ABRUPTO

31.5.05
 


NOTAS A DESENVOLVER PARA UM ARGUMENT�RIO DO �N�O�

Os defensores da Constitui��o t�m que explicar por que raz�o o que classificam de uma mera simplifica��o dos tratados se chama uma Constitui��o.

Os defensores da Constitui��o t�m que explicar por que raz�o aquilo que foi pedido, - uma mera simplifica��o dos tratados mais uma devolu��o de poderes aos parlamentos nacionais �, resultou no seu oposto: num tratado muito mais complicado e com menos poderes para os parlamentos nacionais.

Os defensores da Constitui��o t�m que explicar para que pa�s � que esta Constitui��o foi escrita porque a Europa n�o � um pa�s.

Os defensores da Constitui��o t�m que explicar a sua necessidade em geral para a Uni�o e a necessidade de v�rias das suas solu��es particulares para resolver problemas para os quais n�o bastavam os tratados anteriores.

Quando se vota na Constitui��o n�o se vota s� na Constitui��o. N�o � leg�timo reduzir um documento pol�tico desta dimens�o e alcance apenas ao seu texto, ignorando olimpicamente o contexto. O contexto primeiro e depois o texto � o que se deve discutir para decidir o �sim� e o �n�o�. Sem o contexto o texto � na sua maior parte proclamat�rio e irrelevante, n�o acrescenta nada ao que j� existe nos tratados anteriores. O que sobra dessa irrelev�ncia � por seu lado relevant�ssimo porque introduz l�gicas de funcionamento da Uni�o que n�o s�o neutras em rela��o ao que existe e definem e consolidam e inovam tend�ncias e formas de funcionamento da Uni�o muito diferentes das anteriores. Mas, mesmo a parte do texto irrelevante, colocada no contexto, ganha outro significado.

Por isso, n�o � de aceitar a mera discuss�o ass�ptica do texto constitucional sem a sua interpreta��o pol�tica linha a linha com tudo o que tem sido a Uni�o e a pol�tica dos estados nacionais que mais tem contribu�do para o seu modus operandi. � por isso que n�o h� verdadeiramente �quest�es internas� nacionais que n�o possam ser chamadas ao debate da Constitui��o.

� ali�s assim que tem sido feita a discuss�o pelos defensores do �sim� que n�o se co�bem de a discutir na base de uma interpreta��o contextual (por exemplo a quest�o do �n�mero de telefone da Europa�), ao mesmo tempo que pretendem obrigar os defensores do �n�o� a n�o ir mais longe do que a discuss�o abstracta do texto, repetindo sempre que �isso� (quase tudo) nada tem a ver com a Constitui��o.

(Continua)
 


APRENDENDO COM E�A DE QUEIR�S

"E quem nos tem enraizado estes h�bitos de. desoladora leviandade? O jornal � o jornal, que oferece cada manh�, desde a cr�nica at� aos an�ncios, uma massa espumante de ju�zos ligeiros, improvisados na v�spera, � meia-noite, entre o silvar do g�s e o fervilhar das chala�as, por excelentes rapazes que rompem pela redac��o, agarram uma tira de papel, e, sem tirar mesmo o chap�u, decidem com dois rabiscos da pena sobre todas as coisas da Terra e do C�u. Que se trate de uma revolu��o do Estado, da solidez de um banco, de uma m�gica, ou de um descarrilamento, o rabisco da pena, com um tra�o, esparrinha e julga. Nenhum estudo, nenhum documento, nenhuma certeza.

Ainda este domingo, meu Bento, um alto jornal de Paris, comentando a situa��o econ�mica e pol�tica de Portugal, afirmava, e com um aprumado saber, que �em Lisboa os filhos das mais ilustres fam�lias da aristocracia se empregam como carregadores da Alf�ndega, e ao fim de cada m�s mandam receber as soldadas pelos seus Lacaios�! Que dizes tu aos herdeiros das casas hist�ricas de Portugal, carregando pipas de azeite no cais da Alf�ndega, e conservando criados de farda para lhes ir receber o sal�rio? Estas pipas, estes fidalgos, estes lacaios dos carregadores, formam uma deliciosa e quim�rica Alf�ndega que � menos das Mil e Uma Noites, que das Mil e Uma Asneiras. Pois assim o ensinou um jornal consider�vel, rico, bem provido de enciclop�dias, de mapas, de estat�sticas, de telefones, de tel�grafos, com uma redac��o muito erudita, pinguemente remunerada, que conhece a Europa, pertence � Academia das Ci�ncias Morais e Sociais, e legisla no Senado!

E tu, Bento, no teu jornal, fornecido tamb�m de enciclop�dias e de telefones, vais com pena sacudida lan�ar sobre a Fran�a e sobre a China, e sobre o desventuroso universo que se torna assunto e propriedade tua, ju�zos t�o s�lidos e comprovados como os que aquela bendita gazeta arquivou definitivamente acerca da nossa Alf�ndega e da nossa fidalguia..."
 


COISAS SIMPLES


Zurbar�n
 


UMA NOTA SUPLEMENTAR SOBRE A DISPLIC�NCIA

A displic�ncia � uma das filhas dilectas do relativismo moral e pol�tico. N�o se pode atacar o relativismo e cultivar a displic�ncia porque isso � pecado. Vem na B�blia, para os seus cultores apolog�ticos. � a acedia, a incarna��o filos�fica da �pregui�a�, uma forma de indiferen�a moral. Dava no ennui para os franceses e no spleen para os brit�nicos. Aquilo de que fugia o nosso Henrique de Souselas, o que �bocejava� em todo o lado pelo imenso t�dio que tudo lhe provocava, e que vai para as terras da Morgadinha.

� capaz de ser muita areia para algumas camionetas. Mas tamb�m est� no Spectator, � preciso � l�-lo a montante e a jusante, para os lados, um bocado mais. Aqui fica, pois, uma verdadeira nota arrogante e para al�m disso com um plebe�smo � horror! � sobre camionetas e areia.
 


O MAL DA DISPLIC�NCIA

Se se faz o debate � porque se faz o debate, se n�o se faz o debate � porque n�o se faz o debate. Se se faz o debate, nunca � esclarecedor, falta sempre alguma coisa, nunca chegam os argumentos, tudo � mau e triste, todos s�o brutos e feios e porcos. Ningu�m � um gentleman ingl�s, como n�s somos, de manh�, ao espelho. Se se discute nunca � por gosto, ou dedica��o a uma ideia ou causa, nunca � para esclarecer ou contraditar ou convencer, nunca � por interesse intelectual, � s� para ganhar votos, para ter protagonismo, para servir obscuros interesses, por vaidade ou por ignor�ncia presumida, para ajustar contas, ou qualquer sinistra agenda escondida. Ou se � xen�fobo, ou racista, ou populista, ou reaccion�rio, ou revolucion�rio, ou torcion�rio, ou �bushista�, ou �lepenista�, ou fascista, ou comunista, ou partid�rio da �tripa� versus o �cora��o�, ou medroso ou ignorante. �-se sempre interessado, interesseiro. Sempre, �-se sempre incoerente em qualquer minud�ncia verbal.

Por cima e ao lado, � que se est� bem, nem com o sim, nem com o n�o, sempre � espera de algu�m que nos esclare�a definitivamente, de algum trabalho alheio que nos ilumine na pregui�a, ou pior ainda, j� com posi��o tomada, seja pelo partido, seja pelo grupo, seja pela tribo, seja pela confraria dos cumprimentos m�tuos, mas, mantendo a reserva mental e a m� f� necess�ria para castigar o vulgo, e o vulgo s�o todos aqueles que n�o s�o gentlemen ingleses como n�s somos, e em particular, essa esp�cie ainda mais perigosa, daqueles que sabem o que � um gentleman ingl�s e sabem como n�s estamos bem longe de o ser.
 


APRENDENDO COM E�A DE QUEIR�S

"Um ingl�s, com quem outrora jornadeei pela �sia, var�o douto, colaborador de revistas, s�cio de Academias,considerava os franceses todos, desde os senadores at� aos varredores, como �porcos e ladr�es...�. Porqu�, meu Bento? Porque em casa de seu sogro houvera um escudeiro, vagamente oriundo de Dijon, que n�o mudava de colarinho e surripiava os charutos. Este ingl�s ilustra magistralmente a forma��o escandalosa das nossas generaliza��es."
 


EARLY MORNING BLOGS 508

El instante


�D�nde estar�n los siglos, d�nde el sue�o
de espadas que los t�rtaros so�aron,
d�nde los fuertes muros que allanaron,
d�nde el Arbol de Ad�n y el otro Le�o?
El presente est� solo. La memoria
erige el tiempo. Sucesi�n y enga�o
es la rutina del reloj. El a�o
no es menos vano que la vana historia.
Entre el alba y la noche hay un abismo
de agon�as, de luces, de cuidados;
el rostro que se mira en los gastados
espejos de la noche no es el mismo.
El hoy fugaz es tenue y es eterno;
otro Cielo no esperes, ni otro Infierno.


(Jorge Luis Borges)

*

Bom dia!

30.5.05
 


AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS 14

SINAIS DA POL�TICA EM ERAS VIOLENTAS 2



As hist�rias que estes livros e brochuras contam s�o todas exemplares da viol�ncia que atravessou o s�culo XX. As duas brochuras s�o propaganda alem� do tempo da guerra editada em portugu�s. Uma, � uma resenha do trabalho alem�o nos "ersatz", produtos industriais inventados para substituir mat�rias-primas a que os alem�es n�o tinham acesso durante o conflito. O livro tem no fim uma s�rie de p�ginas de publicidade comercial de empresas alem�s ligadas a este esfor�o que incluem a AEG, a Krebs, a gigante qu�mica e farmac�utica Merck, a Siemens, as f�bricas de vidros de Jena. Entre os produtos-"ersatz" estavam a baquelite, l�s de celulose, borracha sint�tica, vidro "Plexi", ligas cer�micas e de alum�nio e zinco.

A Vida Continua!
refere uma hist�ria bem mais tr�gica, at� porque data de 1944: as destrui��es das cidades alem�s no fim da guerra. Na contra-capa interior uma cita��o de Hitler "as centenas de milhar daqueles que por ac��o das bombas perderam os seus haveres s�o a guarda avan�ada da vingan�a."

O "for�ado", uma t�pica edi��o anticomunista do in�cio da guerra fria, contendo o "verdadeiro depoimento do cardeal Mindszenty", o cardeal hungaro que foi feito prisioneiro pelos comunistas. A edi��o portuguesa � de 1949.
 


APRENDENDO COM E�A DE QUEIR�S

"A tua ideia de fundar um jornal � daninha e execr�vel. Lan�ando, e em formato rico, com telegramas e cr�nicas, uma outra �dessas folhas impressas que aparecem todas as manh�s�, como diz t�o assustada e pudicamente o arcebispo de Paris, tu vais concorrer para que no teu tempo e na tua terra se aligeirem mais os ju�zos ligeiros, se exacerbe mais a vaidade, e se endure�a mais a intoler�ncia. ju�zos ligeiros, vaidade, intoler�ncia � eis tr�s negros pecados sociais que, moralmente, matam uma sociedade! E tu alegremente te preparas para os ati�ar.

Inconsciente como uma peste, espalhas sobre is almas a morte. j� decerto o Diabo est� atirando mais brasa para debaixo da caldeira de pez em que, depois do julgamento, recozer�s e ganir�s, meu Bento e meu r�probo! N�o penses que, moralista amargo, exagero, como qualquer S. Jo�o Cris�stomo. Considera antes como foi incontestavelmente a Imprensa, que, com a sua maneira superficial, leviana e atabalhoada de tudo afirmar, de tudo julgar, mais enraizou no nosso tempo o funesto h�bito dos ju�zos ligeiros. Em todos os s�culos decerto se improvisaram estouvadamente opini�es: o Grego era inconsiderado e g�rrulo, j� Mois�s, no longo deserto, sofria com o murmurar vari�vel dos Hebreus; mas nunca, como no nosso s�culo apressado, essa improvisa��o impudente se tornou a opera��o natural do entendimento. Com excep��o de alguns fil�sofos escravizados pelo m�todo, e de alguns devotos ro�dos pelo escr�pulo, todos n�s hoje nos desabituamos, ou antes nos desembara�amos alegremente, do penoso trabalho de verificar.

� com impress�es fluidas que formamos as nossas maci�as conclus�es. Para julgar em pol�tica o facto mais complexo, largamente nos contentamos com um boato, mal escutado a uma esquina, numa manh� de vento. Para apreciar em literatura o livro mais profundo, atulhado de ideias novas, que o amor de extensos anos fortemente encadeou � apenas nos basta folhear aqui e al�m uma p�gina, atrav�s do fumo escurecedor do charuto. Principalmente para condenar, a nossa ligeireza � fulminante. Com que soberana facilidade declaramos �Este � uma besta! Aquele � um maroto!� Para proclamar �� um g�nio!� ou �� um santo!� oferecemos uma reSist�ncia mais considerada. Mas ainda assim, quando uma boa digest�o ou a macia luz de um c�u de Maio nos inclinam � benevol�ncia, tamb�m concedemos bizarramente, e s� com lan�ar um olhar distra�do sobre o eleito, a coroa ou a aur�ola, e a� empurramos para a popularidade um magan�o enfeitado de louros ou nimbado de raios.

Assim passamos o nosso bendito dia a estampar r�tulos definitivos no dorso dos homens e das coisas. N�o h� ac��o individual ou colectiva, personalidade ou obra humana, sobre que n�o estejamos prontos a promulgar rotundamente uma opini�o bojuda. E a opini�o tem sempre, e apenas, por base aquele pequenino lado do facto, do homem, da obra, que perpassou num relance ante os nossos olhos escorregadios e fortuitos. Por um gesto julgamos um car�cter: por um car�cter avaliamos um povo. "
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: UM BRILHOZINHO NOS OLHOS


Tit� e Rea

Todos eles, todos eles, malvados, sedutores, malandros, aturdidos, admirados, impudicos, envergonhados, apanhados, exibicionistas, t�m este brilhozinho nos olhos, uma claridade que se mostra, um fragmento de luz, para nos intrigar.
 


COISAS SIMPLES / GRANDES CAPAS

 


EARLY MORNING BLOG 507

De nada se sabe


La luna ignora que es tranquila y clara
Y ni siquiera sabe que es la luna;
La arena, que es la arena. No habr� una
Cosa que sepa que su forma es rara.
Las piezas de marfil son tan ajenas
Al abstracto ajedrez como la mano
Que las rige. Quiz� el destino humano
De breves dichas y de largas penas
Es instrumento de otro. Lo ignoramos;
Darle nombre de Dios no nos ayuda.
Vanos tambi�n son el temor, la duda
Y la trunca plegaria que iniciamos.
�Qu� arco habr� arrojado esta saeta
que soy? �Qu� cumbre puede ser la meta?


(Jorge Luis Borges)

*

Bom dia!
 


ESQUERDA / DIREITA

O referendo franc�s � mais um exemplo da esterilidade em querer pensar tudo em termos da dicotomia esquerda / direita. Acrescento-o a uma j� longa lista de quest�es, de issues que mostram o esgotamento heur�stico do dualismo reducionista.
 


H� QUEM N�O APRENDA NADA

Esta insist�ncia em �continuar� com a Constitui��o contra tudo e contra todos, afirmada por Jean-Claude Juncker., Dur�o Barroso e Freitas do Amaral, mostra a cegueira e a falta de esp�rito democr�tico (e na vez dele, esp�rito burocr�tico) com que se pretende impor uma solu��o indesejada. Por um lado, n�o querem perder a face, por outro, n�o sabem sair do sarilho em que se meteram. Mas o que mais falta � bom senso, porque qualquer pessoa que pense percebe logo que esta � uma atitude que s� aprofundar� a crise para que empurraram a Europa. Algu�m pensa que sem a Fran�a, a Holanda e o Reino Unido, pelo menos, � poss�vel haver uma Uni�o Europeia assente nesta Constitui��o?
 


TEMOS DIREITO A VOTAR �N�O� OU N�O PODEMOS?

Reproduzo aqui o que escrevi h� mais de um m�s sobre o referendo franc�s. N�o preciso de mudar uma linha.

Como os dinamarqueses, os irlandeses e os suecos no passado, os franceses n�o podem votar �n�o� em mat�rias europeias. Como os portugueses num futuro pr�ximo, tamb�m lhes vai ser descrito o apocalipse que cair� sobre eles se votarem �n�o�. A Europa � muito democr�tica, mas s� se lhe pode dizer �sim�, nunca �n�o�, e os cidad�os dos pa�ses europeus tem o nefasto h�bito de o fazer ou de ent�o ficar em casa em massa, deixando �sins� mirrados e perplexos.

O vilip�ndio dos que querem votar �n�o� come�a antes de votarem. O voto �sim� � sempre o iluminado, o progressista, o que aposta no futuro, o dos que n�o tem medo. O �n�o� nunca � um �n�o� ao modo como est� a ser constru�da a Europa, � sempre uma mesquinha soma de pequenos interesses corporativos e nacionais, sempre uma manifesta��o de vistas curtas da pol�tica interna de cada pa�s, sempre menor.

N�o tenho nenhuma simpatia pol�tica e ideol�gica pelas raz�es que levam muitos franceses a votar �n�o� � Constitui��o europeia porque n�o querem abrir o seu mercado � competi��o e � m�o-de-obra de servi�os mais baratos permitido pela directiva Bolkestein. Os franceses querem sempre �excep��es�, na cultura e no �social�. Apoiados por tudo o que � esquerda europeia que entende, e bem, que o �modelo social europeu� assenta na closed shop, mobilizaram-se para combater aquilo que chamam a �deriva neo-liberal� da Europa, personificada no Frankenstein-Bolkestein e no nosso pobre Jos� Manuel Barroso, apanhado no tiro cruzado.

Mas n�o � isso que � democr�tico, votar sim ou n�o conforme entendemos que uma lei ou directiva nos atinge e afecta? E n�o � um sofisma pretender que o voto nobre nos �princ�pios� da Constitui��o est� �acima� moral e politicamente das pol�ticas que dela decorrem e que ela, com todo o seu upgrade dos poderes burocr�ticos, potencia?

(De A LAGARTIXA E O JACAR�, na S�bado, Abril 2005)

29.5.05
 


NADA SER� COMO DANTES...

...se se confirmarem os resultados franceses. Est� aberto o caminho a repensar-se a Uni�o de forma diferente da dos �ltimos anos, mais democr�tica, mais solid�ria, menos ambiciosa e mais prudente. Melhor para todos os europeus, melhor para a Europa.

(Continua no S�TIO DO N�O.)
 


COISAS COMPLICADAS


Giotto, A expuls�o dos dem�nios de Arezzo
 


EARLY MORNING BLOGS 506

Le jeune homme et le vieillard


De gr�ce, apprenez-moi comment l'on fait fortune,
Demandait � son p�re un jeune ambitieux.
Il est, dit le vieillard, un chemin glorieux,
C'est de se rendre utile � la cause commune,
De prodiguer ses jours, ses veilles, ses talents,
Au service de la patrie.
- Oh ! Trop p�nible est cette vie,
Je veux des moyens moins brillants.
- Il en est de plus s�rs, l'intrigue... -elle est trop vile,
Sans vice et sans travail je voudrais m'enrichir.
- Eh bien ! Sois un simple imb�cile,
J'en ai vu beaucoup r�ussir.

(Florian)

*

Bom dia!

28.5.05
 


GRANDES CAPAS

 


A FEIRA DO LIVRO NO PORTO

Triste, mais triste, mais ba�a. Com uma circula��o interior pouco flu�da, - a sa�da est� escondida -, com uma luz acinzentada, sem alfarrabistas, a �nica coisa que pode justificar visitar-se mais do que uma Feira do Livro. Isto de n�o haver alfarrabistas parece-me mais um sinal dos mesquinhos conflitos entre sectores no mercado livreiro, que se esquecem que para chamar o maior n�mero de pessoas �s Feiras � preciso diversificar a oferta.Nas bancas, o estado actual da edi��o portuguesa: pilhas e pilhas de lixo editorial, com capas berrantes e inuendos sexuais, para cobrir literatura light. As poucas coisas boas, na mar� do lixo, nem chegam �s livrarias pelo tamb�m deprimente estado da distribui��o e pelas pol�ticas de espa�o escasso das pr�prias livrarias que o d�o aos sucessos "leves". N�o est� brilhante.


Quanto � Feira do livro em si, concordo com �triste� e concordo com �ba�a�, mas n�o com �mais triste� e �mais ba�a�, pois mant�m o mesmo aspecto h� v�rios anos. � agrad�vel, por outro lado, constatar que h� editoras que remam contra a mar�, tais como, por exemplo, as Edi��es Caixotim e a Cavalo de Ferro. Por outro lado, aconteceu algo este ano que me divertiu e que me fez lembrar as minhas idas � Feira do Livro nos anos oitenta. Naquele tempo, encontrava � venda todos os anos um livro chamado �A grande cat�strofe de 1983�, de Boris Cristoff.
Tratava-se de um livro publicado antes de 1983, a anunciar uma grande cat�strofe para aquele ano, cat�strofe essa que n�o veio a ter lugar.
O que me divertia era encontrar esse livro � venda durante largos anos ap�s 1983. Quem � que o compraria? O que vi este ano que me trouxe aquilo � mem�ria foi o livro �Onde Est� Bin Laden? O Jogo Duplo dos Americanos�, de Mohamed Sifaoui. Nesse livro, datado de 2003, o autor explica que provavelmente Bin Laden j� foi capturado pelos norte-americanos e que estes tencionariam anunciar a captura apenas poucas semanas antes das elei��es presidenciais de 2004, como trunfo eleitoral a favor de George W. Bush, obviamente. Quem � que agora compra um tal livro?

(Jos� Carlos Santos)
 


EARLY MORNING BLOGS 505

Le rossignol et le prince


Un jeune prince, avec son gouverneur,
Se promenait dans un bocage,
Et s'ennuyait suivant l'usage ;
C'est le profit de la grandeur.
Un rossignol chantait sous le feuillage :
Le prince l'aper�oit, et le trouve charmant ;
Et, comme il �tait prince, il veut dans le moment
L'attraper et le mettre en cage.
Mais pour le prendre il fait du bruit,
Et l'oiseau fuit.
Pourquoi donc, dit alors son altesse en col�re,
Le plus aimable des oiseaux
Se tient-il dans les bois, farouche et solitaire,
Tandis que mon palais est rempli de moineaux ?
C'est, lui dit le mentor, afin de vous instruire
De ce qu'un jour vous devez �prouver :
Les sots savent tous se produire ;
Le m�rite se cache, il faut l'aller trouver.


(Florian)

*

Bom dia!

27.5.05
 


COISAS SIMPLES


Andrew Wyeth
 


EARLY MORNING BLOGS 504

La fable et la v�rit�


La v�rit�, toute nue,
Sortit un jour de son puits.
Ses attraits par le temps �taient un peu d�truits ;
Jeune et vieux fuyaient � sa vue.
La pauvre v�rit� restait l� morfondue,
Sans trouver un asile o� pouvoir habiter.
� ses yeux vient se pr�senter
La fable, richement v�tue,
Portant plumes et diamants,
La plupart faux, mais tr�s brillants.
Eh ! Vous voil� ! Bon jour, dit-elle :
Que faites-vous ici seule sur un chemin ?
La v�rit� r�pond : vous le voyez, je g�le ;
Aux passants je demande en vain
De me donner une retraite,
Je leur fais peur � tous : h�las ! Je le vois bien,
Vieille femme n'obtient plus rien.
Vous �tes pourtant ma cadette,
Dit la fable, et, sans vanit�,
Partout je suis fort bien re�ue :
Mais aussi, dame v�rit�,
Pourquoi vous montrer toute nue ?
Cela n'est pas adroit : tenez, arrangeons-nous ;
Qu'un m�me int�r�t nous rassemble :
Venez sous mon manteau, nous marcherons ensemble.
Chez le sage, � cause de vous,
Je ne serai point rebut�e ;
� cause de moi, chez les fous
Vous ne serez point maltrait�e :
Servant, par ce moyen, chacun selon son go�t,
Gr�ce � votre raison, et gr�ce � ma folie,
Vous verrez, ma s�ur, que partout
Nous passerons de compagnie.


(Florian)

*

Bom dia!

26.5.05
 


A CONSTITUI��O QUE NUNCA TEM NADA A VER COM AS RAZ�ES PELAS QUAIS SE LHE DIZ �N�O�

S�o estas pequenas coisas, que passam desapercebidas, que manipulam a opini�o p�blica: no notici�rio da 2, a pretexto das manifesta��es dos agricultores e vinhateiros franceses que apelavam ao �n�o�, a jornalista-locutora diz que o �n�o� cresce em Fran�a �por coisas que nada t�m a ver com a Constitui��o Europeia�, um ju�zo de valor n�o uma not�cia. �Por coisas que nada t�m a ver com a Constitui��o Europeia�? Esta agora! Ent�o a Constitui��o n�o tem a ver com tudo? Ent�o o governo da Europa, as suas pol�ticas e os seus efeitos, nada t�m a ver com o texto constitucional?

A descri��o da Constitui��o pelos seus defensores oscila, ao sabor das circunst�ncias, entre um angelismo absoluto � a Constitui��o nada tem a ver com a UE tal como ela � de facto, nem com as pol�ticas europeias � ou como um upgrade pol�tico salv�fico da UE que dar� uma nova dimens�o a todas as pol�ticas europeias. N�o, as �coisas que nada t�m a ver com a Constitui��o Europeia�, n�o s�o mesmo nenhumas, todas t�m a ver, por muito que isso custe aos que queriam que os europeus votassem no texto de um documento puramente ang�lico, uma nuvem benfazeja, pairando no mundo jur�dico das regras abstractas, escritas pelos Melhores em nome do Bem.

(Colocado igualmente no S�TIO DO N�O.)
 


INTEND�NCIA

Mais entradas na bibliografia dos ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO e actualiza��o do S�TIO DO N�O.

Publicada no P�blico uma nova vers�o de OS CINQUENTA MOMENTOS POL�TICOS MAIS IMPORTANTES DEPOIS DO 25 DE ABRIL de que saiu a 1� PARTE (1974-1985), com a seguinte nota : "Esta lista teve origem no Abrupto onde conheceu tr�s vers�es, alteradas e acrescentadas pelos leitores e pelas cr�ticas e sugest�es de outros blogues. Nesse sentido, sendo de minha responsabilidade individual, � tamb�m uma obra colectiva. No Abrupto sair�, posteriormente � sua publica��o no P�blico, a vers�o final com a lista das contribui��es, e as liga��es que o texto do jornal n�o permite fazer."

O que ser� feito depois da 2� PARTE.
 


GRANDES CAPAS

 


EARLY MORNING BLOGS 503

Lines on Retirement, after Reading Lear


for Richard Pacholski

Avoid storms. And retirement parties.
You can�t trust the sweetnesses your friends will
offer, when they really want your office,
which they�ll redecorate. Beware the still
untested pension plan. Keep your keys. Ask
for more troops than you think you�ll need. Listen
more to fools and less to colleagues. Love your
youngest child the most, regardless. Back to
storms: dress warm, take a friend, don�t eat the grass,
don�t stand near tall trees, and keep the yelling
down�the winds won�t listen, and no one will
see you in the dark. It�s too hard to hear
you over all the thunder. But you�re not
Lear, except that we can�t stop you from what
you�ve planned to do. In the end, no one leaves
the stage in character�we never see
the feather, the mirror held to our lips.
So don�t wait for skies to crack with sun. Feel
the storm�s sweet sting invade you to the skin,
the strange, sore comforts of the wind. Embrace
your children�s ragged praise and that of friends.
Go ahead, take it off, take it all off.
Run naked into tempests. Weave flowers
into your hair. Bellow at cataracts.
If you dare, scream at the gods. Babble as
if you thought words could save. Drink rain like cold
beer. So much better than making theories.
We�d all come with you, laughing, if we could.


(David Wright)

*

Bom dia!

25.5.05
 


GRANDES CAPAS



Grande capa, grande livro necess�rio para os dias de hoje. Talvez acrescentar "fabricar um blogue", no cap�tulo da Solarine, insecticidas e espelhos...
 


INTEND�NCIA

Actualizados os ESTUDOS SOBRE COMUNISMO e a sua eterna bilbiografia.

Actualizado o S�TIO DO N�O com mais "n�os" e "sins". Chamo a aten��o para este texto O "N�O" DE MICHEL ONFRAY.

Colocado no VERITAS FILIA TEMPORIS o artigo que escrevi h� uma semana no P�blico, agora sem liga��es, sobre as manobras do d�fice ATEN��O: OPERA��O DE PROPAGANDA EM CURSO.

Ufa, j� chega!
 


EARLY MORNING BLOGS 502

This Is Just To Say

I have eaten
the plums
that were in
the icebox

and which
you were probably
saving
for breakfast

Forgive me
they were delicious
so sweet
and so cold


(William Carlos Williams)

*

Bom dia!

*

Rui Amaral chamou a aten��o para uma tradu��o no Quartzo, Feldspato & Mica de Jo�o Lu�s Barreto Guimar�es e ainda in�dita fora da rede.

ERA S� PARA DIZER

Eu comi
as ameixas
que estavam
no frigorifico

as quais
estavas provavelmente
a guardar
para o pequeno almo�o

Perdoa-me
estavam deliciosas
t�o doces
e t�o frias

24.5.05
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES
AR PURO E FUTEBOL�NDIA


Penso que o Abrupto (...) vai gostar de fazer saber ao pa�s que n�o se vive s� de futebol, nestes dias... o Jo�o Garcia � um alpinista portugu�s que, no passado S�bado, subiu ao 4� cume mais alto do Mundo (Lhotse, 8516m). Foi o primeiro portugu�s que pisou o Everest em 1999, facto que lhe deu a notoriedade actual porque sofreu um grave acidente e tamb�m porque nele perdeu o seu melhor amigo. Como no passado S�bado tudo correu bem e o Jo�o n�o teve acidente nenhum, foi not�cia ontem, no jornal da SIC, durante 2 minutos, e ningu�m festejou coisa nenhuma, a n�o ser a fam�lia e os amigos dele!

Este homem j� subiu seis dos catorze cumes mais altos do Mundo, o que � not�vel se pensarmos que at� hoje apenas doze criaturas foram capazes de o fazer... Quando se vai � lua e a mais uma s�rie de lugares, o que � que isto tem de especial? Estes catorze cumes t�m altitudes superiores a oito mil metros, onde a parca oxigena��o do c�rebro luta com a racionalidade necess�ria para n�o cometer nenhum erro. Erros, descuidos ou c�lculos imperfeitos pagam-se com a vida! A uma altitude em que � preciso inspirar oito vezes para conseguir dar um passo... � caso para dizer que temos um h�roi nacional! Um requinte: quando subiu ao Everest, juntou-se a uma pequena elite de aproximadamente oitenta pessoas que o conseguiram fazer sem recurso a oxig�nio artificial, entre os aproximadamente 2 milhares de pessoas que j� l� foram.

(...)

Nunca terei seguramente capacidade para entender o que � que motiva o Jo�o a desafiar a morte repetidamente, mas fico orgulhosa por saber que h� um homem que leva Portugal ao topo do Mundo, a troco de algo que s� ele entende.

Acredito que o caro JPP tamb�m esteja orgulhoso do Jo�o Garcia, um her�i nacional genu�no, s� compar�vel aos nossos navegadores quinhentistas... que, por ares n�o antes respirados e mais do que permite a for�a humana, em lugares remotos conseguiu marcar, a presen�a do grande Portugal!

Portugal queixa-se de tudo. Depois comemora tudo. E volta tudo ao habitual queixume.... O Jo�o n�o � comemorado, mas n�o se queixa. E volta a planear a nova subida, para levar Portugal ao tecto do Mundo.

Mais factos e opini�es no site do jornal P�blico e no blogue que alguns amigos dele iniciaram h� uns dias, para lhe dar leitura de cabe�eira quando ele chegar ao aeroporto da Portela e, mais uma vez, ser um not�vel desconhecido!

(Sofia Pereira)
 


OS LIVROS DA S�BADO

A DIOGNETO



Em 1436, Tomaz de Arezzo, um monge italiano que estava a estudar grego em Biz�ncio, comprou peixe num mercado. Biz�ncio estava nos seus �ltimos anos �gregos� antes de ser ocupada pelo sult�o e os seus turcos. Quando chegou a casa verificou que o embrulho do peixe era um manuscrito muito antigo que ele n�o conhecia. Voltou a correr para o mercado e comprou as folhas que sobravam e se destinavam a embrulhar mais peixe. Tinha recuperado uma compila��o de obras atribu�das a S. Justino, um filosofo do s�culo II que se tinha convertido � nova religi�o e se tornara no primeiro apologista do cristianismo. Entre elas vinha uma que era completamente desconhecida e de autor an�nimo, uma carta a um tal Diogneto, um pag�o culto e curioso que mostrava interesse em saber:

�Qual � esse Deus no qual confiam e como o veneram, para que todos eles desdenhem o mundo, desprezem a morte, e n�o considerem os deuses que os gregos reconhecem, nem observem a cren�a dos judeus; que tipo de amor � esse que eles t�m uns para com os outros; e, finalmente, por que esta nova estirpe ou g�nero de vida apareceu agora e n�o antes. �

O an�nimo apologista come�a assim a resposta:

�Aprovo este teu desejo e pe�o a Deus, o qual preside tanto o nosso falar como o nosso ouvir, que me conceda dizer de tal modo que, ao escutar, te tornes melhor; e assim, ao escutares, n�o se arrependa aquele que falou.� (*)

A livraria Alcal�, que tem uma not�vel colec��o de documentos crist�os primitivos, publicou o breve texto do s�culo II numa edi��o bilingue anotada e comentada por Isidro Pereira Lamelas. N�o se assustem com o car�cter erudito da edi��o, porque vale a pena mergulharem na voz original do cristianismo, quando ela era ainda fresca e pura e �falava�, por cima das diferen�as, com um pag�o de boa vontade e crente nos seus deuses. Em poucos textos como este se percebe a for�a e o impacto que a nova religi�o, vinda do juda�smo, teve no mundo cl�ssico greco-latino.

(*) Uso uma tradu��o diferente porque no momento em que escrevo n�o tenho o �meu� Diogneto ao lado.

23.5.05
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: OS AN�IS VISTOS COM OUTROS OLHOS



Cada vez olhando melhor, de mais perto e com outra luz.
 


INTEND�NCIA

Mais actualiza��es na bibliografia dos ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO.
 


FUTEBOL�NDIA

Estamos assim, pobretes mas alegretes. Arruaceiros e �picos. A televis�o p�blica d� o exemplo: depois de vinte minutos de n�o-not�cia (a parte informativa do futebol n�o dava num pa�s civilizado mais de dois ou tr�s minutos), l� se lembrou que havia uma coisa chamada d�fice. Inebriados pela habitua��o, os telespectadores devem ter ido a correr para a SIC e a TVI. A TVI titulava a "Festa dos Her�is" e ao lado a palavra "balne�rio". Os "her�is", j� n�o me lembra o que significava esta palavra antes da instaura��o do regime da Futebol�ndia, eram uns homens em trajos menores aos saltos e muita intimidade corporal. A SIC passou a falar do d�fice dez minutos depois, a TVI ainda estava aos saltos.

*
Hoje de manh�, quando vinha trabalhar � a ouvir o r�dio do carro, como habitualmente - dei por mim a matutar nas duas grandes not�cias, o d�fice e a bola.

E pensava: �Este maravilhoso entusiasmo, esta for�a emotiva, este imenso sentido de perten�a, este esp�rito de sacrif�cio (gente que anda centenas de quil�metros, que gasta sem contar, que fica a p� at� �s 4 da manh�, para ver os artistas) n�o poderiam ser atrelados � carro�a desconjuntada da nossa economia, do �Estado a que isto chegou�, e de qualquer forma, ao servi�o de uma causa de recupera��o econ�mica e de progresso moral e material da P�tria?�

(Sou antiquado, ainda penso P�tria, recuso-me a ser apenas �deste pa�s�)

No mesmo f�lego, a R�dio informou-me dos passeios cobertos de lixo, de latas de cerveja vazias, de garrafas de cerveja partidas, de gente que n�o iria trabalhar ou � escola, porque �tinha valido a pena��

E de repente, tive a minha resposta: N�o, n�o � poss�vel�

Toda essa for�a � apenas uma manifesta��o tribal, uma adora��o e um sacrif�cio ao totem, ao que d� sentido ao que n�o tem sentido, � incapacidade e � impot�ncia.

N�o � enformada por um resqu�cio de racionalismo, n�o h� possibilidade de lhe dar uma direc��o e um significado outro, que n�o o da emerg�ncia (tempor�ria?) vitoriosa do primevo que existe em todos n�s, sobre o verniz de civiliza��o que geralmente nos cobre.

S�culos de filosofia e estudo, pr�-socr�ticos, helenistas, aristot�licos, hebraicos, mu�ulmanos, medievos, renascentistas, cartesianos� por a� fora, at� ontem � noite. Lixo t�o in�til, como as garrafas de cerveja partidas pelos passeios� E viva o Benfica!

(Luis)
 


AR PURO


John Ruskin, Cascade de la folie
 


EARLY MORNING BLOGS 501

Break of Day


Stay, O sweet, and do not rise ;
The light that shines comes from thine eyes ;
The day breaks not, it is my heart,
Because that you and I must part.
Stay, or else my joys will die,
And perish in their infancy.


(John Donne)

*

Bom dia!

22.5.05
 


PORTUGAL,O REINO DA FUTEBOL�NDIA

(Em directo na TVI) Com a delicadeza de estilo, respeito c�vico, esp�rito desportivo, bons costumes, e fino linguajar que o caracteriza.
 


POR QUE RAZ�O OS GOVERNANTES E A INTELLIGENTSIA FRANCESA SE D�O MAL COM O GOOGLE

No Le Monde de hoje mais uma evidente explica��o das raz�es porque as consultas de endere�os no Google fornecem t�o poucos resultados franceses. Se eu procurar um blogue, um software (logiciel na terminologia da Commission g�n�rale de terminologie et de n�ologie) para blogues, procuro em blog, weblog, blogue ou "bloc-notes"?


Ne dites plus jamais blog mais bloc-notes


Ne dites plus jamais blog ! La Commission g�n�rale de terminologie et de n�ologie a publi� au Journal officiel du 20 mai un avis �tablissant une liste de termes et d'expressions destin�s � supplanter les anglicismes sur Internet. Ainsi, "bloc-notes", que l'on pourra accepter sous sa forme abr�g�e "bloc", d�signera "un site sur la Toile, souvent personnel, pr�sentant en ordre chronologique de courts articles ou notes, g�n�ralement accompagn�s de liens vers d'autres sites", soit un blog.
D'autres expressions anglo-saxonnes famili�res aux internautes ont d�sormais leur �quivalent en fran�ais. La commission propose de traduire un "hoax" (une fausse information) par un "canular". Le "worm", ce logiciel malicieux qui se transmet par le R�seau et perturbe le fonctionnement des syst�mes, devient logiquement un "ver". Quant au "splash screen", qui s'affiche � l'�cran pendant le chargement d'un fichier, d'un programme ou d'un logiciel, il faudra dor�navant dire "fen�tre d'attente".
 


COISAS COMPLICADAS


Larry Rivers, Constitution
 


EARLY MORNING BLOGS 500

Perdre le Midi quotidien


Perdre le Midi quotidien ; traverser des cours, des arches, des ponts ; tenter les chemins bifurqu�s ; m'essouffler aux marches, aux rampes, aux escalades ;

�viter la st�le pr�cise ; contourner les murs usuels ; tr�bucher ing�nument parmi ces rochers factices ; sauter ce ravin ; m'attarder en ce jardin ; revenir parfois en arri�re,

Et par un lacis r�versible �garer enfin le quadruple sens des Points du Ciel.

*

Tout cela, � amis, parents, familiers et femmes, � tout cela, pour tromper aussi vos ch�res poursuites ; pour oublier quel coin de l'horizon carr� vous rec�le,

Quel sentier vous ram�ne, quelle amiti� vous guide, quelles bont�s menacent, quels transports vont �clater.

*

Mais, per�ant la porte en forme de cercle parfait ; d�bouchant ailleurs : (au beau milieu du lac en forme de cercle parfait, cet abri ferm�, circulaire, au beau milieu du lac, et de tout,)

Tout confondre, de l'orient d'amour � l'occident h�ro�que, du midi face au Prince au nord trop amical, � pour atteindre l'autre, le cinqui�me, centre et Milieu.

Qui est moi.


(Victor Segalen)

*

Bom dia!

21.5.05
 


A VER / LER

A Cidade Surpreendente, um blogue surpreendente com as cores do Porto e s� l� no Alto se sabe como s�o dif�ceis de ver e mostrar.

Uma serpente negra na Astronomy Picture of the Day.
 


MORREU PAUL RICOEUR

para que se recorde, agora que entrou para a "mem�ria" que t�o bem compreendeu.

A ler o artigo sobre Ricoeur na Stanford Encyclopedia of Philosophy.
 


AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS 13


SINAIS DA POL�TICA EM ERAS VIOLENTAS


Pol�cia Portuguesa era a revista oficial da PSP e, como a capa com os velhos sinaleiros de cabe�a de giz (tempus edax rerum, mais uma vez) mostra, uma t�pica revista corporativa do Estado Novo. Este n�mero tem no entanto um reclame da Mercedes que me recordou um velho conhecido meu e de muitos manifestantes antes do 25 de Abril, o carro de �gua. Antes do 25 de Abril, o carro de �gua era a menos assustadora realidade do vendaval repressivo que era atirado para cima dos manifestantes. As manifesta��es duravam meia d�zia de minutos e pouco mais eram do que ajuntamentos breves. Logo a seguir, vinha a pol�cia de choque a bater, nalguns casos com c�es, depois a PIDE fazia pris�es selectivas, e por fim o carro da �gua varria o que sobrava nos passeios. Os passeios eram um elemento fundamental nas manifesta��es porque era o engrossar dos ajuntamentos nos passeios que era preliminar ao breve acto de ir para o meio da rua. Para al�m disso, muita gente que n�o queria arriscar-se a manifestar, mas entendia que l� devia estar, andava lentamente pelos passeios. Uma �ltima nota sobre o carro de �gua: eu e mais gente �amos para as manifesta��es com o "traje" apropriado, ou seja, roupa que se podia estragar. A pol�cia misturava tinta azul ou azul de metileno na �gua do carro com o duplo objectivo punitivo de sujar a roupa com uma tinta resistente � lavagem e identificar os manifestantes.

 


EARLY MORNING BLOGS 499

EL ESCUCHADOR (GUSTAVO ADOLFO B�CQUER)


Mueve el viento.
Mueve el velo
quedo.

Mueve el aire.
Mueve el arce.
Vase.

Luz sin habla.
Voz callada.
Clara.

Sombra justa.
Suena muda.
Luna.

Y �l la escucha.


(Vicente Aleixandre)

*

Bom dia!

20.5.05
 


OS LIVROS DA S�BADO

GOSTAR DE PORTUGAL

Gostar de Portugal de uma forma escorreita, escrever sobre Portugal de muito pr�ximo, ter de Portugal uma intimidade feita de andar a p� pelas suas terras, observar, desenhar, anotar foi o que fez durante a sua vida Fernando Galhano. O livro P�ginas de Cultura e Arte, antologia dos artigos e desenhos publicados no Com�rcio do Porto nos anos sessenta e editados pela Caixotim, � um excelente retrato desse gosto, t�o raro entre n�s. O que impressiona nos textos e desenhos de Fernando Galhano � a sua eleg�ncia e leveza est�tica, o fluir do olhar com rigor sobre coisas que j� n�o iremos mais ver: uma rapariga a moer o cereal para preparar umas papas numa aldeia serrana, uma cozinha rural, uma trovoada no rio Douro, um rio que quem o conhece tem medo dele, fragmentos de um Portugal que � hoje o �pa�s estrangeiro� do nosso passado.

Galhano fazia parte de um pequeno grupo de portugueses que transformaram esse gosto em estudo, em literatura e arte, e que sem eles, n�o existiria para n�s. O salazarismo pretendeu apropriar-se desta movimento de recolha das coisas p�trias para o elevar a uma apologia do mundo rural e mar�timo, que pouco mais era do que uma apologia da pobreza. Mas esta gera��o de homens � Ernesto Veiga de Oliveira, Benjamim Pereira, Jorge Dias, Orlando Ribeiro, a equipa de Keil do Amaral coligiu a Arquitectura Popular Portuguesa, Lopes Gra�a e Giacometti, e alguns outros - sobreviveu a essa apropria��o ideol�gica do seu trabalho.

Politicamente eram muito diferentes, havia comunistas e gente pr�xima do regime salazarista, mas olhavam para Portugal de uma forma que podemos reconhecer n�o s� como nossa, mas tamb�m como nos fazendo falta hoje, quando a destrui��o acelerada da paisagem e do habitat j� est� em grande parte consumada. Um Portugal que j� estava a acabar no seu tempo foi assim salvo in extremis para a nossa mem�ria. Eles ouviram por n�s os �ltimos velhos que ainda cantavam uma �ltima can��o tradicional antes da r�dio e televis�o impregnarem os ouvidos, fotografaram as velhas casas, palheiros e espigueiros, os utens�lios de trabalho, recolheram as lendas, os prov�rbios, as pr�ticas culturais e de trabalho de lavradores, pastores e pescadores, caminharam por caminhos que n�s, criminosamente, estamos a fazer com que v�o dar a parte nenhuma.

*

Escrevo-lhe para retificar um nome sa�do neste seu post, a saber, Benjamim Pereira era e �, por que est� vivo e de boa sa�de, um etn�grafo do famigerado e brilhante grupo de Jorge Dias, e n�o Benjamim Ribeiro, como consta.[corrigido] Recomendo o livro Etnografias Portuguesas (1870-1970). Cultura Popular e Identidade Nacional de Jo�o Leal publicado na colec��o da Dom Quixote, Portugal de Perto, que aborda o trabalho deste grupo de etn�grafos bem como o tema da arquitectura desde Raul Lino ao trabalho de Keil do Amaral, entre outros assuntos.

(S�rgio Alves)
 


INTEND�NCIA

Em actualiza��o os ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO.
 


AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS 12

QUANDO O MUNDO TINHA ORDEM E OS MAUS ERAM MESMO MAUS






Numa altura em que mais umas toneladas chegam (uma e meia presumo), estas capas de livros de "maus".
 


EARLY MORNING BLOGS 498

Why It Often Rains in the Movies


Because so much consequential thinking
happens in the rain. A steady mist
to recall departures, a bitter downpour
for betrayal. As if the first thing
a man wants to do when he learns his wife
is sleeping with his best friend, and has been
for years, the very first thing
is not to make a drink, and drink it,
and make another, but to walk outside
into bad weather. It's true
that the way we look doesn't always
reveal our feelings. Which is a problem
for the movies. And why somebody has to smash
a mirror, for example, to show he's angry
and full of self-hate, whereas actual people
rarely do this. And rarely sit on benches
in the pouring rain to weep. Is he wondering
why he didn't see it long ago? Is he wondering
if in fact he did, and lied to himself?
And perhaps she also saw the many ways
he'd allowed himself to be deceived. In this city
it will rain all night. So the three of them
return to their houses, and the wife
and her lover go upstairs to bed
while the husband takes a small black pistol
from a drawer, turns it over in his hands,
then puts it back. Thus demonstrating
his inability to respond to passion
with passion. But we don't want him
to shoot his wife, or his friend, or himself.
And we've begun to suspect
that none of this is going to work out,
that we'll leave the theater feeling
vaguely cheated, just as the movie,
turning away from the husband's sorrow,
leaves him to be a man who must continue,
day after day, to walk outside into the rain,
outside and back again, since now there can be
nowhere in this world for him to rest.


(Lawrence Raab)

*

Bom dia!

19.5.05
 


COISAS SIMPLES


Kuzma Petrov-Vodkin
 


CONTRA O VOTO "BOM" E O VOTO "MAU"

Os votos num referendo, no caso que agora nos interessa no referendo europeu, s�o necessariamente transversais. Admito que as decis�es partid�rias a favor do �sim� afectem muitos militantes e eleitores e que estes votem em concord�ncia. � ali�s para potenciar este efeito que se escolheu fazer o referendo europeu acoplado �s elei��es aut�rquicas que desfavorecem o debate, e n�o nas presidenciais que o potenciavam. Mas h� muito voto solto e livre e muita gente votar� apenas pelas raz�es do �sim� e do �n�o�.

Os partid�rios do �sim� t�m sistematicamente desvalorizado aquilo que consideram s� existir do lado do �n�o�: uma converg�ncia de vota��es por motivos muito diversos, alguns que parecem pouco recomend�veis. Mas esta chantagem pol�tica que atribui ao �sim� uma limpidez pol�tica e moral superior ao �n�o� tem que ser liminarmente recusada. O voto �sim� como o voto �n�o� tem clarezas e ambiguidades, mas depois do debate, se houver debate contra o falso consenso, os votos valem o mesmo.

O meu voto �n�o� misturar-se-� com outros �n�os� diferentes dos meus, alguns dos quais s�o por raz�es que recuso. Eu pessoalmente n�o me reconhe�o nas raz�es do PCP e do BE para votarem n�o, nem nas de grupos nacionalistas da direita radical para votarem no mesmo sentido. Entendo que o debate deve ter outras componentes e outros intervenientes e n�o ficar preso aos dilemas da vis�o �social� de comunistas e bloquistas e do soberanismo extremado dos nacionalistas. Mas isso n�o me condiciona, nem me impede de discutir todas as raz�es com todos, desde que sejam dados argumentos e n�o impreca��es. Se desejo que um n�mero significativo de �n�os� se expresse eu aceito o princ�pio b�sico que em democracia e nas urnas os votos s�o exactamente iguais e exactamente oriundos do mesmo acto de liberdade.

E mais: dar�o um sinal pol�tico mais inequ�voco do que as raz�es que os justificaram a montante e a jusante � e esse sinal � que assim, com esta Constitui��o, toda a agenda que gravita � sua volta, e as suas consequ�ncias, n�o se constr�i uma Europa de paz, progresso material e liberdade. O �sim� n�o garante que assim seja, o �n�o� ajuda a que se volte para tr�s da insensatez imprudente dos �ltimos anos e se fa�a melhor e diferente.

(Nota colocada tamb�m no S�TIO DO N�O.)
 


EARLY MORNING BLOGS 497

WHEN HALF THE TIME THEY DON'T KNOW THEMSELVES...


Old cathedrals, old markets, good and firm things
And old streets, one always feels intercepted
As they walk quickly past, no nonsense, cabbages
And turnips, the way they get put into songs:

One needn't feel offended
Or shut out just because the slow purpose
Under it is evident,
Because someone is simply there.

Yet it's a relief to look up
To the moist, imprecise sky,
Thrashing about in loneliness,
Inconsolable...

There has to be a heart to this.
The words are there already.
Just because the river looks like it's flowing backwards
Doesn't mean that motion doesn't mean something,
That it's incorrect as a metaphor.

And the way stones sink,
So gracefully,
Doesn't rob them of the dignity
Of their cantankerous gravity.

They are what they are and what they seem.
Maybe our not getting closer to them
Puts some kind of shine on us
We didn't consent to,
As though we were someone's car:
Large, animated, calm.

(John Ashbery)

*

Bom dia!
 


INTEND�NCIA

Actualizados os ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO , incluindo a bibliografia.

18.5.05
 


EST� NA HORA DE ORGANIZAR O MOVIMENTO DO �N�O� 2

H� um conjunto de blogues e de co-autores de blogues que s�o a favor do �n�o� � Constitui��o Europeia. N�o t�m as mesmas raz�es, nem os mesmos argumentos, mas o movimento do �n�o� tem que ser agregador, n�o sect�rio e ter fronteiras largas. A sugest�o que fa�o � criar-se um blogue do �n�o� para que todos contribuam come�ando um debate organizado, mesmo que o fa�am duplicando a� as notas que originalmente publicam nos seus s�tios. Para facilitar criei um blogue S�TIO DO N�O como sugest�o. N�o posso, no entanto, garantir a� mais do que colabora��o, nunca a gest�o solit�ria do s�tio para que n�o tenho disponibilidade de tempo. Entregarei a casa e as chaves a quem queira seriamente tratar do assunto, ou encerr�-lo-ei caso apare�a melhor iniciativa com o mesmo fim.
 


COISAS COMPLICADAS


Larry Rivers, John Ashbery working
 


EST� NA HORA DE ORGANIZAR O MOVIMENTO DO �N�O�

Todos aqueles que querem votar �n�o� e n�o se rev�em no �n�o� do PCP e do BE � Constitui��o Europeia, de que est�o � espera para organizar um movimento que explique as suas raz�es aos portugueses? Ou o derrotismo face � gigantesca coliga��o do �sim�, com todos os partidos e todos os meios, j� impera? Os partid�rios do �sim� usam toda a sua for�a institucional. O Presidente da Rep�blica j� anda em campanha pelo �sim� nas escolas, mostrando que nesta mat�ria n�o se importa de ser presidente s� de uma parte dos portugueses. S�crates, Vitorino, Cavaco, Marcelo, Marques Mendes e Portas vir�o defender o �sim�. O dinheiro da Comiss�o e do Parlamento Europeu j� flui para encartes, artigos, panfletos e col�quios com os p�dios ou as audi�ncias cuidadosamente equilibrados para se parecer que se debate, quando n�o se debate, ou, quando se debate, n�o haver exposi��o p�blica dos argumentos do �n�o�. Est� na hora de se exigir � r�dio e � televis�o p�blicas um acesso igual aos defensores do "sim" e do "n�o", como � suposto numa democracia.

Sen�o tudo ser�, como j� �, prudente, sottovoce, regrado e controlado para que o �sim� ganhe pela porta de tr�s, sub-rept�cio, a reboque de umas elei��es aut�rquicas em que, est�-se mesmo a ver, a quest�o europeia vai ser muito discutida. Est� pois na altura de criar um movimento, um f�rum de debate p�blico, um ajuntamento, seja l� o que for, para explicar porque raz�o se deve pensar duas vezes antes de assinar de cruz um tratado cujas implica��es podem ser tr�gicas para quem deseja uma Europa unida mas uma Europa de na��es e n�o uma h�brida constru��o transnacional, pouco democr�tica, subordinada a um direct�rio franco-alem�o e a uma burocracia internacional que funciona, como todas as burocracias, para aumentar o seu poder.
 


EARLY MORNING BLOGS 496

anyone lived in a pretty how town

anyone lived in a pretty how town
(with up so floating many bells down)
spring summer autumn winter
he sang his didn't he danced his did

Women and men(both little and small)
cared for anyone not at all
they sowed their isn't they reaped their same
sun moon stars rain

children guessed(but only a few
and down they forgot as up they grew
autumn winter spring summer)
that noone loved him more by more

when by now and tree by leaf
she laughed his joy she cried his grief
bird by snow and stir by still
anyone's any was all to her

someones married their everyones
laughed their cryings and did their dance
(sleep wake hope and then)they
said their nevers they slept their dream

stars rain sun moon
(and only the snow can begin to explain
how children are apt to forget to remember
with up so floating many bells down)

one day anyone died i guess
(and noone stooped to kiss his face)
busy folk buried them side by side
little by little and was by was

all by all and deep by deep
and more by more they dream their sleep
noone and anyone earth by april
wish by spirit and if by yes.

Women and men(both dong and ding)
summer autumn winter spring
reaped their sowing and went their came
sun moon stars rain


(e.e.cummings)

*

Bom dia!
 


POBRE PA�S , O NOSSO
COME�OU A FESTA

J� se come�ou a perceber como o governo S�crates vai actuar: est� em curso uma opera��o de propaganda e condicionamento a prop�sito do n�mero do d�fice, destinada a abrir caminho a medidas que n�o tocam no essencial da despesa p�blica aumentando mais uma vez a carga fiscal; tomou-se mais uma medida t�pica do nosso mundo de redomas proteccionistas selectivas, a inspec��o �s lojas chinesas (quantos restaurantes portugueses ficariam abertos se houvesse uma massiva inspec��o sanit�ria?); e avan�ou-se com uma medida perigosa, a nacionaliza��o de parte de uma empresa estrangeira, oferecendo ao estado uma f�brica de comboios, enviando um preocupante sinal aos investidores estrangeiros e abrindo uma nova frente de despesismo. Come�ou a festa, o mau governo.

17.5.05
 


AR PURO


Gal�xia M51 fotografada pelo telesc�pio espacial Hubble.
Para perder a respira��o, mesmo com o ar puro, ver aqui em todo o ESPLENDOR,
 


EARLY MORNING BLOGS 495

Meaningful Love


What the bad news was
became apparent too late
for us to do anything good about it.

I was offered no urgent dreaming,
didn't need a name or anything.
Everything was taken care of.

In the medium-size city of my awareness
voles are building colossi.
The blue room is over there.

He put out no feelers.
The day was all as one to him.
Some days he never leaves his room
and those are the best days,
by far.

There were morose gardens farther down the slope,
anthills that looked like they belonged there.
The sausages were undercooked,
the wine too cold, the bread molten.
Who said to bring sweaters?
The climate's not that dependable.

The Atlantic crawled slowly to the left
pinning a message on the unbound golden hair of sleeping maidens,
a ruse for next time,

where fire and water are rampant in the streets,
the gate closed�no visitors today
or any evident heartbeat.

I got rid of the book of fairy tales,
pawned my old car, bought a ticket to the funhouse,
found myself back here at six o'clock,
pondering "possible side effects."

There was no harm in loving then,
no certain good either. But love was loving servants
or bosses. No straight road issuing from it.
Leaves around the door are penciled losses.
Twenty years to fix it.
Asters bloom one way or another.


(John Ashbery)

*

Bom dia!
 


AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS 11


AVENTURAS
(Para o Almocreve das Petas.)


16.5.05
 


OS LIVROS DA S�BADO

O CAMINHO DA �CAMINHO�

Quem gosta de livros sabe que a Caminho � uma das melhores editoras portuguesas. Ligada ao PCP, funcionando no seu in�cio como bra�o civil das Edi��es Avante!, publicando para os agn�sticos e os incr�us mais daquilo que a casa m�e publicava para os fi�is, a Caminho nem por isso deixou de �caminhar� para aquilo que � hoje: n�o apenas uma boa editora, mas uma excelente editora. Dominante em muitas �reas da edi��o, como o livro infantil e juvenil, a Caminho iniciou uma variante portuguesa de livros de arte muito semelhante no formato e ilustra��o a uma id�ntica colec��o da Taschen, numa s�rie dirigida por Bernardo Pinto de Almeida e Armando Alves.
Na colec��o sa�ram j� tr�s volumes, sobre Almada, Ant�nio Carneiro e Alvarez, e como os dois �ltimos s�o menos conhecidos do grande p�blico, podem e devem funcionar como descobertas para um Portugal desconhecido. Veja-se, como aperitivo ao mundo genial de Alvarez, o moinho da capa do seu livro. � verdade que Alvarez era meio galego e que aquela paisagem n�o � portuguesa, mas basta para se perceber como o mundo ic�nico da pintura fica mais complexo se lhe somarmos coisas como este moinho ou o �Nocturno de Le�a� de Ant�nio Carneiro. Vale a pena.

(Entretanto sa�ram mais volumes.)
 


FORMAS DE SENSIBILIDADE ANTIGAS

AMOR FILIAL

 


AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS 10


DO CAOS PARA A ORDEM O PROGRESSO AVAN�A!

Ordem e progresso.

Livros deitados para se acamarem, amansarem, disciplinarem. Depois ser�o colocados em p�, pressionados uns contra os outros, numa gaiola em forma de estante, para se socializarem pelo conv�vio pr�ximo. Estes ainda n�o se socializam vendo televis�o, embora haja l� uma Escrava Isaura, e v�rias Gabrielas, 007s , E Tudo o Vento Levou. Quem � que disse que uma biblioteca (p�blica, a Widener acho eu ) respirava de dia e inspirava de noite, com os livros a sairem da estante e a serem devolvidos como o mol�culas de ar? N�o sei. Esta para j� s� respira p�.
 


EARLY MORNING BLOGS 494

UNE T�TE SORT DU MUR


J'ai l'habitude, le soir, bien avant d'y �tre pouss� par la fatigue, d'�teindre la lumi�re.

Apr�s quelques minutes d'h�sitation et de surprise, pendant lesquelles J'esp�re peut-�tre pouvoir m'adresser � un �tre, ou qu'un �tre viendra � moi, je vois une t�te �norme de pr�s de deux m�tres de surface qui, aussit�t form�e, fonce sur les obstacles qui la s�parent du grand air.

D'entre les d�bris du mur trou� par sa force, elle appara�t � l'ext�rieur (je la sens plus que je ne la vois) toute bless�e elle-m�me et portant les traces d'un douloureux effort.

Elle vient avec l'obscurit�, r�guli�rement depuis des mois.

Si je comprends bien, c'est ma solitude qui � pr�sent me p�se, dont j'aspire subconsciemment � sortir, sans savoir encore comment, et que J'exprime de la sorte, y trouvant, surtout au plus fort des coups, une grande satisfaction.

Cette t�te vit, naturellement. Elle poss�de sa vie.

Elle se jette ainsi des milliers de fois � travers plafonds et fen�tres, � toute vitesse et avec l'obstination d'une bielle.

Pauvre t�te !

Mais pour sortir vraiment de la solitude on doit �tre moins violent, moins �nerv�, et ne pas avoir une �me � se contenter d'un spectacle.

Parfois, non seulement elle, mais moi-m�me, avec un corps fluide et dur que je me sens, bien diff�rent du mien, infiniment plus mobile, souple et inattaquable, je fonce � mon tour avec imp�tuosit� et sans r�pit, sur portes et murs. J'adore me lancer de plein fouet sur l'armoire � glace. Je frappe, je frappe, je frappe, j'�ventre, j'ai des satisfactions surhumaines, je d�passe sans effort la rage et l'�lan des grands carnivores et des oiseaux de proie, J'ai un emportement audel� des comparaisons. Ensuite, pourtant, � la r�flexion, je suis bien surpris, je suis de plus en plus surpris qu'apr�s tant de coups, l'armoire � glace ne se soit pas encore f�l�e, que le bois n'ait pas eu m�me un grincement.


(Henri Michaux)

*

Bom dia!

15.5.05
 


MAIS CAPAS DE TRIER PARA LIVROS DE KASTNER
(O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES)



(Enviadas por monika kietzmann.)
 


EARLY MORNING BLOGS 493

Porch Swing in September


The porch swing hangs fixed in a morning sun
that bleaches its gray slats, its flowered cushion
whose flowers have faded, like those of summer,
and a small brown spider has hung out her web
on a line between porch post and chain
so that no one may swing without breaking it.
She is saying it�s time that the swinging were done with,
time that the creaking and pinging and popping
that sang through the ceiling were past,
time now for the soft vibrations of moths,
the wasp tapping each board for an entrance,
the cool dewdrops to brush from her work
every morning, one world at a time.


(Ted Koose)

*

Bom dia!

14.5.05
 


INTEND�NCIA

Continua a ser completada a bibliografia dos ESTUDOS SOBRE COMUNISMO.

Actualizada a nota GRANDES NOMES.
 


AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS 9

VULCANOLOGIA



EM�LIO NUM QUADRO DE CHIRICO



Esta bel�ssima capa de Walter Trier, que veio com a edi��o alem�, tem um ambiente que parece o dos quadros de Chirico. Que se entendesse que dava uma capa apelativa para um livro de literatura juvenil diz alguma coisa sobre a qualidade das edi��es da �poca. A edi��o portuguesa � de 1932. Trier era um convicto opositor de Hitler que saiu da Alemanha e emigrou para Inglaterra, onde trabalhou como desenhador e participou na propaganda anti-nazi. Foi depois para os EUA e para o Canad�. Walt Disney convidou-o a fazer desenhos animados, mas ele recusou. Hoje est� quase esquecido.

UM LIVRO REALMENTE �TIL



Na capa d�-se o melhor exemplo: "Rende-te! Rends-toi! Do you render! Bendieren Sie sich! (Rendiren Zi zixe!)". Mesmo assim, com este arremedo de transcri��o fon�tica para o alem�o. Estamos a ver o nosso soldadinho da I Guerra na Flandres a berrar ao boche "Rendiren Zi zixe!" e ele a obedecer.

UM SALGARI VINTAGE


Edi��o de 1938.

HOMENS: UM CRIMINOSO, UM INOCENTE, E UM CONDENADO




N�o sei se o 411 estava inocente, nem onde � que o Adolfo Coelho, uma esp�cie de jornalista do Crime da �poca, foi buscar o boxeur ou o cadastrado que posa com a metralhadora, mas como se v� as queixas contra a justi�a s�o j� antigas e produzem abundante literatura.
 


COISAS COMPLICADAS


�cone russo do s�culo XIV

1 Sucedeu que, quando o SENHOR estava para elevar a Elias num redemoinho ao c�u, Elias partiu de Gilgal com Eliseu.
2 E disse Elias a Eliseu: Fica-te aqui, porque o SENHOR me enviou a Betel. Por�m Eliseu disse: Vive o SENHOR, e vive a tua alma, que n�o te deixarei. E assim foram a Betel.
3 Ent�o os filhos dos profetas que estavam em Betel sa�ram ao encontro de Eliseu, e lhe disseram: Sabes que o SENHOR hoje tomar� o teu senhor por sobre a tua cabe�a? E ele disse: Tamb�m eu bem o sei; calai-vos.
4 E Elias lhe disse: Eliseu, fica-te aqui, porque o SENHOR me enviou a Jeric�. Por�m ele disse: Vive o SENHOR, e vive a tua alma, que n�o te deixarei. E assim foram a Jeric�.
5 Ent�o os filhos dos profetas que estavam em Jeric� se chegaram a Eliseu, e lhe disseram: Sabes que o SENHOR hoje tomar� o teu senhor por sobre a tua cabe�a? E ele disse: Tamb�m eu bem o sei; calai-vos.
6 E Elias disse: Fica-te aqui, porque o SENHOR me enviou ao Jord�o. Mas ele disse: Vive o SENHOR, e vive a tua alma, que n�o te deixarei. E assim ambos foram juntos.
7 E foram cinquenta homens dos filhos dos profetas, e pararam defronte deles, de longe: e assim ambos pararam junto ao Jord�o.
8 Ent�o Elias tomou a sua capa e a dobrou, e feriu as �guas, as quais se dividiram para os dois lados; e passaram ambos em seco.
9 Sucedeu que, havendo eles passado, Elias disse a Eliseu: Pede-me o que queres que te fa�a, antes que seja tomado de ti. E disse Eliseu: Pe�o-te que haja por��o dobrada de teu esp�rito sobre mim.
10 E disse: Coisa dif�cil pediste; se me vires quando for tomado de ti, assim se te far�, por�m, se n�o, n�o se far�.
11 E sucedeu que, indo eles andando e falando, eis que um carro de fogo, com cavalos de fogo, os separou um do outro; e Elias subiu ao c�u num redemoinho.
12 O que vendo Eliseu, clamou: Meu pai, meu pai, carros de Israel, e seus cavaleiros! E nunca mais o viu; e, pegando as suas vestes, rasgou-as em duas partes.
13 Tamb�m levantou a capa de Elias, que dele ca�ra; e, voltando-se, parou � margem do Jord�o.
14 E tomou a capa de Elias, que dele ca�ra, e feriu as �guas, e disse: Onde est� o SENHOR Deus de Elias? Quando feriu as �guas elas se dividiram de um ao outro lado; e Eliseu passou.
15 Vendo-o, pois, os filhos dos profetas que estavam defronte em Jeric�, disseram: O esp�rito de Elias repousa sobre Eliseu. E vieram-lhe ao encontro, e se prostraram diante dele em terra.


(Bibl�a, Reis, Cap.2)
 


GRANDES NOMES:
O DIREITO DO MAIS FORTE � LIBERDADE / O MEDO CORR�I A ALMA / LAGRIMAS AMARGAS DE PETRA VON KANT


G. Proen�a sugeriu como um grande nome As Lagrimas Amargas de Petra von Kant (Die bitteren Tr�nen der Petra von Kant) filme de Rainer Werner Fassbinder, e eu acrescento O amor � mais frio que a morte (Liebe ist k�lter als der Tod) e, em particular, o t�tulo portugu�s de "Faustrecht der Freiheit", O Direito do Mais Forte � Liberdade, e O Medo Corr�i a Alma (Angst essen Seele auf).

*
Se a evoca��o de t�tulos tamb�m pode contribuir para reavivar mem�rias de Fassbinder, sugiro-lhe mais dois: Liebe ist k�lter als der Tod/O Amor � Mais Frio que a Morte e Warnung vor einer heilingen Nutte/Cuidado Com Aquela Puta Sagrada. Mas j� agora tamb�m o de uma outra importante obra do "jovem cinema alem�o", Die Artisten in der Zirkuskuppel: Ratlos/Os Artistas sob a Cup�la de Circo - Perplexos de Alexander Kluge.

(Augusto M. Seabra)
 


EARLY MORNING BLOGS 492

Rough Country


Give me a landscape made of obstacles,
of steep hills and jutting glacial rock,
where the low-running streams are quick to flood
the grassy fields and bottomlands.
A place
no engineers can master�where the roads
must twist like tendrils up the mountainside
on narrow cliffs where boulders block the way.
Where tall black trunks of lightning-scalded pine
push through the tangled woods to make a roost
for hawks and swarming crows.
And sharp inclines
where twisting through the thorn-thick underbrush,
scratched and exhausted, one turns suddenly
to find an unexpected waterfall,
not half a mile from the nearest road,
a spot so hard to reach that no one comes�
a hiding place, a shrine for dragonflies
and nesting jays, a sign that there is still
one piece of property that won't be owned.


(Dana Gioia)

*

Bom dia!
 


VER A NOITE

Amena, como h� muito n�o estava. Os luzeiros brilham devidamente, a lua ainda est� pequena, Z�firo voltou.

13.5.05
 


AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS 8

MAIS MULHERES: A M�E, A DE CORA��O DE BARRO, A ASSASSINA E A TOUTINEGRA




E A QUE PASSA


 


OS LIVROS DA S�BADO

Para al�m do texto completo dos artigos da S�bado que coloco no VERITAS FILIA TEMPORIS, passarei a reproduzir no Abrupto as notas sobre livros. Esta � a da semana passada, a actual � sobre o livro de Fernando Galhano P�ginas de Cultura e Arte.

EU SOU SUSPEITO

porque sou amigo do Vasco Gra�a Moura, mas que o �ltimo livro de poemas que publicou, Laocoonte, Rimas V�rias, Andamentos Graves � um magnifico livro, �. Eu sou ainda mais suspeito porque alguns desses poemas foram publicados in�ditos no Abrupto, e porque conhe�o noutros a �biografia� que lhe est� por detr�s. Tamb�m vivi a mesma Bruxelas, do regresso a casa � noite�Mas eu n�o suspeito de mim, sei que n�o sou propriamente partid�rio do amiguismo na cr�tica, e que o livro � magnifico, �. Depois, dentro do livro, eu sou tamb�m suspeito de gostar daquele movimento entre falas e autorias, que caminha de um poema para outro, e um � de Hor�cio em latim e Gra�a Moura em portugu�s que soa a latim que soa a portugu�s, outro � uma tradu��o, mais � frente uma vers�o, mais � frente uma cita��o. O poema de Blake do tigre, �brilho em brasa�, caminha assim entre palavras dele e nossas. Eu sou suspeito de gostar de ler um livro assim porque acho que este � o cerne da poesia ocidental, uma conversa interior entre textos, uma �alta� conversa mas mesmo assim uma conversa, de corpo para corpo, de tempestade para tempestade, de m�sica para m�sica, de verso para verso, de palavras para palavras, de emo��es para emo��es. Um dos poemas fala disso, do mundo que j� coube e que j� n�o cabe na poesia, mas fala na voz de um �fabro� como Dante chamava a Arnaut Daniel e Eliot a Pound. E o Vasco est� no cerne dessa tradi��o central do �fabro�, a mais cl�ssica de todas, da poesia que se ergue como uma f�brica de palavras, em que os sentimentos s�o fortes porque s�o domados por disciplinas antigas como os decass�labos, para n�o serem vulgares, sendo, como humanamente s�o, vulgar�ssimos.
 


EARLY MORNING BLOGS 491

Brise marine


La chair est triste, h�las ! et j'ai lu tous les livres.
Fuir ! l�-bas fuir ! Je sens que des oiseaux sont ivres
D'�tre parmi l'�cume inconnue et les cieux !
Rien, ni les vieux jardins refl�t�s par les yeux
Ne retiendra ce c�ur qui dans la mer se trempe
� nuits ! ni la clart� d�serte de ma lampe
Sur le vide papier que la blancheur d�fend
Et ni la jeune femme allaitant son enfant.
Je partirai ! Steamer balan�ant ta m�ture,
L�ve l'ancre pour une exotique nature !
Un Ennui, d�sol� par les cruels espoirs,
Croit encore � l'adieu supr�me des mouchoirs !
Et, peut-�tre, les m�ts, invitant les orages
Sont-ils de ceux qu'un vent penche sur les naufrages
Perdus, sans m�ts, sans m�ts, ni fertiles �lots...
Mais, � mon c�ur, entends le chant des matelots !


(Mallarm�)

*

Bom dia!

12.5.05
 




AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS 7

FOTOGRAFIAS DE GUERRA







Os livros caminham de maneiras misteriosas. Este, desenterrado da pilha, � um album de fotografias intitulado Siege, uma obra c�lebre do fot�grafo e cineasta Julien Bryan. S�o fotografias do blitzkrieg alem�o na Pol�nia, no in�cio da guerra, que ele testemunhou. Mas h� mais: o livro tem uma dedicat�ria de Bryan, datada de Lima em Outubro de 1940, a R. Henry Norweb que foi diplomata e depois embaixador em Portugal em 1944-5. A minha perplexidade inicial - como � que este livro foi parar ao Ribatejo - foi resolvida pela dedicat�ria.




 


AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS 6

ICONOLOGIAS: ALEM�ES COM CAVEIRA




ZOLA

 


A M�O DO FINADO QUE N�O � DE DUMAS MAS DE ALFREDO POSSOLO HOGAN

"O que me leva a escrever-lhe � a reprodu��o da capa de �A M�o do Finado�, livro a que se refere como �um Dumas sinistro�. N�o conhe�o a edi��o reproduzida na imagem. Eu tenho uma da Lello, em 2 volumes, integrada na colec��o das obras de Alexandre Dumas.

N�o sei se lhe estou a dar alguma novidade, mas este livro tem uma hist�ria curiosa, que me levou mesmo, em tempos, a propor a sua inclus�o na colec��o de cl�ssicos da literatura Juvenil que o P�BLICO lan�ou.

� que a obra n�o � da autoria de Alexandre Dumas, mas sim de um portugu�s chamado Alfredo Possolo Hogan, que nasceu em Lisboa em 1830, e morreu na mesma cidade, muito novo, em 1865. Era empregado dos Correios e publicou v�rias novelas, entre as quais �A M�o do Finado�, que apresentou como continua��o de �O Conde de Monte-Cristo�, de Dumas pai.

N�o sei que informa��o vir� na edi��o cuja capa o �Abrupto� reproduz. A da Lello d� o livro como sendo de Dumas, sem fazer qualquer refer�ncia a Possolo Hogan.

O mais curioso, no entanto, � que o livro foi depois traduzido e editado em Fran�a e na Alemanha (e talvez noutros pa�ses)."

(lu�s miguel queir�s)
 


INTEND�NCIA

Actualizada a �ltima INTEND�NCIA...

Actualizada COISAS SIMPLES / GRANDES CAPAS com uma pequena biografia de Marques Gast�o, feita por sua filha Ana Marques Gast�o.

Em breve mais not�cias sobre as toneladas de papel em forma de livro, de que est�o a chegar mais neste momento.
 


LIVROS NO ESTADO L�QUIDO

Os livros chegam em contentores assim e s�o descarregados em cestos de vindima. N�o vale a pena fazer de outra maneira. L� dentro s�o despejados como se fossem uvas para um lagar. � a primeira vez que vejo livros a comportarem-se no estado l�quido. Ou ser� a cornuc�pia da abund�ncia? Ou a caixa de Pandora? (Onde � que eu j� ouvi isto?. Depois fica um monte tipo cofre-forte do Tio Patinhas. Por fim, a inevit�vel Ordem e o inef�vel Progresso chegam, e os livros come�am a ser amontoados como deve ser em caixas para perderem qualquer veleidade de atitude, ou andarem a distribuir folhas por tudo quanto � s�tio.

Terror! Come�ou a chover.

*

O reverso da medalha ou outra medalha no Rato de Livraria.
 


AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS 5

MULHERES: A CEGUINHA, A PERVERSA, A AD�LTERA E A SEVERA



Detalhe da AD�LTERA
 


MEM�RIAS DE BIBLIOTECAS
(O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES)

A biblioteca municipal de Sintra, antes de mudar para o actual Palacete Mantero, na Estef�nia, estava instalada no Pal�cio Valen�as, na descida de S.Pedro, a entrar na Vila, um pouco antes do actual Museu do Brinquedo. Antes da direc��o iluminista do (Prof.) V�tor Serr�o, que esquartejou os elegantes sal�es do r�s-do-ch�o para poder prestar um servi�o em condi��es � popula��o escolar do Secund�rio que ia aumentando inexoravelmente a partir final dos anos 70, a Biblioteca era mais uma biblioteca de casa particular abastada ou de clube ingl�s, de atmosfera tranquila, e pequeno terra�o com mob�lia de palhinha, que os servi�os municipalizados de apoio � leitura em que se tornou.

As funcion�rias, com a eleg�ncia e o porte de secret�rias dum 5� piso do MI5, acharam-me simp�tico, ou talvez as tivesse impressionado favoravelmente a minha precoce sofreguid�o por novos livros, sempre novos livros. A verdade � que deixaram de me acompanhar � Sala Principal, onde estavam os arm�rios de rede de galinheiro com um enorme esp�lio. Davam-me a chave e eu deambulava, abrindo e fechando o acesso �s estantes, at� perfazer o meu resgate. Havia uma pol�tica de s� deixar sair para leitura um m�ximo de tr�s livros, e apenas por uma semana. No final do Ver�o, quando as visitas � Biblioteca se tinham tornado tri-semanais e as funcion�rias se convenceram que eu lia mesmo o que levava e que trazia os livros sem falta, aceitaram uma excep��o. Levei para casa, no in�cio de Outubro do ano de 1970 dos meus catorze anos, a �A La Recherche du Temps Perdu�, em 15 volumes cartonados. S� os devolvi, em bloco, passados meses.

Estou seguro que o Tio Marcel teria gostado de se sentar numa cadeira de palhinha, no terra�o de canto, do primeiro andar do Pal�cio Valen�as, a ler uma edi��o amarelecida e perfumada de mofo pelos nevoeiros da Serra.

(J.T.P.)
 


COISAS SIMPLES


Morandi
 


EARLY MORNING BLOGS 490

XXXV. Les Fen�tres


Celui qui regarde du dehors � travers une fen�tre ouverte, ne voit jamais autant de choses que celui qui regarde une fen�tre ferm�e. Il n'est pas d'objet plus profond, plus myst�rieux, plus f�cond, plus t�n�breux, plus �blouissant qu'une fen�tre �clair�e d'une chandelle. Ce qu'on peut voir au soleil est toujours moins int�ressant que ce qui se passe derri�re une vitre. Dans ce trou noir ou lumineux vit la vie, r�ve la vie, souffre la vie.

Par-del� des vagues de toits, j'aper�ois une femme m�re, rid�e d�j�, pauvre, toujours pench�e sur quelque chose, et qui ne sort jamais. Avec son visage, avec son v�tement, avec son geste, avec presque rien, j'ai refait l'histoire de cette femme, ou plut�t sa l�gende, et quelquefois je me la raconte � moi-m�me en pleurant.

Si c'e�t �t� un pauvre vieux homme, j'aurais refait la sienne tout aussi ais�ment.

Et je me couche, fier d'avoir v�cu et souffert dans d'autres que moi-m�me.

Peut-�tre me direz-vous: "Es-tu s�r que cette l�gende soit la vraie?" Qu'importe ce que peut �tre la r�alit� plac�e hors de moi, si elle m'a aid� � vivre, � sentir que je suis et ce que je suis?


(C. Baudelaire)

*

Bom dia!

11.5.05
 


EARLY MORNING BLOGS 489

XLVI. Perte d'aur�ole


"Eh! quoi! vous ici, mon cher? Vous, dans un mauvais lieu! vous, le buveur de quintessences! vous, le mangeur d'ambrosie! En v�rit�, il y a l� de quoi me surprendre.

- Mon cher, vous connaissez ma terreur des chevaux et des voitures. Tout � l'heure, comme je traversais le boulevard, en grande h�te, et que je sautillais dans la boue, � travers ce chaos mouvant o� la mort arrive au galop de tous les c�t�s � la fois, mon aur�ole, dans un mouvement brusque, a gliss� de ma t�te dans la fange du macadam. Je n'ai pas eu le courage de la ramasser. J'ai jug� moins d�sagr�able de perdre mes insignes que de me faire rompre les os. Et puis, me suis-je dit, � quelque chose malheur est bon. Je puis maintenant me promener incognito, faire des actions basses, et me livrer � la crapule, comme les simples mortels. Et me voici, tout semblable � vous, comme vous voyez!

- Vous devriez au moins faire afficher cette aur�ole, ou la faire r�clamer par le commissaire.

- Ma foi! non. Je me trouve bien ici. Vous seul, vous m'avez reconnu. D'ailleurs la dignit� m'ennuie. Ensuite je pense avec joie que quelque mauvais po�te la ramassera et s'en coiffera impudemment. Faire un heureux, quelle jouissance! et surtout un heureux qui me fera rire! Pensez � X, ou � Z! Hein! comme ce sera dr�le!"


(C. Baudelaire)

*

Bom dia

10.5.05
 


APRENDENDO COM JORGE LUIS BORGES

"La Biblioteca existe ab aeterno. De esa verdad cuyo colorario inmediato es la eternidad futura del mundo, ninguna mente razonable puede dudar. El hombre, el imperfecto bibliotecario, puede ser obra del azar o de los demiurgos mal�volos; el universo, con su elegante dotaci�n de anaqueles, de tomos enigm�ticos, de infatigables escaleras para el viajero y de letrinas para el bibliotecario sentado, s�lo puede ser obra de un dios. Para percibir la distancia que hay entre lo divino y lo humano, basta comparar estos rudos s�mbolos tr�mulos que mi falible mano garabatea en la tapa de un libro, con las letras org�nicas del interior: puntuales, delicadas, negr�simas, inimitablemente sim�tricas."
 


BIBLIOFILIA: ENTUSIASMOS


O meu �ltimo entusiasmo, n�o apenas gosto, mas entusiasmo, por um livro portugu�s de n�o fic��o foi para a publica��o da correspond�ncia �scar Lopes � Ant�nio Jos� Saraiva. Fiz tudo para lhe fazer propaganda, no Abrupto, em artigos, na televis�o. O livro j� saiu em 2� edi��o, corrigindo-se um defeito da primeira, a falta de um �ndice onom�stico.

Agora tenho outro, que para um velho leitor temperado pelas esta��es, como se diria na loura Albion, j� n�o � mau. Esse entusiasmo � a edi��o dos artigos publicados por Fernando Galhano, nos anos sessenta no Com�rcio do Porto, onde ali�s fiz, in illo tempore , cr�tica liter�ria, semana sim, semana n�o com �scar Lopes, (est�o a ver como o mundo � pequeno �). Chama-se P�ginas de Cultura e Arte, � editado pela Caixotim, e vale a pena exigir � livraria mais perto que o mande vir, dado que a distribui��o � err�tica. � tudo bom, os textos, os desenhos, o que l� est� dentro. Uma nota mais detalhada vai ser publicada na S�bado.
 


INTEND�NCIA

Retomo a bibliografia dos ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO.

Actualizada nota PR�NCIPIOS B�SICOS PARA SE PERCEBER PORTUGAL.

N�o est�o esquecidos OS CINQUENTA MOMENTOS ... e a identifica��o dos textos an�nimos. � apenas falta de tempo.

E j� agora uma precis�o. Eu n�o disse ao P�blico: "sou muito cr�tico em rela��o ao blogues cujos autores n�o se identificam. Nenhuma coisa que l� se diz me merece credibilidade", mas sim, "Nos blogues pol�ticos ou de opini�o pol�tica, sou muito cr�tico em rela��o ao blogues cujos autores n�o se identificam. Nenhuma coisa que l� se diz me merece credibilidade.�. E acrescentei: "nada tenho contra o anonimato nos blogues pessoais ou intimistas". A frase foi truncada e tornada absoluta, ou seja, falsa como express�o da minha opini�o. Mas vale mesmo a pena estar a fazer estes esclarecimentos? Duvido, porque quem se mete por a� n�o faz outra coisa.

*
Aprecio a distin��o que faz entre blogs pol�ticos e blogs pessoais, em rela��o ao anonimato. Os blogs an�nimos possibilitam um acto de imortalidade que me fascina: se o blogger dispuser de um sistema inform�tico que lhe permita automatizar as actualiza��es da sua p�gina (o que � relativamente f�cil, para quem tenha alguns conhecimentos de inform�tica), pode continuar a publicar regularmente os seus textos, largos anos depois de ter morrido (desde que assegure previamente o pagamento do servi�o onde aloja a sua p�gina), sem que ningu�m o saiba.


(Paulo Almeida)
 


COISAS SIMPLES / GRANDES CAPAS



*

Jornalista e escritor, Marques Gast�o nasceu a 30 de Abril de 1914, em Lisboa e morreu a 29 de Novembro de 1995. Iniciou a sua vida profissional no �Di�rio de Lisboa� e no �S�culo�, tendo colaborado em grande parte dos jornais portugueses e fundado, em 1943, o Gabinete de Imprensa do Aeroporto de Lisboa que funcionou sob a sua direc��o at� 1962 , e de onde viria a ser expulso. Chefiar�, entretanto, a redac��o da ex-Emissora Nacional. Em 1969, passa a dirigir os Servi�os de Imprensa da Funda��o Calouste Gulbenkian, onde desempenhar� as fun��es de director-adjunto do Servi�o da Presid�ncia.

Tem v�rios livros de entrevistas publicados, entre os quais �As Portas do Mundo�, �Figuras do Meu Tempo�, �Os Homens do Mundo Falaram�, �O M�xico, Grande Na��o�, �Pedras do Sonho�, �Di�logos com Escritores e Artistas Portugueses� e �Rela��es Culturais Luso-Brasileiras�. Entrevistou personalidades como Sartre, Fran�oise Sagan, Andr� Maurois, Alberto Moravia, Stephen Spender, Giovanni Papini, Graham Greene, Tennessee Williams, Aldous Huxley, Jos� Lins do Rego, Graciliano Ramos, Cec�lia Meireles, Diego Rivera e os Papas Jo�o XXIII e Paulo VI. S�o ainda muitas as suas colect�neas de reportagens, de �As Confiss�es que me Fizeram� � s�rie �Carnet do Rep�rter�. Da sua vasta obra como ficcionista, no dom�nio do romance, do conto e da novela, destacam-se �Tr�s Vidas�; �Porta Maior�, �O Dia J� Nasceu Noite� ; �Avalanche�, ��nfora de P�rolas�, �Destro�os�, �Suykim�, �A Voz de Eleonora e �Maria da Luz sem Olhos�. Na �rea da investiga��o hist�rica, escreveu �S�o Jo�o de Deus, Sua Vida e Sua Obra�, �Algumas Notas sobre Frei Domingos Lu�s Vieira� e �O Casamento da Infanta D. Leonor com o Imperador Frederico III da Alemanha� (in�dito). Traduziu autores como Malaparte ou Moravia. Deixou, in�dito, um di�rio.

(Ana Marques Gast�o)
   


EARLY MORNING BLOGS 488

The Secret Work


Nadezhda Mandelstam has told the story. In Strunino, after her husband's arrest, working the night shift in a textile factory, she runs, sleepless and distraught, among the machines, chanting his forbidden poems to herself to preserve them. And so for twenty-five years in Perm, in Moscow, in Voronezh, Leningrad, Ulyanovsk, Samatikha...

A man with chills hugs himself,
rejoicing in his fever. She,
the frozen century's daugher, rejoices
in her secret, hugs to herself
the prophet hiding in her breath,
the infant she keeps close, safe, swaddled,
speaking.
She covers over, makes him
smaller, safer, no bigger than
a seed, a spark�search where they will,
they will not find him here, yet here
he is, a little voice praying,
an enormous voice prophesying,
this live coal held on her tongue
burning behind clenched teeth.

To herself, in herself, over
and over, what must not
be said aloud, not written down,
not whispered in corners or left
to be smelled out clotting
at the ends of broken phrases
...the poems of Mandelstam
going out in Siberia's night.


(Irving Feldman)

*

Bom dia!

9.5.05
 


AR PURO
(O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES)


Tirada da aldeia no sop� do glaciar Franz-Josef, Nova Zel�ndia.
Fotografia de Jo�o Amaral.
 


SCRITTI VENETI



O poder em Veneza � cuidadosamente partilhado. O doge manda, mas num sistema de controlos complexos que permitem sempre aos patr�cios-mercadores, os verdadeiros donos de Veneza, o controle �ltimo sobre tudo. Quando um doge, Martino Faliero (Marin Falier) que sucedeu a Andrea Dandolo no in�cio da segunda metade do s�culo XIV, quis romper com estes mecanismos e fazer uma �revolu��o popular�, a justi�a do Conselho dos Dez caiu-lhe em cima.
O doge era j� um septuagen�rio e mostrava-se particularmente irritado com as viol�ncias dos jovens aristocratas, que inclu�am alguns insultos � sua mulher, e espancamentos a cidad�os comuns da Republica. Participa ent�o numa conjura para acabar com o poder da aristocracia e construir uma alian�a entre ele, que seria Pr�ncipe, e o �povo�, em particular os trabalhadores do Arsenal que constitu�am um corpo paramilitar tem�vel.
Por�m Veneza � Veneza e todos falam demais, e todos denunciam todos e em breve o Conselho dos Dez toma conhecimento da conjura e aborta-a. Denunciado o doge, foi julgado e condenado � morte em 17 de Abril de 1355. Numa cena simb�lica o seu corno , o chap�u ducal em formato de um solit�rio corno, foi-lhe tirado da cabe�a, e decapitado na escadaria dos Gigantes. A execu��o foi anunciada da loggia do Pal�cio e a cabe�a seguiu para exposi��o p�blica. O dia passou a ser feriado.
Nunca mais nenhum doge �traiu� a Seren�ssima. O Conselho dos Dez, como Estaline, preparou-se para manipular a mem�ria, tirando o seu Trotsky da fotografia. Mas os venezianos eram uns meninos de coro comparados com o mestre georgiano. O local do seu retrato na sala do Grande Conselho foi inicialmente coberto com um pano escuro. Mais tarde, quando do inc�ndio do pal�cio destruiu a sala, Tintoretto e os seus disc�pulos tornaram a pintar os retratos. N�o apagaram de todo a mem�ria do doge traidor. L� est� at� hoje o pano negro, agora pintado, dizendo: �HIC EST LOCUS MARINI FALETRI DECAPITATI PRO CRIMINIBUS� (�este � o lugar de Marini Faletri decapitado pelos seus crimes�).

(Do texto "Olhares sobre Veneza")
 


COISAS COMPLICADAS

 


EARLY MORNING BLOGS 487

In a Country

My love and I are inventing a country, which we
can already see taking shape, as if wheels were
passing through yellow mud. But there is a prob-
lem: if we put a river in the country, it will thaw
and begin flooding. If we put the river on the bor-
der, there will be trouble. If we forget about the
river, there will be no way out. There is already a
sky over that country, waiting for clouds or smoke.
Birds have flown into it, too. Each evening more
trees fill with their eyes, and what they see we can
never erase.

One day it was snowing heavily, and again we were
lying in bed, watching our country: we could
make out the wide river for the first time, blue and
moving. We seemed to be getting closer; we saw
our wheel tracks leading into it and curving out
of sight behind us. It looked like the land we had
left, some smoke in the distance, but I wasn't sure.
There were birds calling. The creaking of our
wheels. And as we entered that country, it felt as if
someone was touching our bare shoulders, lightly,
for the last time.


(Larry Levis)

*

Bom dia!

8.5.05
 


AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS 4


LITERATURA POPULAR




LITERATURA DE GUERRA



OUTRA LITERATURA




LIVROS �TEIS

 


COISAS COMPLICADAS

(Agradecendo ao Almocreve das Petas)



Manobras necess�rias a um autom�vel para fazer uma curva mais estreita, do L'Art de Bien Conduire Une Automobile.
 


o que sobrou dos DOIS ANOS



OBJECTOS EM EXTIN��O



Selos, o prot�tipo dos objectos em via de extin��o. Os selos falam. Ali�s tudo fala se soubermos ouvir. Estes selos dum envelope enviado para um servi�o burocr�tico da �metr�pole�, (porque no pa�s independente muita coisa ainda precisa de ser pedida � �metr�pole�), dizem muito: que h� infla��o em Mo�ambique, que o valor dos selos n�o acompanha a infla��o e � por isso que s�o precisos tantos selos numa carta que eles t�m que ser colados uns sobre os outros. Sabemos tamb�m mais duas coisas: a m�o-de-obra � barata porque o carimbo ainda � colocado � m�o e que n�o justifica falsificar o valor da franquia colocando de novo selos j� usados, escondendo as marcas do carimbo debaixo da sobreposi��o dos selos. Num correio europeu, o selo teria que estar completamente vis�vel. Devem ser malef�cios da globaliza��o.
 


PR�NCIPIOS B�SICOS PARA SE PERCEBER PORTUGAL

(Dedicado � navega��o do Mar Salgado)

� muito pequeno.

� bastante pobre.

� muito perif�rico.

Somos todos primos uns dos outros, logo a democracia � dif�cil.

Os bens s�o escassos, a competi��o pelos bens � muita.

Dada a escassez dos bens, a inveja est� muito socializada.

A ignor�ncia � muita.

A abund�ncia da ignor�ncia acentua nas novas gera��es a tend�ncia ad�mica de pensarem que o mundo come�a com eles.

Efeitos do adamismo : o n�mero de pessoas que pensam estar a arrombar portas, que j� est�o abertas h� muito, � elevado. O alarido que fazem ao passarem pelas portas abertas � inversamente proporcional � resist�ncia das portas.

A pregui�a � muita e � induzida pelos crit�rios de mediania dominantes.

Entre as letras e as artes de consumo trabalhoso e as de consumo pregui�oso, tender�o a acentuar-se as segundas.

A m�sica e o cinema, a televis�o e a moda, s�o de consumo pregui�oso.

H� muita coisa que n�o vale a pena tentar explicar. Primeiro, porque j� est� mais que explicada h� muito, depois porque n�o � por falta de explica��o que as coisas mudam.

(Continua)

*
Os princ�pios de JPP ajudam, de facto, a perceber Portugal. Mas parece-me que alguns deles devem ser aprimorados.

Portugal n�o � bastante pobre. Isto � quase ofensivo para tr�s quartos da popula��o mundial. O princ�pio verdadeiro: Portugal � pouco rico.

Portugal tamb�m n�o � muito perif�rico; Portugal foi muito perif�rico e ainda � um bocado perif�rico. Mas dito como JPP disse soa a desculpa e a esquecimento dos aeroportos e da internet.

O princ�pio de os bens serem escassos, e grande a competi��o por eles, est� muito bem posto. Mas JPP talvez queira esclarecer que n�o se refere aqui aos bens que h� em Portugal, mas sim aos bens que h� onde houver.

Um princ�pio que JPP certamente vai acrescentar � o de que Portugal � um pa�s cat�lico. Isto ajuda a perceber tr�s ou quatro coisas.

Mas talvez JPP se esquecesse de um princ�pio verdadeiramente iluminador para quem quer perceber o nosso pa�s: Portugal � essencialmente igual a outros pa�ses pequenos, pouco ricos e um bocado perif�ricos.
(Ateu Cat�lico)

*
"A ignor�ncia � muita.

A abund�ncia da ignor�ncia acentua nas novas gera��es a tend�ncia ad�mica de pensarem que o mundo come�a com eles.

Efeitos do adamismo : o n�mero de pessoas que pensam estar a arrombar portas, que j� est�o abertas h� muito, � elevado. O alarido que fazem ao passarem pelas portas abertas � inversamente proporcional � resist�ncia das portas.
"

Mas essa parece-me ser a hist�ria da humanidade. E talvez mal esteja a humanidade quando as novas gera��es deixarem de ser adamicas. � que existe a possibilidade de existir um ganho impercept�vel mas constante ao longo da hist�ria da humanidade nesse arrombar de portas abertas.

(timshel)
*

Ateus e tamb�m cat�licos costumam afirmar ou pelo menos insinuar que uma causa estrutural do atraso portugues (em certos dom�nios e em relacao ao mundo
industrializado) � ser um pa�s cat�lico. Esta � uma hipotese interessante mas que pode eventualmente estar errada. Senao vejamos. � sobejamente conhecido que a Baviera, patria do actual Papa e o mais cat�lico dos Laender alemaes, � uma das regioes mais ricas e desenvolvidas da Europa. Para al�m de sobressa�r entre os Laender alemaes pela sua pujanca economica � muito claramente um importante centro de desenvolvimento tecnol�gico e cient�fico a n�vel mundial. Poderia citar aqui tamb�m como outros exemplos o norte de It�lia, a Austria ou o "tigre" celta (a Irlanda), ou no panorama leste-europeu a Pol�nia e a Hungria.
No outro lado do espectro religioso gostaria de recordar o caso protestante da Escandin�via que durante muitos seculos (no caso da Finlandia at� recentemente) abrigou uma grande pobreza. Isto tudo para dizer que as tradicoes religiosas sao apenas um factor entre muitos, e poderao at� nao ter qualquer ligacao com a situacao (economica, etc...) de um povo. Claro est�, pode ser que no caso portugu�s o "catolicismo" do pais seja o factor mais relevante, s� falta que algu�m apresente a prova...

(Filipe Paccetti Correia)
 


COISAS SIMPLES


Encyclopedia Rural, 1841
 


MEM�RIAS SELECTIVAS DO FIM DA II GUERRA MUNDIAL

Hist�rias de que quase nunca se fala. Uma, a viola��o colectiva, quase sacrificial, das mulheres alem�s pelos soldados russos. Outra, a entrega a Staline dos soldados e oficiais russos do chamado "ex�rcito de Vlassov", que se tinha rendido aos aliados ocidentais para evitar a execu��o colectiva, e que acabaram por a conhecer j� a guerra tinha acabado. Em ambos os casos trata-se de crimes de guerra que nunca foram punidos.
 


EARLY MORNING BLOGS 486


LE POULPE


Jetant son encre vers les cieux,
Su�ant le sang de ce qu'il aime
Et le trouvant d�licieux,
Ce monstre inhumain, c'est moi-m�me.



LA M�DUSE

M�duses, malheureuses t�tes
Aux chevelures violettes
Vous vous plaisez dans les temp�tes,
Et je m'y plais comme vous faites.


L'�CREVISSE

Incertitude, � mes d�lices
Vous et moi nous nous en allons
Comme s'en vont les �crevisses,
� reculons, � reculons.


LA CARPE

Dans vos viviers, dans vos �tangs,
Carpes, que vous vivez longtemps !
Est-ce que la mort vous oublie,
Poissons de la m�lancolie.

(Apollinaire)

*

Bom dia!
 


A LER

Ainda sobre o Abrupto, textos no Bloguitica, no bombyx mori, no Ma-Schamba e no Mem�ria Inventada.

7.5.05
 


DOIS ANOS

AGRADECIMENTOS

A todos os que se referiram ao anivers�rio do Abrupto.

A todos os que enviaram mensagens.

A todos os que leram o Abrupto nestes dois dias e nos outros.

Um leitor amigo, FNV, tamb�m autor de blogues, fez-me a invectiva confuciana certa: "insista, mesmo sabendo que o que pretende n�o funciona". Assim ser�.
 


AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS 3

LITERATURA POPULAR



ENSINAMENTOS �TEIS



LITERATURA DE GUERRA



Alguns livros recuperados. Entre muitos outros, uma s�rie de publica��es populares com magn�ficas capas, muitos livros sobre guerras, I e II Guerras mundiais e guerra de Espanha, entre os quais um de Brasillach, fuzilado por colabora��o com os alem�es, e Bard�che, e manuais de ensinamentos �teis, como esta Enciclopedia Rural de 1841, em fasc�culos e uma L'Art de Bien Conduire Une Automobile do in�cio do s�culo XX. Voltaremos a esta L'Art cheia de gravuras interessantes e anacronismos, como seja a explica��o de como � que se ultrapassa uma carro�a puxada a cavalos. Anacronismo europeu e americano, claro.
 


A LER

*** (como no Michelin) A entrevista de Luiz Pacheco no esplanar.
 


AR PURO


Whistler, Lagoa de Veneza
 


EARLY MORNING BLOGS 485

The trumpet of morning blows in the clouds and through
The sky. It is the visible announced,
It is the more than visible, the more
Than sharp, illustrious scene. The trumpet cries
That is the successor of the invisible.

This is its substitute in stratagems
Of the spirit. This, in sight and memory,
Must take its place, as what is possible
Replaces what is not. The resounding cry
Is like ten thousand tumblers tumbling down

To share the day. The trumpet supposes that
a mind exists, aware of division, aware
Of its cry as clarion, it's dictions way
As that of a personage in a multitude:
Man's mind grown venerable in the unreal.


Wallace Stevens (cortesia de Jo�o Costa)

*

Bom dia!
 


DOIS ANOS

FIM DE FESTA


A festa foi interrompida por outra festa: um debate viv�ssimo sobre Einstein e a ci�ncia em que participei com Paulo Crawford, Jo�o Cara�a, e Nuno Crato. A coisa demorou mais do que previa e impediu-me de completar a fase final dos Dois Anos e alguns agradecimentos e coment�rios. Ficam para depois.

O que o Abrupto tem sido, e foi nestes dois dias, � o que continuar� a ser enquanto durar.

6.5.05
 


DOIS ANOS



NOTAS SOBRE AS FORMAS DE SENSIBILIDADE ANTIGAS


De uma carta do Realista Antigo:

�Antigamente dava-se valor ao que era constru�do lentamente, � experi�ncia, ao estudo porfiado, ao sil�ncio e ao rigor do pensar, � modera��o na vida, � prud�ncia na pol�tica, ao carpe diem, � �urea mediocritas. O pathos era para o teatro. S�rios legisladores como S�lon discutiam como � que � poss�vel governar uma cidade a quem se alimenta de �mentiras� no palco. Os gregos n�o gostavam da impetuosidade, da hubris, na qual viam uma qualquer vingan�a divina. Os romanos gostavam ainda menos e fizeram todo o seu imp�rio assente na velocidade das legi�es, na soldadesca profissional, e no bet�o da �poca, pontes e cal�adas, e n�o no princ�pio da �inter-pessoalidade� como se diz agora. A for�a contava, os estados de alma, n�o. N�o havia �di�logo� para medir tudo. Valia-se o que se valia. E sabia-se o que se valia ou n�o. Se n�o se sabia algu�m nos lembrava, � for�a.

Compreende-se: era um mundo violento, duro, onde a vida valia pouco e os prazeres tinham que ser intensos para durarem. A vida inclu�a a guerra para os homens como regra. N�o se chegava aos vinte e cinco anos sem estar v�rias vezes em risco de vida. Garanto-vos que isto muda muito. Os pobres morriam brevemente, com a idade de Cristo, os ricos tinham sempre um punhal ao dobrar da esquina ao favor ou desfavor do imperador.

(�)

Podes sempre dizer que � a velhice. Os velhos falam sempre assim do mundo. Mas v� tu, meu amigo, que tudo isto que te escrevo tem apenas uma raz�o: a maior das ilus�es � pensar que a viol�ncia do mundo antigo ficou no mundo antigo e hoje, nas cidades confort�veis, s� existe um �problema de seguran�a� e n�o o vento maligno da guerra. Que ganhamos muito ficando prosaicos e d�beis. Talvez valha por isso voltar para traz, para os modos de sensibilidade antigos, e perceber a sua necessidade. Tudo mudou menos a crueldade. E sobra muita, quase toda. N�s n�o vemos porque houve uma ou duas gera��es em paz, mas est� l�.

(�)

Antigamente, dava-se valor a separar o mundo de Apolo do de Dion�sio, coisa que desde que o dr. Freud nos entendeu doutra maneira, e desde que os romancistas russos e os dramaturgos n�rdicos, come�aram a descobrir o �individuo� (primeiro a �menina J�lia�, ou a Anna Karenina e s� depois o Vronski) passou a ser tida como poss�vel. Agora o c�none � que tudo deve vir sempre misturado e Dion�sio � o verdadeiro senhor. Apolo est� sentado sempre em cima de Dion�sio e, mal este se mexe, a apol�nea virtude e o Logos caiem por terra. Deixou de se poder ser um severo Cat�o num dia e noutro um perverso Marcial, tem que se ser sempre um Cat�o que � verdadeiramente um Marcial. Pobres romanos que deixamos de perceber h� muito!

(�)

Agora somos todos rom�nticos, � nossa medida, sucessiva. Somos tamb�m ligeiros, muito ligeiros, demasiado ligeiros, light como a Coca Cola, acreditamos na monda qu�mica dos pensamentos, nas artes leves como o cinema e a m�sica, que se ministram para plateias sentadas, e gostamos que n�o nos macem muito com lembran�as e hist�rias, obriga��es e deveres. Tudo isso passou a arrog�ncia, um sentimento desprez�vel porque nos mede e n�s n�o queremos ser medidos. Ficou tudo descart�vel e s� a mudan�a conta. A pieguice ganhou a aura do sentimento mais forte.

(�)"
 


DOIS ANOS

FOZ DO DOURO
(O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES)


Fotografia de Jos� Diogo, Janeiro 2005
 


DOIS ANOS

A LER

Sobre o Abrupto:

Luis Carmelo no Miniscente

Jo�o Morgado Fernandes no Terras do Nunca e discuss�o com Jos� Pimentel Teixeira no Ma-Schamba

Pedro Mexia no Fora do Mundo

Afonso Bivar no bombyx mori

e outras opini�es:

"O blogue Abrupto festeja o hoje o seu anivers�rio da forma habitual: a colocar �em linha� um esp�lio/pastiche de tralha que recolhe da net, do scanner privado e da caixa do email." (Apostrofe)

"Pergunto: com tanta emin�ncia, com tanto raio de luz a escorrer por entre aqueles fios de barba, recordando o velho S�crates (o de Atenas, n�o confundir com o de Castelo Branco, que � "inginheiro"), para onde lhe fugiu o talento??? Tudo para dizer: o abrupto nem pela poesia se salva, e se n�o se afogou j� � porque vive numa permanente rela��o parasit�ria com o seu autor. Ser� que ele sabe??!!!" (Macroscopio)

"Hoje irritei-me com o servilismo blogosf�rico pretextualizado nos totalit�rios enc�mios ao putativo pai da lusa blogosfera, subordinados ao seu anivers�rio. O efeito JPP alavancou, de forma abrupta, a mediatiza��o dos blogues em Portugal. (...) Ano e meio depois a tend�ncia tornou-se mainstream e a genuflex�o de contornos feudais uma irritante realidade.

[ NOTA: abre-se hoje uma nova sec��o n'(o vento l� fora)* onde, numa base que se pretende mais ou menos di�ria, desabafarei as minhas irrita��es. ]
[103 palavras; sec��o Irrita��es]
" (o vento l� fora)*

"Hoje 'tive a ler um blog abrupto, em que um fulano qualquer no meio de coisas que n�o interessam nada, de quadros asquerosos e de ejacula��es espaciais, lembra-se de dizer o que aconteceu a uns mortos quaisquer em mil oitocentos e troca o passo." (Garfiar s� me apetece)

e h� muito mais.
 


DOIS ANOS



BIBLIOFILIA









Este manual escolar, encontrado num alfarrabista, � de autoria de dois intelectuais seareiros e oposicionistas ao Estado Novo. Trata-se uma edi��o de autor, t�pica na �poca, destinada a garantir um pec�lio a quem tinha limita��es de acesso a cargos p�blicos e conhecia muitas dificuldades econ�micas. Os textos no seu interior s�o do melhor da grande literatura francesa e um prazer de ler, como esta carta ficcional, escrita por Mme Rastignac a seu filho, no romance de Balzac Le P�re Goriot:

"Mon cher enfant, je t'envoie ce que tu m'as demand�. Fais un bon emploi de cet argent, je ne pourrais, quand il s'agirait de te sauver la vie, trouver une seconde fois une somme si consid�rable sans que ton p�re en f�t instruit, ce qui troublerait l'harmonie de notre m�nage. Pour nous la procurer, nous serions oblig�s de donner des garanties sur notre terre. II m'est impossible de juger le m�rite de projets que je ne connais pas : mais de quelle nature sont-ils donc pour te faire craindre de me les confier ? Cette explication ne demandait pas des volumes, il ne nous faut qu'un mot � nous autres m�res. et ce mot m'aurait �vit� les angoisses de l'incertitude. Je ne saurais te cacher l'impression douloureuse que ta lettre m'a caus�e. Mon cher fils, quel est donc le sentiment qui t'a contraint � jeter un tel effroi dans mon coeur ? tu as d� bien souffrir en m'�crivant, car j'ai bien souffert en te lisant. Dans quelle carri�re t'engages-tu donc ? Ta vie, ton bonheur seraient attach�s � para�tre ce que tu n'es pas, � voir un monde o� tu ne saurais aller sans faire des d�penses d'argent que tu ne peux soutenir, sans perdre un temps pr�cieux pour tes �tudes ? Mon bon Eug�ne, crois-en le coeur de ta m�re, les voies tortueuses ne m�nent � rien de grand. La patience et la r�signation doivent �tre les vertus des jeunes gens qui sont dans ta position. Je ne te gronde pas, je ne voudrais communiquer � notre offrande aucune amertume. Mes paroles sont celles d'une m�re aussi confiante que pr�voyante. Si tu sais quelles sont tes obligations, je sais, moi, combien ton coeur est pur, combien tes intentions sont excellentes. Aussi puis-je te dire sans crainte : Va, mon bien-aim�, marche ! Je tremble parce que je suis m�re : mais chacun de tes pas sera tendrement accompagn� de nos voeux et de nos b�n�dictions. Sois prudent, cher enfant. Tu dois �tre sage comme un homme, les destin�es de cinq personnes qui te sont ch�res reposent sur ta t�te. Oui, toutes nos fortunes sont en toi, comme ton bonheur est le n�tre. Nous prions tous Dieu de te seconder dans tes entreprises. Ta tante Marcillac a �t�, dans cette circonstance, d'une bont� inou�e : elle allait jusqu'� concevoir ce que tu me dis de tes gants. Mais elle a un faible pour l'a�n�, disait-elle gaiement. Mon Eug�ne, aime bien ta tante, je ne te dirai ce qu'elle a fait pour toi que quand tu auras r�ussi : autrement, son argent te br�lerait les doigts. Vous ne savez pas, enfants, ce que c'est que de sacrifier des souvenirs ! Mais que ne vous sacrifierait-on pas ? Elle me charge de te dire qu'elle te baise au front, et voudrait te communiquer par ce baiser la force d'�tre souvent heureux. Cette bonne et excellente femme t'aurait �crit si elle n'avait pas la goutte aux doigts. Ton p�re va bien. La r�colte de 1819 passe nos esp�rances. Adieu, cher enfant. Je ne dirai rien de tes soeurs : Laure t'�crit. Je lui laisse le plaisir de babiller sur les petits �v�nements de la famille. Fasse le ciel que tu r�ussisses ! Oh ! oui, r�ussis, mon Eug�ne, tu m'as fait conna�tre une douleur trop vive pour que je puisse la supporter une seconde fois. J'ai su ce que c'�tait que d'�tre pauvre, en d�sirant la fortune pour la donner � mon enfant. Allons, adieu. Ne nous laisse pas sans nouvelles, et prends ici le baiser que ta m�re t'envoie."

Como � que se fica quando se � educado por estes textos?

*
O texto � de grande beleza e for�a. Ao l�-lo sente-se alguma estranheza pois parece retratar algo bem mais distante do nosso mundo actual do que uma carta deste tipo era suposto mostrar. Cartas entre m�es e filhos n�o deveriam variar muito de uma �poca para a outra. No entanto esta parece t�o long�nquo que n�o consigo impedir de me interrogar sobre o que diriam os psic�logos e peritos em �jovens� de hoje de um texto deles? Falariam de �dipos mal resolvidos, de chantagens afectivas, de falhas no processo de autonomiza��o, de demasiadas expectativas projectadas nos filhos, de discurso demasiado moralizante? Que discurso teriam sobre paci�ncia e resigna��o como virtudes dos jovens? De paci�ncia talvez se falasse, mas resigna��o � uma palavra a cair no desuso. � contr�ria a toda a potencialidade inspiradora da �assertiveness�. Mudam-se os tempos, mudam-se as cartas� Hoje seria um SMS de poucas linhas, numa linguagem codificada cheia de �k� e de �x� terminando com �beijinhos�, que parece ser o �nico c�digo actualmente aceite para veicular qualquer tipo de afectividade, ou n�o!
(J.)
 


DOIS ANOS

AR PURO


Whistler
 


DOIS ANOS

HUGO VON HOFMANNSTAHL
(NUMA TRADU��O IN�DITA DE VASCO GRA�A MOURA)


Tercinas

Sobre a fugacidade de tudo


I

Inda lhes sinto o h�lito na face:
pode l� ser que este correr de dias
para sempre e de todo assim passasse?

Ningu�m entende coisa t�o estranha,
cruel demais pra queixas e agonias:
que deslizando, nada se detenha.

E que o meu pr�prio eu, imperturbado,
de um menino pequeno at� mim venha,
c�o de estranheza inquieto e t�o calado.

Mais: que eu fosse h� cem anos, e sab�-lo,
que cada av� dos meus, amortalhado,
esteja tanto em mim como o cabelo,

sendo um comigo como o meu cabelo.




II

As horas! Onde n�s o azul claro
do mar vemos e a morte se nos fez
leve e sem medo, em festa e sem reparo,

como meninas s� de palidez
e grandes olhos sempre se resfriam,
e � tarde olham perdidas, na mudez

de ver que a vida, enquanto adormeciam
seus membros, lhes fluiu silente e langue
em �rvore e erva, e t�midas sorriam,

como uma santa enquanto verte o sangue.


III



Nossa mat�ria aos sonhos � igual
e os sonhos abrem olhos � maneira
de umas crian�as sob o cerejal.

Das copas, ouro p�lido se esgueira
da lua-cheia e a vasta noite alcan�a...
sen�o, sonhos n�o h� � nossa beira.

Vivem a� qual riso de crian�a,
e como a lua-cheia sobem, descem,
quando desperta sobre a fronde avan�a.

O mais �ntimo se abre a quanto tecem;
quais m�os-fantasma sempre num tristonho
espa�o est�o em n�s e vida oferecem.

E os tr�s s�o um: homem e coisa e sonho.


(Hugo von Hofmannstahl)
 


DOIS ANOS


BIBLIOFILIA

AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS 2




Olhei para o monte de livros, melhor, olhei para um dos montes de livros, e a minha primeira sensa��o foi comportar-me como o Tio Patinhas: salto em cima e deito as moedas, engano, os livros ao ar, agradecendo � moedinha da sorte original. Depois a imensa sensatez que me povoa nos dias pares, lembrou-me que isso n�o se faz aos livros. Estes j� tinham sido carregados como tijolos, e � p�, descarregados em cestos de vindimas e atirados para o lagar inexistente com a sem cerim�nia com que se atira uvas, ou ra��o aos animais (urbanos, vejam a quinta das "celebridades"...), pelo que me devia comportar. Comportar.

Foi o que fiz e l� estou festejando o anivers�rio da folha abstracta de bits, o Abrupto, com o manuseio da folha concreta de �tomos. Colocando-os uns sobre os outros para perderem a deforma��o da viagem atribulada. Dando ordem ao caos. E encontro de tudo: livros, revistas, recortes, fotografias, postais, selos, documentos. E s� arrumei para a� cinco por cento.


Como um Dumas sinistro, um �Ar livre� vigoroso e percursor do surto de aten��o ao corpo que os totalitarismos trouxeram nas primeiras d�cadas do s�culo XX ( sim, os nazis foram naturistas militantes e olhavam para os corpos nus e atl�ticos, dos homens em primeiro lugar, mas tamb�m das mulheres, de uma forma, digamos, viril�), uma bela revista Ocidente e v�rias �formiguinhas�, a colec��o micro da Majora, um nome m�tico para as crian�as portuenses, que eu tive entre as primeiras leituras. Mas h� muito, muito mais.
 


DOIS ANOS

OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: GAL�XIA MESSIER 104 "SOMBRERO"



Se eu usasse chap�u, e na improv�vel hip�tese de usar sombrero, era este que eu queria. Prometo, no entanto, que n�o o traria na cabe�a no avi�o (no foguet�o, no S.S. Enterprise, seja l� em que nave) de regresso de umas f�rias numa praia algures numa gal�xia distante, numa col�nia qualquer governada pelo Partido Revolucion�rio Institucional. Metia numa caixinha, um pouco grande, e trazia timidamente.
 


DOIS ANOS


EARLY MORNING BLOGS 484


Days of Me

When people say they miss me,
I think how much I miss me too,
Me, the old me, the great me,
Lover of three women in one day,
Modest me, the best me, friend
To waiters and bartenders, hearty
Laugher and name rememberer,
Proud me, handsome and hirsute
In soccer shoes and shorts
On the ball fields behind MIT,
Strong me in a weightbelt at the gym,
Mutual sweat dripper in and out
Of the sauna, furtive observer
Of the coeducated and scantily clad,
Speedy me, cyclist of rivers,
Goose and peregrine falcon
Counter, all season venturer,
Chatterer-up of corner cops,
Groundskeepers, mothers with strollers,
Outwitter of panhandlers and bill
Collectors, avoider of levies, excises,
Me in a taxi in the rain,
Pressing my luck all the way home.

That's me at the dice table, baby,
Betting come, little Joe, and yo,
Blowing the coals, laying thunder,
My foot on top a fifty dollar chip
Some drunk spilled on the floor,
Dishonest me, evener of scores,
Eager accepter of the extra change,
Hotel towel pilferer, coffee spoon
Lifter, fervent retailer of others'
Fumor, blackhearted gossiper,
Poisoner at the well, dweller
In unsavory detail, delighted sayer
Of the vulgar, off course belier
Of the true me, empiric builder
Newly haircutted, stickerer-up
For pals, jam unpriser, medic
To the self-inflicted, attorney
To the self-indicted, petty accountant
And keeper of the double books,
Great divider of the universe
And all its forms of existence
Into its relationship to me,
Fellow trembler to the future,
Thin air gawker, apprehender
Of the frameless door.


(Stuart Dischel)

*

Bom dia!
 


DOIS ANOS

MAIS JORGE LUIS BORGES: MILONGA DE ALBORNOZ

 


DOIS ANOS

POEIRA DE 6 DE MAIO




Hoje, h� sessenta e seis anos, Christopher Isherwood e um amigo, apanhavam um autocarro da Greyhound de Nova Iorque para Washington. Isherwood achava que os autocarros �are built like streamlined Martian projectiles; they seem designed to destroy everything else on the road�. No mundo, dentro e fora do autocarro, tudo parecia uma fatia de Americana. Cada condutor trazia a sua placa e colocava-a bem � vista de todos: �N. Strauser. Safe. Reliable. Courteous�. Devia ser para receber gorjeta. De vez em quando o autocarro parava. �Comfort stops� e hot dogs, leite, Coca Cola. Pouco a pouco, amanhecia e �the country begins to come alive.� Numa localidade qualquer, um padre esperava por clientela para os casamentos; noutra �duas colunas separadas honravam os mortos da Guerra, de um lado os brancos, do outro, os negros.� Chegaram �s quatro e meia da tarde.

5.5.05
 


DOIS ANOS



UM DI�RIO DOS IDOS DE 1968



Este texto, esp�cie de poema, escrito no final de 1967, in�cio de 1968, circulou nesse tempo an�nimo e clandestino. Embora hoje pare�a in�cuo, nesses anos passava por "subversivo". Para quem o leu na altura, fica a conhecer o seu autor.
 


DOIS ANOS


NOTAS CHEKOVIANAS


Os maridos, meu caro, s� matam nas novelas ou nos tr�picos, onde fervilham paix�es africanas! Quanto a n�s bastam-nos os horrores dos roubos por arrombamento ou das falsifica��es de identidade�. Um Drama na Ca�a (Colec��o Vampiro, n�684, p�g. 11).

Um Drama na Ca�a, foi publicado em folhetins no ano de 1884-1885, sendo das primeiras obras de Anton Tcheckov e � considerado o seu �nico romance, embora creia que �novela� � o termo apropriado para a obra. Para quem conhece e aprecia os contos de Tcheckov, esta novela tamb�m causa surpresa.

As simples, mas precisas pinceladas, ou talvez seja mais preciso falar num inspirado tra�o de �line drawing� que comp�em os seus contos: as suas personagens, o seu enredo, o seu desfecho; bem como a inevitabilidade do que acontece, est�o ausentes desta obra. Nela encontramos um cheiro de modernidade no facto de ser uma (ainda inocente) novela policial, um g�nero que come�ava a dar os primeiros passos, mas somos confrontados com um ambiente de excessos, de contradi��es, de fraquejar que nos lembram alguns atormentados her�is rom�nticos de vida dissoluta, mais do que as personagens dostoievskianas divididas pelas d�vidas sobre o em e o mal e pela procura de absoluto.

Os esp�ritos mais mesquinhos afirmavam que o ilustre conde via na pessoa de um pobre juiz de instru��o criminal, de origem humilde, um mero companheiro de bebedeiras.�
(�)
�Teriam dito algo mais se soubessem como � suave, d�bil e submissa a natureza do conde e como a minha � forte e obstinada. E teriam acrescentado ainda mais se estivessem ao corrente de quanto aquele homem fraco me estimava e qu�o escassa era a minha simpatia por ele�.
(�)
�De quantas desgra�as me teria livrado e que bem teria feito ao meu amigo se, naquela tarde, eu tivesse tido a coragem de voltar atr�s� (�)


O mote est� lan�ado: n�o h� lugar a subtileza, nem conten��o nesta novela.
As descri��es e a linguagem s�o ricas e pict�ricas e a sensualidade lasciva abunda. O tr�gico e o decadente andam de m�o dada. Tudo parece excessivo: o que se v�, o que se sente, o que se diz, o que se faz.

�Decorrida uma hora est�vamos a comer � volta de grandes mesas. Para quem se achava habituado �s teias de aranha, � sujidade da mans�o e aos gritos dos ciganos, aquela multid�o que rompia com as suas conversas f�teis o sil�ncio das divis�es solit�rias, era motivo de espanto.�
(�)
�Eu detestava aquela multid�o que, com fr�vola curiosidade, observava os tra�os de decl�nio da minguante fortuna dos Karnieiev.�
(�)
� Sentia o exagero de tal orat�ria, que despertava o riso dos circunstantes. Apesar do champanhe que havia bebido, n�o parecia alegre; exibia a mesma palidez que revelara na igreja, o mesmo terror nos olhos�.

Estes pequenos excertos da novela mostram como estamos longe do s�brio Theckov a que a leitura dos contos nos habituou. Este � certamente um Tcheckov mais novo, mais exuberante, com uma linguagem adjectivada, rica e intensa que quase toca o exagero, numa novela com toda a �alma� russa poss�vel (camponeses pobres, aristocracia � beira da ru�na, meios pequenos e mesquinhos) e que se l� de um folgo, sempre � espera de saber o que vai acontecer de seguida, tal como nos bons policiais. Com a inoc�ncia dos primeiros passos que se d�o neste g�nero policial, o final reserva-nos uma surpresa, que posteriormente fez hist�ria.

(JCD)
 


DOIS ANOS


APRENDENDO COM O PADRE ANT�NIO VIEIRA


Os prov�rbios, que s�o evangelhos humanos, f�-los a experi�ncia, e conserva-os a prud�ncia para doutrina e dire��o da vida, e n�o para descuido, como acontece aos n�scios, sen�o para cautela. E este � o fim do que por tantos meios deixamos provado na mat�ria de maior import�ncia. Entre, pois, cada um em si, e pergunte � sua pr�pria consci�ncia: se Deus o chamasse no estado presente para a conta, qual lha daria? Dos verdadeiros devotos do Ros�rio, que s�o os que o rezam e meditam atentamente, bem creio eu que, exceto o caso de alguma desgra�a, em que t�o raro � o cair como f�cil o levantar, todos os mais se achar�o com as suas contas t�o ajustadas que as dar�o muito boas. E a estes somente advirto que d�em infinitas gra�as a Deus e a sua Sant�ssima M�e por t�o singular merc�, por que lhes n�o aconte�a como ao servo do Evangelho, que, por ingrato, veio a perder o mesmo perd�o, e tornou de novo a contrair toda a d�vida, e a pagou sem rem�dio.

Aqueles, por�m, que se n�o acharem em estado de dar boas contas, considerem que nas Ave-Marias, que s� rezam de boca, quando dizem: Nunc, et in hora mortis nostrae - o hora mortis, e o nunc, tudo pode vir junto. Dizemos, agora, e na hora da nossa morte, e se a hora da nossa morte for o agora? Se a hora da morte n�o for hora, sen�o este mesmo momento, como acontece aos que morrem subitamente, ou subitamente perdem os sentidos, sem tempo, nem lugar de arrependimento, que contas podem estes dar, ou que se pode esperar deles? Logo, dir� algu�m, n�o � verdadeiro o prov�rbio que os que rezam o Ros�rio, dar�o boas contas a Deus? Sim �, se o rezar o Ros�rio for tamb�m verdadeiro. Porque ningu�m h� que verdadeiramente reze o Ros�rio que nele e nos seus mist�rios n�o considere o muito que deve a Deus, e lhe n�o pe�a perd�o de suas d�vidas, como pediu o servo do rei, que para a sua miseric�rdia isso basta.
 


DOIS ANOS

A CANETA DE FERNANDO PESSOA, ESCULTURA DE JOS� AUR�LIO


Fotografia de Ana Gaiaz, 2003
 


DOIS ANOS


BIBLIOFILIA

AFINAL H� LENDAS URBANAS QUE S�O VERDADEIRAS



N�o foi certamente por ser o dia do anivers�rio do Abrupto, mas h� coisas que de vez em quando acontecem e que s� se contam nos livros ou nas lendas urbanas. Esta � das lendas bibli�filas e aconteceu-me: descobrir, no meio de um campo, num sucateiro, uma biblioteca inteira com milhares de livros, que estava � espera de ser rasgada para separar o tipo de papel (o das capas e o do interior n�o valem o mesmo aos olhos de um homem que vende papel). Cinco toneladas de papel, assim me foi anunciado o objecto para base do c�lculo do valor e ainda h� jornais �muito escuros� (quer dizer muito antigos) nos cestos de vindima� Quantas vezes isto acontecer�? Tantas�

Darei novas do que l� est� em breve.
 


DOIS ANOS

SCRITTI VENETI: A CIDADE-ALEPH



Uma das mais c�lebres e dram�ticas chegadas a Veneza abre o filme de Visconti Morte em Veneza, a partir da novela de Thomas Mann. A personagem principal do livro, Gustav von Aschenbach, um escritor e um esteta, moldado a partir da figura do compositor Gustav Mahler, chega a uma cidade que est� doente, presa numa das suas febres peri�dicas, que atravessaram a sua hist�ria muitas vezes. Chega de barco. Thomas Mann explica porque se deve sempre chegar a Veneza por mar:

�Ele via, este cais t�o espantoso, a magnifica composi��o desta arquitectura fant�stica que a Rep�blica de Veneza oferecia aos olhares respeitosos dos navegantes que se aproximavam: o esplendor ligeiro do Pal�cio, e da Ponte dos Suspiros, as colunas com o Le�o e o Santo, sobre o cais o flanco do templo fe�rico que se anunciava em todo o seu esplendor, a perspectiva abrindo-se sobre o grande portal, com o seu rel�gio gigantesco e, olhando tudo isto, ele pensou que chegar a Veneza por terra era o mesmo que entrar num pal�cio pela porta de servi�o e que nunca se devia, na mais improv�vel das cidades, chegar de outro modo que n�o fosse aquele que estava a usar, um barco, vindo do mar largo.�

Aschenbach ia para o Lido, para o Grand Hotel des Bains, que ainda existe, mas quer passar em frente da Pra�a de S. Marcos, para a ver do lado do mar, por entre as ilhas envoltas em bruma. � um alem�o que chega, que lera certamente os Epigramas que Goethe escrevera sob inspira��o veneziana, �aqui tudo � vida e actividade, n�o ordem e disciplina�. Ali n�o havia a �honestidade alem��, ali havia perigos iminentes, como se vai ver. Aschenbach pensava que ultrapassara os sentidos, que atingira um estado de perfei��o est�tica que estava para l� dos sentimentos vulgares . Mas escolheu mal a cidade para se testar. Nela vai encontrar, contra a sua vontade, a �ltima paix�o. E acaba por morrer em Veneza, uma cidade onde se morre sozinho, como se morre sempre, mas como se essa morte pertencesse �quilo a que chamamos �cultura�.

Nenhuma cidade da Europa tem este tipo de fasc�nio decadente, a for�a cultural da hist�ria em estado bruto de t�o sofisticada. Apenas Istambul poderia rivalizar com Veneza, se n�o fosse hoje uma cidade turca, demasiado turca para ter mem�rias contradit�rias do seu passado. O esp�rito da cidade, o esp�rito do lugar, o heimatgeist, caro aos alem�es, transpira das �guas, das paredes. O tapete que cobre as ruas � feito de palavras. Palavras sobre palavras, sobre palavras. Palavras venezianas como as de Goldoni ou Casanova, mas palavras em todas as outras l�nguas do mundo. Goethe, Byron, Ruskin, Proust, Pound, Mann, Brodsky, numa espessura que constitui por si s� a hist�ria do mundo, do nosso mundo. Se somarmos as imagens e os volumes dos edif�cios e das esculturas, desde os cavalos perfeitos trazidos de Biz�ncio, at� �s hist�rias de Corto Maltese, tamb�m tudo � coberto por imagens. Imagens sobre imagens, sobre imagens. E sons. De Vivaldi a Wagner ou Mahler, sons sobre sons sobre sons. Esta � um terra de excessos, como Aschenbach percebeu, para seu mal, �sem honestidade alem��, mas com uma espessura m�rbida. Uma cidade-aleph onde est� tudo.


Do texto "Olhares de Veneza", publicado na revista Volta ao Mundo.Uma parte do Abrupto foi escrita de Veneza.
 


DOIS ANOS



GRANDES NOMES
(O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES)

Ainda que contrariando as convic��es de V. Exa, mas acreditando sempre na sua largueza de vistas, aqui envio mais um conjunto de grandes nomes, n�o s� de toureiros, como tamb�m de toiros e de nomes de refer�ncia da imprensa taurina, tamb�m estes merecedores dos famosos �apodos�.

(RM)


NOTA DO ABRUPTO: um "mundo" que trata da mesma maneira cr�ticos (comentadores), jornalistas, bestas de carne e sacrif�cio (os touros), e os algozes (toureiros) merece curiosidade, sem "Desperdicios" mas com "Sentimientos". Reparei ainda que, num acto de racismo evidente para com a parte bovina do reino animal, falta o nome pr�prio do touro.


Toureiros



Desperdicios (Manuel Dominguez Campos)

Lagartijo (Rafael Molina)

Frasculeo (Salvador Sanches)

Guerrita (Rafael Guerra)

Bombita(Ricardo Torres)

Conejito (Ant�nio de Dios)

Tigre de Guanajuato (Jua Silveti)

Morenito de Maracay (Jos� Nelo)

Carnicerito de M�xico (Jos� Gonzalez Lopez)

Cara Ancha (Jos� Sanchez del Campo)

Machaquito (Rafael Gonzales)

Cocherito de Bilbao (C�stor Jaureguibeita)

Gitanillo de Triana (Francisco Vegas de los Reyes)

Cangacho (Joaquin Rodrigues)

El Mam�n (Pedro de la Cruz)

Cacique de Santa F� (Juan Hernandez)

Cochinillo (Victoriano P�rez)

El Ch�rran (Manuel Gonzalez)

Carcerelito (Jos� Ledesma)

Gangrena (Francisco Erades)

El Maligno (Ram�n Martinez)

El Mellao de la Puerta de la Carne (Miguel Gom�z)

Noteveas (Pedro Sanch�z)

Poquitop�n (Ant�nio Sanchez)

El Ti�oso (Luis Rodriguez)


Criticos/Jornalistas


Alamares (A. Moises)

Uno al sesgo (Tom�s Orts Ramos)

Corinto y oro (M. Clavo)

Desperdicios (Aureliano Lopez Becerra)

Recorte (J�sus Lloret)

Tio Caniyitas (Jos� M. Gaona)

Camisero (A. Carmona)

Sentimientos (Eduardo de Palacios)

Sobaquillo (Mariano de Cavia)

El Terrible P�rez (Rog�rio Perez)


Toiros

Agacha�to

Botic�rio

Caramelo

Cari�oso

Relamido

Rompelindes

Zalamero
 


DOIS ANOS

OUVINDO

 


DOIS ANOS

O PRIMEIRO SOM
"ARTE PO�TICA" - PALAVRAS DE JORGE LUIS BORGES




(O primeiro som do Abrupto por gentileza da Carla Hil�rio.)
 


DOIS ANOS

AS IMAGENS MANIFESTANTES
FOTOS IN�DITAS DE TIMOR

(O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES)



(T.)
 


DOIS ANOS


T�TULOS QUE NUNCA USEI

Por miser�veis raz�es. Ou porque n�o consegui escrever um texto digno do t�tulo, como se passa com o "Pode ser Vidago?", retrato da nossa permanente habilidade para ficar sempre ao lado, contentes e remediados com o que temos, mesmo n�o sendo Vidago. Ou por falta de coragem para usar o t�tulo certo com a pessoa ou a ocasi�o certa. Um dos que me perseguia h� muitos anos ficou para t�tulo da s�rie de artigos da S�bado, assim mais in�cuo: "Quem nasceu para lagartixa nunca chega a jacar�". Mas passei os �ltimos meses com uma m�o a segurar a outra para n�o ter a tenta��o de escrever "A pol�tica segundo Porfirio Rubirosa" e outras variantes sobre o mesmo Rubirosa. Nunca pude assim falar de grandes personagens / grandes nomes como Flor de Oro Trujillo, ou o pr�prio Rubirosa.
 


DOIS ANOS

OUVINDO







Young Man with a Horn, filme de Michael Curtiz, m�sica de Max Steiner, com a voz muito fresca de Doris Day a cantar The Very Thought of You:

"The very thought of you and I forget to do
The little ordinary things that everyone ought to do".

 


DOIS ANOS


BIBLIOFILIA
CORREC��ES DE EUG�NIO DE ANDRADE � TRADU��O DE UM POEMA DE LORCA



Final da d�cada de sessenta. Colec��o de provas com as correc��es manuscritas originais de Eug�nio de Andrade, que me foram oferecidas pelo grande amigo, muito lembrado nestes dias. O Eug�nio trabalhava os poemas at� � �ltima oportunidade antes da publica��o.
 


DOIS ANOS


BIBLIOFILIA
(O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES)


Foi com o debate sobre a Lei do v�u Isl�mico em Fran�a, em Dezembro de 2003, que me tornei visitante di�ria do Abrupto. Agora que o Abrupto faz dois anos, e inspirada nesse mesmo tema, retomo a j� aqui abordada ideia da crescente tens�o civilizacional do mundo em que vivemos, ilustrando-o com um actual e interessante livro, cuja leitura � muito proveitosa, e dispensa qualquer tipo de coment�rio: Les Qualit� de l��pouse Vertueuse ou seja �As qualidades da Esposa Virtuosa�. Nota: Como se pode ver na imagem o erro de concord�ncia �qualit� em vez de �qualit�s�, n�o � meu! E, para avivar a curiosidade em rela��o ao conte�do do texto recheado de cita��es, apresento o �ndice dos cap�tulos, chamando particular aten��o para o segundo �Como inspirar o desejo de obedecer ao esposo e de o satisfazer� e o terceiro �Como inspirar o temor de desagradar ao seu esposo, de entrar em contradi��o com ele e de perder os seus direitos�:

O livro foi comprado em Argel muito recentemente, e foi editado pela Esslam - Paris, em 2004.

(J.)
 


DOIS ANOS

MATEUS


Fotografia de Ana Gaiaz, Julho 2004
 


DOIS ANOS


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: CAOS




As coisas que crescem assim costumam ser do reino animal ou vegetal. Os fungos, os bolores, bact�rias, v�rus, c�lulas, intumesc�ncias, cancros, coisas m�s. Mas "isto" � um peda�o de Marte visto de cima e Marte � grande. Tem areia, desertos, colinas, dunas, dem�nios, vento, berlindes pelo ch�o, pedras, meteoritos, vulc�es, talvez �gua. Mas o caos � o caos e demorar� tempo at� sabermos como nele andar com os p�s. Se calhar os p�s n�o s�o a melhor forma de andar neste caos. � a cabe�a. A imagina��o. A curiosidade. E assim podemos andar j�. Talvez o caos tenha ordem. H� pior, bem mais perto.
 


DOIS ANOS


EARLY MORNING BLOGS 483

Livro, se luz desejas, mal te enganas.
Quanto melhor ser� dentro em teu muro
Quieto, e humilde estar, inda que escuro,
Onde ningu�m t'impece, a ningu�m danas!

Sujeitas sempre ao tempo obras humanas
Coa novidade aprazem; logo em duro
�dio e desprezo ficam: ama o seguro
Sil�ncio, fuge o povo, e m�os profanas.

Ah! n�o te posso ter! deixa ir comprindo
Primeiro tua idade; quem te move
Te defenda do tempo, e de seus danos.

Dir�s que a pesar meu fostes fugindo,
Reinando Sebasti�o, Rei de quatro anos:
Ano cinquenta e sete: eu vinte e nove.

(Ant�nio Ferreira)

*

Bom dia!
 


DOIS ANOS

MARMELEIRA 2003


Fotografia de Ana Gaiaz
 


DOIS ANOS


YEATS - RUMO A BIZ�NCIO
(UMA TRADU��O IN�DITA DE VASCO GRA�A MOURA)


Rumo a Biz�ncio

Velhos n�o t�m pa�s. Os jovens t�o
enla�ados e as aves em trinado
- levas que h�o-de ir -, a�udes do salm�o,
mares de cavalas em cardume, e al�ado
em peixe, carne ou p�ssaro, no ver�o,
tudo o que nasce e morre, ap�s gerado,
desleixa em sensual m�sica infrene
testemunhos do esp�rito perene.

Um homem velho � coisa n�o prestante,
um casaco de trapos em bengala,
a menos que a alma bata as m�os e cante,
cante alto os mortais trapos a tap�-la,
sem escola de canto e prescrutante
dos monumentos dessa excelsa gala;
assim cruzei os mares e assim
a Biz�ncio, cidade santa, vim.

S�bios que estais no fogo divinal
como em mosaico de oiro na parede,
girai, do fogo santo, em espiral,
mestres do canto e da minha alma sede.
E consumi meu cora��o: em mal
de ansiar e preso a um bicho � morte, vede,
n�o sabe o que �; levai-me de verdade
ao artif�cio da eternidade.

Ido eu da natureza, n�o se ir�
meu corpo em forma natural formar,
mas qual de ourives grego ela ser�
de oiro batido e de oiro a esmaltar
que ap�tico imperador despertar�,
ou posta em ramo de oiro h�-de cantar,
nobres e damas de Biz�ncio a ouvir,
do que passou, ou passa, ou h�-de vir.

(W. B. Yeats)
 


DOIS ANOS


O ESTADO DO ABRUPTO

1. Ao fim de dois anos, cerca de 2300 notas publicadas, milh�o e meio de visitantes, usando os contadores mais avaros (na verdade bastante mais, porque o contador esteve inactivo v�rias vezes e n�o conta desde o in�cio), dois milh�es e meio de �Page Views� (idem), com liga��es a mais de dois mil blogues e milhares e milhares de cita��es, um pouco por todo o lado na rede e fora dela, o Abrupto � uma �empresa de sucesso� e devia agradar ao yuppie que h� em mim. Infelizmente, se tal existe em mim, e o Dr. Freud preveniu-nos para que todos os dem�nios existem, tenho dificuldade em encontr�-lo. O Abrupto contenta-me, e estes n�meros contentam-me, mas o que me contenta mais n�o � bem isso. J� o disse e repito: o Abrupto � o �jornal� que, desde que me conhe�o, gostaria de ter tido, parte da minha voz. N�o a minha voz, mas parte da minha voz. Feita do ru�do do mundo, do meu ru�do, da fala incessante, dos quadros, dos versos, da m�sica, das palavras, que nos faz o que somos. O Abrupto � sobre isso, o Abrupto � isso.


2. Um das novidades minimalistas do novo arranjo gr�fico do Abrupto manda todos os contadores para o fim do blogue. N�o haver� qualquer n�mero de leitores na parte mais vis�vel do blogue. O Abrupto nunca entrou em conflitos de n�meros com outros blogues para saber quem � o "primeiro", t�pico e compreens�vel nos blogues que s� t�m uma agenda pol�tica. Mas os n�meros traduzem uma orienta��o, a que podemos chamar �editorial�. Foi desde in�cio um desejo que a maioria dos leitores viesse de fora da blogosfera e isso foi sempre uma caracter�stica do Abrupto, que � lido um pouco por toda a gente que acede � Internet portuguesa, a julgar pela correspond�ncia - e cerca de 7800 mensagens permanecem ainda por responder ou ter seguimento - e pelos contactos pessoais com os seus leitores. � igualmente lido por um n�mero significativo de portugueses da di�spora com relevo para a Europa, os EUA e o Brasil. Tentar� continuar assim.


3. O crit�rio que sempre me pareceu mais importante para medir o impacto n�o � apenas o n�mero de leitores, mas o da cita��o, um pouco como acontece na avalia��o das revistas cient�ficas. Os resultados s�o inequ�vocos e s�o-no por defeito, porque o Abrupto deve ser o �nico blogue portugu�s que conheceu uma campanha activa contra a coloca��o de liga��es, uma interessante, reveladora e um pouco infantil forma de censura, por puras raz�es pol�ticas � esquerda e � direita. Blogues que t�m dezenas e dezenas de liga��es omitem deliberadamente o Abrupto, outros gabam-se de o referir e citar sem colocar liga��es como se isso fosse m�rito. Que lhes fa�a bom proveito. Mesmo assim, o Abrupto faz parte da lista do Top 100 da Technorati , que acompanha cerca de 9500000 blogues com "2,739 links from 2,117 sources" (o outro blogue portugu�s que faz parte desta lista � o Gato Fedorento com "2,514 links from 2,285 sources"). � o equivalente a vir na lista dos 500 da Forbes, s� que em muit�ssimo mais pobre.

4. O Abrupto n�o tem coment�rios e continuar� a n�o ter, por raz�es que a consulta a qualquer lugar na Internet, com um n�mero significativo de consultas, torna evidente. No entanto, publicou e publicar� todas as contribui��es que entenda substantivas, com a fragilidade do meu crit�rio pessoal. Mas o "Abrupto feito pelos seus leitores" � uma parte fundamental da identidade do blogue e por exclusivo m�rito dos seus leitores pode-se encontrar nos seus arquivos documentos, mem�rias, informa��es e pontos de vista de grande qualidade comparando com a comunica��o social "exterior" � rede. Recordo, por exemplo, o que os leitores do Abrupto escreveram sobre a mem�ria das bibliotecas, os exames de F�sica e Matem�tica, ou sobre os problemas "computacionais" que "justificaram" os atrasos na coloca��o dos professores.
 


DOIS ANOS


...M'ESPANTO AS VEZES , OUTRAS M'AVERGONHO ...

Quando eu, senhora, em v�s os olhos ponho,
e vejo o que n�o vi nunca, nem cri
que houvesse c�, recolhe-se a alma a si
e vou tresvaliando, como em sonho.

Isto passado, quando me desponho,
e me quero afirmar se foi assi,
pasmado e duvidoso do que vi,
m'espanto �s vezes, outras m'avergonho.

Que, tornando ante v�s, senhora, tal,
Quando m'era mister tant' outr' ajuda,
de que me valerei, se alma n�o val?

Esperando por ela que me acuda,
e n�o me acode, e est� cuidando em al,
afronta o cora��o, a l�ngua � muda

(Francisco S� de Miranda)

4.5.05
 


DOIS ANOS DE ABRUPTO, DOIS DIAS DE FESTA



O Abrupto comemorar� dois anos a 6 de Maio, e tenho estado a preparar um "n�mero especial". No entanto, tenho j� tanto material que � imposs�vel us�-lo em apenas um dia, pelo que come�arei a festa �s 0 horas do dia 5 e acabarei �s 0 horas do dia 7, no estado que se imagina.

3.5.05
 


INTEND�NCIA

Actualizada a nota IMPRENSA NACIONAL.

Em breve, uma actualiza��o de IDENTIFICAR TEXTOS AN�NIMOS com as contribui��es dos leitores do Abrupto, que desde j� agrade�o.

Continua a prepara��o do Abrupto especial para o dia 6 de Maio.
 


AR PURO


Whistler
 


EARLY MORNING BLOGS 482

Portola Valley


A dense ravine, no inch
of which was level until
some architect niched in this
shimmer of partition, fishpond
and flowerbed, these fording-
stones' unwalled steep staircase
down to where (speak softly) you
take off your shoes, step onto
guest-house tatami matting,
learn to be Japanese.

There will be red wine,
artichokes, and California
politics for dinner; a mocking-
bird may whisper, a frog rasp
and go kerplunk, the shifting
inlay of goldfish in the court-
yard floor add to your vertigo;
and deer look in, the velvet
thrust of pansy faces and vast
violet petal ears, inquiring,
stun you without a blow.

(Amy Clampitt)

*

Bom dia!

2.5.05
 


INTEND�NCIA

Dominada pela prepara��o de um Abrupto especial para o segundo anivers�rio, a 6 de Maio. Haver� festa, deitarei os foguetes, beberei o que for preciso e apanharei as canas. O Abrupto ser� nesse dia individual e colectivo, dedicado aos amigos e leitores, e aberto, como sempre, aos malfeitores que tenham alguma coisa para dizer. Depois segue-se o habitual.
 


COISAS SIMPLES / AR PURO


Van Gogh
 


EARLY MORNING BLOGS 481


Io mi senti' svegliar dentro a lo core
un spirito amoroso che dormia:
e poi vidi venir da lungi Amore
allegro s�, che appena il conoscia,

dicendo: �Or pensa pur di farmi onore�;
e ciascuna parola sua ridia.
E poco stando meco il mio segnore,
guardando in quella parte onde venia,

io vidi monna Vanna e monna Bice
venir inv�r lo loco l� ov'io era,
l'una appresso de l'altra maraviglia;

e s� come la mente mi ridice,
Amor mi disse: �Quell'� Primavera,
e quell'ha nome Amor, s� mi somiglia�.

*

Senti que despertava no meu peito
um esp�rito amoroso que dormia:
vi vir Amor de longe a mim direito,
e assim t�o ledo mal o conhecia,

dizendo "Pensa pois render-me preito";
e palavra a palavra Amor se ria.
E estando ent�o com um senhor, espreito
pouco depois pra l� donde sa�a

senhora Vanna vi, senhora Bice
que vinham ao lugar aonde eu era,
maravilha uma a outra assim unida;

e tal como se a mente o repetisse
Amor me disse: "Aquela � Primavera,
e Amor se chama a outra a mim parecida."

Dante (traduzido por Vasco Gra�a Moura)


*

Bom dia!

1.5.05
 


INTEND�NCIA ANIVERSARIAL

Daqui a uns dias o Abrupto far� anos, dois. Nesse dia haver� textos, desenhos e fotografias in�ditos dos amigos escritores e artistas, mas tamb�m notas correspondendo a s�ries que t�m a ver com a identidade do blogue, desde o �early morning�, aos j� esquecidos e extintos objectos em extin��o, grandes nomes, notas chekovianas, di�logos do monge Bernardo, �scritti veneti�, e outras antiqualhas e perip�cias. Haver� tamb�m notas �feitas pelos seus leitores�, para cuja colabora��o fica j� feito um apelo. Outras sugest�es ser�o bem-vindas.
 


IMPRENSA NACIONAL

O que � que se passa com as publica��es da Imprensa Nacional, pagas com o nosso dinheiro de contribuintes, que permanecem muito bem escondidas e n�o se encontram nas livrarias? A caminho da Leitura passo pela livraria da Imprensa Nacional no Porto, se � que se pode chamar livraria �quele espa�o, que ali�s � do mesmo tipo de outras �livrarias� da Imprensa Nacional e que n�o s�o mais do que locais onde se compram impressos. Nenhuma � atractiva como livraria, nenhuma � gerida como livraria. As edi��es da Imprensa Nacional, algumas de alta qualidade, como a das obras completas de Arist�teles, permanecem confidenciais e ignoradas. Se eu, que acompanho com detalhe o que se publica, e passo a vida em livrarias, me surpreendo sempre com t�tulos que nunca tinha visto, nem sabia que existiam, o que far� um consumidor mais moderado? Para al�m de se poder contestar a orienta��o das suas edi��es, ou sequer a exist�ncia de uma editora do estado com estas caracter�sticas, n�o seria de exigir um melhor uso dos dinheiros p�blicos, divulgando-as? Os livros s�o para vender ou para ficar em armaz�m?

*

Em refer�ncia ao que anota no seu blog acerca da Imprensa Nacional, permito-me esclarec�-lo do seguinte:

1. Sendo a INCM uma sociedade an�nima que tem apresentado sempre resultados positivos e que n�o recebe quaisquer subs�dios ou apoios do Estado mas, pelo contr�rio, contribui para os cofres p�blicos, quer pelo IRC que paga, quer pelos dividendos que entrega ao Estado, � de todo incorrecto afirmar que as publica��es que edita s�o pagas com o dinheiro dos contribuintes.

2. O cat�logo das edi��es da INCM encontra-se dispon�vel no respectivo site na Internet, pelo que poder� qualquer interessado inteirar-se de tudo o que sai editando, a um ritmo que ronda os 70 t�tulos anuais. Alem disso, em todos os n�meros do JL poder� encontrar um an�ncio, de p�gina, em que � dada publicidade �s novas edi��es da INCM, as quais s�o tamb�m anunciadas em diversas revistas culturais e universit�rias, que V. Exa. decerto conhecer�.

3. Se, quanto � nossa Livraria do Porto � que ir�, em breve, ser profundamente remodelada � as suas observa��es s�o relativamente pertinentes, j� quanto �s restantes, designadamente as das ruas S� da Bandeira, D. Filipa de Vilhena, Escola Polit�cnica, Portas de Santo Ant�o e Av. Roma, a sua cr�tica se afigura inteiramente improcedente, j� que as mesmas n�o s� apresentam nas montras, um amplo lote de obras editadas pela INCM como, em estantes acess�veis directamente ao p�blico, t�m em exposi��o a maioria das obras dispon�veis do seu cat�logo.

4. Como decerto ser� do seu conhecimento, o volume actual da edi��o portuguesa leva a que muitas livrarias utilizem todo o seu espa�o dispon�vel, em regra n�o muito amplo, para expor as obras de grande procura e r�pida venda e n�o as destinadas a p�blicos mais restritos e de mais lento escoamento (que, muitas vezes, n�o aceitam sequer receber � consigna��o) como acontece com as editadas pela INCM, pela Funda��o Calouste Gulbenkian ou por institui��es universit�rias ou culturais.

(Alcides Gama / INCM Director Comercial)
 


H� NAS �RVORES DO PORTO

uma for�a sem paralelo. Talvez porque seja a Norte e n�o a Sul. Talvez porque o ar, talvez porque a terra, talvez porque o olhar, talvez por causa do granito, talvez porque j� as veja h� muito tempo, como se n�o crescessem porque j� estavam grandes.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: FOTOS DAS MANIFESTA��ES DE DILI, TIMOR





Dili, 29 de Abril de 2005, 13 horas - Manifestantes e pol�cias. A N.S. de F�tima est� na manifesta��o.



A esta hora os manifestantes v�o almo�ar e dormir, ficando representantes da igreja, as imagens e as for�as de seguran�a.
Entoam-se c�nticos
 


AR PURO


Bonnard
 


EARLY MORNING BLOGS 480

SONETO FIEL


Voc�bulos de s�lica, aspereza,
Chuva nas dunas, tojos, animais
Ca�ados entre n�voas matinais,
A beleza que t�m se � beleza.

O trabalho da plaina portuguesa,
As ondas de madeira artesanais
Deixando o seu fulgor nos areais,
A solid�o coalhada sobre a mesa.

As s�labas de cedro, de papel,
A espuma vegetal, o selo de �gua,
Caindo-me nas m�os desde o in�cio.

O abat-jour, o seu luar fiel,
Insinuando sem amor nem m�goa
A noite que cercou o meu of�cio.


(Carlos Oliveira)

*

Bom dia!
O Porto cheira a maresia.

� Jos� Pacheco Pereira
In�cio
Site Meter [Powered by Blogger]