidade e à criação de uma imagem que serve unicamente causas sociais absolutamente perniciosos. Resolvi por isso fazer uma coisa muito simples. Peguei no maior número possível de dicionários biográficos e enciclopédias, e fui pesquisar o dizem sobre a leucotomia, a lobotomia e sobre António Egas Moniz . Os erros são imensos (ver aqui) e, pior, são erros impressos, que circulam sob a máscara da credibilidade editorial. Quando detectados não há forma de corrigi-los a não ser através da edição de um novo volume.

Para terminar, gostava de alertar para o perigo do uso do espaço Wikipédia com fins sociais perniciosos. Recentemente vi-me envolvido numa discussão contra desconhecidos (os tais colaboradores anónimos) porque na entrada "Clara Pinto Correia", ainda muito incompleta, alguém tinha colocado em destaque o episódio do plágio na revista Visão. A forma como aquela página se apresentava era inaceitável pois era provinciano e difamatório. Depois de uma discussão (ver aqui) a situação ficou resolvida.

Na minha opinião, a Wikipédia pode ser um excelente instrumento de trabalho mas precisa de ser restruturada. Não podemos ignorar o facto de a Wikipédia ser usada como fonte bibliográfica por milhares de estudantes. Mas é também nossa obrigação aproveitar o pretexto e repensar o modelo actual das enciclopédias clássicas que, convenhamos, deixam muito a desejar.

(Ricardo S. Reis dos Santos)

*

O que afirma sobre os artigos no seu post referidos é verdade. No entanto, esses artigos não citam fontes, fazem afirmações não sustentadas e não são neutrais -- como bem refere no seu post.

Ora, os princípios da Wikipedia explicitamente recomendam que:

* "os artigos da wikipédia devem ser imparciais, ou seja, devem ser escritos numa forma com a qual ambos (ou todos) os lados envolvidos possam concordar com ele." (aqui)

* "os artigos não devem conter conceitos, recolha de dados, pesquisas ou teorias que não tenham sido anteriormente publicados em veículos adequados e reconhecidos para o efeito." (aqui)

* "qualquer leitor deverá poder aferir que tal material foi já publicado por uma fonte fiável" (aqui)

Donde:

1. Não parece ser um problema fundamental com a Wikipedia

2. Não se percebe como a entrada sobre a Oposição à Ditadura pode ser candidado a um dos melhores artigos. Deveria pelo contrário ser assinalado como opinativo e sem fontes (ver por exemplo o seguinte
artigo em inglês, onde está visivelmente assinalado o facto de haver disputas acerca da precisão dos factos).

3. Porque é que ainda ninguém assinalou este artigo como contendo factos discutíveis ou como sendo opinativo, permanece para mim um mistério.

(Tiago Loureiro)

*

Num mundo ideal talvez a Wikipedia ou outra qualquer enciclopédia podessem ambicionar a um estatuto de referência. A seguir ao importante acontecimento recente (durante o ICM2006), que foi o reconhecimento do matemático russo Gregory Perelman pela comunidade matemática internacional, atribuindo-lhe a medalha Fields pelo seu trabalho sobre a conjectura de Poincaré, a qual ele recusou, levantaram-se diversas questões. Uma relaciona-se com o papel dos jornais e revistas matemáticas na validação e arquivo do conhecimento matemático, pois Perelman não procedeu da forma habitual, que seria submeter os seus artigos a essas revistas, antes divulgando-os apenas no servidor arXiv. O que é facto é que estes artigos foram considerados importantes para serem analisados pelos seus pares, embora tivesse havido uma quebra das regras. Não estaremos perante um caso semelhante, quando falamos da Wikipedia?

(Américo C. L. Tavares)

*

A propósito dos marroquinos, espanhóis e portugueses no artigo da Wikipedia, convém referir que basta aceder ao histórico da página.
Podem-se comparar as versões da página. Vê-se claramente quando e quem as efectuou. Um recurso valiosíssimo que está ausente das versões em papel. E mais: pode-se ver que mais tem escrito cada pessoa!
Quanto à alteração de vandalismo, pode-se ver claramente que foi efectuada às 7:21 de 6 de Novembro e anulada às 8:07 do mesmo dia. Um mero acto de vandalismo, facilmente resolvido. O problema coloca-se quando os vândalos são persistentes, o que felizmente não é muito frequente (e geralmente leva a que passado algum tempo se encerrem as alterações à página, para resolver o problema).
Graças à própria Wikipedia, pude detectar uma alteração do mesmo utilizador à página da cidade do Porto, de menor teor, e anulá-la.

(Leonel)

*

Em resposta aos seus comentários sobre a fiabilidade da informação contida na Wikipedia, gostaria de levantar as seguintes objecções:

1) Até agora, todos os artigos que consultei na Wikipedia estavam não só correctos mas também, algumas vezes, mais completos e actualizados do que os seus correspondentes em enciclopédias com edição revista. Mas também acrescento que praticamente todas as pesquisas que fiz foram relativas a temas científicos e não históricos e, se bem me lembro, nunca li nenhuma entrada em português.

2) Relativamente à fiabilidade dos artigos da área das ciências humanas, talvez este artigo seja interessante.

3) Como já disse, não conheço o nível geral dos artigos em português, ou relativos a assuntos portugueses, mas não ficaria espantado se fosse fraco. Só que eu não acho que isto seja uma falha da Wikipedia, acho que apenas reflecte a debilidade da nossa classe acadêmica, e a escassez do debate intelectual e crítico na nossa sociedade (e também a nossa irrelevância no contexto intelectual global). Afinal, quantos erros semelhantes áqueles que apontou são cometidos nas edições, seja de livros ou revistas especializadas, com revisão, portuguesas?

(João Soares)
 


EARLY MORNING BLOGS

905 - Je te vends ma vache

Je te vends ma vache
Bonne à beurre
Bonne à lait
Bonne à veau
Bonne à tout ce que tu voudras
Un plat de morue
Marché conclu
Ma vache est vendue.

*

Bom dia!

5.11.06
 


RETRATOS DO TRABALHO NA AGUDA, PORTUGAL



Trabalho na praia de Aguda.

(Gil Coelho)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: TLEBS DE NOVO



A propósito da Nova Terminologia Linguística do Ensino Básico e Secundário, e como Professora de Português, ocorrem-me muitas questões, sendo algumas as seguintes:

Que sentido faz para uma criança uma classificação como esta 'advérbio disjunto restritivo da verdade de asserção'? Alguém deseja explicar-me que significa isto?

E água , por exemplo, que , por Portugal inteiro tem sido uma farturinha? Vai ser um nome quantificável? mas é sempre quantificável? ou só o é se estiver bem medida dentro de uma garrafa? Porque não vejo ninguém a quantificar a água de uma catarata do Niagara, de uma cheia ou de uma enxurrada!

Que vai ganhar uma criança, aprendendo toda uma terminologia sobre a qual nem os próprios linguistas se entendem, para falar bem , escrever bem, dar as suas opiniões ? E para saborear as palavras de um texto?

(Terão que se queimar todas as gramáticas e dicionários 'antigos'? Já houve quem dissesse que era tudo para ir para o lixo. Vamos ler de modo diferente, um Camões, um Eça , um Saramago, um Lobo Antunes?... Ou a ideia é essa mesma : deixar os bons livros para uns tantos intelectuais e afastar as crianças e jovens deles por causa de tais terminologias? Ou já se esqueceram da tremenda asneira de ensinar 'Os Lusíadas' quase só à base da 'divisão de orações', que tornaram, para muitos , a obra intragável e detestada? E porque tem a nossa Língua, românica, que submeter-se aos ditames da Gramática Inglesa , anglo-saxónica?

Não creio que os problemas do ensino da Língua Portuguesa se ultrapassem com estas medicinas, nem - parafraseando uns quantos versos de Fernando Pessoa - consta que os grandes Escritores da nossa Língua conhecessem tais Terminologias. E, no entanto, escreveram como escreveram.

Mas isto sou eu a divagar, uma simples e anónima Professora de Português do 2º ciclo, pelo trigésimo quarto ano, que não sabe nada, nem pode nada...contra as modas! Ainda se lembram da experiência da Gramática Generativa e das ' árvores' todas? Pois, já ninguém se lembra... Mas, para os linguistas foi uma experiência muito bonita!

(Alexandrina Pinto)
*
Na Nova Terminologia, ( um exemplo entre vários) nomes epicenos, sobrecomuns, comuns de dois que agora se retoma nem sequer é novidade nenhuma. Estudei esta terminologia na minha 4ª classe , há mais de quarenta anos...

(Alexandrina Pinto)

*

• O ensino da TLEBS, cujo conteúdo contempla a Portaria 1488/2004, de 24 de Dezembro, sendo obrigatório e fazendo parte do currículo escolar, terá que ser adoptado na escola.

• A Associação de Professores de Português (é claro que haverá outras que têm outra percepção) apoia a introdução da nova terminologia (que substitui a nomenclatura de 1967), pelas razões que podem ser consultadas no respectivo site, tendo essa associação deixado os contributos na feitura da TLEBS que ali se mencionam.

• Considerações como se será preciso saber Linguística para escrever serão sempre inconclusivas. De todo o modo, a Linguística não é a ciência que ensina a escrever obras literárias.

• É bem verdade que esta reforma, como todas as reformas, poderá ter conotações ideológicas, como diz o Sr. Mithá Ribeiro. E também é bem verdade que o mesmo acontece com a Área de Projecto, de objectivos totalmente falhados. Mas o problema mais prosaico da Área de Projecto é que é visto como mera perda de tempo pelos alunos, por muitos professores ao que parece, e pelos pais, que estamos totalmente alheados do mundo escolar, por opção e por imposição. É devastador para a credibilidade da escola que existam disciplinas cujo único objectivo percebido seja o de “perder” o tempo que podia ser dedicado as disciplinas “importantes”.

(Carmen Formigo)

*

Era bom que se distinguisse progresso científico, técnico ou humanista de «engenharia social». Caso contrário, continuaremos a ver apenas virtudes nas revoluções e nos revolucionários. Para que conste, sublinho que a questão da TLEBS é apenas um sintoma de uma «Revolução Cultural à Portuguesa» que se arrasta no ensino básico e secundário há meia década. Não discuto tecnicamente a TLEBS. Mas preocupa-me o sentido ideológico em que se enquadra. Outro exemplo claríssimo e não menos dramático que deriva do mesmo «espírito inovador» da TLEBS é a Área de Projecto. Escrevo porque estou neste momento «com a mão na massa». Está também a romper-se com o passado, incentivando, de modo quase boçal, os alunos a realizar trabalhos de investigação apenas porque têm umas luzes sobre leitura, escrita e «problemas sociais» (muitas vezes nem isso). É algo comparável à ideia do incentivo à actividade sexual na puberdade por ordem do Estado apenas porque biologicamente já se está apto. Está a forçar-se de modo compulsivo a maturidade intelectual e cívica. Corremos o risco com estas «experiências» de não só não inovar, como matar em idades precoces o interesse futuro por projectos de investigação ou desviar os professores de modo inaceitável de uma determinada empatia que desenvolveram ao longo da vida com o conhecimento. E vamos caindo em banalizações e simplismos irresponsáveis, como se o social se mudasse por decreto e por muitas acções de formação.

Sobre a Área de Projecto, adolescentes que, por exemplo, frequentam agora no 7º ano, arriscam-se a chegar ao 12º ano com «n» «investigações» ou «projectos» sobre droga, sexo, terrorismo, violência, religião, racismo, doenças terminais, eutanásia, música, desporto, ambiente, cinema, etc. A lista de temas da Área de Projecto por esse país fora, para pessoas com dois dedos de testa, mostra claramente que na esmagadora maioria dos casos tratam-se de temas de grande sensibilidade moral, intelectual, cultural, ideológica, académica, aqueles que exigem mais saber e maturidade para serem tratados com o mínimo de seriedade; ou então são temas que em si e no modo como são tratados servem objectivamente para denegrir o papel intelectual e civilizacional da escola. Está a brincar-se com a vida social, com as instituições e com o conhecimento naquilo que há neles de mais profundo. Como tudo tem sido feito, a «Revolução Cultural» que o Estado está a impor às escolas é tão perigosa e socialmente nefasta quanto o simplismo intelectual da «Revolução Cultural Chinesa».

No caso da Área de Projecto, porque a iniciativa é entregue aos alunos, a massa popular de onde brotam as preocupações e questões «genuínas», o resultado prático é demonstrar como o Estado está a dar o seu melhor para estupidificar os mais carenciados, a maioria dos alunos da escola pública. Enquanto as turmas excepcionais de classe média escolhem temas como «o ambiente», «o teatro» ou «a arte», a esmagadora maioria das turmas de classe média-baixa e baixa anda à volta do «sexo, drogas & violência». Quando, por exemplo, se solicita aos alunos organizados em grupos (outra medida «colectivista») que coloquem questões que gostariam de ver esclarecidas sobre o «seu» tema, surgem em adolescentes de 12-13 anos questões do tipo «Quais são as vantagens e desvantagens do sexo oral?», «Porque é que os jovens praticam tanto sexo?», «Quais as drogas com maior consumo?». Uma vez que as turmas não são rigorosamente homogéneas (e mesmo que assim não fosse), o Estado Democrático força-nos a colocar crianças com um mais saudável enquadramento familiar (e felizmente distantes destas questões), face a problemas que «a turma acha importantes que sejam debatidos». Portanto, não só não se resolvem os problemas de quem os tem, como se permite que eles sejam irresponsavelmente modeladores de comportamentos e atitudes dos outros, esses outros – alunos e professores – que o Estado deveria formar e proteger da barbárie. Se juntarmos a isso a desorientação (e até uma justa revolta entre os professores) provocada pelas TLEBS, percebemos como se gere a educação.

Um Estado que corta nos excessos (e bem!) e que deveria ser racional, deveria esclarecer quanto custam ao erário público por dia as Áreas Curriculares Não Disciplinares (Área de Projecto; Estudo Acompanhado e Formação Cívica). Cada turma consome cerca de um dia inteiro de aulas com tais barbaridades que podem equivaler a mais de um quinto dos salários pagos aos professores. Pior: há professores impedidos de ter mais horas da sua disciplina que tanta falta fazem (como história no 7º ano) porque o seu tempo lectivo e dos seus alunos é ocupado com essas «causas-maoístas-versão-século-XXI».

(...) Por muito que seja uma solução terceiro-mundista, espero que as elites que estão a oferecer de mão beijada um novo Estatuto da Carreira Docente à Ministra como panaceia para os males da educação, ao menos exijam em troca um pouco de inteligência, dignidade e estabilidade para o ensino. Quantas mais décadas isto continuará?

(Gabriel Mithá Ribeiro)

*

Tendo sido aludida pela Sra. D. Cármen Formigo que não conheço de parte nenhuma, cumpre-me apenas dizer que:

- não tenho que aprender nada que muitos linguistas dizem que está errado;
- que , como a referida Senhora não me conhece não sabe o que já estudei pela vida fora e continuo a estudar todos os dias, porque não sei nada. A única motivação para ensinar são os meus alunos, os de trinta e três anos e os actuais. É perante com eles que sinto responsabilidade.
- para que eu não seja Professora das suas crianças é muito fácil, deve saber como se faz;
- e repito que nenhum dos GRANDES ESCRITORES da nossa Língua precisam de saber Linguística para serem GRANDES. Muitos nem sequer estudaram Humanidades, como agora se chama.Com certeza, Camões não estudou.

Com isto , (...) dou por finda esta troca de palavras que nunca imaginei poder originar, apenas quis mostar o meu sentir e de muitas colegas que não têm coragem de o dizer para não serem mal interpretadas. Eu, com a idade que tenho, já não me impressiono com ataques. Muito menos vindos de quem não me conhece e que se sente autorizado a fazer juízos de valor sem conhecer a minha vida profissional.

(Alexandrina Pinto, Professora de Português do 2º ciclo)

*

Como mãe de alunos do 2º Ciclo, preocupa-me a resistência à auto-formação contínua da professora Alexandrina Pinto, na medida em que pode ser representativa do que acontece entre, espero que muito poucos, professores.

Ninguém tem que explicar aos professores a Nova Terminologia Linguística. Antes deveriam ser eles a procurar aprender (têm informação disponibilizada pelo Ministério de Educação desde, pelo menos, 2004 e capacidades intelectuais suficientes). Porque aprender sempre é o que todos esperamos que façam os médicos que nos curam, os engenheiros que constroem as nossas casas e os professores que ensinam os nossos filhos.

A TLEBS é aplicada por fases, segundo me parece. Os alunos não levam com toda ela de uma vez.

A terminologia científica é necessária em todas as disciplinas científicas, da Matemática à Física, da Biologia à Língua.

Não há que deitar fora as gramáticas antigas, que são imprescindíveis. Mas a verdade é que, custe a quem custar, a ciência evolui. Há muito que a medicina deixou de se basear no estudo dos quatro humores e na receita de sangrias.

Tenho a certeza de que os escritores conhecem o funcionamento da língua, porque o estudaram. Quem não o conhece, poderá escrever, mas não é escritor. Se dominam ou não a terminologia científica, é outro assunto totalmente diferente.

Todos os professores, anónimos ou não, têm que estudar. Não podem ter medo e, pior ainda, incutir aos pais e aos alunos, medo dos novos avanços científicos. O conhecimento humano é cada vez maior. Custa cada vez mais trabalho saber. Hoje, estudar é uma tarefa que não tem mais fim.

(Carmen Formigo)
 


CORES À VOLTA



Figueira, damasqueiro, tília, camélia, árvores perdendo-se das cores antigas.

 


INTENDÊNCIA

Actualizada a nota O PROBLEMA DA WIKIPEDIA: OS ERROS DO ARTIGO “PARTIDO COMUNISTA PORTUGUÊS” com exemplos enviados pelos leitores que confirmam as maiores reservas quanto ao "conteúdo" português da Wikipedia.

[NOTA: depois das referências a estes textos, quer o do PCP, quer outros citados pelos leitores - o texto absurdo na entrada em inglês sobre Portugal estava de facto em linha, verifiquei-o pessoalmente - foram retirados. À hora a que escrevo (12 horas), o texto inglês foi retirado e no texto sobre o PCP aparece uma anotação que diz "A Wikipédia não tem um artigo com este nome." Vai ser interessante assistir à evolução deste caso, escrita pela "mão invisível" dos internautas, mas, até por isso, a iniciativa que aqui se tomou veio revelar o problema de fundo da "informação" da Wikipedia. Mesmo que a colocação de textos fraudulentos tenha sido feita intencionalmente para comprometer o projecto da Wikipedia, nem por isso o facto de eles permanecerem em linha deixa de pôr em causa a credibilidade da enciclopédia como referência, potenciado pela prioridade que o Google dá às suas entradas em qualquer procura. Depois, subsiste outro problema suplementar: como é que "informação" tão flagrantemente errada permanecia em linha, sem que fosse posta em causa a sua qualidade, durante tanto tempo?]

NOTA 2: Conforme mensagem de José Carlos Santos, a informação respeitante à página original do PCP encontra-se ainda hoje, com os mesmos erros, noutra ligação distinta (aqui também) daquela onde ainda ontem se encontrava o mesmo texto. Quanto ao texto citado da página inglesa sobre Portugal, esteve em linha 14 horas como se pode ver aqui. O texto foi apagado depois de o Abrupto o ter referido.

Em contrapartida, já há anos que a Encyclopaedia Britannica contém um erro crasso no artigo sobre Pedro Nunes que, tanto quanto sei, continua por corrigir.

(José Carlos Santos) ]

Actualizada a nota O INVERNO DO NOSSO DESCONTENTAMENTO com os comentários dos leitores.

Em actualização durante o dia de hoje os ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO.

*

O Sr. está a cometer um erro nas suas apreciações sobre a entrada do Partido Comunista Português na Wikipedia.

Quer na versão em Português quer na versão em Inglês já existe vai para muito tempo as entradas sobre o PCP:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_Comunista_Português

http://en.wikipedia.org/wiki/Portuguese_Communist_Party

O que acontece é que os seus links estão mas escritos no seu blog. O link que tem no seu blog é este:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_Comunista_Portugu%C3%83%C2%AAs

E se clicar obviamente que o Wikipedia lhe vai dizer que não existe nenhum artigo sobre o Partido Comunista Portugu%C3%83%C2%Aas.

Isto acontece quando no blogger se copia directamente do browser os links da Wikipedia que têm caracteres acentuados. O blogger ao gravar o post altera os caracteres acentuados do URL. Por exemplo o ê é subsituido por %C3%83%C2%AA.

Para que isso não aconteça deve depois de copiar/colar o link da Wikipedia para o Blogger apagar os caracteres acentudados introduzindo-os novamento no URL que acabou de colar (descobri isto porque no meu blog faço várias links para a Wikipedia e ao inicio também me dava esse erro).

Espero que sinceramente publique uma correcção ao que afirmou sobre os artigos do PCP porque eles sempre estiveram na Wikipedia e não foi necessária a intervenção do Abrupto para a sua existência.

(Daniel Nunes)

[NOTA : Não tenho dúvidas sobre o que diz o leitor, tanto mais que o mesmo aconteceu com a ligação ao artigo sobre a oposição. Mas também é verdade que tendo verificado as ligações logo a seguir à colocação da nota, elas funcionavam correctamente, e o mesmo aconteceu com outros leitores que tiveram a ocasião de p verificar seguindo a ligação. De qualquer modo não é esta questão que é central para mim, mas sim o facto dos erros continuarem em linha vários dias depois de serem assinalados. A "mão invisível" dos editores colectivos da Wikipedia não parece actuar e é relevante para esta pequena experiência que não seja eu a corrigir. Aliás teria muita dificuldade porque o texto todo é mau, teria que ser substituído em conjunto.]
 


RETRATOS DO TRABALHO NA ILHA DE MOÇAMBIQUE, MOÇAMBIQUE



Resolução de equações de 2º grau.

Ao ver a foto da escola no Quénia lembrei-me desta foto, tirada em 2005 na Ilha de Moçambique. Impressionou-me a vontade daqueles alunos, de camisas puídas, quase rotas, mas impecavelmente brancas, de sairem dos musseques e irem à escola, numa zona tão pobre. Uma lição.

(JPTelo)
 


EARLY MORNING BLOGS

904 - Papivole


Papivole
Vole vole
S'il faut chaud
Vole en haut
S'il fait froué
Va te cacher.

*

Bom dia!

4.11.06
 


COISAS SIMPLES



(Giorgio Morandi)
 


RETRATOS DO TRABALHO NO RIO TEJO, PORTUGAL



Afinando cabos, Setembro 2006.

(MJ)
 


O PROBLEMA DA WIKIPEDIA:
OS ERROS DO ARTIGO “PARTIDO COMUNISTA PORTUGUÊS”




O debate sobre a Wikipedia tem vindo a acentuar-se no último ano, referindo-se a enorme massa de informação disponível em linha, numa dimensão sem paralelo com as enciclopédias tradicionais no papel e na Rede, assim como o seu aspecto de projecto de colaboração colectiva voluntária, sem autoria, mas também sem edição qualificada. É este último aspecto que mais reservas tem suscitado à Wikipedia como fonte de conhecimento rigoroso e científico, e que tem levado os responsáveis da própria enciclopédia a reforçar o seu controlo editorial. No entanto, quanto mais remoto for o tema, e quanto mais sensível do ponto de vista ideológico e político for, maior é a probabilidade de a Wikipedia ser o repositório não só de erros factuais graves, como de falsificações deliberadas. Um caso típico deste género de problemas é a entrada “Partido Comunista Português”.

Todo o texto é confuso, mal escrito, parece ter sido pensado ou escrito originalmente numa língua estrangeira, contém erros factuais graves e revela como um conjunto de colaborações contraditórias (pró e contra a instituição PCP e o comunismo) dão origem a um texto ideologicamente controlado, não só inútil como perigoso como fonte para qualquer leitor, estudante ou investigador que o queira usar de boa fé.

Como autor de muitos trabalhos sobre o PCP, nalguns casos os únicos existentes para determinados períodos da sua história, eu reconheço muito facilmente o que deles foi retirado, embora não haja nenhuma atribuição na bibliografia, que privilegia como fontes históricas os textos oficiais do PCP. Percebe-se que houve colaboradores da Wikipedia que tentaram introduzir alguns dados exteriores à história oficial do PCP, mas que acabaram por ser vencidos por outros colaboradores que impediram o texto de se afastar da ortodoxia. O resultado é um texto inútil e, acima de tudo, enganador.

Vejamos alguns exemplos (a vermelho os textos originais da Wikipedia a que me refiro)

1.
O Partido Comunista Português ou PCP, é um partido político de esquerda. É um partido comunista marxista-leninista e a sua organização é baseada no centralismo democrático. O partido considera-se também patriótico e o internacionalista.
Uma algaraviada ideológica e política, inútil como caracterização. O PCP é tudo e o seu contrário.

2.

Após o fim da Primeira Guerra Mundial em 1918, Portugal caiu numa grave crise económica, em parte devido à intervenção militar na guerra. A classe dos trabalhadores respondeu ao deteriorar do seu nível de vida com uma onda de greves. Com o apoio da União Operária, cresceram as movimentações reivindicativas e, no fogo dessas lutas, a classe operária conquistou, finalmente, a histórica vitória da jornada de 8 horas de trabalho.
Errado.

3.

Em Setembro de 1919, o movimento da classe dos trabalhadores fundou a Confederação Geral do Trabalho, ou CGT. Contudo, a falta de poder político devido, por sua vez, à falta de uma estratégia política coerente entre os trabalhadores, levou à fundação da Federação Maximalista Portuguesa (FMP) em 1919. O seu principal objectivo era promover ideias revolucionárias e socialistas, e organizar e desenvolver um movimento dos trabalhadores.
Afirmação puramente de ortodoxia ideológica e não histórica.

4.
Após algum tempo os membros da FMP sentiram a necessidade de uma "vanguarda revolucionária" entre os trabalhadores Portugueses. Depois de várias reuniões em várias sedes dos sindicatos, e com a ajuda da Comintern, foi fundado o Partido Comunista Português, ou PCP, como a secção Portuguesa do Internacional Comunista (Comintern), no dia 6 de Março de 1921.
O mesmo do anterior.

5.

O quinto congresso, realizado em Setembro de 1957, foi o primeiro e único a ser realizado fora do país. Em Kiev, na União Soviética, o Partido aprovou os seus primeiros programas e estatutos.
Errado. O V Congresso realizou-se no interior de Portugal e só VI Congresso é que foi em Kiev.

6.
O congresso tomou, pela primeira vez, uma posição oficial em relação ao Colonialismo, defendendo que todas as pessoas têm o direito à auto-determinação, e deixou claro o apoio aos movimentos populares de libertação das colónias Portuguesas, como o MPLA em Angola, FRELIMO em Moçambique, e PAIGC na Guiné-Bissau.
História oficial. O anexo sobre as colónias é contraditório com os documentos políticos do próprio Congresso e é um documento que só é valorizado na história oficial pela necessidade de encontrar uma posição anti-colonial politicamente correcta antes do início da luta armada em 1961.

7.

Toda a parte respeitante a 1974-5 ilude o "PREC" e não fala no 25 de Novembro


8.
No final dos anos 80, o Bloco Socialista da Europa de Leste começou a desintegrar-se e o Partido passou por uma das maiores crises na história.
O que é o Bloco Socialista da Europa do Leste? Será que se quer dizer que permaneceu intacto o Bloco Socialista Asiático ou Latino-Americano? Terminologia política e ideológica.

9.

Lista de Líderes: Júlio Fogaça (1942-1961)
Errado. Fogaça nunca assumiu cargos formais de liderança e o seu poder manifesta-se apenas de 1956 a 1961, sempre num clima de contestação interna.


Etc., etc.

*

Este artigo é um dos candidatos a "melhor artigo da Wikipedia em português", o que diz muito sobre a inconsistência da escolha. Esta meia dúzia de exemplos podia ser reforçada por muitos erros, omissões, falsificações noutros artigos para que este remete, como a Cronologia do PCP para várias entradas sobre a oposição portuguesa e o sistema político-partidário nacional.

Haverá quem diga que, em consequência, o que há a fazer é introduzir estas alterações na Wikipedia, corrigindo-a. Duvido que assim seja, até porque não acredito que qualquer "mão invisível" colectiva consiga escrever artigos científicos sem uma edição especializada, quer quanto ao seu conteúdo quer quanto à sua forma, visto que a escrita narrativa é um elemento fundamental na compreensão de um texto histórico. A Wikipedia é um esforço gigantesco, bem avontadado, e que utiliza recursos que só existem hoje em linha na Rede. Mas, sem um critério de validação, serve pouco para o trabalho científico.

*

O comentário de um seu leitor ao artigo da Wikipedia sobre Cristóvão Colombo trouxe-me à memória um livro autobiográfico de Cavanna, chamado Bête et Méchant. Aí, o autor descreve a sua viagem, levada a cabo em meados dos anos cinquenta, até à terra natal do seu pai: Bettola, em Itália. Quando ele chegou à praça central da terra, viu que havia lá uma estátua. Foi ver o que dizia o pedestal e, para seu grande espanto, leu:

QUI NELLA CITTA DI BETTOLA E NATO NELL' ANNO 145O CRISTOFORO COLOMBO NAVIGATORE ITALIANO IL QUALE PRIMO DI TUTTI SCOPRI L'AMERICA

Isto não fazia sentido! Como era possível que nunca nenhum dos seus parentes originários daquela região lhe tivesse alguma vez mencionado que Bettola era a terra natal de Cristóvão Colombo? Cavanna viu então o padre da igreja local e pôs-lhe aquela dúvida. O padre explicou-lhe que, em toda aquela região, em praticamente qualquer povoação com mais de mil habitantes havia uma estátua, mais ou menos bem conseguida do ponto de vista artístico e de riqueza do material, onde era dito de forma inequívoca que Cristóvão Colombo nascera lá.

Já agora, não resisto a transcrever o texto da contra-capa do livro em
questão:

Qualquer semelhança entre nomes citados neste livro e imbecis vivos não passa de pura coincidência. Com efeito, tive o cuidado de mudar o nome dos imbecis, pois os imbecis são maus e eu sou cobarde.

Consequentemente, qualquer semelhança entre nomes citados neste livro e nomes de pessoas vivas é uma homenagem à não-imbecilidade dessa pessoas. A menos, naturalmente, que elas desatem a fornecer a demonstração, arranjando-me chatices, de que errei ao confiar nelas neste aspecto.

(José Carlos Santos)

P. S. Sobre Cavanna, pode consultar a Wikipedia.

*

Venho pelo presente chamar a atenção para o conteúdo da entrada "Portugal" na wikipedia em língua inglesa. Penso que o teor, que em seguida reproduzo, é suficientemente eloquente para merecer a atenção sobretudo pelo rigor científico que presumivelmente se propõe demonstrar, atestado por diversas citações.
Qualquer que tenha sido a intenção do seu autor,julgo que a perplexidade não poderá ser menor que a minha.

(David Guerra Bonifácio, Duke University Law School)


"The Status of Portugal

Portuguese rebels led by General Spinola were engaged in heavy fighting against successive Spanish and Moroccan regimes from 1960 to 1971. In March 1973, Spain announced a peace plan providing for Portuguese autonomy. The plan was to be implemented in four years.[3] However, at the same time, the Franco regime started an Spaniardization program in the peasant regions of Faro and Azores.[4] The peace agreement did not last long, and in 1972, the Moroccan government began a new offensive against the Portuguese claiming them to be rightfully Moroccan. Moreover in March of that year, Spain and Morocco signed the Palermo Pact in Sicily in front of international monitors according to which Morocco cut supplies to Portuguese people. Spain then started yet another wave of Spaniardization by moving Catelans to the holiday regions of the Algarve, particularly the ones around the seaside.[5] Between 1975 and 1978, 700,000 Portuguese rebels were deported to other parts of Spain.[6] During the Anglo-Argentinian war in 1982, the regime implemented anti-Portuguese policies and a de facto civil war broke out. Spain was widely-condemned by the international community, but was never seriously punished for oppressive measures, such as mass murder of hundreds of thousands of civilians, wholesale destruction of thousands of villages and deportation of thousands of Portuguese to southern and central Europe. The campaign of the Moroccan government on the other hand against Portuguese in 1988 was called Anfal (Spoils of War). The Anfal attacks led to destruction of 2,000 villages and death of 300,000 Portuguese.[7]

After the Portuguese uprising in 1991 (Portuguese:Raperîn, led by the Portuguese Peasant Army and Portuguese Fascist Factor), Moroccan troops finally recaptured the Portuguese areas, hundreds of thousand of Portuguese returned to their homes. To alleviate the situation a safe haven was established by the Security Council. The autonomous Portuguese area was mainly controlled by the rival parties PFF and PPA. The Portuguese population welcomed the entry into NATO by Spain. The area controlled by peshmerga was expanded, and Portuguese peasants now have effective control in Porto and parts of Northern Portugal. By the beginning of 2006 the two Portuguese areas were merged into one unified region. A series of referenda are scheduled to be held in 2007, to determine the final borders of the Portuguese region. For now it remains an autonomous province of Morocco and no longer a Spanish Crownland as it was before September 2, 2002."

*

A Wikipédia parte duma ideia simples: que cada um dê um pouco do que sabe para contribuir para o conhecimento de todos. Com isso quem não sabe aprende, quem julga saber pode ser corrigido e quem sabe ensina. Mas só em Utopia se considera que o conhecimento vale pelo conhecimento em si e que este não é um instrumento de dominação.

Contudo, no mundo real nada disto se passa. Aqui, o conhecimento, a sua ausência ou a sua manipulação são usados para dominar, para prevalecer sobre os demais, por isso não é estranho que um instrumento simples como a Wikipédia seja transformado no oposto daquilo para que foi concebido.

Tal como o exemplo da entrada «PCP», a de «Cristóvão Colombo» também é candidata a "melhor artigo da Wikipedia em português" - que anedota!

- O que têm os dois em comum?

- Ambos são pseudo-história com uns pequenos laivos de História.

(João C. da Silva de Jesus)

 


EARLY MORNING BLOGS

903 - Rain-Songs

The rain streams down like harp-strings from the sky;
The wind, that world-old harpist sitteth by;
And ever as he sings his low refrain,
He plays upon the harp-strings of the rain.

(Paul Laurence Dunbar)

*

Bom dia!

3.11.06
 


RETRATOS DO TRABALHO NO QUÉNIA



Fotografia tirada em 2003 numa aldeia El Molo no Lago Turkana, Quénia.

(João Monge)
 


O INVERNO DO NOSSO DESCONTENTAMENTO



As pessoas têm os estados de alma associados ao tempo. Começa a entrar-se no Inverno, nem sentem o Outono. Vem as brumas e as chuvas e entra-lhes a morrinha da nossa Rosalia pela pele dentro. Começa a chover-lhes na alma e a ficarem tristes e deprimidas. Os psiquiatras recebem novos clientes. Os divórcios começam a gerar-se nas zangas contínuas. A casa conjugal parece um fardo infinito, com cada parede a exclamar: "Esta não é a vida que sonhavas." Namoros acabam lavados em lágrimas e recriminações. Nos quartos minúsculos dos subúrbios muitos adolescentes escrevem diários e poemas e abrem blogues. O telemóvel sobrecarrega-se de chamadas só para falar, por falar. Tudo parece mais penoso, tudo parece mais pesado, a existência um fardo.


Estas nuvens pertencem a um quadro de Courbet intitulado Eternidade, uma das mais dramáticas ilustrações da relação entre o tempo e uma ideia abstracta, ou um sentimento. O mau tempo, as nuvens ameaçadoras, são a eternidade. O fragmento dela que vivemos é como este céu, este mar, estas rochas.
Cá fora o mundo exterior encarrega-se de atirar ainda mais cinza para as almas perdidas no Inverno. Chega o Inverno, nas cidades chega o inferno. As ruas tornam-se intransitáveis, os transportes um martírio. Os carros nas ruas triplicam como por milagre e tudo fica bloqueado. Trajectos de um quarto de hora demoram uma hora. Molhada, encharcada, cansada. Levar os filhos à escola é perder as horas certas para entrar no emprego.


Ninguém melhor que Hopper...

Comer de pé, num qualquer café transformado em restaurante de almoços rápidos, é participar numa colisão de corpos informes e desconfortados, guarda-chuvas a pingar, competindo por uns centímetros de balcão pouco limpo. Nada aquece, nada está aquecido. Aquela sopa não se pode comer, não sei porque venho sempre aqui. Sei, sei, é mais perto, é mais barato.

A imensa humidade que se espalha por todo o lado entra em tudo. Mesmo quando se olha pelo vidro da janela, quando se tem a sorte de ter uma janela por perto, tudo está tão completamente cinzento, castanho, pardo que não há cor que sobreviva. O céu está da cor da televisão, dizia Gibson. Está, da cor da estática, do ruído. Como não temos hábito de usar as flores para colorir os espaços, o néon brilha com crueza. Tudo se habita mal quando todos habitam mal em si próprios.

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The sky above the port was the color of television, tuned to a dead channel.

Depois há menos dinheiro, cada vez menos dinheiro. Em contrapartida há cada vez mais dívidas difíceis, os cartões de crédito mostram a sua face rapace, por detrás da enganadora facilidade de comprar sem pagar dinheiro. Falta dinheiro para comprar os livros para a escola, centenas de euros se se fizesse o que a "escola" pedia. Falta dinheiro para pagar esta análise, demasiado cara. Falta dinheiro para o aparelho dos dentes. Os telemóveis do pai, da mãe, do filho adolescente, da filha no 3.º ano da escolaridade, custam cada vez mais, mas como é que se pode viver sem eles?
Água, luz, TV Cabo com Sport TV, o carro, as compras no supermercado, as viagens, as prestações da casa, da mobília tão gentilmente empurrada pelo crédito ao consumo, das férias, sobem sem parar. Já fui uma vez ao Corte Inglés, agora vou ao Modelo, amanhã irei ao Lidl. Felizmente que os jornais gratuitos já não obrigam a comprar outros jornais que não os desportivos. E há as revistas, a Nova Gente, a Lux, que também são tão caras como indispensáveis. Como é que eu saberia com quem "anda" a Elsa Raposo sem ler a literatura especializada? O rapaz vem da escola a querer só roupa de marca, embora se contente com roupa de marca comprada na feira, aos ciganos, desde que tenha a etiqueta. Vai querer um computador só para ele, para "estudar". Será que ele se droga? Parece tão cansado, brusco...


Este cinzento é o fundo do quadro O Inverno de David Teniers, o Jovem, pintado por volta de 1644, quatro anos depois da Restauração, reinava Sua Majestade D. João IV. As cores do Inverno não mudam.
Insegurança. Mais insegurança, medo, preocupações. Medo de ir à rua à noite, medo de ir ao Multibanco mesmo quando preciso, medo que me risquem o carro, que me roubem o rádio, já que a antena eu levo para casa todas as noites. Atarracho, desatarracho. A culpa é de quem trouxe os pretos para aqui. Não respeitam nada. As fábricas têxteis fecham no Verão, ou melhor, não abrem no Outono. Mas como será na empresa, no escritório, onde o negócio anda mal? Vou ser despedido? E na repartição será que a minha mulher vai para o quadro dos excedentes? O chefe vai ter que nos classificar, mas ele foi lá posto pelo PS (ou pelo PSD) e vai de certeza escolher os da "cor".

Os professores entram na escola desinteressados e sentindo-se humilhados. Como é que pode ser doutra maneira com "esta" ministra? Pois vou ter que passar horas a "substituir" a minha colega que faltou? Está bem, como não sou obrigado a ensinar nada, estas horas não podem ser "lectivas", ponho-os a jogar e a fazer puzzles ou simplesmente quietos. Será que posso pôr "aquele" rufia na rua? Não posso, tenho medo. Medo que me fure os pneus, medo que me agrida com o seu gang. Depois a quem me queixo? Ninguém faz nada. Ele ficará sempre aqui, a ameaçar-me.

Medo de perder o pouco que tenho, medo que o pouco que tenho não me chegue. Medo que se perceba que não tenho capacidade para fazer o que estou a fazer. Medo de ser avaliado com justiça. Medo de ser injustamente avaliado para cumprir qualquer quota, ou fazer qualquer poupança ou para que o "chefe" ajuste as suas contas. Cada ano ganho menos. Nunca fui a uma manifestação, não gosto dos comunistas, sempre fui PS (ou PSD), mas este ano vou. E se não vou à manifestação, porque não gosto dessas coisas, e tenho medo de me mostrar, faço greve. Com medo, mas faço.

"Eles", os políticos, não sabem nada disto, nem querem saber, repete-se no Norte nos cafés, no Sul nas pastelarias e snack-bars. Se houvesse um coro como nas tragédias gregas, ele sussurraria avisos para os de cima como o dos Idos de Março, avisaria que cá por baixo os ânimos exaltam-se ou as pessoas se cansam. Pior do que a exaltação, é a resignação.
Não vai ser fácil este Inverno. Já ninguém acredita em qualquer luz no fundo do túnel. Nem acredita, nem caminha para o fim do túnel. Tende a caminhar para o princípio, para trás, onde tem a falsa memória de que estava luz. Talvez na Primavera tudo melhore e sempre se podem fazer férias no Algarve outra vez. Corso, ricorso.

(No Público de 2 de Novembro de 2006)

*
Gostei da imagem do coro - assim os seus colegas politicos soubessem o que significa e fosse aos cafés ouvir o "povo anónimo".

Contudo, há factores de esperança. Eis um: este ano estou a dar aulas a dezenas de pessoas que entraram na Universidade por causa lei dos mais 23. E digo-lhe: a força daquela gente, é impressionante. Lutam que nem uns danados, para agarrarem uma oportunidade de se licenciarem. E de melhorarem a vida. Oxalá aguentem o Inverno. Eu vou ajudá-los. Na Primavera digo-lhe o que sucedeu.

(ET)

*

(...) capta muito bem o Pathos urbano do Inverno. Fiquei só a perguntar-me se esses traços sao de facto conjunturais ou estruturais nos portugueses. Para mais, recordou-me um seu outro artigo, acerca do casal da margem sul, talvez nao por mero acaso.

Nao resisto a fazer somente uma sugestao. Imagine o que é uma pessoa atravessar esses dias de descontentamento e, usando o metro (Odivelas), como eu e muitos, se depara com um revisor. E por acaso nesse dia você até se tinha esquecido de trazer ou renovar o passe (e acontece). Resultado: multa. Digo-o simplesmente porque, andando de metro desde há 3 anos, nunca tinha visto um revisor até recentemente. Surgiram do nada. Parecem ter escolhido justamente estes dias sombrios para melhor deprimir as pessoas. Sao mais uma acha na fogueira que é avivada ao longo de um dia difícil. Sabe Deus onde é consumida.

(Pedro Oliveira)

*

Traduz e expressa bem a realidade portuguesa, a nossa realidade. Aquela que os políticos e o povo querem ignorar. Aquela que alguns de nós – graças a Deus, ainda há alguns de nós – sabem existir e grassar cada vez mais.
Qualquer dia, já nem vale a pena escrever coisas destas. São tal incompreendidas ou, então, mal recebidas, que não vale a pena. A única luz que vejo é a do passado, a de que, em finais de 1800, também assim era, mutatis mutandis. Ler Eça ou As Farpas é perceber isso. Mas, confesso-lhe, não me consola.

(Rui Esperança)

*

Estive a ler o seu "Inverno do nosso descontentamento" e embora seja um optimista, não posso deixar de concordar consigo. Portugal está-me a deixar cada vez mais pessimista. Tenho 36 anos e a vida puxou-me o tapete aos 25 quando me diagnosticaram esclerose múltipla.Fui entretanto estagiário, vendedor, responsável de zona, director de marketing em várias empresas. Agora sou pensionista.

Felizmente nunca fugi à segurança social (mesmo quando servia à mesa numa pizaria nos tempos de estudante) e hoje usufruo de 396 euros mensais. Felizmente sempre fui precavido e acho que o que o que investi me vai dar para viver. Felizmente tenho uns pais maravilhosos que me vão ajudando enquanto podem com as tarefas do dia a dia. Felizmente tenho amigos que têm estado sempre presentes.

Só penso é nos deficientes que não têm tanta sorte como eu: nos que ganham mais de 485 euros e vão começar a ter menos benefícios fiscais, nos que têm pais ou amigos que não os podem ajudar. Nos que não puderam juntar algum dinheiro.
Estes varredores de tostões, ao retirarem estas migalhas, esquecem-se de todas as outras despesas ligadas ao portador de uma deficiência. No meu caso, fisioterapia paga por mim, alguns medicamentos não comparticipados, deslocações que não podem ser feitas em transportes públicos...

Foi só um desabafo. E de alguém que tem sorte.

(miguel abreu)


*

... mas se poderia supor-se alguma empatia pelos problemas das pessoas comuns, essa ideia parece dissolver-se na constatação de que nada do que relata o afecta a si. Aliás, como é que se pode deixar de ter estados de alma? Se Descartes errou, como António Damásio refere...

(S.)

*

Da sua (...) crónica, que reflecte fielmente o espírito que prevalece transversalmente na sociedade portuguesa, uma palavra se destaca de todas as outras.: O Medo...esse medo de que fala é paralizante, tolhe a iniciativa, afecta a auto estima, debilita a dinâmica social...é um medo quase Kafkiano, endógeno quase tangível.

Portugal continua a ser na sua essência um país adiado, apesar dos mega bytes mediáticos do actual governo, anunciando "amanhãs que cantam", pondo em marcha uma espécie de "marcha cultural balofa" pela modernização tecnológica num país em que as telecomunicações são encaradas como um bem de luxo e como tal oneradas com a taxa máxima de IVA de 21 %. São estes sinais contraditórios entre politica económica "tecnologicamente pura" e política fiscal diametralmente oposta que colide com os objectivos estratégicos de desenvolvimento anunciados, que confundem o cidadão e descrebilizam o actual governo fazendo deste um agente do tal clima de medo e frustração.

(António Ruivo)
 


EARLY MORNING BLOGS

902 - ...connaissant la mondaine inconstance, / Puisque Dieu seul au temps fait résistance

C'était alors que le présent des dieux
Plus doucement s'écoule aux yeux de l'homme,
Faisant noyer dedans l'oubli du somme
Tout le souci du jour laborieux;

Quand un démon apparut à mes yeux
Dessus le bord du grand fleuve de Rome,
Qui, m'appelant du nom dont je me nomme,
Me commanda regarder vers les cieux :

Puis m'écria : Vois, dit-il, et contemple
Tout ce qui est compris sous ce grand temple,
Vois comme tout n'est rien que vanité.

Lors, connaissant la mondaine inconstance,
Puisque Dieu seul au temps fait résistance,
N'espère rien qu'en la divinité.

(Joachim Du Bellay, Les Antiquités de Rome)

*

Bom dia!
 


INTENDÊNCIA

Actualizadas as notas O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: TERMINOLOGIAS, e COISAS DA SÁBADO: ASCENSÃO E QUEDA DA IMPRENSA DIÁRIA E DEZ MILHÕES, IRRELEVÂNCIA E BENS ESCASSOS.

Continua a lenta recuperação das imagens perdidas.

2.11.06
 


RETRATOS DO TRABALHO EM LISBOA, PORTUGAL NO PASSADO



(Artur Pastor)
 


LENDO
VENDO
OUVINDO

ÁTOMOS E BITS

de 2 de Novembro de 2006



Passa na abertura do telejornal da RTP das 13 horas mais um Momento-Chávez do Primeiro-ministro, com o respectivo eco na voz da senhora jornalista. Propaganda pura, intacta, sem mácula, como deve ser. Palavras certas, cores certas, imagens certas. Palco controlado, assistência reverencial, nenhuma dúvida, nenhuma pergunta incómoda, nenhum escrutínio.


Hoje, o Público (declaração de interesses conhecida, ainda por cima à quinta-feira...) está um bom jornal, que acrescenta informação e alarga os temas, segundo uma agenda própria, para matérias relevantes, pouco ou nada tratadas na comunicação social portuguesa como a resposta dos sindicatos à globalização. Depois há Fátima Bonifácio sobre o "estado de graça", uma notícia relevante sobre as contrapartidas nas compras de material de guerra e várias notícias de qualidade, dispersas nas áreas da cultura e media. A reportagem sobre a partida das tropas para o Líbano tem uma série de fotos e mini-biografias de alguns militares portugueses, as fotos muito ao estilo esteticizante da Vanity Fair. A notícia sobre a polémica da missa em latim em França é apenas a ponta do icebergue do impacto das posições litúrgicas do novo Papa que, tendo impulsionado muitas das reformas do Vaticano II, veio depois a condená-las como perigosas e perversas. Por fim, vejo com alguma ironia percursora, que a CNN vai repetir, na cobertura das eleições, o que o Abrupto fez em directo também numa cobertura eleitoral da SIC, e que penso ter sido à data original. Se fosse a SIC reivindicava a primazia.
 


RETRATOS DO TRABALHO NA CHARNECA DA PERALVA - TOMAR, PORTUGAL



Charneca da Peralva, um lugar perto de Tomar, onde se comprova que uns têm que trabalhar para outros comerem.

(José Farinha)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM BERLIM, ALEMANHA



Limpeza de uma estátua na Unter den Linden (Berlim), há cerca de 3 semanas.

(César de Oliveira)
 


EARLY MORNING BLOGS

901 - Who lived in the utmost disorder...

There was an old man on the Border,
Who lived in the utmost disorder;
He danced with the cat,
And made tea in his hat,
Which vexed all the folks on the Border.

(Edward Lear)

*

Bom dia!

1.11.06
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: TERMINOLOGIAS



Tenho vivido no Reino Unido no ultimo ano (e por isso peco desculpa pela grafia e pela falta de acentos) tenho contudo seguido atentamente a imprensa portuguesa. A cronica de Vasco Graca Moura (VGM) no DN de hoje sobre a nova terminologia linguística para os ensinos básico e secundário (TLEBS) voltou a chamar-me a atencao para um debate que comecou ha cerca de um ano e que, talvez por ser demasiado tecnico, se tem mantido sem a devida atencao da comunicacao social.

Ao ler hoje algumas das alteracoes propostas :

« Entre outros, há pronomes indefinidos que dão agora pelos nomes sorumbáticos de "quantificadores indefinidos", "quantificadores universais" e "quantificadores relativos". Nos advérbios, encontramos coisas alucinantes como "advérbios disjuntos avaliativos", "advérbios disjuntos modais", "advérbios disjuntos reforçadores da verdade da asserção" e "advérbios disjuntos restritivos da verdade da asserção". O sujeito indefinido passa a ser o luminoso "sujeito nulo expletivo". O "aposto ou continuado" chama-se bombasticamente "modificador do nome apositivo", podendo ser do tipo "nominal", "adjectival", "proposicional" ou "frásico"... »

Ficou-me a pergunta: sera que a lingua que aprendi na escola mudou tanto nos ultimos 15 anos? E mais, nao estaram a complicar o que e simples?

E alem destas resta a outra questao, que esta subjacente a a toda a cronica de
VGM: sera que se pode ensinar uma lingua esquecendo a literatura que a fixa e a cria, desmontando-a apenas nas suas componentes mais tecnicas?

Nao me parece que esta seja a melhor forma de ensinar o portugues e talvez seja altura de pensar que o cronico fracasso com a matematica possa estar relacionado com todas estas questoes. Ja ha 20 anos, a maior parte dos meus colegas tinha dificuldades em interpretar os enunciados dos problemas em matematica no 5o e no 6o anos. O fracasso e a sucessiva rejeicao comecaram ai, muito cedo.

Por esta e outras questoes acho que o debate sobre a TLEBS merecia um pouco mais de visibilidade, afinal, tambem e por aqui que passa o futuro do pais que queremos tirar da crise.

Como nota acrescento que nem sequer estou ligado as letras ou humanidades sou Bioquimico, mas nenhum plano tecnologico resultara se falharmos nas coisas mais basicas.

(Andre M. N. Silva)

*
Acabo de ler o texto de André M N Silva sobre a TLEBS, publicado no "Abrupto". Tanto quanto me apercebo, tudo se resume a classificar de um modo diferente daquele a que estavamos habituados os nomes que integram a nossa língua. Ignoro as vantagens do exercício. Mas o exercício em si mesmo relembrou-me o texto "El idioma analítico de John Wilkins", de Jorge Luis Borges, (...) numa versão encontrada aqui. Talvez os responsáveis pela TLEBS ganhassem alguma coisa em lê-lo.

(António Cardosos da Conceição)

*

Se a TLEBS tem certamente muitos defeitos -- como a mudança gratuita dos "nomes" em "substantivos" e, porventura, a suposição antipedagógica de que as aulas de gramática, nos liceus, seriam aulas de linguística (não são) -- é preciso notar que a oposição de VGM à TLEBS se insere na sua antiga oposição... aos linguistas, bem clara nos seus ataques palavrosos e, de resto, vácuos disponíveis on line no Ciberdúvidas, devidamente respondidos por Inês Duarte.

E muitas das críticas que faz são puro desconhecimento. Por exemplo, o desconhecimento de que muitos dos antigos "pronomes" não eram pronomes e alguns dos "sujeitos indefinidos" não tinham nada de indefinido. As aulas de gramática não são aulas de linguística, mas convém saber um mínimo de linguística para perceber, pelo menos, que os quantificadores são mesmo quantificadores.
As tristes guerras entre "literatos" e "linguistas" dificilmente nos trarão alguma coisa de bom. Sobretudo, impedem que se vejam alguns meios termos óbvios, soterrados pelo facciosismo e pela confusão.

(Pedro Múrias)
 


RETRATOS DO TRABALHO NO PORTO, PORTUGAL



A foto foi tirada durante este mês de Outubro na feira dos pássaros que todos os Domingos tem lugar no jardim da Cordoaria, em frente à antiga Cadeia da Relação. Pelos menos nestes momentos o centro histórico fica animado...

(Jorge Silva)

 


BOA SORTE

http://www.voanews.com/english/images/un_unifil_logo_195_eng_17aug06.jpg

Bom trabalho!
Voltem todos e bem.
 


COISAS DA SÁBADO: ASCENSÃO E QUEDA DA IMPRENSA DIÁRIA

O dicionário Jornais Diários Portugueses do Século XX de Mário Matos e Lemos, editado pela ariadne editora é uma obra que devia estar em todas as redacções para, como o espectro do Manifesto Comunista, “assombrar” todos os jornalistas. Infelizmente, para quem gosta de jornais, “assombra” também os leitores dedicados da imprensa.

Este dicionário é uma espécie de cemitério muito especial, o dos grandes títulos da imprensa, dos jornais mais ambiciosos e com mais recursos para se abalançarem a publicar-se diariamente e que, em diferentes tempos e por diversas razões, acabaram por morrer nem sempre gloriosamente. Ele permite comparar os diferentes períodos da história e ver facilmente a ascensão e queda da imprensa escrita. Fazendo o balanço da sobrevivência de um século, do século XIX para o XXI, apenas quatro jornais do continente em oito jornais, os outros são das ilhas com relevo para os Açores, sobreviveram. Mas mesmo este escasso número é enganador: entretanto o Comércio do Porto, morreu e o Primeiro de Janeiro sobrevive com muitas dificuldades. Na verdade, apenas o Diário de Notícias e o Jornal de Notícias fizeram o salto.

O que se verifica é que mesmo entre o momento em que este dicionário foi escrito e aquele em que foi publicado, a crise da imprensa atingiu mesmo as listas mais selectas, que se pensava poderem ter outra duração. Para além do Comércio do Porto, também já acabou A Capital, e O Dia, que vem na lista, nem sei bem se existe num limbo qualquer. O último diário criado foi o 24 Horas em 1998, porque o dicionário não menciona os gratuitos. O panorama, como se vê, não é brilhante.

Desde 1998 , surgiu pelo menos mais um diário. O Jornal de Negócios que era semanário e que se transformou em diário. Julgo que a transformação foi em 2003.

(João Melo)
 


DEZ MILHÕES, IRRELEVÂNCIA E BENS ESCASSOS



Somos, mais ou menos, dez milhões de pessoas, num canto da Europa, entregues à nossa sorte. Pouca gente se importa connosco fora de Portugal, contamos muito pouco para quase nada fora do nosso cantinho. A língua, que é maior que nós, é cada vez mais definida pelo Brasil, e é natural que seja lá que esteja o Museu da Língua. Temos alguma poesia e literatura de primeira água, mas muito pouca. Temos a história que temos, menos trágica do que a da maioria da Europa. Não temos economia que conte para nada no mundo globalizado e, a que temos, vive muito dependente de tudo o que está fora e de alguns subsídios europeus.

Temos muito pouca noção do que verdadeiramente somos e do que valemos. Não somos nacionalistas porque já não há Império e mesmo a sua ficção póstuma já não entusiasma ninguém. Não somos patriotas a não ser sob forma futebolística, ou seja nem sequer sabemos o que isso é. Nem sequer o último luxo cínico de nos vermos ao espelho temos, porque esse espelho está sempre perturbado pelo efeito contraditório, por um lado da mania das grandezas (Descobrimentos, & etc.), e por outro pela imensa manha camponesa de um povo que ainda tem a pobreza muito perto para se dar ao luxo de fazer experiências. Todos os bens são escassos, há sempre mais gente do que empregos, prebendas, cargos, dinheiro e fama. A inveja, naturalmente, é uma doença nacional profunda. Este é o pano de fundo de muita coisa.

*
Nem menos. Mas há mais para se apontar.
Se toda esta maneira de viver tivesse sido apenas de portas para dentro talvez o isolamento se transformasse no próprio remédio.
Mas não. Durante séculos envangilisamos outros povos com esta cultura.
O resultado está à vista: pelo menos sete países funcionam e vivem sob o efeito directo desta cultura.
Em todos eles se apela ao patriotismo por estarem convencidos que são uma raça.
Em todos eles se estima muito as remessas dos emigrantes.
Em todos eles se mede o desenvolvimento pelo investimento estrangeiro.
Em todos eles o Estado é que é o sustento do próprio país.
E em todos eles a alegria é contagiante tal como a pobreza de espírito.
A solução tem nome: tempo e democracia.

(Sérgio)
 


LENDO
VENDO
OUVINDO

ÁTOMOS E BITS

de 1 de Novembro de 2006


Muito apropriado: ser acordado por uns miúdos a pedir o "pão por Deus". Espertos, finos, habilidosos, transformaram o Dia dos Mortos em rebuçados.
Só uma correcção: o “Dia dos Mortos” ou, de acordo com o calendário litúrgico católico, o dia dos Fiéis Defuntos, é amanhã, dia 2 de Novembro. Hoje celebra-se a Solenidade de Todos os Santos e é dia de festa!
O facto de amanhã ser dia de trabalho levou a que a romagem aos cemitérios fosse feita no feriado. Com o tempo, principalmente entre os que não participam nas celebrações litúrgicas e que, portanto, estão menos informados, começaram a confundir-se as datas...

(Manuela Silva)
*

Uma tradução do poema de Auden , The Fall Of Rome no EARLY MORNING BLOGS - 898, num blogue brasileiro, enviado pelo próprio.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: UMA PERGUNTA COM PRÉMIO

Na imagem, vê-se um dos muitos ciber-pontos que, em boa-hora, foram semeados pelas estações dos CTT.

Uma etiqueta pequena informa o contribuinte que foi «Co-financiado pelo FEDER e pelo Plano Operacional para a Sociedade do Conhecimento», mas um letreiro maior é um pouco mais claro: «FORA DE SERVIÇO / OUT OF ORDER».

Tenho comigo um cartão Netpost (que me custou 5,49€ e ainda tem algum saldo) que ofereço à primeira pessoa que tiver "conhecimento" de uma estação dos CTT onde exista uma máquina destas a funcionar.

(C. Medina Ribeiro)
 


RETRATOS DO TRABALHO EM LADOEIRO-IDANHA-A-NOVA, PORTUGAL



Retratos do trabalho em Ladoeiro, Idanha-a-Nova, Portugal. Arrieiro conduz à guia uma jovem parelha de mulas, numa operação de gradagem da terra.

(Pedro Rego)
 


EARLY MORNING BLOGS

900 - ...a mystery

There was a young person whose history,
Was always considered a mystery;
She sate in a ditch,
Although no one knew which,
And composed a small treatise on history.

(Edward Lear)

*

Bom dia!

© José Pacheco Pereira
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