ABRUPTO

30.9.05
 


A CAMINHO DAS TERRAS FRIAS

para ver o anel que a Lua vai enfiar no Sol. De vez em quando, os pequenos parecem iguais aos grandes, mas � s� uma ilus�o.
 


COISAS DA S�BADO:
UMA COMUNIDADE DESAPARECIDA E ESQUECIDA

Este livro, a publica��o da correspond�ncia entre um f�sico austr�aco judeu, assistente de Heisenberg, e que, na di�spora da fuga � persegui��o nazi, esteve em Portugal durante a guerra e os seus colegas nacionais, passou desapercebido injustamente. O livro coordenado por Augusto Fitas e Ant�nio Videira, Cartas Entre Guido Beck e Cientistas Portugueses, editado em 2004 pelo Instituto Piaget, d�-nos um retrato de uma gera��o de f�sicos e matem�ticos que se esfor�avam por modernizar a comunidade cientifica portuguesa, lig�-la �s investiga��es que corriam pelo mundo fora, num momento crucial da revolu��o da f�sica p�s-einsteiniana.

Esses homens tinham um enorme �bice, eram todos da oposi��o e quase todos comunistas. Cara�a, membro do PCP desde o in�cio da d�cada de trinta, Valadares, representante do PCP junto do PCF, Ruy Lu�s Gomes, companheiro de estrada do PCP, candidato presidencial contra Craveiro Lopes, Aniceto Monteiro, os matem�ticos que fundaram o �movimento matem�tico� entre 1937 e 1947, data da expuls�o das universidades da maioria, foram mais uma das gera��es que Portugal maltratou e perdeu. Este livro mostra-a em acto, a tentar, a conseguir alguma coisa e a falhar, em esfor�os baldados que acabaram, como muitas vezes acontece, na emigra��o para o estrangeiro, EUA, Fran�a, Brasil, da maioria dos seus melhores cientistas.
 


COISAS DA S�BADO:
EST� NA ALTURA DE DIZER QUE N�O



O Presidente da Rep�blica n�o tem tido um final do mandato f�cil, mas � da natureza da fun��o a responsabilidade de ter que tomar decis�es dif�ceis. Mas h� duas ainda em que muito da sua autoridade tem que ser exercida sob o fio da navalha: uma, diz respeito ao referendo do aborto; outra, � nomea��o do novo Presidente do Tribunal de Contas. A segunda � muito mais importante do que a primeira, logo mais dif�cil. Eu n�o sou da escola de andar a dar recados p�blicos ao Presidente, mas, neste caso, a qualidade da nossa democracia est� em causa. E � que est� mesmo.

A quest�o � muito simples: num cargo com a delicadeza do Tribunal de Contas, em que toda a oposi��o se manifestou contra, a nomea��o de um deputado do PS (mesmo quando todos lhe reconhecem m�rito e at� por isso) para uma fun��o que exige n�o s� ser, mas tamb�m parecer, a mais absoluta independ�ncia, a decis�o do governo � errada e perigosa. O mais ch�o bom senso pol�tico, e o mais elevado esp�rito de estado, convergem para a contestar, e o Presidente tem que dizer que n�o ao governo.
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: OS PLANETAS D' "OS TRABALHOS E OS DIAS"



Epimeteu e a ponta de um anel; Hyperion

Os amadores de fic��o cient�fica j� viram os mundos todos: esponjas, bolas de t�nis, esferas de gelo, sopas de metano, calhaus rolantes, pedrinhas, tocadores de flauta de Hamelin levando atr�s de si milh�es de poeiras, gelos diversos, gases, for�as terr�veis.

Conheciam-nos dos livros, agora sabem onde est�o. Cada volta da trabalhadora Cassini, l� vem mais um mundo novo. Mais um nome de gigante, de tit�, de atlante, filhos de Cronos, co�gulos do sangue criador da Grande Castra��o m�tica no in�cio dos tempos, tudo honra o seu cronista antigo, Hes�odo, o primeiro a falar destes trabalhos e destes dias.
 


COISAS COMPLICADAS


John Pilson, Misty Harbor (II)
 


EARLY MORNING BLOGS 614

Aubade


Jane, Jane,
Tall as a crane,
The morning light creaks down again;
Comb your cockscomb-ragged hair,
Jane, Jane, come down the stair.
Each dull blunt wooden stalactite
Of rain creaks, hardened by the light,
Sounding like an overtone
From some lonely world unknown.
But the creaking empty light
Will never harden into sight,
Will never penetrate your brain
With overtones like the blunt rain.
The light would show (if it could harden)
Eternities of kitchen garden,
Cockscomb flowers that none will pluck,
And wooden flowers that �gin to cluck.
In the kitchen you must light
Flames as staring, red and white,
As carrots or as turnips shining
Where the cold dawn light lies whining.
Cockscomb hair on the cold wind
Hangs limp, turns the milk�s weak mind�
Jane, Jane,
Tall as a crane,
The morning light creaks down again!


(Edith Sitwell)

*

Bom dia!
 


POUCO EM COMUM ENTRE 2005 E 1985


� vulgar ver na comunica��o social compara��es entre a pr�xima campanha presidencial com a primeira volta da campanha de 1985. Nada de mais superficial e enganador. Quase nada h� em comum entre ambas as campanhas, se excluirmos M�rio Soares, o que n�o � pouco. Em 1985, havia um duro confronto entre projectos pol�ticos contradit�rios, hoje h� apenas um confronto de personalidades, forte entre Alegre e Soares, d�bil nas candidaturas presenciais como as de Lou�� e Jer�nimo.

Participei activamente na campanha de 1985, desde quando Soares tinha 8 por cento nas sondagens e tudo parecia perdido. Comecemos exactamente por a�: as m�s sondagens, que alguns pretendem comparar, entre os 8 por cento de 1985 e os pouco mais de 20 por cento, �s vezes menos, de hoje. De novo, repito: incompar�vel. Em 1985, Soares vinha de uma experi�ncia governamental dif�cil e controversa, o "bloco central", e fora apanhado por uma volta inesperada da hist�ria nas suas aspira��es presidenciais.

Tinha contra ele uma governa��o de austeridade, a que se somou uma crise pol�tica no parceiro da coliga��o, o PSD, com que Soares contava para a maioria presidencial. Soares esperava que a maioria do "bloco central", que governava em parceria com Rui Machete, o pudesse apoiar, tanto mais que o PS n�o parecia firme no seu apoio. Soares tivera sempre dificuldades com a "esquerdiza��o" do PS, com muita gente a querer ajustar contas pela governa��o, que acusavam de se ter afastado das "conquistas de Abril". Ao mesmo tempo era pressionado por uma ala esquerda que se revia em Zenha e que n�o perdoara o distanciamento que Soares tivera do apoio do partido a Eanes nas elei��es anteriores. Eanes, o "eanismo" e o PRD eram uma perturba��o nova no sistema pol�tico, a �nica que verdadeiramente colocou em causa a hegemonia alternativa do PS e do PSD, e o "eanismo" era veementemente anti-soarista e vice-versa.

Soares percebeu que n�o ia ter o apoio do PSD, onde a novel estrela em ascens�o, Cavaco, tinha ganho for�a ao p�r em causa o "bloco central" em mat�ria presidencial, apoiando Freitas do Amaral. Soares, para travar o desgaste, bloqueou ent�o todas as reformas do Governo, como a sempre adiada legisla��o sobre o arrendamento, que ainda irritariam mais o PS, mas n�o conseguiu estancar o confronto com os v�rios "socialismos" �rf�os do PREC. Rejeitado por Cavaco, virou-se para defrontar todos os candidatos nas "prim�rias da esquerda", ou seja, Zenha e Pintasilgo. Ao defront�-los, defrontava tamb�m uma parte importante do PS.

Neste confronto, que alguns pensam semelhante ao actual, nada � compar�vel. Em 1985, afrontavam-se projectos pol�ticos antag�nicos, ferozmente competitivos, mais do que personalidades. Hoje o embate � mais entre personalidades, e menos entre projectos, porque Soares, Alegre, Lou�� e Jer�nimo n�o t�m muitas diferen�as na vis�o do mundo. Em 1985, ainda a campanha era feita essencialmente fora da televis�o (que favorece o "protagonismo") e o 25 de Abril e o PREC estavam muito vivos na mem�ria, rasgando o tecido pol�tico. Hoje � o contr�rio.

Em 1985, os dois candidatos Zenha e Pintasilgo eram os �ltimos representantes de projectos pol�ticos vindos directamente do PREC, e Soares, da resist�ncia ao PREC. Dez anos depois de 1975, era uma fase da vida pol�tica portuguesa que estava a terminar numa esp�cie de "luta final". Pintasilgo representava o basismo, que agregara as sobreviv�ncias do MES e muitos outros nost�lgicos do "poder popular", e uma esquerda radical independente que tinha ent�o um papel muito importante na comunica��o social, � volta do seman�rio O Jornal, e que partilhava influ�ncias com o PRD. Zenha era um candidato ainda mais complicado, recebendo o apoio simult�neo do PRD e do PCP, misturando a resist�ncia de um certo "socialismo militar", justicialista e moralista, � normaliza��o democr�tica, com uma estrat�gia comunista de usar o PRD para enfraquecer o PS. O PCP desejava que o PRD igualizasse os partidos num grupo de cinco, favorecendo a fragmenta��o do poder, quebrando o PS. Soares era para todos o advers�rio a abater, que representava a "social-democratiza��o", que tirara da gaveta para l� p�r o socialismo.

Desde o 25 de Novembro at� finais de 1985, todos os grandes impasses de um estado feito pelas "conquistas da revolu��o", constru�do institucionalmente por uma Constitui��o equ�voca e amb�gua, foram o pano de fundo do combate entre os que defendiam a "ruptura" (como S� Carneiro) e as mil e uma variantes de "socialismo" ainda muito vivas e pujantes. Conv�m lembrar que a Constitui��o ainda tinha fortes resqu�cios do poder militar, que a parte econ�mica da Constitui��o consagrava as nacionaliza��es, a reforma agr�ria e o controlo oper�rio, e a Europa ainda n�o trouxera fundos e soberania partilhada. Tudo isto estava por resolver ap�s o fracasso de duas experi�ncias governativas "centrais", a da AD e a do "bloco central".
Por isso, a primeira volta de 1985 foi bem mais importante do que a segunda volta de 1986, em que muitos equ�vocos do passado voltaram de novo, com Soares a ir buscar o "antifascismo" para derrotar Freitas. E esses equ�vocos s� n�o bloquearam outra vez o fim das "conquistas da revolu��o" porque apareceu Cavaco, o segundo acto da primeira volta das presidenciais. Soares, fresco no seu antieanismo, fez uma primeira presid�ncia, marcada pela recusa do Governo PS-PRD que lhe queriam impor, depois da mo��o de censura que tinha derrubado o governo minorit�rio (28 por cento teve o PSD nas urnas e ganhou, sinal da fragmenta��o eleitoral do sistema partid�rio). Cavaco, obtendo a maioria absoluta, ajudou Soares a fazer uma "magistratura de influ�ncia" no primeiro mandato, que ele iria abandonar a favor do "direito � indigna��o" no segundo, tornando o intervencionismo do general Eanes uma brincadeira, comparado com o dele pr�prio.

Hoje, nada que tenha a ver com estes confrontos existe entre as candidaturas de Soares, Alegre, Lou�� e Jer�nimo. Estes dois �ltimos t�m candidaturas puramente tribun�cias, destinadas a garantir voz aos seus partidos, mas bastante indiferentes aos resultados finais. Ningu�m teme qualquer cataclismo pela vit�ria de Cavaco, ou pela derrota de Soares. No PCP, h� mesmo uma velha animosidade contra Soares (que n�o existe no BE), com ra�zes n�o s� pol�ticas como sociais, pelo que muita gente ficar� "vingada" se Soares perder. Nenhum movimento genu�no existe para concentrar os votos numa segunda volta em M�rio Soares, embora a facilidade de dramatiza��o do dualismo pol�tico o possa favorecer.

Mas que t�m os concorrentes de Soares a criticar-lhe, ou vice-versa? Em todas as quest�es de fundo, em mat�ria de pol�tica externa (Iraque, antiamericanismo, antiglobaliza��o, antiblairismo, pol�tica face ao terrorismo, etc.), Soares ultrapassa em radicalismo mesmo o BE e, em pol�tica interna, Soares de h� muito propugna por vers�es simplistas do c�none antiglobalizador de Porto Alegre, irrealistas at� ao limite. Dir-me-�o que isso n�o � importante porque o Presidente n�o governa. Verdade, mas o que ele pensa da governa��o � o pano de fundo da sua fun��o presidencial e conv�m n�o apostar que um utopista radical possa avalizar uma pol�tica que acha "neoliberal", ou seja, demon�aca.

O caso de Alegre tamb�m pouco tem a ver com ideias e programas, como se ver� na campanha. Se Jo�o Soares n�o fosse candidato na disputa interna do PS, M�rio Soares estaria com Alegre, que nunca atacou nesses dias, embora tenha atacado S�crates. Ret�rica por ret�rica, ambos s�o bons, Soares tem mais experi�ncia e intui��o pol�tica, Alegre mais "honestidade", "princ�pios" e "�tica republicana". Mas o confronto entre ambos s� na apar�ncia � semelhante ao de Zenha com Soares, porque falta a Alegre qualquer projecto consistente que seja antag�nico com o de Soares. Diferem de clientelas no PS? N�o chega. Na pr�tica, ambos pairam um pouco por cima da realidade do pr�prio PS, onde o "socratismo" � uma coisa muito diferente. S�crates est� a fazer um rejuvenescimento da rede de interesses dentro do PS e, desse ponto de vista, o grupo � volta de Soares est� a perder peso e influ�ncia, o que foi ali�s uma das motiva��es de Soares para concorrer.

Talvez por isso, um confronto Soares-S�crates tivesse muito mais sentido do que Soares-Alegre. Na verdade, ele existe e est� l� disfar�ado. O PS que est� no poder n�o est� representado nesta campanha presidencial, que, logicamente, S�crates desvaloriza. N�o surpreende que seja assim, porque foi exactamente por essa desvaloriza��o que Soares o criticou.

Em 1985, nas "prim�rias", havia espadas pelo ar, desembainhadas, na rua, fora do palco, na pra�a principal, com f�ria e vigor; em 2005, � teatro de c�mara, veneziano, interior, envenenado, um jogo com muitas sombras, de egos cansados e pouco subtis. Em 2005, havia outras "prim�rias" poss�veis, essas sim mais parecidas com as de 1985, mas seriam do outro lado do espelho. Seriam as que oporiam o projecto de Cavaco Silva com o de Portas e Lopes, como em 1985, "prim�rias" opondo projectos de conte�do distinto, representando espa�os pol�ticos e interesses sociais distintos, que resolveriam alguns mal-entendidos sociais e pol�ticos que ficaram em suspens�o desde a funda��o do Independente at� ao consulado de Santana Lopes-Portas. Mas duvido que tal se verifique, dado que os eleitores este ano j� come�aram a colocar as coisas em ordem, provocando a falta de compar�ncia dos que diziam "nunca desistir".

(No P�blico.)

29.9.05
 


BIBLIOTECA


Ant�nio Leal, Biblioteca da M. 7
 


INTEND�NCIA

Em actualiza��o os ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO.
 


PRISIONEIRO

Pega-se no livro, um entre muitos, bem sei do Conrad, vale sempre a pena (porqu� a pena?). Vale. J� sei que vale. Mas ser� este que agora vou ler? Est� ali outro, e um ensaio, e aquele t�tulo que chama por mim. Folheio, na l�mpida pagina��o dos Oxford World's Classics, na primeira p�gina, na primeira linha, no primeiro par�grafo, depois no segundo, depois no terceiro, isto:


THE SHADOW LINE

D'autre fois, calme plat, grand miroir De mon desespoir.

BAUDELAIRE

ONLY the young have such moments. I don't mean the very young. No. The very young have, properly speaking, no moments. It is the privilege of early youth to live in advance of its days in all the beautiful continuity of hope which knows no pauses and no introspection.

One closes behind one the little gate of mere boyishness -- and enters an enchanted garden. Its very shades glow with promise. Every turn of the path has its seduction. And it isn't because it is an undiscovered country. One knows well enough that all mankind had streamed that way. It is the charm of universal experience from which one expects an uncommon or personal sensation -- a bit of one's own.

One goes on recognizing the landmarks of the predecessors, excited, amused, taking the hard luck and the good luck together -- the kicks and the halfpence, as the saying is -- the picturesque common lot that holds so many possibilities for the deserving or perhaps for the lucky. Yes. One goes on. And the time, too, goes on -- till one perceives ahead a shadow-line warning one that the region of early youth, too, must be left behind.

This is the period of life in which such moments of which I have spoken are likely to come. What moments? Why, the moments of boredom, of weariness, of dissatisfaction. Rash moments. I mean moments when the still young are inclined to commit rash actions, such as getting married suddenly or else throwing up a job for no reason.

....

Agora j� n�o h� rem�dio. Mais preso do que o prisioneiro do Juan del Encina l� abaixo.
 


UMA FORMA NOVA DE ASSALTO AO BOM SENSO



Com sondagens lidas como se fossem argumentos pol�ticos e opini�es de especialistas que saltam do terreno seguro que conhecem para a opini�o livre, t�o �impressionista� como qualquer outra, mesmo que informada (e muita opini�o �impressionista� � tamb�m informada), est� a dar-se um novo assalto ao bom senso. Na minha escola de pensamento, o bom senso, assente na experi�ncia, � sempre um terreno seguro para pensar, mesmo contra-intuitivamente, ou seja de forma criadora.

Muita gente embarca alegremente, at� porque � uma moda como qualquer outra. Uma das coisas espantosas que circula (e que Alegre transformou em argumento pol�tico) � que a exist�ncia de v�rias candidaturas competitivas na �esquerda� � vantajosa porque vai buscar todos os votos poss�veis, pela pluralidade de op��es. Talvez seja, talvez numericamente assim seja, mas politicamente � um absurdo imaginar um voto gelado, racional, descontar o papel das fric��es inevit�veis, da usura da �rea (de toda a �esquerda�), da desmobiliza��o pela garantia da derrota antecipada, pelo menos na primeira volta, pelo desgosto pela divis�o, pela acrim�nia inevit�vel e o desgaste nos candidatos. Pelo menos entre Alegre e Soares, o bom senso diz que ser� assim, mau para ambos, mas posso enganar-me. Ser� verific�vel em Janeiro.

Como tamb�m n�o acredito, - insisto, n�o acredito -, pode ser f� minha, mas parece-me boa f�, que Alegre no mundo real possa ser melhor do que Soares na segunda volta. Pura e simplesmente parece-me � absurdo. E pode ser que, neste caso, n�o se seja verific�vel em Janeiro.
 


COISAS SIMPLES


Andrew Wyeth, Cape Forchu Light
 


EARLY MORNING BLOGS 613

No te tardes


�No te tardes que me muero
carcelero,
no te tardes que me muero!

Apresura tu venida
porque no pierda la vida
que la fe no est� perdida:
carcelero,
�no te tardes que me muero!

S�came de esta cadena,
que recibo muy gran pena
pues tu tardar me condena,
carcelero,
�no te tardes que me muero!

La primera vez que me viste,
sin lo sentir me venciste;
su�ltame pues me prendiste,
carcelero,
�no te tardes que me muero!

La llave para soltarme
he de ser galardonarme,
prometiendo no olvidarme,
carcelero,
�no te tardes que me muero!

(Juan del Encina)

*

Bom dia!

28.9.05
 


AR PURO


Frederick H. Clark, Vineyard Haven
 


EARLY MORNING BLOGS 612

Acquainted With The Night

I have been one acquainted with the night.
I have walked out in rain�and back in rain.
I have outwalked the furthest city light.

I have looked down the saddest city lane.
I have passed by the watchman on his beat
And dropped my eyes, unwilling to explain.

I have stood still and stopped the sound of feet
When far away an interrupted cry
Came over houses from another street,

But not to call me back or say good-by;
And further still at an unearthly height
One luminary clock against the sky

Proclaimed the time was neither wrong nor right.
I have been one acquainted with the night.


(Robert Frost)

*

Bom dia!

27.9.05
 


COISAS SIMPLES


Rembrandt
 


EARLY MORNING BLOGS 611

There Was A Young Lady Of Portugal

There was a Young Lady of Portugal,
Whose ideas were excessively nautical:
She climbed up a tree,
To examine the sea,
But declared she would never leave Portugal.

(Edward Lear)

*

Bom dia!

26.9.05
 


BIBLIOFILIA:
DAS PAR�QUIAS AO CHEFE, A ORDEM NATURAL DAS COISAS



Este cat�logo do pavilh�o portugu�s da Exposi��o Internacional de Paris de 1937, � um verdadeiro retrato da propaganda do salazarismo visto por Antonio Ferro. � um muito interessante mostru�rio da publicidade dos anos trinta, com o melhor e o pior, e toda um colec��o de simbologia pol�tica do regime nos seus momentos de maior proximidade com o fascismo italiano, como se v� por este relevo escult�rico da hierarquia "org�nica" da Na��o.
 


� PROCURA DA PALAVRA 2

Muito obrigado aos excelentes leitores do Abrupto (Tiago Loureiro, Pedro Domingos, Jo�o Paulo Barros, Alberto Mendes, Jos� Viana Gomes, Leonel Morgado, etc.) que me enviaram indica��es sobre os problemas com o MSWord. Entre essas indica��es incluem-se endere�os de p�ginas sobre a formata��o do texto, livros e sugest�es para a utiliza��o dos programas Endnote e LaTeX (que o Word teima em escrever L�TEX). Estou agora a estudar as informa��es que recebi.

Entretanto formatei todo o texto e notas j� existentes de um projecto de dicion�rio - enciclop�dia numa tabela do Word, usando a primeira coluna para fazer os t�tulos das entradas, e as outras colunas com texto em bruto e a bibliografia. Resolve-me para j� o problema de organizar o texto e poder juntar fragmentos que s�o f�ceis de anexar ao texto principal atrav�s da ordem alfab�tica. Tenho assim cerca de 590 p�ginas na horizontal, para maximizar as colunas da tabela, e os problemas dos textos longos come�am a aparecer e s� se ir�o agravar, porque calculo que as p�ginas v�o triplicar ou quadruplicar. A correla��o �marcador� � �hiperliga��o� tamb�m funciona mal, para as refer�ncias cruzadas. Nada que n�o fosse previs�vel quer por asneira minha, quer pelas dificuldades de um texto complexo. Vou ver se estudo mais em detalhe as poss�veis variantes. Obrigado.
 


O MUNDO EST� PERIGOSO:
AQUILES DE MADREP�ROLA

J� agora que estamos na ind�stria dos perigos do mundo, parece que a madrep�rola, o delicado n�car, � um excelente material para blindagem, e outros b�licos artefactos. O que diria Homero destes guerreiros �vestidos� de madrep�rola? Est�o a ver Patroclo, Aquiles, Heitor, Ulisses, brilhantes nas suas armaduras, que festival de vaidades! Suspeito que Homero devia gostar, homens pintados, bravado, gritos de guerra, sangue e estilha�os de conchas ao sol de Tr�ia...
 


O MUNDO EST� PERIGOSO:
TZETZES VENDENDO PHARRUMACY, PHRRMARCY E OUTRAS RECEITAS


O spam � um bom exemplo de imagina��o utilizada para nos dar cabo da vida, mas tamb�m n�o � nada de novo quanto ao uso da imagina��o com tais prop�sitos. N�o sei porque curiosidade m�rbida demorei mais que um segundo a apagar uma en�sima propaganda da felicidade qu�mica, quando vejo de vislumbre o nome inesquec�vel de Tzetzes a seguir aos habituais Cia lis, Via gra, Xan ax, Pro pecia, Am bien, Cel ebrex, partidos em duas colunas para n�o serem reconhecidos pelos filtros de spam. Tzetzes, o que eu conhecia, o das Exegesis in Homeri Iliadem, dos Prolegomena de comoedia Aristophanis, o das c�lebres Chiliades? O bizantino, o gram�tico furioso, o precursor do name dropping? Esse mesmo, vendendo Xa nax.

No fundo da lista dos qu�micos estava a um textozinho destinado a enganar os filtros, talvez tirado por uma dessas m�quinas que tamb�m �l� blogues para lhes aumentar as audi�ncias:

Lion. Tzetzes, a grammarian and poet of Constantinople, who lived A HUNTER, not very bold, was searching for the tracks of a Lion. greeted them with this salutation: What sort of a king do I seem wretched creature that I am! to take such precaution against the A FOWLER, taking his bird-lime and his twigs, went out to catch

O mundo est� perigoso, mas n�o est� perdido. Tzetzes est� vivo, as m�quinas lembram-se dele.
 


AR PURO


LeRoy Grannis, Big Storm Surf at Ehukai Beach (near Pipeline)
 


EARLY MORNING BLOGS 610

The Woman Who Collects Noah�s Arks


Has them in every room of her house,
wall hangings, statues, paintings, quilts and blankets,
ark lampshades, mobiles, Christmas tree ornaments,
t-shirts, sweaters, necklaces, books,
comics, a creamer, a sugar bowl, candles, napkins,
tea-towels and tea-tray, nightgown, pillow, lamp.
Animals two-by-two in plaster, wood,
fabric, oil paint, copper, glass, plastic, paper,
tinfoil, leather, mother-of-pearl, styrofoam,
clay, steel, rubber, wax, soap.
Why I cannot ask, though I would like
to know, the answer has to be simply
because. Because at night when she lies
with her husband in bed, the house rocks out
into the bay, the one that cuts in here to the flatlands
at the center of Texas. Because the whole wood structure
drifts off, out under the stars, beyond the last
lights, the two of them pitching and rolling
as it all heads seaward. Because they hear
trumpets and bellows from the farther rooms.
Because the sky blackens, but morning finds them always
safe on the raindrenched land,
bird on the windowsill.


(Janet McCann)

*

Bom dia!

25.9.05
 


BIBLIOTECA


Ant�nio Leal, Biblioteca da M. 6
 


EARLY MORNING BLOGS 609

Of Some Renown


For some time now, I have
lived anonymously. No one
appears to think it odd.
They think the old are,
well, what they seem. Yet
see that great egret

at the marsh�s edge, solitary,
still? Mere pretense
that stillness. His silence is
a lie. In his own pond he is
of some renown, a stalker,
a catcher of fish. Watch him.


(Jean L. Connor)

*

Bom dia!

24.9.05
 


FONTES DE ONDE VEM O MAL QUE TODOS VEMOS � FRENTE



H� muitas, o atraso, a pobreza a ignor�ncia, a arrog�ncia presumida, a hipocrisia, os p�ssimos costumes da classe m�dia (nome que n�s damos � pequena burguesia), a corrup��o, os �pol�ticos�, a Lux, a Caras, o Herman, o �conde�, a TVI, o jornalismo de quinta, o provincianismo, os reality shows, etc, etc, etc, You name it.

Mas h� mais uma fonte: o cinismo dos intelectuais. O cinismo dos intelectuais que se comportam como nefelibatas e que se �espantam� porque as pessoas se indignam com o �caso� de F�tima Felgueiras. O mais espantoso � ver este cinismo coexistir com a cr�tica ao relativismo, mostrando como n�o bastam algumas leituras da moda, onde falta vida. Seja por puro formalismo jur�dico, seja por n�o se gostar de misturar as suas opini�es com as do vulgo, seja pela irritante mania da superioridade, seja por pedantismo.

Alguns portugueses indignam-se com a saga da fugitiva libertada. � s� hipocrisia, dizem os c�nicos do intelecto, porque para eles o sin�nimo de indigna��o � a hipocrisia. �, pode ser tudo isso, pode ser uma indigna��o bacteriologicamente impura, mas � tamb�m inc�modo, mal-estar, mal connosco pr�prios, com o pa�s, como o �nosso Portugal�, uma das �ltimas sobreviv�ncias de um sistema de valores quase de rastos, colocado de rastos tamb�m pelos c�nicos, um dos �ltimos restos de alguma coisa a que cham�vamos patriotismo. V�o viver para Felgueiras e atrevam-se a criticar a �Fatinha� em p�blico, e n�o me venham com a Madeira por raz�es de equidist�ncia, porque isso tamb�m mostra que n�o sabem nada do que est�o a falar.

H� alturas de facto em que os intelectuais n�o prestam mesmo. H� alturas em que os intelectuais n�o percebem nada. Bem vistas as coisas, � quase sempre assim.
 


COISAS COMPLICADAS


William Hogarth. An Election Entertainment
 


EARLY MORNING BLOGS 608

Dizia uma vez Aquilino...


Dizia uma vez Aquilino que em Portugal
os fil�sofos se exilavam ainda em seu pa�s
(v.g. Spinoza). O curioso por�m
� que tamb�m ningu�m foi santo l�:
os nascidos em Portugal foram todos s�-lo noutra parte
(St. Ant�nio, S. Jo�o de Deus, etc.)
e outros santos portugueses, se o foram,
ter� sido, porque, estrangeiros que eram e em Portugal
vivendo, n�o tiveram outro rem�dio
(v.g. Rainha Santa) sen�o ser santos,
� falta de melhor. Oh pa�s danado.
Porque os her�is tamb�m nunca tiveram melhor sorte
(Albuquerque e outros que o digam) a menos que
tivessem participado de revolu��es feitas
"em vez de" (v.g. o Condest�vel que fez
fortuna e a casa de Bragan�a e acabou s� Santo quase).


(Jorge de Sena)

*

Bom dia!

23.9.05
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
PROPAGANDA POL�TICA E OS POSTES DA EDP




Sou um cidad�o residente em S.Bernardo - Aveiro e sou Electricista de profiss�o.Serve esta descri��o para alertar para uma situa��o que est� a acontecer na minha freguesia e n�o s�, e passo a explicar.

Como cidad�o tenho que lamentar que se coloquem placards de campanha pol�tica fixos aos postes da EDP e na �poca de Natal n�o se possa fixar ilumina��o decorativa de Natal aos mesmos.Como Electricista tamb�m � de lamentar que quando solicitamos uma liga��o para execu��o de obras n�o nos seja permitido fixar a baixada aos mesmos postes e para campanha politica j� � autorizado.

Posso ainda informar que actualmente os postes s�o pagos pelos cidad�os que requisitam a baixada que por sua vez s�o obrigados a cede-los a titulo definitivo � EDP para que a EDP por sua vez os ceda para campanha politica, o que � de lamentar. Todos os placards que vi est�o associados a um �nico partido pol�tico o que torna a situa��o ainda mais grave.

Ser� que a EDP est� ao servi�o dos cidad�os ou ao servi�o da politica?

(J�lio Gon�alves)
 


INTEND�NCIA

Em actualiza��o os ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
UMA COLIGA��O NEGATIVA QUE PODE SER POSITIVA NUMA EMERG�NCIA

OU PARA GRANDES MALES GRANDES REM�DIOS




� penoso, confrangedor mesmo, observar os candidatos do PSD e PS a relativizarem a pol�tica, n�o chamando "a senhora pelo seu verdadeiro nome" (fugitiva), relegando para a justi�a (manipulada por quem?!) desenvolver os passos, ditos, "normais". Bem sei que em Democracia, todos s�o presum�veis inocentes at� tr�nsito em julgado - mas mesmo aqueles que fogem na bagageira de um carro, para um pa�s onde sabem, � partida, que n�o poder�o ser extraditados, onde fazem pl�sticas, alterando o visual e que chegam, at� esta quase rep�blica das bananas, como triunfadores, mais jovens, de cara lavada!?!?

N�o sei se concorda comigo, por ventura n�o; mas mesmo assim deixo-lhe um
repto: e se o PS e PSD de Felgueiras comunicassem ao Pa�s que se iriam coligar, ap�s as elei��es, para travar o �mpeto devorador dos que apenas conhecem as leis das favelas?!

Ut�pico?! Talvez, mas seria um sinal de que os pol�ticos, nas quest�es essenciais de cidadania, onde est�o em causa valores mais elevados do que a conquista do poder, dariam um sinal de que, afinal, fazer pol�tica, ainda � uma actividade nobre.

(Daniel Ferreira Gaspar)

*

Ver tamb�m a actualiza��o de VAMOS ESCOLHER O �FIXE� OU O �CONFI�VEL�?
 


BIBLIOTECA


Ant�nio Leal, Biblioteca da M. 5
 


� PROCURA DA PALAVRA



O Plano Tecnol�gico visto de baixo, da comezinha realidade vai ter muito quer andar. Sucede que preciso de escrever um texto com formata��o complicada, entre o dicion�rio e a enciclop�dia, um texto grande, cheio de refer�ncias cruzadas no seu interior, a meio caminho entre o processamento e a base de dados simples, que possa permitir ordenar entradas e, ao mesmo tempo, usar todos os instrumentos de formata��o de um processador de texto - enfim, complicado. Resolvi procurar um manual actualizado do MSWord, para ver se, entre as mil e uma fun��es que o programa tem, podia encontra resposta ao problema.

Pois sim. Mais �pois n�o� do que �pois sim�. Acreditam que nas duas FNAC, na livraria do Corte Ingl�s, nos livros de inform�tica da Vobis, nas Bertrand v�rias, nas Boulhosa v�rias, na Barata, e em mais tr�s ou quatro livrarias n�o h� um �nico manual decente � venda, que n�o seja umas tradu��es de uns livros para principiantes do g�nero �Word for dummies�, e mesmo assim s� numa ou duas. Eu pensava que o MSWord era o mais popular processador de texto, e pensava que algu�m, algures, n�o se bastaria com o �help�, ou com o que encontra em linha. Numa capital da Europa. Pois sim.
 


VAMOS ESCOLHER O �FIXE� OU O �CONFI�VEL�?



Parece que os portugueses preferem ter como �chefe no trabalho� M�rio Soares e como �professor do filho� Cavaco Silva, preferem ter �como companhia ao jantar� M�rio Soares e �emprestar o carro� a Cavaco Silva. Se eu quisesse ser mau para Soares diria que nestes inqu�ritos ele aparece com um perfil muito pr�ximo de um outro presidente que n�o estima por a� al�m, George W. Bush. A maioria dos portugueses gostaria de jantar com Soares, como a maioria dos americanos de ir a um barbecue com Bush, voltando as costas a um pesadelo que seria ter de aturar Al Gore. E eu aqui, percebo muito bem os portugueses.

Mas ainda os percebo melhor quando, - registem a letras de fogo - , desejam M�rio Soares como �chefe no trabalho�, todo um programa. Sabem exactamente o que isso significa? Sabem, sabem, todos sabem, � por isso que respondem assim. Pena � que apenas uma pequen�ssima minoria de portugueses tenha visto a s�rie da BBC The Office, uma das que devia fazer parte (com o Sim Senhor Ministro) de um curr�culo moderno de educa��o c�vica e pol�tica do secund�rio.

Mas h� mais. No mesmo inqu�rito (do Expresso) � feita uma pergunta s�ria e respons�vel, principalmente nos conturbados dias de hoje: �a quem entregava a organiza��o das suas contas pessoais?� A Cavaco claro. Aqui n�o � apenas Cavaco que vence, h� um esmagador desequil�brio, o maior de todos, entre 22% a favor de Soares e 69% a favor de Cavaco. Mesmo que a Presid�ncia n�o seja para gerir o nosso dinheiro, j� que Jesus Cristo nada sabia de finan�as, d� que pensar.

Claro que nem tudo nesta sondagem favorece Cavaco. Os portugueses reconhecem que Soares fez mais pelo pa�s do que Cavaco, e eu, assim perguntado, responderia da mesma maneira lembrando-me de 1975. Num momento conturbado e perigoso, num momento revolucion�rio, M�rio Soares fez muito por Portugal, e sem o que ele fez, o que Cavaco fez de bom (nem o que de mal fez Soares) n�o seria poss�vel. � uma quest�o fundacional, e ser� por essa que Soares ficar� na hist�ria. Os portugueses s�o s�bios, mas duvido que seja raz�o bastante para lhe entregarem pela terceira vez a Presid�ncia.

Tamb�m n�o pediriam a Cavaco um conselho para um livro, s� 35% o fariam, contra 60% a Soares, a maior diferen�a a favor de Soares. Muito bem, tamb�m aqui s�o os portugueses s�bios, porque, como revela a antologia dos �poemas da minha vida�, distribu�da pelo P�blico, Soares tem poemas da sua vida, coisa que alguns dos outros autores n�o t�m de todo. A antologia de Soares revela a sua vivacidade, gosto, e leituras e � das melhores, da s�rie.

Foi por isso que Soares proclamou a sua vantagem sobre Cavaco em mat�ria de �cultura human�stica�, cuja aus�ncia tornava Cavaco um candidato n�o aceit�vel para Presidente. � verdade que a cultura das elites portuguesas formadas nos anos quarenta, na tradi��o liberal e republicana, inclui uma dose s�lida da literatura do s�culo XIX e XX, com �nfase na gera��o dos Vencidos da Vida, a que depois se acrescentam os autores que um homem �letrado� conhecia, quase sempre seus contempor�neos.

Mas essa cultura tem s�rias limita��es para nela se fundar uma superioridade �human�stica�, a n�o ser numa vis�o republicana, jacobina, ma��nica. � por exemplo omissa de qualquer dimens�o cient�fica s�ria (as pessoas continuam a achar que cultura � saber o n�mero de cantos dos Lus�adas mesmo que n�o se saiba o principio de Arquimedes, ou o que � a in�rcia), pouco tem de filosofia, teoria pol�tica (que nos anos da ditadura ficava para os �fascistas� que liam Maquiavel, Hobbes, Schmidt), e nada de economia, mesmo na forma filos�fica cl�ssica da �economia pol�tica�. Era dominada pela ret�rica, mesmo quando esta servia boas causas como a democracia.

Havia excep��es, como h� sempre, mas esta era a regra para a gera��o de Soares, de que o nosso antigo Presidente � um bom exemplo, a que acrescem os seus dotes de escrita e de conversador, uma arte em extin��o que cultiva como ningu�m. (Fa�o aqui uma nota de passagem, nos meus trabalhos sobre a oposi��o ao salazarismo, onde havia muitos escritores, entre as pessoas que melhor escreviam contam-se Cunhal Leal e M�rio Soares. Descri��o de um evento feita por Soares � sempre viv�ssima, mostrando uma percep��o e observa��o fina, quase sem paralelo.)

Mas aten��o, h� aqui uma outra quest�o oculta, que se a esquerda fosse o que diz ser, devia soar todas as trombetas b�blicas, h� aqui uma clara divis�o social, uma diferen�a de classe, de meios, de vida, e tamb�m de tempo, de idade. Cavaco nasceu em Boliqueime entre o pobre e o remediado e Soares em Lisboa e nasceu rico. E nasceram em tempos diferentes de ser jovem e de ser adulto, em diferentes gera��es. � por isso que � preciso muita prud�ncia para se usar a �cultura human�stica� como arma de arremesso, porque acaba por ser mais uma afirma��o de superioridade da condi��o social, do que uma cr�tica pol�tica.

Sintetizando e concluindo, o Expresso titulava �Soares � fixe, Cavaco � de confian�a�. Duma vez por todas, o Expresso acerta num t�tulo. Os portugueses gostam de Soares (j� gostaram menos, j� gostaram mais, j� gostam menos outra vez), mas confiam em Cavaco. Resta agora saber que escolha far�o. A �nica coisa que sei � que essa escolha vai depender do grau de racionalidade da campanha, numa vida pol�tica em que ela n�o abunda. Se Cavaco acentuar a racionalidade da sua campanha, ganha contra um Soares que tender� a impregna-la de afectividade, de irrita��es, ao mesmo tempo de drama e de boa disposi��o. � contradit�rio? �, mas a personagem � assim, virtudes e qualidades coladas como grude, �fixe� na apar�ncia, e com os seus, e autorit�rio e duro com os que est�o fora da fam�lia e que ousam defronta-lo.

Como far�o os portugueses? H� muita coisa a favor de Soares, porque a atitude de adiar tudo, de nonchalance face ao futuro, de despreocupa��o, muito facilmente irritada com quem lhe lembre responsabilidades (veja-se a velha hist�ria do Carnaval), cala muito fundo na anomia em que vivemos. Podem continuar a n�o querer mudar nada, e n�o se aborrecerem por nada, enquanto puderem viver remediadamente, como faz uma parte importante da burguesia urbana, entre o Algarve, e Varadero, sem cuidar que os seus filhos v�o viver pior, e, se tudo continuar como est�, os seus netos v�o viver mediocremente. Em Soares t�m o candidato ideal.

Por outro lado, Cavaco traz um bem precioso, o que menos abunda na nossa vida pol�tica, credibilidade e �confian�a�. � aqui que remeto para o meu artigo anterior, infelizmente ainda mais confirmado pelos n�meros entretanto divulgados sobre a crise de confian�a entre os investidores. Cavaco acrescenta ao sistema pol�tico, Soares diminui, ou, na melhor das hip�teses, n�o muda nada. H� muitas outras raz�es para se escolher um ou outro, mas esta � talvez aquela em que a diferen�a � mais n�tida, a escolha � mais escolha. Ou o �fixe� ou o �confi�vel�.

(Do P�blico de ontem.)

*
(...) que interessam as escolhas no nosso pa�s? A Isaltino Morais, com um caso de contas suspeitas na Sui�a, as sondagens d�o-lhe quase maioria absoluta, F�tima Felgueiras, depois de fugir � justi�a volta a candidatar-se e ainda tem direito a tempo de antena num canal de televis�o, Avelino Torres oferece subornos para votarem nele. Por isso pergunto, que interessam as escolhas no nosso pa�s?

H� uns dias contaram-me esta hist�ria: em conversa de amigos, na universidade, um jovem com aspira��es pol�ticas virou-se para outro e fez-lhe esta pergunta: "Ouve l�, se eu um dia chegar a me candidatar a um cargo importante como Primeiro Ministro ou Presidente da Rep�blica, votarias em mim?", ao que o outro respondeu com um sorriso, "Bom, isso iria depender... de qual seria a minha fatia do bolo". Face � resposta, o jovem pol�tico rapidamente respondeu "Oh p�, � claro, � claro que arranjava qq coisa". Desta vez o amigo questionado tomou um ar s�rio e disse "Bom, meu amigo, ent�o nesse caso n�o votaria em ti de certeza". E o jovem com aspira��es pol�ticas ficou mudo e nunca mais questionou aquele seu amigo sobre elei��es ou tend�ncias de voto.

A hist�ria � real e foi-me contada por um jovem de 21 anos, o amigo questionado. E apesar do orgulho e da surpresa que senti, pois tratava-se do meu irm�o mais novo, sei que a resposta ut�pica que ele deu ao amigo conduz a um beco sem sa�da. Pelo menos no nosso pa�s. No pa�s em que ind�cios de corrup��o d�o maiorias absolutas, no pa�s em que foragidos � justi�a aparecem na televis�o como se nada tivesse acontecido, no pa�s em que os interesse partid�rios alimentam os interesses pessoais numa sucess�o de favores e contra-favores que agravam e afundam cada vez mais a nossa economia, a nossa educa��o, a heran�a que iremos passar �s pr�ximas gera��es.

Por isso, volto a perguntar, que interessam as escolhas no nosso pa�s?

(Paulo)
 


COISAS SIMPLES


John Pilson, St Denis (Painting and Lamp)
 


EARLY MORNING BLOGS 608

N�o toques nos objectos imediatos


N�o toques nos objectos imediatos.
A harmonia queima.
Por mais leve que seja um bule ou uma chaven�,
s�o loucos todos os objectos.
Uma jarra com um cris�ntemo transparente
tem um tremor oculto.
� terr�vel no escuro.
Mesmo o seu nome, s� a medo o podes dizer.
A boca fica em chaga.


(Herberto Helder)

*

Bom dia!

21.9.05
 


BIBLIOTECA


Ant�nio Leal, Biblioteca da M. 4
 


EARLY MORNING BLOGS 607

Laranja, peso, pot�ncia


Laranja, peso, pot�ncia.
Que se finca, se apoia, delicadeza, fria abund�ncia.
A mat�ria pensa. As madeiras
incham, d�o luz. Apuram t�o leve a��car,
tal golpe na l�ngua. Espa�o lunado onde a laranja
recebe soberania.
E por an�is de carne artesiana o ouro sobe � cabe�a.
A ferida que a gente �: de mundo
e inven��o. Laranja
assombrosamente. Doce dem�ncia, arrancada � monstruosa
inoc�ncia da terra.

(Herberto Helder)

*

Bom dia!

20.9.05
 


INTEND�NCIA

Em actualiza��o, mais que necess�ria, os ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO.

Coloquei a� um �ndice final dos cap�tulos do III volume da biografia de �lvaro Cunhal.
 


VIAGENS NO TEMPO



Uma das descobertas do Estado Novo foram as viagens no tempo. Este exemplo in�dito de 1935 revela como � poss�vel escrever uma "not�cia" antes dela ter acontecido, pr�tica muito comum nos dias de hoje em que se "antecipa" o que vai acontecer, anter de ter acontecido. Pelos vistos, j� havia mestres no tempo do dr. Salazar desta actividade t�pica do jornalismo imaginativo: Carmona eleito com "colossal" vota��o, antes da vota��o. Sempre a aprender com o passado.

(Agrade�o a M.L.E. a oferta deste e doutros pap�is.)
 


AR PURO


Cifford Ross, Hurricane XXV
 


EARLY MORNING BLOGS 606

esta��o


Esperar ou vir esperar querer ou vir querer-te
vou perdendo a no��o desta subtileza.
Aqui chegado at� eu venho ver se me apare�o
e o fato com que virei preocupa-me, pois chove miudinho

Muita vez vim esperar-te e n�o houve chegada
De outras, esperei-me eu e n�o apareci
embora bem procurado entre os mais que passavam.
Se algum de n�s vier hoje � j� bastante
como comboio e como subtileza
Que d� o nome e espere. Talvez apare�a


(M�rio Cesariny)

*

Bom dia!

19.9.05
 


NUNC EST BIBENDUM NUNC PEDE LIBERO PULSANDA TELLUS


�s quinze horas e trinta e seis minutos, coloquei o �ltimo ponto final a seguir � palavra �hoje�. Quatro anos depois, seiscentas e cinquenta e uma p�ginas depois, mil setecentas e cinquenta notas de rodap� depois, encerrei o terceiro volume da biografia de �lvaro Cunhal para os anos da pris�o (1949 a 1960). Sair� em Novembro na Temas e Debates e em Janeiro no C�rculo de Leitores. A nossa l�ngua � pobre em onomatopeias para o que se passou �s quinze horas, trinta e seis minutos e um segundo depois.
 


BIBLIOTECA


Ant�nio Leal, Biblioteca da M. 3
 


EARLY MORNING BLOGS 605

Autumn Movement


I cried over beautiful things knowing no beautiful thing lasts.

The field of cornflower yellow is a scarf at the neck of the copper
sunburned woman, the mother of the year, the taker of seeds.

The northwest wind comes and the yellow is torn full of holes,
new beautiful things come in the first spit of snow on the northwest wind,
and the old things go, not one lasts.

(Carl Sandburg)

*

Bom dia!

18.9.05
 


BIBLIOTECA


Ant�nio Leal, Biblioteca da M. 2
 


EARLY MORNING BLOGS 604

VIDA


Choveu! E logo da terra humosa
Irrompe o campo das lili�ceas.
Foi bem fecunda, a esta��o pluviosa!
Que vigor no campo das lili�ceas!

Calquem. Recalquem, n�o o afogam.
Deixem. N�o calquem. Que tudo invadam.
N�o as extinguem. Porque as degradam?
Para que as calcam? N�o as afogam.

Olhem o fogo que anda na serra.
� a queimada... Que lumar�u!
Podem calc�-lo, deitar-lhe terra,
Que n�o apagam o lumar�u.

Deixem! N�o calquem! Deixem arder.
Se aqui o pisam, rebenta al�m.
- E se arde tudo? - Isso que tem?
Deitam-lhe fogo, � para arder...


(Camilo Pessanha)

*

Bom dia!
 


BIBLIOTECA


Ant�nio Leal, Biblioteca da M. 1

17.9.05
 


SEGUREM-ME SFF 2

Muitos leitores acertam no Rubirosa, (que n�o est� esquecido e de quem acabou de sair uma biografia de Shawn Levy, The Last Playboy: The High Life of Porfirio Rubirosa), nenhum at� agora no Huey P. Long. E no entanto, s�o t�o parecidos, s�o t�o iguais. Mas, seguro eu estou na minha rocha.
 


O QUE SE APRENDE LENDO OS JORNAIS



Muita defesa do indefens�vel Carrilho se l� nos jornais! Como, se ele � atacado? Simples: h� uma linha cl�ssica de defesa quando se comete uma asneira grossa e t�o evidente que n�o vale a pena escond�-la, que � meter tudo no mesmo saco e dizer que todos cometeram asneiras. � educativo ver o tratamento editorial do debate tumultuoso entre Carrilho e Carmona, que qualquer observador na Terra ou em S�rius, percebe que foi muito mais um resultado do "estilo" Carrilho do que de Carmona, culminando em dois gestos antag�nicos (cumprimentar /recusar o cumprimento) que revelam a abissal diferen�a, para ver que as asneiras de Carmona, que tamb�m as houve, n�o podem ser reduzidas a um injusto e igualizador �insultos de parte a parte�, ou outras variantes. Exemplos para n�o se dizer que n�o os dou: aqui, , aqui (Jo�o Pedro Henriques, Frente-a-frente resumido a um aperto de m�o e a uma casa de banho, sem liga��o) aqui (Fernando Madrinha, Bem podem prometer a lua..., sem liga��o) e em muitos outros s�tios. (J� agora n�o � segredo para ningu�m que apoio Carmona, mas, se pensam que � por isso que escrevo o que escrevo, n�o vale a pena perderem tempo a ler o Abrupto.)

No fundo, n�o � novidade: quando M�rio Soares se candidatou, subitamente os aspectos negativos incontroversos que foram apontados como �bices � candidatura de Soares, e que s� ele suscitara, a idade, a falta de novidade, o "mais do mesmo", o bloqueio � renova��o, etc., passaram a ser defeitos dos dois candidatos, Cavaco e Soares. Meter tudo no mesmo saco. Para se comparar veja-se como o elevado debate dos "sif�es", na Assembleia da Madeira, ficou a penalizar s� um lado, Jardim, o "Jaiminho", o jumento, etc., poupando o PS/Madeira e n�o houve a� equidist�ncia para se meterem os dois no mesmo saco.
 


COISAS COMPLICADAS:
L'EN-DEHORS



Th�ophile Steinlen

"Celui que rien n'enr�le et qu'une impulsive nature guide seule, ce hors la loi, ce hors d'�cole, cet isol� chercheur d'au-del� ne se dessine-t-il pas dans ce mot : L'EN-DEHORS ? "
Zo d'Axa (Anarchiste n� 8 � 11, Julho a Outubro 1930).
 


EARLY MORNING BLOGS 603

Meu corpo, que mais receias?


-Meu corpo, que mais receias?
-Receio quem n�o escolhi.

-Na treva que as m�os repelem
os corpos crescem trementes.
Ao toque leve e ligeiro
O corpo torna-se inteiro,
Todos os outros ausentes.

Os olhos no vago
Das luzes brandas e alheias;
Joelhos, dentes e dedos
Se cravam por sobre os medos...
Meu corpo, que mais receias?

-Receio quem n�o escolhi,
quem pela escolha afastei.
De longe, os corpos que vi
Me lembram quantos perdi
Por este outro que terei.


(Jorge de Sena)

*

Bom dia!

16.9.05
 


RESPONSABILIDADE, CREDIBILIDADE E CONFIAN�A



(No P�blico de ontem.)

Os pol�ticos costumam ser responsabilizados por todas as coisas, muitas vezes injustamente. H� por�m uma coisa pela qual s�o quase que inteiramente respons�veis: a exist�ncia de um clima de credibilidade das institui��es que gere factores de confian�a. � certo que, mesmo quando cumprem plenamente as suas obriga��es, t�m que defrontar uma permanente cultura de cinismo da comunica��o social, o "ninho de v�boras" como lhe chamava h� anos uma das mais prestigiadas revistas americanas que estuda o jornalismo, e isso cria dificuldades cada vez maiores, �s vezes mais aos bons pol�ticos do que aos maus. A comunica��o social pode critic�-los e diminui-los todos os dias, mas "gosta" de Ferreira Torres ou Valentim Loureiro, porque eles produzem espect�culo.

A credibilidade das institui��es, � tamb�m responsabilidade dos grandes corpos do estado, t�o politizados como os pol�ticos, cada vez mais produzindo um ru�do de descr�dito p�blico, que se soma � crise das institui��es, como infelizmente acontece com a justi�a, com corpos de seguran�a como os bombeiros, com sectores das for�as armadas e do funcionalismo p�blico. Tudo isto conta, mas, mesmo assim, como numa democracia quem legisla para as for�as armadas, a justi�a, as for�as de seguran�a, s�o os pol�ticos, � deles a responsabilidade �ltima se esses corpos do estado entram em disfun��o.

Agora vamos aos "ora". Ora, n�o haver� ningu�m hoje em Portugal que n�o refira a crise de credibilidade do sistema pol�tico e dos seus agentes, como um elemento fundamental na descren�a da sociedade portuguesa no seu futuro, a come�ar pelo cidad�o comum e a acabar nos agentes econ�micos. Existe hoje um grav�ssimo problema de crise de confian�a, que, sendo subjectivo, tem poderosos efeitos objectivos. Quando um empres�rio decide n�o investir, um jovem cientista ou profissional de m�rito percebe que s� tem carreira no estrangeiro, um politico capaz manda os partidos e o parlamento �s malvas, porque se sente impotente, ou uma fam�lia n�o poupa porque acha que n�o vale a pena dado que o dinheiro desaparece de qualquer maneira e mais vale gast�-lo, � de confian�a que falamos e dos efeitos devastadores da sua falta.

Ora, desde Mar�o, que temos um novo governo, feito de fresco, dotado de uma maioria absoluta no parlamento, legitimado tanto quanto o pode ser um governo em democracia. Um governo com tudo para ser forte, e no entanto� Ora, este governo durante o seu per�odo crucial do "estado de gra�a", nos �ltimos seis meses, deveria gerar uma invers�o da curva da desconfian�a, deveria, pelo pr�prio facto de existir e ser, em teoria, um "governo forte", gerar confian�a.

Ora, acontece exactamente o contr�rio, os n�veis de confian�a baixam para patamares de verdadeira depress�o nacional, e, mesmo pequenas flutua��es que existam, revelam que, tendo tudo para gerar confian�a, este governo minou a confian�a. E aqui voltamos aos pol�ticos, � responsabilidade e � credibilidade.

N�o se trata de confundir popularidade e confian�a. Um governo pode descer nas suas taxas de popularidade e aumentar a confian�a, coisa que me parece quase inevit�vel nos dias de hoje em que governar bem � tomar medidas dif�ceis. O problema � outro, � que um governo n�o pode tomar medidas, umas a seguir �s outras, que agravam o descr�dito da ac��o pol�tica e destroem a j� de si escassa confian�a existente sem s�rias consequ�ncias. A arrog�ncia do Primeiro-ministro pode fazer de conta que quer pode e manda, mas, mais cedo do que tarde, pagar� o seu custo. Ele e n�s.

Na lista das medidas que minam a credibilidade, est�o duas � cabe�a, a falsa promessa eleitoral sobre os impostos e a demiss�o do ministro das finan�as quando este contestou a compatibilidade do grande programa de obras p�blicas com a necessidade de conten��o financeira do estado. S�o ambas graves, a dos impostos porque acrescenta mais uma t�bua no caix�o da credibilidade das promessas eleitorais, e a demiss�o do ministro, porque ele era tido como um penhor da capacidade do governo em tomar medidas de conten��o que todos sabem dif�ceis. A sua sa�da significou que o �mpeto inicial n�o era um verdadeiro �mpeto, mas um surto sem continuidade, que ficaria, desgarrado e in�til, no meio de um progressivo retorno � realidade gastadora. O sil�ncio sobre o pr�ximo or�amento de estado, seja ele qual for, pode aprofundar esta descren�a. Se o or�amento for duro e austero, deveria impedir as mil e uma promessas aut�rquicas dos candidatos do partido do governo que nunca ir�o ser cumpridas, se for laxista e inconsequente, confirmar� o significado da sa�da do ministro das finan�as. � o que d� este tipo de actua��o, perde-se sempre.

Mas o pior � que se continuou depois, dia ap�s dia, a minar a confian�a, com os actos absolutamente lament�veis das nomea��es de personalidades do aparelho socialista, sem compet�ncia espec�fica, para altos cargos no sistema de empresas p�blicas. O afastamento da administra��o da CGD por raz�es que nada tem a ver com a sua gest�o, mas com a confian�a pol�tica, � um terramoto cujas consequ�ncias ainda n�o acabaram. A principal institui��o banc�ria do estado, passou a ter uma cadeia pol�tica de comando, particularmente grave na �rea do cr�dito, que "politizado", � um instrumento de manipula��o poderoso na �rea econ�mica. O sinal j� foi percebido, e a confian�a afunda-se.

A escolha de um deputado do PS, antigo ministro e porta-voz do partido para a �rea das finan�as, para presidir ao Tribunal de Contas mostra como o governo est� disposto a tudo e � capaz de tudo, para minimizar o sistema de "checks and balances" fundamentais num estado democr�tico. Por muito menos, algu�m que todos conhecemos, falaria do seu "direito � indigna��o" pela "ditadura da maioria".

N�o est� em causa a pessoa, mas a oportunidade e o sinal que se d�. Mais tarde, estar� em causa tamb�m a pessoa, e n�o compreendo como � que um homem prudente como o Guilherme Oliveira Martins n�o o antev� com clareza. Estar� a pessoa, porque o estilo am�vel e protector com que gerir� o Tribunal de Contas, se n�o p�e em causa nem a sua compet�ncia, nem a sua honestidade, p�e em causa a sua capacidade de usar os instrumentos do controlo das contas do estado e das autarquias com agressividade, hoje mais que nunca necess�ria. � como com a luta contra a corrup��o, a subst�ncia � fundamental, mas o estilo conta muito. A independ�ncia de um Presidente do Tribunal de Contas tamb�m se mede a�, na consci�ncia da urg�ncia de boas pr�ticas para os dinheiros p�blicos, que, se for exercida, o far� entrar em choque quase imediato com os interesses do governo e do PS nas autarquias. Guilherme de Oliveira Martins � um "homem de di�logo", e o Presidente do Tribunal de Contas, no nosso estado e nos dias de hoje, n�o pode ser um "homem de di�logo".

Temo que este despudor funcional, em que pouco importa o p�r em causa a independ�ncia de corpos fundamentais do estado para proteger o governo, chegue aos servi�os de informa��o e seguran�a, onde j� h� bastante partidariza��o, quer do PS, quer do PSD. Todas estas institui��es s�o cruciais para que haja um m�nimo de autoridade do estado, deviam ser mexidas com pin�as, e o PS p�e-lhe as m�os todas e sem luvas, tanta � a gan�ncia de exercer o poder sem controlo.

*

Para a semana, voltaremos a este assunto, porque esta quest�o da credibilidade e da confian�a, ser� a mais importante condicionante do processo eleitoral das Presidenciais. Aqui tamb�m, o PS e o governo, actuaram de modo a minar a credibilidade e a confian�a, escolhendo M�rio Soares. Como se v� pela forma como est� a decorrer a pr�-campanha, tal como � revelada pelo aspecto qualitativo das sondagens, M�rio Soares hoje n�o acrescenta nada � confian�a no sistema pol�tico, perdendo para Cavaco Silva em todos os elementos qualitativos da credibilidade mo julgamento dos portugueses. Nas sondagens, estes s�o os �nicos resultados que v�o para al�m da primeira volta.
 


SEGUREM-ME SFF

De h� muito tempo que tento evitar fazer duas magn�ficas e certeiras compara��es entre pol�ticos portugueses e duas personagens �larger than life�, com que eles se parecem em quase tudo. Quase tudo. Mim�ticos at� ao limite do espelho. Depois fa�o censura. Seguro-me, digo aos outros para me segurarem. N�o, n�o escrevas esse artigo sobre Porf�rio Rubirosa e a sua c�pia nacional. J� ningu�m sabe quem ele �, deixa o homem sossegado. Mas � exactamente igual, v� aquela hist�ria das dragas com a Flor de Oro Trujillo � Seguro-me, seguram-me.

E o outro? O outro � Huey P. Long, o governador da Louisiana, que muitos americanos (principalmente fora da Louisiana) consideram que foi o melhor candidato a �ditador� que a Am�rica jamais teve, lembrado ainda hoje com saudade nos bayou. �Se n�o o tivessem morto, chegava a Presidente�. Tamb�m c� temos o nosso, falando alto e grosso, t�o, t�o, t�o parecido nos discursos, no justicialismo, na �obra feita�. Deixa l� isso, ningu�m sabe quem foi esse Long, s� te metes em sarilhos, depois ele insulta-te, n�o vale a pena� Seguro-me, seguram-me.

Pois �, mas o Rubirosa e o Long s�o t�o parecidos com as nossas vers�es, ao menos podia fazer uma coisa neutra, distante, biogr�fica, americana, dominicana, seja l� o que for�
 


AR PURO / COISAS SIMPLES


Clifford Ross, Hurricane III
 


EARLY MORNING BLOGS 602:
"SEI MUITO BEM QUE SOUBE SEMPRE UMAS COISAS"

voz numa pedra


N�o adoro o passado
n�o sou tr�s vezes mestre
n�o combinei nada com as furnas
n�o � para isso que eu c� ando
decerto vi Os�ris por�m chamava-se ele nessa altura Luiz
decerto fui com Isis mas disse-lhe eu que me chamava Jo�o
nenhuma nenhuma palavra est� completa
nem mesmo em alem�o que as tem t�o grandes
assim tamb�m eu nunca te direi o que sei
a n�o ser pelo arco em flecha negro e azul do vento

N�o digo como o outro: sei que n�o sei nada
sei muito bem que soube sempre umas coisas
que isso pesa
que lan�o os turbilh�es e vejo o arco �ris
acreditando ser ele o agente supremo
do cora��o do mundo
vaso de liberdade expurgada do menstruo
rosa viva diante dos nossos olhos
Ainda longe longe essa cidade futura
onde �a poesia n�o mais ritmar� a ac��o
porque caminhar� adiante dela�
Os pregadores de morte v�o acabar?
Os segadores do amor v�o acabar?
A tortura dos olhos vai acabar?
Passa-me ent�o aquele canivete
porque h� imenso que come�ar a podar
passa n�o me olhas como se olha um bruxo
detentor do milagre da verdade
a machadada e o prop�sito de n�o sacrificar-se
n�o construir�o ao sol coisa nenhuma
nada est� escrito afinal


(M�rio Cesariny)

*

Bom dia!

15.9.05
 


OUVINDO "MALINCOLIA, NINFA GENTILE"
(VINCENZO BELLINI)



Malinconia, Ninfa gentile,
la vita mia consacro a te;
i tuoi piaceri chi tiene a vile,
ai piacer veri nato non �.

Fonti e colline chiesi agli Dei;
m'udiro alfine, pago io vivr�,
n� mai quel fonte co' desir miei,
n� mai quel monte trapasser�.


(Ippolito Pindemonte)
 


INTEND�NCIA

Actualizadas as notas COISAS DA S�BADO: A �INFOROPINI�O�, A INFORMA��O A QUE TEMOS DIREITO (1) e (2).
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
KATRINA, AMERICA, FOGOS, IMAGENS, PALAVRAS



A prop�sito dos seus textos e de outros colunistas sobre o tratamento dado pelos "media" portugueses, deixe-me desabafar um pouco. Eu tamb�m acho que existe uma antiamericanismo hip�crita em cronicas que apareceram por a�, mas o que agora se pretende � passar para o outro lado, ou seja, para o tempo em que atacar-se o partido comunismo era fazer o jogo da reac��o.

Comparar os fogos com o Katrina s� tem um ponto em comum: s�o cat�strofes da natureza, mesmo se no caso dos fogos existam fogos postos. Tudo o resto passa por muita demagogia. Se num caso n�o se deve cair no caminho esquerdista de ver s� agora a pobreza nos EUA ou a desigualdade entre brancos e outras etnias, tamb�m n�o se deve insinuar que no caso portugu�s os fogos atacaram s� os mais desfavorecidos. N�o � verdade e tamb�m n�o � verdade qe os p�s cat�strofes sejam identicas nos dois casos. Contrariamente ao que tamb�m diz muita imprensa, em particular na TV as pessoas n�o ficaram, genaricamente,na mis�ria ap�s os fogos. Sustentar isto � n�o perceber nada do que se passa no interior ruram de Portugal em termos de economia das pessoas.
Disto isto e sem ilus�es � ou n�o verdade que foi substimado o tornado? Que falhou a evacua��o? Se acontecesse c� o JPP n�o estaria na primeira linha da den�ncia da situa��o? Penso que sim.

No caso portugu�s fala-se muito de combate e preven��o aos fogos,mas sinceramente ningu�m fala a s�rio ou percebe muito do assunto, pelos menos os que leio e vejo na TV. Os governos, todos t�m demonstrado pouco perceber do assunto e por isso vemos as figuras tristes que fazem quando falam (ex: Ant�nio Costa) falando e nada dizendo. Fogem ent�o para a frente e prometem mundos e fundos, gastando dinheiro que n�o vai resolver nada.

Para al�m dos combates ideol�gigos que se travam entre os pr� e contra qualquer coisa existem pessoas. Problemas humanos. � sobre esses que gosto de falar e ouvir falar. Tentar perceber. E isso n�o � f�cil neste tempo sem muitas ideias e demasiadas acusa��es.

(Jo�o Leit�o)

*

(...) Gostaria de lembrar que o pr�prio Bush alimenta estas interpreta��es pseudo-teol�gico-escatol�gicas (ou seja l� o que lhe quiserem chamar).
Existe um artigo muito interessante sobre isso aqui

(Cl�udia Silva)

*

H� (...) uma mat�ria onde nunca consegui ver nos seus argumentos suporte bastante para as conclus�es que tira: trata-se do que designa por antiamericanismo ou, na vers�o mais emotiva, antiamericanismo prim�rio.
Permita-me, a este prop�sito, um coment�rio ao seu artigo "Sodoma e Gomarra".

Espanto-me com a sua sanha no ataque a quem pensa, e o expressa, p.e., que os EUA fazem t�bua rasa do direito internacional quando os seus interesses est�o em jogo (caso do Iraque, entre muitos conhecidos), ou que os EUA t�m debilidades estruturais gritantes (caso Katrina, que exp�s algumas das muitas que muitos desconheciam).
Espanto-me, sobretudo, quando esse mesmo ataque come�a por constatar os factos, e assim reconhecer pertinentes as raz�es que levam � forma��o da opini�o (que designa de antiamericana) que t�o �speramente contesta.

No artigo referido come�a por dar como incontest�vel, p.e., que "alguma [...] coisa correu muito mal nos primeiros dias no apoio �s v�timas do furac�o Katrina" e que "parte [...] do que correu mal se deve � administra��o federal do Presidente Bush", para, sem mais, manifestar a sua indigna��o com o que considera ser a "histeria anti-Bush, e antiamericana que varreu a comunica��o social" aproveitando os ventos do Katrina.

Indigna��o esta ampliada pelo facto de n�o ser "apenas a guerra do Iraque, embora esta seja um irritante [para quem ?] muito especial, s�o muito mais coisas, � a "superpot�ncia", � o sistema econ�mico, � o "imperialismo" cultural de Hollywood, � a globaliza��o, s�o os McDonalds, s�o os alimentos geneticamente modificados, � o Deus das notas do d�lar". Estes pol�micos temas apenas s�o elencados, parecendo, contudo, que a mera abordagem dos mesmos � para si, no m�nimo irritante e, quase certamente, sinal de antiamericanismo prim�rio. Como se estas fossem quest�es menores ou definitivamente (bem) resolvidas e n�o fossem, entre outras, o �mago da "discuss�o" - a manter, como, apesar de tudo, espero nos deixem.

Reconhecendo, mais abaixo, que "A pobreza esteve l� sempre, nuns s�tios mais, noutros menos. A desigualdade social tamb�m", continua a indignar-se com o que considera ser a transforma��o das v�timas do furac�o em "bandeira para mostrar que o sistema � mau e o Presidente p�ssimo".
Termina em grande, pondo no mesmo p� "os fundamentalistas da Al-Qaeda", os "do Bible belt" e quem diga mal dos males da Am�rica- j� que todos considerar�o a desgra�a do Katrina um castigo de Deus, ao estilo de Sodoma e Gomarra.

Espanto-me, pois, com o que parece ser uma posi��o de defesa a qualquer custo dos EUA, independentemente das raz�es que assistam a quem critica as suas (muitas) op��es reconhecidamente erradas ou as suas (muitas) omiss�es escandalosas ou as suas (muitas) actua��es ao arrepio do direito internacional, ou ainda as suas (muitas) debilidades pol�ticas e sociais.
Espanto-me tanto mais quanto os EUA n�o precisam de quem os defenda, tal o n�mero coisas boas que deram ao mundo e tal o seu poderio, nomeadamente em termos de influ�ncia da opini�o p�blica mundial, em geral, e do mundo ocidental, em particular.

N�o deixa de ser curioso verificar que inicia o seu artigo fazendo um reconhecimento das raz�es que aos designados antiamericanos assitem, antes de passar a zurzir nas opini�es que nelas se suportam. Como se fizesse uma concess�o ao advers�rio, mas ganhando balan�o para o arremesso.

Posi��o id�ntica, ali�s, � de quem se sente na obriga��o de afirmar a sua simpatia pelos EUA antes de criticar qualquer das suas facetas. Tal como as cr�nicas de contesta��o � invass�o do Iraque, as quais, para serem "cred�veis", t�m de come�ar por afirmar o �bvio: a condena��o do terrorismo, a indigna��o pelas vitimas inocentes, etc.

Uns e outros necessitam de demonstrar, � partida, a sua seriedade. Ou desculparem-se (m� consci�ncia?) de ter aquela opini�o..
N�o poucos, todavia, defendem-se apenas do estigma de antiamericanismo prim�rio, chav�o nada inocente utilizado at� � exaust�o por uma cultura maniqueista cegamente (?) pro-americana. T�o maniqueista e cega como a dos tempos em que os estalinistas se idignavam e irritavam com qualquer cr�tica � ex-URSS, designando-a de imediato como anti-comunismo prim�rio.

Permita-me que lhe lembre que tudo tem a ver com tudo. Se alguns comentadores se suportam no Katrina e nas suas consequ�ncias para reflectir sobre a realidade dos EUA e do mundo, n�o deve tal ser visto conspira��o anti qualquer coisa ou mera indig�ncia mental, mas antes como o direito de express�o de quem pensa diferente e tem a coragem de o expressar, como, ali�s, o senhor faz.

N�o pode, nem deve, um comentador intelectualmente honesto constatar que os diques rebentaram e omitir que tal ocorreu porque n�o houve investimento p�blico para a sua que consolida��o. Tal como n�o pode, nem deve, constatar que a quase totalidade das v�timas s�o negras e pobres e omitir as raz�es, sociais e pol�ticas, do facto. Da mesma forma, n�o pode, nem deve, deixar de real�ar que, nos EUA - onde nos ensinaram a esperar a melhor organiza��o e efic�cia -, um imenso leito de cheia tenha sido ocupada por aglomerados habitacionais, em conviv�ncia com ind�strias e equipamentos estruturantes, para al�m de poluentes,sem que fossem garantidas, como se demonstrou, as condi��es m�nimas de seguran�a. Destes e doutros factos, porque actuais, porque relevantes e porque significativos, n�o podemos exigir aos comentadores que soneguem as causas, n�o associem outros, ou n�o extrapolem consequ�ncias.
Por outro lado, ser� de ter em conta que o algo de menos agrad�vel que agora venha a ser dito est� largamente contrabalan�ado com o imenso caudal de informa��o positiva sobre os EUA que ao longo dos anos desaguou e vai continuar a desaguar sobre as cabe�as pensantes e n�o pensantes dos cidad�os deste mundo. Condutores deste caudal n�o faltam.

Por �ltimo, um coment�rio � invoca��o do exemplo b�blico do castigo de Deus.
Para al�m de algo despropositado, parece-me claramente infeliz: � que, do que conhecemos, o que alguma vez mais se aproximou do que ter� acontecido em Sodoma e Gomarra, foi Hiroshima e Nagasaki. Obra dos humanos que sabemos e sem, quero acreditar, o assentimento de Deus. Obra que nos envergonha a todos. N�o podemos dizer o mesmo do Katrina, que apenas envergonhar� alguns.

(M.J.Correia)

*

Li o seu texto do "P�blico" reproduzido no seu "blog" com o qual concordo parcialmente ( n�o tenho a opini�o de que toda a imprensa europeia imputou a Bush e � sua pol�tica a causa da "n�o ajuda atempada" ou a da "pobreza" nos Estados Unidos ).

No entanto fiquei admirado por n�o ouvir refer�ncia entre o contraste da onda de solidariedade europeia ( e em particular a portuguesa ) que ocorreu quando do tsunami - a maior de que me recordo - e a de agora, que practicamente n�o existiu.

Apenas porque uns eram muito pobres ( os asi�ticos ) e os outros apenas pobres ( os americanos ) ? Porque no tsunami morreram alguns milhares de europeus e agora n�o ?

N�o sei as respostas, mas parece-me que estamos um pouco ( muito ) indiferentes ao que se passa nos EUA. E a culpa n�o � s� dos org�os de comunica��o europeus, mas nuito tamb�m da pol�tica do "MacDonalds" a que ouvi chamar h� muitos anos na Alemanha como "a Embaixada dos EUA" .

(Feliciano Antunes)

*

Tenho lido em alguns blogues da nossa pra�a uma teoria que defende que nas anteriores cat�strofes naturais ocorridas nos EUA a resposta por parte das entidades p�blicas foi muito mais eficaz do que a que ocorreu agora em New Orleans. Uma das cat�strofes citadas � o terramoto de 1906 em San Francisco.

N�o me parece que quem defende esta teoria particular esteja historicamente correcto. Deixo aqui notas do testemunho de Jack London, o famoso escritor americano, que se encontrava na altura por aquelas paragens:

- "Not in history has a modern imperial city been so completely destroyed.
San Francisco is gone. Nothing remains of it but memories and a fringe of dwelling-houses on its outskirts. Its industrial section is wiped out. Its business section is wiped out. It social and residential section is wiped out. The factories and warehouses, the great stores and newspaper buildings, the hotels and palaces of the nabobs, are all gone.

Within an hour after the earthquake shock the smoke of San Francisco's burning was a lurid tower visible a hundred miles away. And for three days and nights this lurid tower swayed in the sky, reddening the sun, darkening the day, and filling the land with smoke.

There was no opposing the flames. There was no organization, no communication. All the cunning adjustements of a twentieth century city had been smashed by the earthquake. The streets were humped into ridges and depressions, and piled with the debris of fallen walls.

Dynamite was lavishly used, and many of San Francisco's proudest structures were crumbled by man himself into ruins, but there was no withstanding the onrush o' the flames. Time and again successful stands were made by the firefighters, and every time the flames flanked around on either side, or came up from the rear, and turned to defeat the hard-won victory.

On Thursday morning, at a quarter past five, just twenty-four hours after the earthquake, I sat on the steps of a small residence on Nob Hill. I went inside with the owner of the house on the steps of which I sat. He was cool and cheerful and hospitable. "Yesterday morning," he said, "I was worth six hundred thousand dollars. This morning this house is all I have left. It will go in fifteen minutes."

He pointed to a large cabinet. "That is my wife's collection of china. This rug upon which we stand is a present. It cost fifteen thousand dollars. Try that piano. Listen to its tone. There are few like it. There are no horses.
The flames will be here in fifteen minutes."

Outside, the old Mark Hopkins residence, a palace, was just catching fire.
The troops were falling back and driving the refugees with them. From every side came the roaring of flames, the rashing of walls, and the detonations of dynamite
".

(Carlos Costa)

*

(...) Tendo isto em considera��o, em primeiro lugar, parece-me que a surpresa hip�crita que diz existir nos media (nalguns casos ser� mesmo assim, n�o duvido) por fingir a descoberta da pobreza (que antes estaria escondida) nos EUA, poder� estar a ser mal interpretada.

Por mim falo quando me confesso surpreso, e consternado, n�o porque os pobres existem ali, n�o porque s�o na sua vasta maioria pretos, mas sim porque foram inequivocamente discriminados e negligenciados em favor de outros grupos sociais. Se se tratou de racismo puro e duro, pela cor da pele, ou racismo social, n�o sei. Qual deles ser� pior?

Mesmo que, at� poderei conceder isto no limite, n�o tenha havido discrimina��o alguma e simplesmente quem tinha posses e meios p�de fugir e quem n�o tinha n�o p�de, a surpresa prende-se com a n�o protec��o e ajuda aos que mais precisaram.

Talvez existam mais pessoas que se reconhe�am nesta surpresa do que no espanto pela descoberta de pobres, e pretos, nos EUA, em particular no Sul. E talvez seja isso que leve os media a procurar as raz�es da inac��o e da imprepara��o das autoridades.

Em segundo lugar, ser� leg�timo comparar esta situa��o com a do Tsunami? O Katrina quando chegou a NO era j� um furac�o de grau 4 e os maiores estragos e v�timas n�o foram causadas directamente por ele mas sim pelas inunda��es que ocorreram ap�s o rebentamento dos diques. E s�o estas inunda��es as respons�veis pelos dramas de isolamento e salvamento que t�m deliciado os notici�rios.

Ent�o, por um lado, (ao que parece) n�o existem grandes imagens do furac�o e, por outro, mesmo que existam, estas n�o colhem tanta audi�ncia como os dramas humanos que por ali subsistem mesmo a pedir uma c�mara de televis�o.

Esta � uma situa��o bem distinta da do Tsunami. Isto pode ser tudo muito critic�vel, e �-o de certeza, mas n�o em sede de anti-americanismo, neste caso.

(Pedro Filipe da Silva Gaspar)
 


AR PURO


Albert Bierstadt, Evening Glow, Lake Louise
 


EARLY MORNING BLOGS 601:
"COMO PASSAREI SEM PONTE?"


Pastoral

Mote

Vai o rio de monte a monte,
Como passarei sem ponte?

Voltas

� o vau mui arriscado,
S� nele � certo o perigo;
O tempo como inimigo
Tem-me o caminho tomado.
Num monte est� meu cuidado,
E eu, posto aqui noutro monte,
Como passarei sem ponte?

Tudo quanto a vista alcan�a
Coberto de males vejo:
D'aqu�m fica meu desejo
E d'al�m minha esperan�a.
Esta, cont�nua, me cansa
Porque est� sempre defronte:
Como passarei sem ponte?

(Francisco Rodrigues Lobo)

*

Bom dia!

14.9.05
 


COISAS DA S�BADO:
A �INFOROPINI�O�, A INFORMA��O A QUE TEMOS DIREITO (2)



O PODER DE CLASSIFICAR

Uma das caracter�sticas da �inforopini�o� est� em reclamar unilateralmente o poder de nomear, mesmo � revelia dos nomeados. No que diz respeito �s classifica��es pol�ticas esse poder de nomear, de chamar um nome, de impor uma classifica��o a algu�m, � ele pr�prio impregnado de pol�tica. � pol�tica, n�o � jornalismo, porque essas classifica��es n�o s�o neutras, nem meramente descritivas. N�o � preciso ir mais longe do que a hist�ria do �PPD-PSD�, ou a flutua��o entre CDS e PP, que traduz muito da hist�ria recente do CDS-PP.

Pois bem, em que manual de estilo, c�digo deontol�gico, ou outro c�digo de normas se baseiam os jornalistas para usarem indiscriminadamente como agora usam a classifica��o de esquerda / direita? Em nenhum, apenas numa generaliza��o de uma classifica��o que tinha entrado em desuso no sistema pol�tico portugu�s at� que foi retomada pelo PP de Portas e pelo BE como instrumento identit�rio. Hoje, a classifica��o esquerda / direita � redutora e serve principalmente o discurso da esquerda, e depois da direita mais radical.

Os jornalistas que n�o chamam, por norma, ao BE um partido de extrema-esquerda, nem ao PP [de Portas] , de extrema-direita, o que podiam fazer em bom rigor, por que raz�o chamam ao PSD um partido de direita e n�o de centro, o que tamb�m se poderia justificar quando se usa estas classifica��es? Se fossemos por aqui ver-se-ia bem como o poder de nomear tem claros efeitos na luta pol�tica. Sendo assim, que direito tem um jornalista numa not�cia de distribuir classifica��es de direita e de esquerda para grupos pol�ticos que nelas n�o se reconhecem? Nenhum.

*

Li atenta e repetidamente o seu "post" a prop�sito do "Poder de Classificar" e questiono-me se o terei percebido de uma forma demasiado simplificada.

Est�-se � procura de jornalistas objectivos, que sejam imunes � utiliza��o da terminologia comum, cinjindo-se �s designa��es oficiais? N�o sou jornalista, tamb�m n�o tenho particular estima pela classe, mas penso que a sua censura aponta para algo de demasiado ut�pico.

Talvez alguns fa�am as classifica��es que descreve motivados por raz�es de caracter estritamente pol�tico, s� que possivelmente a maioria dos jornalistas fa-lo-� por um prosaico arrastamento que se estender� depois aos leitores.

� prosaico, tem muito de moda, � pouco aprofundado, mas � que o fez vender o "Equador" e o livro do Jos� Gil, ainda faz vender "Expressos" e torna interessantes as piadas a prop�sito das interven��es televisivas de Ant�nio Vitorino e de Jorge Coelho.

No caso concreto que aponta, o Sr., que at� goza, como comentador e colaborador, de uma posi��o �mpar em v�rios �rg�os de comunica��o social, pode tentar neutralizar a classifica��o do PSD como partido de direita. At� pode ser que n�o consiga. Porque a localiza��o fa�a algum sentido.

� que suponho que tamb�m o PC gostaria que muitas das suas actividades fossem noticiadas como as da grande "coliga��o unit�ria" de que faz parte... Mas confesso-lhe que o mito da FEPU, da APU, da CDU (est� quase a celebrar os 30 anos...) j� est� bastante gasto. E n�o posso censurar nenhum jornalista por n�o lhe prestar aten��o nenhuma.

(A.Teixeira)
 


COISAS DA S�BADO:
A �INFOROPINI�O�, A INFORMA��O A QUE TEMOS DIREITO (1)



Se em Portugal para cobrir os inc�ndios se usasse a mesma linguagem que se usou para falar dos EUA e de Bush, tinha ca�do o Carmo e a Trindade, mais v�rias igrejas de Lisboa. E bem, porque informa��o � informa��o e opini�o � opini�o. N�s c� temos �inforopini�o�, nem uma coisa nem outra, ou pior, opini�o disfar�ada de informa��o. A �inforopini�o� � um dos ramos do �politiqu�s�, muito praticado pelos jornalistas. Os jornais, com o estilo das not�cias assinadas que misturam factos com julgamentos de valor, as televis�es com os pivots dos telejornais fazendo coment�rios e �bocas� pessoais, resultam numa polui��o do espa�o p�blico, com efectivos resultados no incremento da desinforma��o.

Quando se diz isto, em particular nos momentos quentes, quando produzir �inforopini�o� vai de vento em popa, quando se est� a ganhar a batalha da pol�tica produzindo �inforopini�o� e garantindo a press�o desta nova forma de pensamento �nico, denuncia-lo leva tamb�m � queda do Carmo e da Trindade e v�rias igrejas de Lisboa. Que se quer matar o mensageiro, que se � mais papista do que o Papa, que todos dizem o mesmo, at� gente que est� do �outro lado�, que vultos importantes e s�bios e respeitados n�o duvidam que � assim. Ningu�m se interroga porque raz�o, no mundo dividido dos dias de hoje, h� tanta unanimidade.

Voltemos ao tratamento dos inc�ndios em contraste com o do Katrina. Nos inc�ndios portugueses se se seguissem as mesmas normas discursivas, Portugal n�o seria referido pelo nome, mas como �um dos pa�ses mais pobre da Europa� (um equivalente � �superpot�ncia�, nome que os EUA passaram a ter) e S�crates como o �veraneante do Qu�nia�, quando desaparecido, e, quando aparecido, como querendo remediar a sua imagem procurando uma �photo-opportunity�. Teria � sua frente um tribunal de responsabilidade imediata, em contraste com uma comunica��o que tendeu a isentar S�crates de qualquer responsabilidade. Bush balbuciaria sobre outras causas naturais e artificiais, como S�crates fez de modo mais arrogante, mas ningu�m permitiria que tudo deixasse de ser da sua �nica e exclusiva responsabilidade.

Se estes exageros s�o inadmiss�veis por c�, porque � que s�o leg�timos l�?

UMA FUN��O QUE FALTA POR C� E QUE ABUNDA POR L�

Para dirimir este tipo de conflitos interpretativos, e saber quem tem raz�o, existem meios, estudos, an�lises. Esta � uma fun��o que falta por c�, e, por acaso, abunda por l�, na �superpot�ncia� - a an�lises a tempo relativamente curto, do bias comunicacional, do mau jornalismo, do �jornalismo de causas�, uma contradi��o entre os termos. Uso a palavra inglesa bias porque n�o h� nenhuma em portugu�s que forne�a o mesmo conceito (*): n�o � s� a manipula��o, ou o car�cter tendencioso, � mais do que isso, � a an�lise do conjunto de preconceitos, posi��es aprior�sticas, que condicionam volunt�ria e involuntariamente a informa��o, a que se soma como � evidente o trabalho de m� qualidade. N�o me refiro ao coment�rio, nem aos editoriais, onde o �nico problema que existe � o do saber se h� pluralismo ou n�o. Refiro-me �s not�cias, a parte nobre do jornalismo, a que justifica o jornalismo � contar-nos o que se passa, para n�s tirarmos as nossas conclus�es, o contr�rio da �inforopini�o�.

� verdade que � terreno muito minado, por grupos de press�o pol�ticos e de interesse, mas h� tamb�m muita universidade nesta �rea em que professores e alunos poderiam fornecer estudos a tempo de servirem para alguma coisa, nem que seja para que uma sempre pequen�ssima parte da opini�o p�blica possa julgar sobre o produto que lhe est� a ser dado. Analisamos os iogurtes com crit�rios de qualidade alimentar, n�o analisamos jornais e televis�es com crit�rios de qualidade intelectual, justi�a, apego � verdade. Palavras, dizem alguns c�nicos. Pois �, s�o palavras, mas quando faltam os comportamentos a que elas correspondem, sofremos ainda mais do que com um iogurte estragado.

Digo isto por interesse pr�prio, porque sou um cr�tico do jornalismo que se faz em Portugal, com as habituais excep��es, e j� estou um pouco farto de ver os estudos a posteriori mostrar aquilo que era mais do que evidente na altura, mas, quando se dizia, fazia a classe subir pelas paredes das palavras acima. Por exemplo, que M�rio Soares gozava ( e goza) de um tratamento privilegiado na comunica��o social portuguesa e que manipulou os jornalistas quando da sua Presid�ncia. Por exemplo, que o tratamento comunicacional da quest�o de Timor pouco teve a ver com jornalismo nos momentos cr�ticos do referendo. Por exemplo, que o conflito israelo-palestiniano � sistematicamente representado a favor dos palestinianos. H� muitos etc.

Nestas alturas cr�ticas, em que o seu pr�prio poder � posto em causa, muitos maus jornalistas, com receio que a gente os perceba, reagem com extrema veem�ncia, defendendo o seu direito de manipular, em nome da sua superioridade moral de isentos profissionais. Orwell chamava a isto �doubletalk�. Tenho pena, tenho muita pena, que s� muito depois dos factos consumados, os estudos apare�am mostrando aquilo que de imediato alguns, muito poucos, porque a press�o dos media � um poder de facto, puderam ver. Bias.

(*)
O bias? Mas por que n�o o vi�s? Ali�s, quer a palavra inglesa quer a portuguesa v�m do franc�s (ou do proven�al) biais. Ou por que n�o o enviesamento? Ou mesmo o desvio?

(AC)

Eu uso a palavra vi�s; enviesada � muita opini�o e informa��o que se nem d� conta de tal.

(H. Carmona da Mota)


(...) na sua coluna na revista S�bado desta semana, diz n�o haver tradu��o, em portugu�s, da palavra inglesa �Bias�. Como psic�logo e neto de uma costureira, venho propor-lhe a palavra �enviezamento�, utilizada em ambas as profiss�es e que responde aos significados que procurava transmitir com a sua coluna. Ali�s, embora traduza �Bias� por tend�ncia, o dicion�rio Webster traduz enviezamento por �bias�. De qualquer forma, fala de uma perspectiva enviezada da realidade, em que os jornalistas n�o seguem a realidade como se lhes apresenta, mas atrav�s de um conjunto de pr�-conceitos que perturba todo o processo de informa��o.

(Miguel Augusto Santos)

12.9.05
 


COMO NOS CARRINHOS DE FEIRA

mais uma corrida, mais uma viagem.

11.9.05
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS:
VER A NOITE



num mundo com duas luas: Phobos e Deimos
 


COISAS SIMPLES
OSTINATO RIGORE


Edward Weston, Clouds, M�xico
 


EARLY MORNING BLOGS 600:
"BACKWARD,
BACKWARD"

The Dark Day

A three-day-long rain from the east�
an terminable talking, talking
of no consequence�patter, patter, patter.
Hand in hand little winds
blow the thin streams aslant.
Warm. Distance cut off. Seclusion.
A few passers-by, drawn in upon themselves,
hurry from one place to another.
Winds of the white poppy! there is no escape!�
An interminable talking, talking,
talking . . .it has happened before.
Backward, backward, backward.

(William Carlos Williams)

*

Bom dia!
600 vezes.


10.9.05
 


FANTASMAS



H� fantasmas. H� mesmo qualquer coisa parecida com fantasmas, brumas, vis�es, passagens. Reinos. Sombras. Coisas que passam.

Esta fotografia vinha no meio de uma vida que foi parar ao lixo. �Sabe, eu vivo daquilo que os outros n�o querem�, disse-me o homem do papel, quando trazia mais uma cesta da vindima com os livros. Podiam ser uvas, podia ser milho, podia ser lixo. Na pilha que ficou, onde est� uma vida, est�o cadernos escolares, diplomas, certid�es, multas, cartas, agendas, fotografias, recortes de jornais. Uma vida: livros, cadernos escolares, diplomas, certid�es, cartas, agendas, fotografias, recortes de jornais. Foi o que ele deixou. B�blias anotadas, livros de alem�o, livros de mec�nica, uma ou outra revista com mulheres nuas, er�tica dos anos sessenta, alem�s. Uma foto vestida de pol�cia de via��o, a antiga PVT, uma mota. Da� a mec�nica. Postais, um com a irm� L�cia. Cartas, �minha m�e coma fruta que lhe faz bem�, bilhetes, a �encomenda vai na camioneta�. E fotos, a desaparecer. Como esta, pel�cula Agfa, mais nada. Quem eram, quem tirou a fotografia a estas sombras, uns rapazes pelo meio da rua, ainda n�o devia haver muitos carros, uma rua de paralel�pedos, sinal de m�o de obra barata. As casas de uma vila rica, do interior, quando ainda havia agricultura. Fragmentos, como sempre, vis�es, fantasmas.

Guardarei a foto. Diz demasiado. Os mortos falam.

*
N�o � uma vila rica, � �vora.
Trata-se da, hoje chamada, Rua de Rep�blica que liga o Rossio � Pra�a do Giraldo. A fotografia n�o � assim t�o antiga, pois reconhece-se nela o edif�cio da antiga "Setubalense" que � dos anos cinquenta. Na fachada oposta, h� um quarteir�o e um jardim oitocentistas no local onde, no s�culo XVI, se edificava o pal�cio real.

(Lu�s Carmelo)
*
O Lu�s tem raz�o, � �vora. Mas engana-se quando diz que n�o foi h� muito tempo. A cidade mudou mais em 50 anos que em duzentos. A fotografia � tamb�m o fantasma de uma cidade misteriosa e silenciosa, com rar�ssimo tr�nsito. Pela Rua da Rep�blica ia eu para casa dos meus av�s. Por ela subiam e desciam os mo�os e mulheres de mandados �s lojas da Pra�a do Giraldo. As senhoras n�o iam �s ccompras. Mandavam recados escritos �s lojas do que queriam , os lojistas, detr�s dos seus balc�es enviavam as amostras dos tecidos, as linhas, os el�sticos, os bot�es. depois os mo�os ou as mulheres voltavam a subir a rua com a escolha escrita e desciam-na de novo com o mandado feito. O telefone apareceu em �vora nos anos 50. Eu treinei a minha leitura nas listas de telefones da minha av�.
Foi h� muito tempo.

(Maria Jos� Metello de Seixas)
*

Reconheci de imediato a foto que publicou. Foi onde cheguei a �vora de camioneta, nos final dos anos 70, para onde fora estudar. A� viria a chegar muitas vezes durante dois anos. No princ�pio dos anos 80 ainda era exactamente assim. Quanto �s casas nessa zona da cidade, s�o quase todas senhoriais, incluindo, n�o longe dali, a casa da fam�lia Espanca, isso mesmo me contou pessoalmente T�lio Espanca, parente de Florbela. Uns metros mais acima, do outro lado da rua, fica a Igreja de S. Francisco, com o seu Anjo das Miseric�rdias e esse estranho local de medita��o conhecido por Capela dos Ossos.

(Oct�vio Gameiro)
 


(N�O) OBJEC��ES

Leia-se no Bloguitica o coment�rio sobre estas objec��es. Tentarei ajudar no que puder e sugeria que se come�asse por Lisboa, Porto e Coimbra, onde a composi��o das direc��es partid�rias � mais f�cil de obter para o PS e o PSD, at� na Internet.

Pelo que conhe�o, ver-se-� a gravidade da transforma��o dos aparelhos partid�rios em mecanismos de ascens�o social, dando aos que neles fazem carreira melhores "situa��es sociais" do que aquelas a que acederiam pelo seu m�rito pessoal e profissional, ascendendo apenas pelo exerc�cio de pequenos poderes em n�cleos muito fechados de decis�o, e tornando invi�vel, a prazo, a sa�da da vida pol�tica sem grande perda de estatuto pessoal. Como os bens s�o escassos, essas estruturas tendem a ser cada vez mais fechadas sobre si mesmas, a seguir "m�s pr�ticas" para usar o jarg�o empresarial, a corromperem-se. Os partidos perdem a no��o do "bem p�blico" e abandonam qualquer actividade c�vica. Nada que qualquer estudioso de ci�ncia pol�tica n�o saiba sobre o car�cter oligop�lico dos partidos. S� que, em democracia, � com eles que se vive.

A corrup��o das estruturas partid�rias � hoje um grav�ssimo problema em que quase ningu�m tem m�o nos partidos pol�ticos, nem as suas direc��es. S� com uma revolu��o, democr�tica claro. Como por exemplo, instituir uma morat�ria de dez anos em que o exerc�cio de cargos partid�rios � incompat�vel com outros cargos no sistema pol�tico que n�o sejam por elei��o (deputados, autarcas, etc.). Limpava-se e depois via-se no que dava. E, ao mesmo tempo, em conjunto com este tipo de medidas, um efectivo refor�o do poder de decis�o dos aparelhos partid�rios, assim reformulados, na condu��o pol�tica geral. E a obrigatoriedade, como em Inglaterra, dos ministros serem parlamentares. E mudan�as no sistema eleitoral, para solu��es mistas, entre os c�rculos uninominais e a representa��o proporcional. E por que n�o a possibilidade dos eleitores ordenarem os deputados nas listas? E a revis�o completa do sistema de remunera��es e incompatibilidades, para bem longe da demagogia actual, mas para a identifica��o dos problemas reais? E mais mil e uma pequenas medidas, que, talvez, talvez, permitissem alterar a actual situa��o. Estou consciente que todas elas geram outros efeitos perversos, mas n�o h� solu��es perfeitas para os neg�cios humanos.

De qualquer modo, o conhecimento do que est�, sem ser fragment�rio, pontual, jornal�stico, escolhido a dedo, selectivo, que pode resultar da iniciativa reformulada do Bloguitica, � �til para perceber o que se tem pela frente.
 


OBJEC��ES



Tenho grandes objec��es quanto � iniciativa do Bloguitica sobre a identifica��o dos la�os de parentesco na pol�tica. O seu resultado vai permitir, sem d�vida , identificar casos de redes de interesse, emprego, favores, mas tem um problema de fundo � a lista final n�o pode ser editada, n�o possui em si mesmo um crit�rio de edi��o que possa distinguir entre os casos de abuso e clientelismo e os naturais casos de interesse pela pol�tica em fam�lias em que a pol�tica tem um papel importante ou mil e uma raz�es v�lidas e leg�timas num pa�s com pequenas elites muito endogamicas.

Faria uma sugest�o diferente: uma lista das estruturas partid�rias nacionais e regionais dos grandes partidos do poder � Distritais do PSD e Federa��es do PS � com identifica��o dos cargos de nomea��o partid�ria dos seus membros, agora e no passado. Depois, se houver condi��es, pode-se vir por ai abaixo at� �s sec��es, para se ver o peso da partidariza��o do estado e da falta de independ�ncia das estruturas partid�rias dos �empregos� pol�ticos. Esta lista fornece dados que s�o imediatamente relevantes para conhecer as teias de clientelismo e partidarismo do estado, onde o crit�rio editorial est� presente no crit�rio de escolha � partida (no caso do parentesco, a mera lista n�o significa muito, a n�o ser que se introduzam depois outros crit�rios � chegada, que manifestamente o Bloguitica j� anunciou que n�o pode e n�o quer fazer).

A diferen�a entre uma e outra lista, pode ser a diferen�a entre a cr�tica demag�gica e a cr�tica democr�tica.
 


CORREIO

Enquanto n�o resolvo um bizarro problema com o correio para o endere�o que vem no blogue, pedia-vos o favor de usarem este endere�o : jppereira@gmail.com
 


COISAS SIMPLES


Yayoi Kusama, Fireflies on the water
 


EARLY MORNING BLOGS 599:
"I'VE KNOW RIVERS"


The Negro Speaks Of Rivers

I�ve known rivers:
I�ve known rivers ancient as the world and older than the flow
of human blood in human veins.

My soul has grown deep like the rivers.

I bathed in the Euphrates when dawns were young.
I built my hut near the Congo and it lulled me to sleep.
I looked upon the Nile and raised the pyramids above it.
I heard the singing of the Mississippi when Abe Lincoln went down
to New Orleans, and I�ve seen its muddy bosom turn all golden
in the sunset.

I�ve known rivers:
Ancient, dusky rivers.

My soul has grown deep like the rivers.


(Langston Hughes)

*

Bom dia!

9.9.05
 


COISAS SIMPLES
QUE PODEM SER VISTAS LOGO � NOITE


Jay Ouellet, Moon River
 


EARLY MORNING BLOGS 598

THE GARDEN

En robe de parade.
Samain

Like a skien of loose silk blown against a wall
She walks by the railing of a path in Kensington Gardens,
And she is dying piece-meal
of a sort of emotional anaemia.

And round about there is a rabble
Of the filthy, sturdy, unkillable infants of the very poor.
They shall inherit the earth.

In her is the end of breeding.
Her boredom is exquisite and excessive.
She would like some one to speak to her,
And is almost afraid that I
will commit that indiscretion.


(Ezra Pound)

*

Bom dia!
 


SODOMA E GOMORRA

(Do P�blico de ontem.)

Que alguma coisa correu muito mal nos primeiros dias no apoio �s v�timas do furac�o Katrina, � incontest�vel. Que parte do que correu mal se deve � administra��o federal do Presidente Bush, tamb�m me parece ser incontest�vel. Que os pol�ticos em democracia t�m um pre�o a pagar por coisas como estas, continua a ser incontest�vel. Que h� muita coisa de errado na sociedade americana, que nem tudo � bom, e que est� longe de ser perfeita, tamb�m � incontest�vel. N�o � isso que est� em causa. N�o combato o discurso da culpa com o da desculpa. Enquanto se estiver nessa dan�a �rida da culpa-desculpa, n�o se vai a lado nenhum.

O que est� em causa � outra coisa, � a histeria anti-Bush, e antiamericana, que varreu a comunica��o social, na portuguesa com o primarismo habitual, na de muitos outros pa�ses, incluindo os EUA, reproduzindo as clivagens da �ltima elei��o presidencial. H� hoje uma forte corrente de opini�o mundial hostil aos EUA n�o s� enquanto realidade pol�tica, mas enquanto realidade s�cio-cultural. Pode at� em parte ser culpa dos americanos, mas est� c� para lavar e durar, e moldar� a pol�tica europeia de uma forma muito perigosa, em primeiro lugar para os europeus, que dependem dos EUA para se defender e fazem de conta que n�o sabem isso.

N�o � apenas a guerra do Iraque, embora esta seja um irritante muito especial, s�o muito mais coisas, � a "superpot�ncia", � o sistema econ�mico, � o "imperialismo" cultural de Hollywood, � a globaliza��o, s�o os McDonalds, s�o os alimentos geneticamente modificados, � o Deus das notas do d�lar, s�o mil e um pretextos, mil e um ressentimentos, Podem bater com a m�o no peito e dizer que n�o senhor, n�o s�o antiamericanos, at� gostam dos EUA, da m�sica americana, da cultura americana, das ruas de Nova Iorque, do "esp�rito" americano, tudo abstraindo do pa�s concreto que existe e n�o h� outro. Nesse pa�s concreto, foi eleito aquele Presidente e eu posso detest�-lo, mas n�o uso a desgra�a dos americanos para obter uma pequena vingan�a pol�tica e ganhar uma maior auto-estima feita do mal alheio.

Este antagonismo antiamericano unifica muitos elementos, � poderoso porque vem da esquerda e da direita, tem ra�zes tanto no antiamericanismo filho do Kominform, como no antiamericanismo gaullista, que molda o perverso nacionalismo burocr�tico da Uni�o Europeia. Se h� pensamento �nico, � aqui que se encontra nos nossos dias.
N�o me venham dizer que o que se viu na zona atingida pelo furac�o � o que se costuma ver no Uganda e no Ruanda, porque isso � um completo absurdo que n�o resiste � mais pequena an�lise. � puro discurso ideol�gico transformado em discurso "noticioso", ou ent�o n�o sabem do que est�o a falar, e do que aconteceu no Ruanda, no Uganda, na Serra Leoa, por a� adiante.

N�o me venham agora dizer que descobriram a pobreza americana, com grande "surpresa", para fazerem uma catilin�ria contra o capitalismo selvagem, o "estado m�nimo", e o american way of life que n�o d� aos seus pobres o que o Estado-provid�ncia europeu supostamente lhes d�. � um puro discurso ideol�gico, que, quando vem da esquerda, ent�o � hipocrisia pura, porque o que sempre a esquerda radical disse � que a Am�rica era quase s� isto.
A pobreza esteve l� sempre, nuns s�tios mais, noutros menos. A desigualdade social tamb�m. Na Am�rica, a pobreza � mais nua e crua, t�o inaceit�vel como em qualquer lado, mas nunca esteve escondida de ningu�m por qualquer imagem de perfei��o social que s� existe inventada na imagina��o da propaganda, para ser utilmente negada com falso esc�ndalo.
Insisto, esta surpresa, este espanto, � de todo hip�crita. O retrato da pobreza e viol�ncia nos EUA entra-nos em casa todos os dias pelas s�ries televisivas e pelos filmes, j� que agora n�o se l� literatura, porque, se se lesse, tamb�m entrava pelos livros. Por isso, n�o me venham agora dizer que se "descobriu" a pobreza do Sul e que ela � predominantemente negra. N�o viram nenhum filme americano nos �ltimos anos, n�o viram nenhuma s�rie televisiva?

N�o custaria fazer uma lista dos muitos modos puramente ideol�gicos como o que aconteceu foi usado para a campanha antiamericana. Come�a-se por se esquecer que houve um furac�o, e desapareceram as imagens da viol�ncia da natureza, passados os primeiros dias, em que elas ainda eram politicamente neutras. O contraste com o tratamento do tsunami � flagrante, e, nem de perto nem de longe, as televis�es passaram algo de semelhante � repeti��o m�rbida das ondas que entravam terra dentro.
Os notici�rios deram sempre em primeiro lugar, e �s vezes em �nico lugar, a not�cia da imputa��o da culpa, esquecendo quase de imediato o desastre natural, a n�o ser para refor�ar a culpa, transformando a humanidade das v�timas numa abstrac��o e num libelo acusat�rio. Foi isso que interessou. O sujeito da desgra�a de Nova Orle�es foi Bush, n�o o Katrina e imediatamente se isentou toda e qualquer autoridade local e estadual para s� referir a culpa do governo federal, como se os EUA n�o fossem um pa�s feito de autoridades sobrepostas. Para muitos americanos, a come�ar pelos "pais fundadores", vinha da� a liberdade, mas talvez n�o seja t�o eficaz como sistema de governo quando h� uma cat�strofe destas dimens�es.

Nos EUA, as v�timas n�o s�o verdadeiras v�timas, servem como bandeira para mostrar que o sistema � mau e o Presidente p�ssimo, que h� um cont�nuo entre a guerra do Iraque e o "cen�rio de guerra", que mil e um coment�rios referiram a prop�sito e desprop�sito de Nova Orle�es. N�o me lembro de tal l�xico b�lico para descrever as zonas devastadas pelo tsunami, que certamente tamb�m deveriam parecer zonas de guerra. No tsunami, como a Tail�ndia, o Sri Lanka e a Indon�sia s�o longe e n�o s�o os EUA, a quest�o da culpa s� foi aflorada numa refer�ncia inicial sobre se havia ou n�o aviso poss�vel. Quem � que quer saber da culpa em t�o remotas paragens. A� a culpa � da natureza.

� por isso que h� quem veja a "m�o de Deus" no Katrina e n�o s�o s� os fundamentalistas da Al-Qaeda, nem s� os do Bible belt. A ideia de uma Am�rica e de um Presidente punidos pelo seu orgulho, ou a sua "falta de humildade", por cometer mil e um crimes no mundo e precisar de um revelador catastr�fico da sua inerente maldade, est� subjacente no modo como esta cat�strofe se tornou numa met�fora pol�tica. Pior, numa met�fora moral sobre o mal castigado.
Quem conhece a sua B�blia sabe onde isto vem: no epis�dio de Sodoma e Gomorra. Deus, na sua absoluta ira, pune as duas cidades viciosas pelo fogo. Os seus anjos n�o encontraram nenhum homem que n�o fosse pecador e, depois de Lot estar a salvo mais a sua fam�lia, Deus varreu as cidades para todo o sempre.
� uma forma de justi�a n�o �?

8.9.05
 


LENDO OS JORNAIS: DEPOIS DA M�O, O SINAL DE DEUS



"O Katrina, para quem gosta de interpreta��es mais cabal�sticas destas coisas, ser� um sinal de Deus aos americanos para que come�am a olhar para o que se passa dentro das suas fronteiras, esquecendo por um bocado os seus �mpetos militaristas no exterior. Mas como vivemos dentro dos par�metros do racional cartesiano, o Katrina foi, quanto mais n�o seja, uma terr�vel cat�strofe natural que nos fez olhar de outra forma para os Estados Unidos da Am�rica e descobrir que por debaixo de uma fina m�scara de modernidade e at� de algum �glamour�, est� apenas um pa�s de pobres e ao n�vel do que pior se encontra no Terceiro Mundo. Bye bye, Am�rica. O mundo merece outros donos."

Jos� Diogo Madeira, no Jornal de Neg�cios de ontem.

A ilustra��o na vers�o em papel � uma bandeira norte americana esfarrapada.
 


COISAS SIMPLES


Robert Mapplethorpe, Baby's Breath
 


EARLY MORNING BLOGS 597

Navio


Tenho a carne dorida
Do pousar de umas aves
Que n�o sei de onde s�o:
S� sei que gostam de vida
Picada em meu cora��o.
Quando v�m,v�m suaves;
Partindo,t�o gordas v�o!

Como eu gosto de estar
Aqui na minha janela
A dar miolos �s aves!
Ponho-me a olhar para o mar:
-Olha-me um navio sem rumo!
E,de v�-lo,d�-lho a vela,
Ou sejam meus c�lios tristes:
A ave e a nave,em resumo,
Aqui,na minha janela.


(Vitorino Nem�sio)

*

Bom dia!

6.9.05
 


A CHUVA

cai na janela, ainda t�mida, mas chuva. N�o s�o aguaceiros, � chuva. Chove l� fora, aqui � minha frente, chove neste blogue, com contentamento. O Abrupto � um blogue outonal e invernal. Vem a� o bom tempo. Aquele que Z�firo n�o traz.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: PERGUNTA



Se os m�dia n�o reverenciassem Soares, ou se Soares n�o dominasse a generalidade dos jornalistas, haveria quem lhe perguntasse: Como � que a candidatura � de uni�o e para todos os portugueses, e tem como objectivo n� 1 "derrotar a direita"?

(Fernando Gomes da Costa)
 


LENDO OS JORNAIS. SER� A M�O DE DEUS?



Os inc�ndios este ano. N�meros deste ano, sem os mortos:

"Os fogos florestais destru�ram este ano pelo menos 151 primeiras e segundas habita��es e danificaram outras 224. H� 39 instala��es comerciais ou industriais afectadas pelas chamas, 19 das quais praticamente destru�das. Na agricultura a situa��o n�o � melhor: al�m dos perto de 900 anexos tocados pelo fogo, perderam-se 1000 hectares de olival, quase 450 de pomares e 125 de vinha. Arderam ainda 2500 colmeias e milhares de hectares de floresta. Nos equipamentos de combate aos inc�ndios tamb�m se contabilizam danos: 16 viaturas ficaram destru�das e quatro meios a�reos acidentados.
Quase ningu�m avan�a com estimativas dos preju�zos, mas todos t�m uma certeza: os n�meros v�o continuar a subir. Muitos dos elementos dispon�veis reportam-se a meados de Agosto e ainda h� muitos levantamentos por concluir. Apenas o Minist�rio da Agricultura (MA) arrisca uma avalia��o de 300 milh�es de euros de perdas no sector agr�cola e florestal.
" (no P�blico)

Sobre as matas do Estado que n�o s�o propriedade privada:

"Cerca de 52 mil hectares de matos e florestas p�blicas j� foram consumidos pelo fogo este ano, representando 22 por cento de toda a �rea ardida no pa�s at� 28 de Agosto. Esta � a pior marca dos �ltimos cinco anos, segundo dados ainda provis�rios da Direc��o-Geral de Recursos Florestais. Nem mesmo em 2003, quando os inc�ndios carbonizaram 425 mil hectares de �rea verde, o saldo nas florestas sob gest�o total ou parcial do Estado foi t�o negativo." (no P�blico)

Sobre a m�o de Deus que esmaga a Am�rica para revelar os seus pecados de orgulho (como em Sodoma e Gomorra, lembram-se?):

"N�o � preciso ser um religioso fundamentalista nem sequer ver no furac�o Katrina a m�o de Deus para constatar que ele constituiu para os Estados Unidos uma li��o de humildade.
Uma li��o de humildade perante a for�a dos elementos, que tornam evidente que mesmo para a na��o mais poderosa da Terra n�o � sensato prescindir da ajuda internacional, mas tamb�m uma li��o de humildade perante as violentas lacunas da organiza��o social americana e perante a mis�ria preexistente que o desastre tornou dolorosamente vis�vel.
" (Jos� Vitor Malheiros no P�blico)
 


COISAS COMPLICADAS


Albrecht D�rer, Lot fugindo com as filhas de Sodoma


 


EARLY MORNING BLOGS 596:
"SER� BRANDO O RIGOR
"

Ser� brando o rigor, firme a mudan�a,
Humilde a presun��o, v�ria a firmeza,
Fraco o valor, cobarde a fortaleza,
Triste o prazer, discreta a confian�a;

Ter� a ingratid�o firme lembran�a,
Ser� rude o saber, s�bia a rudeza,
Lhana a fic��o, sof�stica a lhaneza,
�spero o a mor, benigna a esquivan�a;

Ser� merecimento a indignidade,
Defeito a perfei��o, culpa a defensa,
Intr�pito o temor, dura a piedade,

Delito a obriga��o, favor a ofensa,
Verdadeira a trai��o, falsa a verdade,
Antes que vosso amor meu peito ven�a.

(Soror Violante do C�u)

*

Bom dia!

5.9.05
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
SOBRE O KATRINA

O que acho estranho � que em todas as an�lises se fala como se n�s, seres humanos, pud�ssemos moldar e controlar a natureza; quer atrav�s da preven��o, quer atrav�s da reac��o. Tenho visto pouco, ou mesmo nada, que se possa avizinhar com uma atitude de real humildade nossa face ao poder da natureza e � fragilidade humana e da sociedade que n�s constru�mos, face a ela. Como diriam os antigos (...) a natureza ainda � das poucas coisas que, de facto, nos surpreende.

(J.)

*

Temo que o furac�o KATRINA seja acompanhado na Europa por uma n�o confessada auto-congratula��o perante o flagelo dos outros. Ou seja, mais uma vez vamos escolher o caminho sobranceiro e professoral (aprendam umas li��es...), olhando complacentemente para n�s pr�prios e recusando-nos, mais uma vez, a aprender o que temos de aprender...Com "eles", apesar de tudo. Veja-se apenas o ranking internacional das Universidades hoje divulgado no P�blico (s� 8 Universidades americanas nas 10 primeiras). � aspecto agora menor, certamente. Mas condena-nos a um med�ocre e continuado sofrimento, a uma "apagada e vil tristeza", bem mais dif�cil de ultrapassar do que o momento cat�rtico que agora se atravessa do outro lado do Atl�ntico. Quanto �s li��es que a� se ter�o de extrair, estou certo que "eles" as saber�o extrair (basta ler os jornais "deles" e ver como, t�o certeiramente, colocam o dedo nas feridas) e o facto de as seguirem ou n�o, verdadeiramente, n�o � problema nosso.

(Lu�s Coutinho)
 


COISAS COMPLICADAS


Nicolas Poussin, Inverno. Dil�vio
 


EARLY MORNING BLOGS 595:
"J� ME NAM D� DE COMER / SENAM MINHA FAZENDINHA"


De Joam Roiz de Castel-Branco, contador da Guarda, a Ant�nio Pacheco, veador da moeda de Lisboa, em resposta d�a carta que lhe mandou, em que motejava dele.


J� me nam d� de comer
senam minha fazendinha;
rei nem roque nem rainha
nam queria nunca ver.

O pagar das moradias
� o que mais contenta,
o despachar da ementa,
as madrugadas tam frias;
trabalhar noites e dias
por ser na corte cabidos,
e, os tempos despendidos,
ficar com as m�os vazias.

Armadas idas d'al�m
j� sabeis como se fazem:
quantos cativos l� jazem,
quantos l� v�o que nam v�m!
E quantos esse mar tem
somidos que n�o parecem,
e quam cedo c� esquecem,
sem lembrarem a ningu�m!

E alguns que sam tornados,
livres destas borriscadas,
se os is ver �s pousadas,
achai-los esfarrapados,
pobres e necessitados
por mui diversas maneiras
por casas das regateiras
os vestidos apenhados.

Por isto, senhor Mafoma,
tresmontei c� nesta Beira,
por tomar a derradeira
vida, que todo o homem toma;
porque h� l� tanta soma
de males e de paixam
que, por n�o ser cortes�o,
fugirei daqui t� Roma.

Fim

Agora julgai v�s l�
se fiz mal nisto que fa�o:
em me tirar desse Pa�o
e mudar-me para c�;
pois � certo que, se d�
algum pouco galardam,
lan�a mais em perdi�am
do que nunca ganhar�.


(Jo�o Roiz de Castel-Branco)

*

Bom dia!
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
UMA RESPOSTA � PERGUNTA SOBRE O CIBERD�VIDAS


Acho que a quest�o � volta do Ciberd�vidas n�o passou de um equ�voco. Pelo lado da Portugal Telecom sempre houve e sempre haver� a inten��o de apoiar a sua exist�ncia. Nunca houve a inten��o de deixar morrer este projecto, actualmente j� apoiado por n�s, assim os seus respons�veis o queiram e possam manter. � nesse sentido que j� estamos a trabalhar com o seu principal mentor.

(Jos� Carlos Baldino, Administrador PT.Com)

*

Como n�o fica claro (pelo menos para mim) a que equ�voco se refere o dr. Jos� Carlos Baldino sobre �a quest�o � volta do Ciberd�vidas� � e sob pena de a sua presente situa��o n�o ter passado de um logro (obviamente da minha responsabilidade) �, lamento ser obrigado a p�r os seguintes pontos nos ii, at� pela considera��o e estima que tenho pelo director do SAPO, a quem devo o alojamento do Ciberd�vidas no portal da PT, depois de ter ficado com a sua inteira responsabilidade, ap�s o falecimento do seu �mecenas�, o meu saudoso amigo Jo�o Carreira Bom:

1- O Ciberd�vidas est� suspenso desde Junho e desde Junho que � do dom�nio p�blico o seu n�o regresso, caso eu e a Sociedade da L�ngua Portuguesa n�o consegu�ssemos obviar parte do seu financiamento, por via do fim da habilita��o POSI (gra�as, volto a repetir, ao empenho pessoal do ent�o primeiro-ministro Dur�o Barroso);

2- Das muitas entidades, p�blicas e privadas, contactadas e que recusaram liminarmente qualquer apoio ou sequer se dignaram a uma resposta civilizada, a Portugal Telecom foi uma delas. T�o chocante quanto a sua natureza e os conhecidos apoios ao futebol profissional.

3- No caso da Portugal Telecom deu-se at� o caso de a sua administradora Isabel Corte-Real ter recusado a proposta do Instituto Cam�es, cuja presidente, dr.� Simoneta da Luz Afonso, tem tentado, por todas as formas, um apoio ao Ciberd�vidas, sob a alega��o de a PT �j� estar a fazer um grande favor� (sic) ao Ciberd�vidas, com o alojamento no SAPO.

4- Com o SAPO, com cujos respons�veis, incluindo o dr. Jos� Carlos Baldino, cheguei a abordar o problema da publicidade que passa no Ciberd�vidas sem qualquer benef�cio seu (ao contr�rio do que estava previsto no acordo estabelecido h� dois anos), nunca houve a m�nima sensibiliza��o para qualquer apoio suplementar que n�o o alojamento e apenas o alojamento.

5- S� na �ltima sexta-feira, dia 2 de Setembro � portanto, tr�s meses ap�s encerramento do Ciberd�vidas e mais de 15 dias depois de estar a correr, j�, a peti��o subscrita pelo australiano Chrys Chrystello (foi preciso ser uma australiano, n�o � mesmo espantoso?) �, recebi o telefonema de um colaborador do dr. Jos� Carlos Baldino, dando-me conhecimento da abertura de o SAPO em auxiliar uma parte das despesas do Ciberd�vidas, enquanto servi�o p�blico, sem fins lucrativos ou comerciais, e com o papel que desempenha em todo o espa�o lus�fono.

Esta � a verdade dos factos, e s� tenho a agradecer ao dr. Pacheco Pereira e ao seu excelente Abrupto a preciosa ajuda para este debate e do que ele produziu: o Ciberd�vidas vai mesmo continuar, gra�as a duas entidades privadas que a seu tempo se dar� conhecimento. S� espero que o Estado portugu�s n�o se demita de um projecto que, at� pela irrelev�ncia das verbas em causa, deve estar obrigatoriamente associado.

(Jos� M�rio Costa)
*

Se d�vidas restassem est�o esclarecidas, o problema do Ciberd�vidas afinal est� resolvido. E isso era o mais importante. N�o vou por isso contestar publicamente as afirma��es do Jos� Mario Costa por respeito ao pr�prio, ao projecto e aos nomes citados. Obviamente que n�o aceitamos a maior parte delas. O Ciberd�vidas sempre foi recebido de bra�os abertos no SAPO, tendo apoiado o projecto nos seus momentos mais dificeis e dando-lhe a visibilidade que merece. Parece-nos �bvio que isso n�o foi suficiente do ponto de vista do Ciberd�vidas. N�o se pode agradar sempre. O importante � que o motivo que nos levou a apoiar t�o importante projecto, a sua sobreviv�ncia, est� hoje resolvido. Desejamos por isso as maiores felicidades ao Jos� Mario Costa e ao Ciberd�vidas.

(Jos� Carlos Baldino, Administrador PT.Com)

FIM
 


POR FALAR EM PENSAMENTO �NICO



Fora dos blogues n�o conhe�o um �nico �rg�o de comunica��o social, televis�es e jornais, que n�o tenha a mesma linha discursiva sobre o que aconteceu em Nova Orle�es. N�o me refiro aos factos, aos factos n�o adjectivados, que isso escasseia na nossa informa��o e esses s�o iguais para todos. E de passagem acrescento que atrasos, inc�rias e erros na ajuda � popula��o, s�o mat�ria factual, quando s�o tratados como tal, o que n�o � o caso. O que � preocupante � que uma comunica��o impregnada de pol�tica anti-Bush, seja a �nica a que os portugueses t�m acesso. O pensamento �nico � isto.

4.9.05
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
DEMOCRACIA E CAT�STROFES

A cat�strofe que se abateu sobre Nova Orle�es tem-me feito reflectir sobre a Democracia. Aparentemente, j� h� v�rios anos que diversos peritos faziam notar a necessidade de se refor�arem os diques, mas pouco se fez. Creio que isso se deve em grande parte ao facto de se tratar de um grande investimento com poucas contrapartidas pol�ticas. Os pol�ticos que implementassem tais medidas teriam bastante menos probabilidades de serem reeleitos do que no caso de terem investido as mesmas quantias em grandes infra-estruturas medi�ticas ou at� (por se tratar dos Estados Unidos) num refor�o do or�amento militar.

(Jos� Carlos Santos)

E UM BREVE COMENT�RIO

� verdade o que diz Jos� Carlos Santos, mas n�o � um dilema f�cil de resolver nem pelos pol�ticos, nem pelos cidad�os. Vejamos um caso concreto, o de Lisboa. Todos os estudos, do mesmo tipo dos que existiam para os diques de Nova Orle�es, dizem que Lisboa corre um grande risco de sofrer um terramoto que provocar� muitos mortos e destrui��es. Lisboa est� numa zona s�smica, Nova Orle�es na passagem de furac�es. N�o sei se a probabilidade de um terramoto em Lisboa � muito menor do que levar em cima com uma tempestade do grau 5.

Caso haja esse terramoto em Lisboa, ouvir-se-� certamente o mesmo tipo de coment�rios que hoje se ouvem sobre o furac�o: sabia-se que era preciso fazer muita coisa e n�o se fez. Os pol�ticos ser�o crucificados por terem gasto o dinheiro de outra maneira, seja qual for a raz�o, ou irraz�o porque o fizeram (� por isso que me parece fr�gil dizer-se que n�o houve dinheiro para os diques porque se investiu na preven��o do terrorismo. N�o sei sequer se � verdade. E se tivesse havido um atentado terrorista, o que � que se diria? Em Londres o governo foi acusado de n�o ter cuidado da seguran�a dos transportes p�blicos.)

O problema �: quem � que pode ganhar elei��es propondo-se gastar a enorme quantidade de dinheiro que � necess�ria para minimizar os riscos, com o sacrif�cio dr�stico de todos os outros investimentos, como inevitavelmente ser� preciso para se defrontar o problema a s�rio, num pa�s com poucos recursos como Portugal? Ningu�m, porque os lisboetas n�o est�o dispostos a fazer esse investimento, nem na cidade, nem a n�vel nacional. Considerar�o um extravagante lun�tico e perigoso, nas margens do sistema, quem tiver esse programa. Claro que se houver um terramoto, mesmo que seja s� um grande susto, as coisas podem mudar, mas antes do susto duvido. N�o duvido, tenho a certeza.

*
O seu coment�rio � posi��o do leitor Jos� Carlos Santos suscita-me alguns coment�rios. Em primeiro lugar a probabilidade de ocorrer um sismo em Lisboa ou um furac�o em Nova Orle�es � muito diferente. Se pensarmos em situa��es extremas � caso de 1775 em Lisboa ou o Katrina em Nova Orle�es � a minha convic��o � a de que a probabilidade de ocorrer um sismo como o 1775 � substancialmente menor. Seria interessante saber se j� ocorreram furac�es semelhantes em intensidade ao Katrina na Am�rica. Julgo que sim mas com consequ�ncias menos devastadoras.

Quanto aos estudos relativos aos diques de Nova Orle�es eles apontavam a necessidade de realiza��o de obras de manuten��o e refor�o, cuja realiza��o era justificada pelo envelhecimento dos existentes e por caracter�sticas espec�ficas do local, em particular o tipo de solo de funda��o. A principal medida de preven��o no caso americano teria sido o refor�o dos diques. Tratava-se de um elemento fulcral na estrutura de protec��o da cidade. A sua rotura, ainda que parcial, acarretava custos em vidas e bens intoler�veis. O seu refor�o era/� exclusivamente uma responsabilidade p�blica.

No caso do potencial sismo em Lisboa a principal e mais eficaz interven��o a fazer no sentido da preven��o � a de garantir que as constru��es cumprem os regulamentos existentes de forma que o seu comportamento, caso se verifique um sismo de grande intensidade, seja o esperado. A interven��o p�blica faz-se sobretudo na fiscaliza��o das novas constru��es, na reabilita��o do parque p�blico, feita ao longo dos anos, e no apoio � recupera��o do parque privado quando as condi��es financeiras dos propriet�rios justifiquem esse apoio. N�o custa muito dinheiro mas implica uma atitude diferente da que tem sido adoptada pelos diferentes poderes. Implica que o Estado seja eficaz a fazer respeitar a lei e n�o transija nessa defesa hipotecando a seguran�a das popula��es face a interesses corporativos de curto prazo. (Constr�i-se hoje, em Portugal, pior do que h� d�cadas atr�s e n�o � por falta de conhecimento t�cnico. Existe uma confus�o entre melhoria da qualidade arquitect�nica das constru��es e melhoria da qualidade construtiva.)

A cr�tica que se deve fazer � inc�ria das autoridades americanas n�o � por terem gasto o dinheiro de outra maneira, mas por n�o terem gasto nestas obras o dinheiro que elas exigiam. Nas obras e na cria��o e manuten��o de uma rede de servi�os p�blicos capazes de uma resposta mais eficaz em caso de cat�strofe.
Por �ltimo esta quest�o pode ser uma oportunidade para discutir o papel do Estado nas nossas sociedades. Reflectir se um modelo semelhante ao Americano com o esvaziamento das fun��es do Estado e com o desinvestimento em servi�os p�blicos essenciais � desej�vel.

(Jos� Carlos Guinote)
*

Eu fui um dos que foi apanhado pela surpresa da dimens�o das consequ�ncias do furac�o Katrina. No meu caso concreto esta surpresa teve consequ�ncias concretas e nefastas para mim j� que a minha actividade profissional esta ligada ao investimento em mercados financeiros e as ondas de choque do furac�o, obviamente, tamb�m ai se fizeram sentir. Em termos econ�micos e financeiros debate-se j� a import�ncia que o furac�o adquiriu como s�mbolo do momento de viragem na economia americana e na orienta��o da sua politica financeira. Mas este simbolismo faz-me reflectir sobre duas quest�es importantes.

A primeira quest�o que me � evidenciada � a surpresa geral que foram as consequ�ncias deste furac�o. Os mercados financeiros s�o talvez o ambiente mais exigente e competitivo no uso da informa��o, inclusive mais do que o mundo da espionagem que actualmente se cruza frequentemente com o mundo financeiro. Todas as informa��es dispon�veis s�o consumidas de forma voraz e escrutinadas exaustivamente nas suas variadas implica��es e consequ�ncias. Assim desde os relat�rios de contas de empresas, a an�ncios de avan�os cient�ficos, a boletins meteorol�gicos, tudo que implicar altera��es na vida dos mercados, ou seja das pessoas, � analisado e imediatamente repercutido nas avalia��es dos activos. Portanto � para mim impressionante perceber que os agentes de mercado falharam por completo a an�lise e previs�o do que seriam as implica��es deste acontecimento. Isto demonstra que, independentemente das falhas na prepara��o e preven��o de um acontecimento desta magnitude, a esmagadora maioria das pessoas mais bem informadas do mundo n�o esperava o que aconteceu! Dai que este sentimento generalizado de critica face ao governo dos EUA de falta de previs�o do que seriam as consequ�ncias, e portanto na aus�ncia de preparativos adequados � parece-me hip�crita.

A segunda quest�o est� relacionada com as falhas apresentadas nos sistemas de preven��o e auxilio � cat�strofe. Sim, existem muitas falhas, e desgra�adamente muitos sofrem e morrem antes do t�o necessitado aux�lio. A palavra aux�lio, vem de ajudar quem precisa, o que significa que � imposs�vel retirar da vida das pessoas um acontecimento como este, apenas auxiliar e minorar os seus efeitos. E � por isso que eu me impressiono com as capacidades daquele pa�s, com os seus organismos estatais, com as suas estruturas civis, com o seu ex�rcito, com os seus m�dia e com a sua capacidade de critica e reac��o. Mas impressiono-me sobretudo com o seu pragmatismo e com o esp�rito daquele povo. Eu n�o estou a olhar para as falhas, eu estou a olhar para a reac��o �s falhas!

Face aquele esp�rito, n�o me resta nenhuma d�vida que daqui a um ano, quando as cicatrizes e marcas do furac�o ainda forem vis�veis e outros furac�es se aproximarem, nada ser� o mesmo no que se refere � prepara��o deste tipo de cat�strofes. Toda este acontecimento vai ser visto e revisto, pensado e analisado para que em caso de um novo e ainda maior cataclismo aconte�a todas as falhas sejam equacionadas e corrigidas, todos os recursos necess�rios numa pr�xima vez sejam alocados e activados a tempo, todos os acontecimentos sociais desta cat�strofe sejam prevenidos, e todos os respons�veis t�cnicos e pol�ticos sofram as devidas consequ�ncias� E � isto que lhes invejo.

(Andr� Almeida Santos)
 


A LER

todo o Portugal dos Pequeninos e o BLOGUITICA recentes. No Acidental, Am�rica + Europa: um jardim regado com b�lis (l� est� "regago", uma gralha) de Henrique Raposo.
 


COISAS COMPLICADAS


Daumier
 


EARLY MORNING BLOGS 594:
"I STUDIED MERELY MAPS"

The Traveller


They pointed me out on the highway, and they said
'That man has a curious way of holding his head.'

They pointed me out on the beach; they said 'That man
Will never become as we are, try as he can.'

They pointed me out at the station, and the guard
Looked at me twice, thrice, thoughtfully & hard.

I took the same train that the others took,
To the same place. Were it not for that look
And those words, we were all of us the same.
I studied merely maps. I tried to name
The effects of motion on the travellers,
I watched the couple I could see, the curse
And blessings of that couple, their destination,
The deception practised on them at the station,
Their courage. When the train stopped and they knew
The end of their journey, I descended too.


(John Berryman)

*

Bom dia!
 


LER OS JORNAIS



Este artigo do Di�rio de Not�cias, retomando um artigo do Expresso, sobre a compra da TVI pela Prisa e as eventuais cumplicidades PS-PSOE usando os respectivos governos, deve vir na sec��o de Media ou na sec��o de Pol�tica? Ao coloc�-lo na primeira desvaloriza-se o significado da sua inser��o na segunda, ou seja minimiza-se o significado pol�tico da opera��o, caso tenha existido. E caso tenha existido, � bem grave. ( Este artigo � um primeiro elemento para responder a uma pergunta j� antiga, salvo erro, do Jornalismo e Comunica��o,)

Eu n�o digo que a op��o seja f�cil. Ela implica uma avalia��o da gravidade e um ju�zo de valor que pode sempre ser intencional no plano pol�tico. Mas que vale a pena discutir muito a s�rio o que l� se diz, isso vale.

*

Ningu�m se preocupa no jornal com a sucess�o de not�cias falsas na primeira p�gina do Expresso ou j� � um estilo?

3.9.05
 


CIDADES MORTAS

J� h� algum tempo que estou a ler o livro de Mike Davis, Dead Cities . � um conjunto de ensaios, pelo que umas vezes leio um, depois outro. Davis ficou c�lebre quando escreveu City of Quartz , um livro premonit�rio para compreender os tumultos de Los Angeles.
O tema do livro � a destrui��o apocal�ptica das cidades, a �morte� das cidades, uma quest�o que me interessa e sobre a qual escrevi a prop�sito de uma introdu��o �s Lamenta��es, tidas como sendo de Jeremias. A destrui��o de Jerusal�m � o modelo dessas �mortes� reais e simb�licas, uma constante na nossa tradi��o ocidental. Vulc�es, inunda��es, bombardeamentos a�reos, tumultos, saques onde n�o fica pedra sobre pedra, terra salgada (Cartago), explos�es, hecatombes, ar envenenado, inc�ndios � s�o a mat�ria deste livro. O que se percebe muito bem � a adequa��o do nosso viver urbano � destrui��o apocal�ptica, como se percebeu no 11 de Setembro. Torna-se f�cil.

(Publicado no Abrupto em 2003)
 


SECTARISMO 2



Voltando ao caso do notici�rio da RTP de ontem que critiquei e de que mantenho a cr�tica, que n�o � gen�rica e abstracta, mas aponta para um exemplo concreto. � pena que o texto n�o esteja dispon�vel para se analisar, porque se ganhava com isso em clareza na discuss�o.

Eu n�o acho que seja aceit�vel, em termos de bom jornalismo, que os EUA sejam sistematicamente referidos numa mat�ria noticiosa como �a �super pot�ncia�, �a maior pot�ncia do mundo�, classifica��es pol�ticas que envenenam todo o texto. Um editorial pode faz�-lo, uma not�cia n�o deve faz�-lo. Os EUA chamam-se EUA.

Do mesmo modo,nesse notici�rio, sendo o n�mero de mortos confirmados � data por volta de oitenta (um dia depois quando escrevo est� em 147, a subir) prevendo-se no entanto muitos mais (milhares talvez), nada justifica substituir na narrativa os mortos confirmados pelos previstos. O texto da not�cia da RTP falou v�rias vezes em milhares de mortos como se fosse um facto adquirido. Infelizmente pode vir a ser, mas n�o � aceit�vel como jornalismo o que se fez. A especula��o com o n�mero de mortos � uma tenta��o pol�tica como aconteceu com Timor, mas depois, depois do efeito adquirido,a rectifica��o de pouco serve.
 


UMA "IGNI��O" EM TEMPO REAL



In�cio do inc�ndio por volta das 14 horas. A "igni��o" come�ou numa esquina entre duas estradas de terra batida. Ou � neglig�ncia ou � fogo-posto, pela localiza��o. Dez minutos depois, pegou-se a um dos outros lados da estrada. Pinheiros, eucaliptos, mas matas intercaladas com campos sem grande vegeta��o e um terreno terraplanado. Ardem os restos da terraplanagem, ra�zes e ramas amontoados h� v�rios meses, criando dois ou tr�s focos distintos, mas isolados por terra. Ningu�m sabe para que � a terraplanagem, feita numa �rea de reserva agr�cola. N�o h� vento, est�o cerca de 30�. Vinte minutos depois, chegada de um primeiro carro dos bombeiros para observa��o. Meia hora, chegada do primeiro carro com �gua, seguido de outros em intervalos de mais ou menos cinco, dez minutos. Bombeiros de tr�s cidades. O inc�ndio sobe pela encosta. Come�a a ficar vento, com as rajadas muito fortes canalizadas pela rede de vales e colinas. Percebe-se que se o vento tivesse chegado antes dos bombeiros ia ser mais complicado. Passa uma avioneta. Tr�s quartos de hora depois, chega um helic�ptero mas vazio. Faz um reconhecimento e volta dez minutos depois lan�ando �gua, embora o inc�ndio j� estivesse controlado pelos bombeiros a p�. N�o voltou mais. O fumo negro � substitu�do pelo fumo branco, deixou de se ouvir crepitar. Chega um outro carro de bombeiros, o primeiro que vem com as sirenes todas. J� n�o deve ser preciso.

Quando escrevo parece ter sido controlado. Est� a ser feito o rescaldo. Hora e meia depois. Nunca foi um grande inc�ndio. Felizmente.
 


EARLY MORNING BLOGS 593:
"CUANDO YO LO QUISIERE, MUY BIEN LO SABR� GANAR"

ENTREVISTA DE BERNARDO CON EL REY

Con cartas sus mensajeros el rey al Carpio envi�:
Bernardo, como es discreto, de traici�n se recel�:
las cartas ech� en el suelo y al mensajero habl�:
�Mensajero eres, amigo, no mereces culpa, no,
mas al rey que ac� te env�a d�gasle t� esta raz�n:
que no le estimo yo a �l ni aun a cuantos con �l son;
mas por ver lo que me quiere todav�a all� ir� yo.
Y mand� juntar los suyos, de esta suerte les habl�:
�Cuatrocientos sois, los m�os, los que comedes mi pan:
los ciento ir�n al Carpio para el Carpio guardar,
los ciento por los caminos, que a nadie dejen pasar;
doscientos ir�is conmigo para con el rey hablar;
si mala me la dijere, peor se la he de tornar.
Por sus jornadas contadas a la corte fue a llegar:
�Dios os mantenga, buen rey, y a cuantos con vos est�n.
�Mal vengades vos, Bernardo, traidor, hijo de mal padre,
dite yo el Carpio en tenencia, t� t�maslo en heredad.
�Mentides, el rey, mentides, que no dices la verdad,
que si yo fuese traidor, a vos os cabr�a en parte;
acord�seos deb�a de aquella del Encinal,
cuando gentes extranjeras all� os trataron tan mal,
que os mataron el caballo y aun a vos quer�an matar;
Bernardo, como traidor, de entre ellos os fue a sacar.
All� me diste el Carpio de juro y de heredad,
promet�steme a mi padre, no me guardaste verdad.
�Prendedlo, mis caballeros, que igualado se me ha.
�Aqu�, aqu� los mis doscientos, los que comedes mi pan,
que hoy era venido el d�a que honra habemos de ganar.
El rey, de que aquesto viera, de esta suerte fue a hablar:
��Qu� ha sido aquesto, Bernardo; que as� enojado te has?
�Lo que hombre dice de burla de veras vas a tomar?
Yo te d� el Carpio, Bernardo, de juro y de heredad.
�Aquestas burlas, el rey no son burlas de burlar;
llam�steme de traidor, traidor, hijo de mal padre:
el Carpio yo no lo quiero, bien lo pod�is vos guardar,
que cuando yo lo quisiere, muy bien lo sabr� ganar.


(An�nimo)

*

Bom dia!

2.9.05
 


SECTARISMO



� dif�c�l imaginar notici�rio mais sect�rio do que o que acabou de passar na RTP1 sobre o furac�o Katrina. A lista dos adjectivos � um manual do que n�o se deve fazer em jornalismo e as frases valorativas, sem nada de noticioso, s�o repetidas ad nauseam. Tudo para transformar o que aconteceu em Nova Orle�es num panfleto contra a guerra do Iraque. N�o me lembro de um tratamento noticioso de uma cat�strofe qualquer, ocorrida fora de Portugal , feito desta maneira puramente acusat�ria. S� puramente acusat�ria, para atacar Bush e a guerra.

� evidente que h� responsabilidades quando alguma coisa corre mal � com os fogos c� n�o � suposto ser o mesmo? � mas, mesmo no tratamento dessas responsabilidades, o car�cter jornal�stico de um notici�rio deve ser mantido. Este notici�rio seria um interessante case study para as nossas escolas de comunica��o social analisarem, mas infelizmente quando um dia se fizer um estudo sobre o equil�brio noticioso desta mat�ria, o mal j� est� feito.

Fica aqui um apelo � Direc��o de Informa��o da RTP para disponibilizar o texto integral do seu notici�rio de hoje �s 13 horas, incluindo perguntas e respostas dos convidados, para melhor an�lise e julgamento de todos. N�o custa nada, permitia uma an�lise mais rigorosa e, se eu n�o tivesse raz�o, seria o melhor dos desmentidos. Quem n�o deve n�o teme. O Abrupto public�-lo-� na �ntegra.

*

H� uma incontida satisfa��o em todos os anti-americanos prim�rios perante as cenas de caos e pilhagem que as televis�es nos t�m trazido de New Orleans. � m�sica para os seus ouvidos frases como a que o correspondente da CBS/RTP dizia esta manh� - "...cenas como as que assistimos em Nova Orle�es s�o as que se esperariam em pa�ses do terceiro mundo, como o Ruanda...". Estas cenas corroboram, aos seus olhos, o seu dogma de estima��o de que � o modelo capitalista que provoca as assimetrias sociais que potenciam o conflito que explode em situa��es-limite entre quem est� integrado na sociedade capitalista e quem fica na sua margem.

A dura realidade que se respira nas cidades da Am�rica, e todas as cidades importantes s�o invariavelmente assim, � a de um contraste tremendo entre os centros financeiros de cada downtown e os bairros residenciais dos arredores, onde mora a tal Am�rica integrada, essencialmente branca e rica ou remediada, nas suas vivendas com jardim e os seus SUV ou descapot�veis, e os bairros urbanos degradados, onde uma Am�rica negra e miser�vel vai sobrevivendo, alienada e frustrada, pois os pobres s�o mais frustrados � vista da riqueza.

A Am�rica integrada vive de costas voltadas para essa outra Am�rica, que Michael Moore caricaturiza nos seus livros e filmes. Que � real, n�o � ficcionada. Quem a quiser conhecer pode, por exemplo, apanhar uma Greyhound at� Baltimore e abrir bem os olhos, ou, se tiver coragem, ir at� South Central Los Angeles, que ficou c�lebre pela revolta que se seguiu ao assassinato de Rodney King, um negro, por pol�cias do LAPD. Ou ainda, contar os ex�rcitos de sem-abrigo que, todas as noites, dormem nos v�os de escada dos centros financeiros de todas as suas cidades, ant�nimo dos yuppies de port�til a tiracolo e �culos Ray-Ban que as povoam de dia.

A Am�rica n�o �, de facto, o sal da terra. As imagens televisivas de New Orleans falam por si. Mas ser� que o seu crescimento econ�mico, exponencial relativamente ao da nossa Europa, esclerosada e estagnada, n�o vai integrar progressivamente estes alienados. Lembremo-nos dos tempos de MLK e da luta pelos direitos civis, o ponto de partida, porque a hist�ria n�o come�a e acaba hoje. Os founding fathers idealizaram uma sociedade apoiada na livre iniciativa e na responsabilidade individual. A Europa continua a acreditar no Estado-Provid�ncia como corrector das desigualdades sociais.

Por hoje, a Am�rica cresce, a Europa mingua.

Quem ir� rir por �ltimo?...

(Carlos Costa)
*

A RTP disponibiliza, na sua sec��o multim�dia os videos do Telejornal e Jornal da Tarde. Com um dia de atraso, � certo. Pelo que julgo que amanh� se poder� descarregar aquele a que faz refer�ncia. E se algu�m tiver paci�ncia, transcrever para texto a pe�a que refere.

(Gabriel Silva do Blasf�mias)


*

Segundo o P�blico Online de hoje, o nosso PR exprimiu ao seu cong�nere Americano o seu profundo "assombro e choque" pela cat�strofe resultante da passagem do furac�o Katrina. A peculiar escolha de palavras do Dr. Sampaio fez-me parar para pensar. Tinha a certeza que j� tinha lido esta express�o algures mas n�o me lembrava onde. Ent�o lembrei-me que uma poss�vel tradu��o destas palavras para ingl�s � "shock and awe" e que, curiosamente ou talvez n�o, foi o nome escolhido para a ofensiva americana no Iraque. Ser� que o Dr. Sampaio resolveu mandar uma gra�ola subliminar ao Sr. Bush ou sou eu que estou a ficar um pouco paran�ico?

(Rui C., Olean, NY, USA)
*

As declara��es de Hugo Chavez s�o miser�veis e foram apresentadas numa pe�a da RTP esta manh� sob o t�tulo de "... mensagens de solideriedade" onde aparecia v�rios chefes de estado a apresentar a disponibilidade em ajudar - lament�vel
Mario Rui de Cravalho, reporter de imagem da CBS, citado pela TSF, dizia com toda a "propriedade" que "Nunca se saber� quantos morreram em Nova Orle�es" e diz mais etsa coisa extraordin�ria �Haver� muitos desaparecidos ... e nunca se saber� quantas pessoas morreram exactamente, mas eu posso garantir que foram milhares�. Nada disto � jornalismo!

(Filipe Freitas)
*

Pode ser sectarismo ou qualquer adjectivo terminado em "ismo", mas a verdade (e aqui refiro-me � imprensa americana, espanhola, francesa, inglesa, brasileira, qualquer uma e das que tive oportunidade de ler e ouvir) � que aquelas imagens de milhares de pessoas ( na sua grande maioria negros, talvez por isso a Am�rica rica, branca e religiosa n�o deu a devida import�ncia ao Katrina) desesperadas por coisas t�o b�sicas, como �gua para beber e comida, n�o me sa� da cabe�a! Como uma pot�ncia daquelas, que at� previu o tipo de furac�o que iria afectar aquela zona da Am�rica, que aconselhou os cidad�os a abandonar a cidade de Nova Orle�es, n�o se preveniu para se abastecer de �gua pot�vel e alimentos para o p�s-furac�o? Como um pa�s daqueles se encontra agora nas "m�os" do acaso, d�divas e caridade de alguns? Em Portugal disse-se coisas impens�veis ( e o "Abrupto" disse-o!) sobre os inc�ndios e o nosso modo t�o peculiar de tratar cat�strofes, mas pergunto: e o que aconteceu com a Am�rica, o que dizer daquilo? O S�crates levou porrada ( e o "Abrupto" cal�ou as luvas de boxe e bateu at� onde quis!) porque estava de f�rias num Safari, em �frica, quando Portugal ardia e n�o se "dignou" a interromper as suas f�rias ! Mas... E o Bush n�o foi acusado pela imprensa mais independente ( toda ela) americana de ter reagido tarde e de ter menosprezado o furac�o Katrina e de n�o ter interrompido as f�rias no seu rancho? Pois ent�o, caros pr�s e contras americanos o que dizer desta cat�strofe natural? E eu at� gosto e admiro o engenho e a imagina��o americana e estou solid�rio com eles nesta hora de sofrimento, mas n�o nos devemos silenciar quando vemos aquela pobre gente da Nova Orle�es, descendentes dos escravos do Sul, sem qualquer amparo de um Estado que n�o olha a meios para gastar em armas e quejandos!

(Jos� Armando Almeida)
*

Tenho seguido com aten��o os notici�rios dos quatro canais televisivos, mas tamb�m da CNN, da Skynews e da BBWworld. Hoje mesmo, estive a ler os editoriais e textos relacionados com a trag�dia americana no New York Times e, embora possa estar de acordo que determinadas "vis�es" n�o ser�o as mais objectivas, � verdade que tanto Bicudo (RTP), como Costa Ribas (SIC) ou M�rio Carvalho (CBS) s�o un�nimes na sua cr�tica � falta de coordena��o e provid�ncia da Protec��o Civil Americana. Os editoriais e textos dos principais articulistas do NYT s�o, igualmente, un�nimes, na condena��o da Protec��o Civil (e por extens�o do governo federal) dos EUA. De h� muito que se sabe que a regi�o da Louisiana � sujeita a furac�es peri�dicos. Um dos articulistas do NYT, citando dados de 2001, escreve que, nesse ano, a Protec��o Civil tinha projectado tr�s poss�veis grandes cat�strofes contra as quais os EUA deviam estar preparados: um ataque terrorista a NY (j� aconteceu); um terramoto de grau elevado em S�o Franscisco e um furac�o em Nova Orle�es. Destes tr�s, o citado estudo, considerava o furac�o de NO como o que traria mais devasta��o...
No mesmo artigo, podia ainda ler-se que os furac�es v�m sempre em duas ondas: a primeira, de chuva e vento e a segunda de contesta��o social. A primeira j� passou, a segunda vem a�. Ora o que as imagens de Nova Orle�es nos mostram � a popula��o mais pobre (negros, doentes e velhos) que ficaram na cidade por n�o terem meios para escapar. Ser� esta constata��o uma forma de "anti-americanismo" prim�rio? N�o me parece...

(Rui Mota)
*
Ainda sobre o Katrina, hoje de manh�, ao ouvir o notici�rio da TSF, fiquei boquiaberto quando, com grande destaque, informaram de que soldados rec�m-chegados do Iraque tinham sido enviados para Nova Orle�es, armados, e com ordens para atirar a matar!

Est� tudo doido, pensei eu! O objectivo n�o deveria ser ajudar os sobreviventes? Ser� que querem abater os desgra�ados que ainda est�o vivos?

Mais � frente, quase envergonhadamente, l� disseram mais qualquer coisa: n�o se trata de abater as pessoas esfomeadas que invadem supermercados para se alimentarem, mas sim, os gangs e snipers que percorrem a cidade, a matar, roubar e violar "algumas jovens" (sic).

Quem s� tivesse ouvido a primeira parte, o que n�o diria do Bush e da Am�rica?

(Ricardo Peres)


*

Valorizo a manifesta apet�ncia que demonstra em an�lises pol�ticas ou culturais. Mas o m�rito social ou jornal�stico n�o lhe reconhe�o. Bacoca, nefasta e jur�ssica a sua interpreta��o do impacto medi�tico do Katrina...
N�o encontro em si conhecimento vasto na Teoria da Noticia, na Produ��o Jornal�stica ou na Estrat�gia de Alinhamento. E se deixa contagiar o seu texto de um despeito despudorado por quem n�o lhe d� voz (Ja basta a SICNot�cias), garanto que a RTP n�o se move por movimentos anti-Bush ou corridas miliaristas contra a Guerra do Iraque. De fino polimento �tico, os jornalistas da RTP d�o voz. A voz pertence a quem padeceu e sentiu, na pele, a f�ria do Katrina. Se as vozes se questionam quanto � falta de imediatez na resposta do governo americano, s�o essas que se ouvem. Se as vozes se revoltam contra a placidez tonta de Bush, s�o essas que se ouvem.
O que o senhor deseja, v�, confesse!, � o politicamente correcto, a auto-censura, a castra��o moral. Tenha vergonha... a esquizofrenia pol�tica � dos sintomas mais preocupantes. Procure ajuda...

(leitor n�o identificado)
 


UM KATRINA MUITO NOSSO



Est� j� nos blogues e nos jornais, os Merc�rios anunciadores. Chegar� a todo o lado, aos t�xis, �s mesas dos caf�s, �s ruas. Est�o no horizonte uns largos meses de radicalismo pol�tico, de subida de tom, de irrita��es m�tuas, de aquecimento das palavras e dos gestos, o arsenal das duplicidades, os velhos argumentos de sempre, o meter tudo no mesmo saco, o �n�s� e os �eles� quando os �eles� n�o somos �n�s� e vice-versa, a incapacidade de ouvir os outros, a indiferen�a face �s raz�es alheias a favor da posi��o em que se est�, a a-hist�ria como m�todo anal�tico, a manipula��o da mem�ria, o ressentimento e a arrog�ncia.

Metade do pa�s contra outra metade, com raiva, mas sem consequ�ncia, v�o-se dedicar afincadamente a este desporto com a mesma vacuidade que dedicam �s virtudes do seu clube e ao dem�rito do clube alheio. Vai ser um cansa�o e nada mais trar� do que susceptibilidades feridas, lastro de acusa��es e contra-acusa��es, ressentimentos e arrog�ncias e o que ficar� � o mesmo s�lido terreno de resist�ncia � mudan�a, o que se solidificar� � a mesma partidarite interesseira, o mesmo Portugal que se diz n�o desejar mas que se ajuda a ficar t�o s�lido como bet�o.

A nossa incapacidade, heran�a p�ssima do salazarismo e do atraso, de pensar e de fazer pol�tica fora da impreca��o e da acusa��o moral � reveladora da nossa condi��o terceiro-mundista. � o equivalente em pol�tica ao feio que alastra a partir da Estrada Nacional 1, tem as mesmas origens, a mesma mec�nica.

Podia ser diferente? Claro que podia. Com esfor�o podia, mas duvido que o seja. A trituradora j� est� a funcionar com o seu habitual contingente de assessores, jornalistas, pol�ticos, autores de blogues. O seu primeiro esfor�o vai ser a igualiza��o moral (c�vica, pol�tica): s�o todos iguais, ningu�m � diferente, s�o todos t�o maus como n�s somos. Depois desta terraplanagem moral, ent�o pode-se ir ao business as usual, como lhes conv�m.

Posso fazer diferente? Posso pelo menos esfor�ar-me para fazer diferente. Tomando posi��es, porque isso � normal em pol�tica numa democracia, mas n�o colocando entre par�ntesis as causas a favor das posi��es. Vamos ver se consigo.
 


A LER

Uma boa coisa que tem os blogues e que uma palavra inglesa d� melhor que tudo: snippets. Como esta Hist�rias de amor na Origem das Esp�cies.
 


COISAS COMPLICADAS


Sally Mann, Untitled [Chancellorsville # 29]
 


EARLY MORNING BLOGS 593:
"WHO ALTEREST ALL THINGS WITH THY PEERING EYES"


Sonnet - To Science


Science! true daughter of Old Time thou art!
Who alterest all things with thy peering eyes.
Why preyest thou thus upon the poet's heart,
Vulture, whose wings are dull realities?

How should he love thee? or how deem thee wise,
Who wouldst not leave him in his wandering
To seek for treasure in the jewelled skies,
Albeit he soared with an undaunted wing?

Hast thou not dragged Diana from her car?
And driven the Hamadryad from the wood
To seek a shelter in some happier star?

Hast thou not torn the Naiad from her flood,
The Elfin from the green grass, and from me
The summer dream beneath the tamarind tree?


(Edgar Allan Poe)

*

Bom dia!

1.9.05
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: AR PURO


O "Esp�rito" descansa da negatividade e olha em volta. Hegel em Marte.
 


M�RIO SOARES, JESUS, FINAN�AS E BIBLIOTECAS



"A economia � extremamente importante, ningu�m o ignora. � uma das chaves do nosso futuro colectivo. Mas a economia est� ao servi�o das pessoas e n�o as pessoas da economia. (...) Depois, como escreveu Fernando Pessoa: "Mais do que isto/� Jesus Cristo/que n�o sabia nada de finan�as/nem consta que tivesse biblioteca""

Todo o discurso de apresenta��o da candidatura de M�rio Soares � um exerc�cio defensivo de denega��o. J� v�rios o notaram, n�o vale a pena repeti-lo. Mas h� uma frase muito significativa do dilema da sua candidatura, que pronuncia contra Cavaco, mas que revela o aspecto mais fr�gil da sua ac��o como governante, e do seu pensamento presidencial no que diz respeito � governa��o.

M�rio Soares n�o � o Jesus de Pessoa � que Pessoa certamente n�o quereria como Presidente, e que �n�o sabe de finan�as� e �n�o tem biblioteca�. Ora Soares �n�o sabe de finan�as�, mas tem biblioteca, o que significa que a sua ignor�ncia de economia e finan�as, proclamada face ao seu advers�rio, tem outro sentido pol�tico: � que o problema n�o � Soares n�o ser professor de economia, mas n�o dar import�ncia real � economia na crise. Na verdade nem sequer � � �economia� abstracta, porque a ela faz lip service habitual. � � economia real, ao capitalismo, ao mercado, tal como ele funciona, e � economia portuguesa tal como �. E aqui h� ideologia, h� socialismo, h� estatismo, e h�, acima de tudo, jacobinismo. E h� um pre�o enorme que pagamos por estas ideias. Esse pre�o � a crise em que vivemos.

O discurso de Soares � ret�rico e jacobino, acredita no Estado e no exerc�cio do poder pol�tico no estado, no governo e no partido � ali�s � s� por ver este poder amea�ado, ou limitado, que se candidata � e este sobrep�e-se, ou � ontologicamente indiferente � economia, que � vista como uma perturba��o que interesses, em �ltima inst�ncia ego�stas, causam na governa��o iluminista e iluminada pela Raz�o.

� por pensar assim que muito do pa�s que existe e do qual os portugueses retiram as raz�es para o seu pessimismo foi feito por ele e pelo PS. A sua candidatura � a promessa de que n�o aprendeu nada do desastre que foi em Portugal o jacobinismo do PS na manuten��o do estado socialista h�brido gerado pelo PCP em 1975. Com a ajuda �s vezes, s� �s vezes, do PSD e do PP.

O problema n�o � Soares n�o saber de economia, � que ao se vangloriar de n�o o saber, est� a dizer-nos que a economia n�o � um factor ou um revelador fundamental na crise . Ali�s n�o custa perceber que se Soares fosse PM n�o daria prioridade ao controlo do d�fice (sim Soares pronunciou-se sobre a governa��o e n�o vi ainda ningu�m protestar sobre isso). Frases como esta � �a economia est� ao servi�o das pessoas e n�o as pessoas da economia� � em Portugal n�o significam outra coisa. N�o ser� dele que vir� qualquer apoio ao governo para reformas dif�ceis, bem pelo contr�rio. �s ideias jacobinas como as de Soares devemos muito da crise, n�o se espera que delas venha a solu��o.

*

Ignoro onde � que M�rio Soares foi beber o dilema da economia. Se n�o se serviu desta fonte Autisme-Economie.org por l� andar�. Concordo que sem economia laboriosa n�o � poss�vel avan�os audaciosos. Mas a verdade � que as "f�bricas" produtoras e reprodutoras de economistas ainda n�o produziram o milagre "portugu�s". Da� a revolta dos estudantes franceses de economia pretenderem uma reforma do respectivo ensino e considerarem que h� uma viv�ncia de economia autista. Dito de outra forma, o ensino seria totalmente absurdo por n�o responder aos objectivos que o ramo se prop�e realizar, e de que � paradigm�tico o exemplo portugu�s. Se se atribuir a culpa aos pol�ticos por vetarem o trabalho dos economistas, ent�o estamos em presen�a de uma servid�o volunt�ria que alimenta o autismo economicista, em detrimento do papel que a estes competiria. Da� as permanentes sa�das de ministros que n�o se sujeitam a nenhuma servid�o, e os que se sujeitam falham o seu status, e comprometem o futuro deste pa�s. Enfim, como refere Foucault: "Est-il pour autant que nous ne connaissiond d'autre usage de la parole que celui du commentaire? Ce dernier, , � vrai dire, interroge le discours sur ce qu'il dit et a voulu dire; il cherche � faire surgir ce douple fond de la parole, o� elle se retrove en une identit� � elle-m�me qu'on suppose de sa v�rit�; il s'agit, en �non�ant ce qui a �t� dit, de redire ce qui n'a jamais �t� prononc�" (Naissance de la clinique, puf, Paris, 1963, p. XII).

(Jo�o Boaventura)
*

Confesso que n�o segui com muita aten��o (e concentra��o) a sess�o de apresenta��o da candidatura e o discurso oficial. Mas, pelo que vi nos resumos dos telejornais, tudo aquilo (discurso, ideias, sess�o) me fez lembrar o que de pior existia nas sess�es da velha oposi��o republicana nos anos 50 do s�culo passado (mal sabia ler mas tive acesso mais tarde). E, meu caro JPP, o problema nem sequer se centra na Economia, como voc�, apoiante confesso do meu ex-prof. Cavaco Silva, diz. N�o � esse o Key Issue. Pe�o-lhe desculpa mas, em certa medida, � passar ao lado do essencial, apesar de ela (Economia) ser demasiado desvalorizada no discurso de Soares com frases, mt� aplaudidas (claro!), como "a Economia n�o � uma ci�ncia exacta".... "serve os homens" e outras vulgaridades semelhantes. O problema � pol�tico e centra-se numa frase de Soares ("unir todos os portugueses") que � a ant�tese se tudo aquilo que o pa�s precisa, neste momento. Eu sei que a frase � ret�rica, mas �, tamb�m, reveladora de um programa pol�tico que revela um desfazamento total da realidade portuguesa, pois o que o pa�s espera e precisa � exactamente do contr�rio: uma forte ruptura pol�tica (que s� se pode fazer contra uma parte dos portugueses) que permita, ent�o, a aplica��o de um programa de moderniza��o da sociedade a v�rios n�veis, incluindo o econ�mico. Isto � exactamente o contr�rio do que se passava em 1985, quando a quest�o era definir como se poderia caminhar para a democracia plena e para a integra��o europeia: atrav�s de uma ruptura "crispada" esquerda/direita ou unindo tudo aquio que se reconhecia nesse objectivo- ou n�o se reconhecendo (PCP) veria nesta estrat�gia um "mal menor". De que modo pode o Presidente patrocinar essa ruptura? - se � que pode no quadro constitucional actual. Essa �, quanto a mim, a quest�o essencial, e como n�o me parece que as actuais fun��es presidenciais lhe possam dar resposta (ou para isso contribuir decisivamente) penso que se est� a valorizar demasiado essa elei��o desviando as aten��es daquilo que, isso sim, � essencial: o trabalho e actua��o do governo.

(Jo�o C�lia)
 


AR PURO


Ansel Adams, Mount Williamson, Sierra Nevada, from Manzanar, CA, 1944
 


INTEND�NCIA

Actualizada a nota PERGUNTA sobre o Ciberd�vidas, com um coment�rio de Jos� M�rio Costa, o seu respons�vel.
 


EARLY MORNING BLOGS 592

Onde porei meus oihos que n�o veja
A causa, donde nasce meu tormento?
A que parte irei co pensamento
Que pera descansar parte me seja?

j� sei como s'engana quem deseja,
Em v�o amor firme contentamento,
De que, nos gostos seus, que s�o de vento,
Sempre falta seu bem, seu mal sobeja.

Mas inda, sobre claro desengano,
Assim me traz est'alma sogigada,
Que dele est� pendendo o meu desejo;

E vou de dia em dia, de ano em ano,
Ap�s um n�o sei qu�, ap�s um nada,
Que, quanto mais me chego, menos vejo.


(Diogo Bernardes)

*

Bom dia!

� Jos� Pacheco Pereira
In�cio
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