ABRUPTO

30.11.04
 


VENHA A MOEDA BOA

Venha a boa moeda expulsar a má. Nem Santana Lopes, nem Sócrates são boas moedas. São as duas faces da mesma moeda má. É no PSD que se pode encontrar a boa moeda. Cavaco seria a melhor e deveria ponderar as consequências do seu próprio artigo no Expresso. É mais preciso no governo do que na Presidência da República. Se quiser tem tudo e todos com ele.

O PSD tem que perceber que esta é a única possibilidade do oferecer ao país a melhor alternativa, (a alternativa que Santana Lopes dará ao país é o PS e Sócrates), poder ter uma maioria absoluta e fazer as reformas que o país urgentemente necessita. Não é messianismo, é realismo. É só querer.
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: AGORA, ALGO DE VERDADEIRAMENTE ESTRANHO



Antes havia uns desenhadores científicos que ilustravam as cenas que não se podiam ver no espaço, do género: lagos de enxofre em Io, ou nascer do Sol em Titã. Agora não é preciso, pelo menos para uma parte do sistema solar. Vejam esta imagem delicada de Outro Mundo: Mimas, um pequeno satélite de Saturno, passa junto do planeta, através da transparência dos anéis que se dissolvem na noite. É de noite nesta parte de Saturno. Também há noite lá.

29.11.04
 


A INCUBADORA E O BEBÉ DAS ESTALADAS

Se o autismo não fosse uma coisa séria, dir-se-ia que o bebé se caracteriza pelas imensas estaladas que dá a si próprio, e pela vontade persistente de arrancar os tubos da incubadora. Aliás sempre me irritou a palavra bebé, em particular para designar uma coisa como um governo, porque Bebé era um anão francês , de nome Nicholas Ferry, bobo do Rei Estanislau da Polónia e de que os franceses, com uma crueldade imensa, passaram a usar a alcunha para traumatizar as crianças.

*

Foi uma revelação para mim a origem da palavra «bebé». Quanto à crueldade que esta origem revela sobre os franceses, gostaria de fazer notar que é o mesmo povo que designa por «poubelle» os baldes de lixo, pelo simples facto de o seu uso se ter tornado obrigatório em virtude de um decreto de 1884 da autoria do prefeito Eugène Poubelle...

(José Carlos Santos)

*

Em Coimbra os recipientes do lixo eram, e se calhar contiunuam a ser, designados "Jacó", ao que parece por terem sido tornado obrigatórios por um Presidente de Câmara, ou Governador Civil, senhor Jacob Qualquer Coisa...

(P. Barros Viseu)

*

Não é isso que diz a nona edição do Dictionnaire de l'Académie francaise... De qualquer maneira, si non e vero e bene trovatto.

BÉBÉ n. m. XIXe siècle. D'un radical onomatopéique beb-, variante de bab- (voir Babiller, Babine), sous l'influence de l'anglais baby.
1. Enfant en bas âge. Un bébé joufflu. C'est un beau bébé. Emmailloter, langer un bébé. Elle attend un bébé, elle est enceinte. Sans article. Une baignoire, des jouets de bébé. Fam. Faire le bébé, se conduire d'une manière puérile. Ne fais pas le bébé, tu es trop grand. S'emploie parfois comme substitut affectueux du nom propre. Faire couler le bain de bébé. Adjt. Ce garçon est encore très bébé. Expr. fig. Jeter le bébé avec l'eau du bain, voir Bain. Titre célèbre : On purge bébé, de Georges Feydeau (1910). 2. Poupée figurant un tout petit enfant. Un bébé articulé. Un bébé qui marche, qui rit. 3. Fam. Se dit parfois d'un tout jeune animal. Les bébés phoques.


(Sérgio Carneiro)

*

Parece que temos um problema. Fui pesquisar a etimologia de "bebé" e, embora a explicação que dá no Abrupto esteja no Dicionário Etimológico de José Pedro Machado, no Petit Robert "bebé" aparece como proveniente da palavra inglesa "baby". No Dicionário Etimológico da Oxford, "baby" terá aparecido pela primeira vez no Século XIV (um pouco vago mas enfim) e é uma derivação de uma onomatopeia, neste caso a dos primeiros sons dos... bebés. Ou seja, be-be-ba-bi etc.

Mas vejamos a coisa em pormenor: o dicionário francês diz que "bebé" vem do inglês "baby"; o dicionário inglês diz que vem da onomatopeia e o dicionário etimológico português confirma as duas versões: a do anão e a da onomatopeia. Parece-me mesmo uma história repetida de Portugal na UE: um bocadinho daqui, um bocadinho dali...

(Carla)
 


A INCUBADORA E A FALTA DE SENTIDO DE ESTADO

Um Primeiro-ministro, no exercício das suas funções oficiais, não pode fazer um discurso como o da "incubadora" naquele local e naquelas circunstâncias. E se um dos bombeiros, que fazia a guarda de honra, pousasse a bandeira e saísse dizendo "como não sou dessa família não tenho que estar em formatura num comício partidário...", dava uma lição bem merecida ao Primeiro-ministro e até ao país, que já começa a ficar habituado, mal habituado, a estas confusões entre partido e governo.
 


AR IMPURO


K. Appel
 


EARLY MORNING BLOGS 373

From Milton: And did those feet


And did those feet in ancient time
Walk upon England's mountains green?
And was the holy Lamb of God
On England's pleasant pastures seen?

And did the Countenance Divine
Shine forth upon our clouded hills?
And was Jerusalem builded here,
Among these dark Satanic Mills?

Bring me my Bow of burning gold:
Bring me my Arrows of desire:
Bring me my Spear: O clouds unfold!
Bring me my Chariot of fire!

I will not cease from Mental Fight,
Nor shall my Sword sleep in my hand,
Till we have built Jerusalem
In England's green & pleasant Land.


(William Blake)

*

Bom dia!
 


LIMITE

Está tudo a chegar ao limite, até porque o limite sempre esteve muito perto do começo. Só que a experiência portuguesa mostra que tudo está preparado para tornar o limite o lugar mais pastoso da terra e podemos ficar por lá ainda bastante tempo. A regra é a de Eliot

This is the way the world ends
Not with a bang but a whimper.


28.11.04
 


DESAGREGAÇÃO

Porque é que nada disto me surpreende?
   


BARBAS BRANCAS

Não sei porquê mas tenho a impressão que conheço aquelas "barbas brancas" que Jerónimo de Sousa aconselhou a "cuidarem-se" e colocar de molho no seu discurso final do Congresso do PCP.
 


AR PURO


Levitan
 


EARLY MORNING BLOGS 372

A MÁQUINA DO MUNDO


E como eu palmilhasse vagamente
uma estrada de Minas, pedregosa,
e no fecho da tarde um sino rouco

se misturasse ao som de meus sapatos
que era pausado e seco; e aves pairassem
no céu de chumbo, e suas formas pretas

lentamente se fossem diluindo
na escuridão maior, vinda dos montes
e de meu próprio ser desenganado,

a máquina do mundo se entreabriu
para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.

Abriu-se majestosa e circunspecta,
sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável

pelas pupilas gastas na inspeção
contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar

toda uma realidade que transcende
a própria imagem sua debuxada
no rosto do mistério, nos abismos.

Abriu-se em calma pura, e convidando
quantos sentidos e intuições restavam
a quem de os ter usado os já perdera

e nem desejaria recobrá-los,
se em vão e para sempre repetimos
os mesmos sem roteiro tristes périplos,

convidando-os a todos, em coorte,
a se aplicarem sobre o pasto inédito
da natureza mítica das coisas,

assim me disse, embora voz alguma
ou sopro ou eco ou simples percussão
atestasse que alguém, sobre a montanha,

a outro alguém, noturno e miserável,
em colóquio se estava dirigindo:
"O que procuraste em ti ou fora de

teu ser restrito e nunca se mostrou,
mesmo afetando dar-se ou se rendendo,
e a cada instante mais se retraindo,

olha, repara, ausculta: essa riqueza
sobrante a toda pérola, essa ciência
sublime e formidável, mas hermética,

essa total explicação da vida,
esse nexo primeiro e singular,
que nem concebes mais, pois tão esquivo

se revelou ante a pesquisa ardente
em que te consumiste... vê, contempla,
abre teu peito para agasalhá-lo.”

As mais soberbas pontes e edifícios,
o que nas oficinas se elabora,
o que pensado foi e logo atinge

distância superior ao pensamento,
os recursos da terra dominados,
e as paixões e os impulsos e os tormentos

e tudo que define o ser terrestre
ou se prolonga até nos animais
e chega às plantas para se embeber

no sono rancoroso dos minérios,
dá volta ao mundo e torna a se engolfar,
na estranha ordem geométrica de tudo,

e o absurdo original e seus enigmas,
suas verdades altas mais que todos
monumentos erguidos à verdade:

e a memória dos deuses, e o solene
sentimento de morte, que floresce
no caule da existência mais gloriosa,

tudo se apresentou nesse relance
e me chamou para seu reino augusto,
afinal submetido à vista humana.

Mas, como eu relutasse em responder
a tal apelo assim maravilhoso,
pois a fé se abrandara, e mesmo o anseio,

a esperança mais mínima — esse anelo
de ver desvanecida a treva espessa
que entre os raios do sol inda se filtra;

como defuntas crenças convocadas
presto e fremente não se produzissem
a de novo tingir a neutra face

que vou pelos caminhos demonstrando,
e como se outro ser, não mais aquele
habitante de mim há tantos anos,

passasse a comandar minha vontade
que, já de si volúvel, se cerrava
semelhante a essas flores reticentes

em si mesmas abertas e fechadas;
como se um dom tardio já não fora
apetecível, antes despiciendo,

baixei os olhos, incurioso, lasso,
desdenhando colher a coisa oferta
que se abria gratuita a meu engenho.

A treva mais estrita já pousara
sobre a estrada de Minas, pedregosa,
e a máquina do mundo, repelida,

se foi miudamente recompondo,
enquanto eu, avaliando o que perdera,
seguia vagaroso, de mãos pensas.


(Carlos Drummond de Andrade)

*

Bom dia!

27.11.04
 


INTENDÊNCIA

Os ESTUDOS SOBRE COMUNISMO estão a ser actualizados.
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: "GORGEOUS DIONE...



... posa para a Cassini", escreve o entusiasmado escriba da NASA, ao ver a fotografia da deusa celeste que orbita Saturno. Dione, "a que brilha" diz-se na Ilíada, a Deusa do Carvalho, a quem Afrodite chamava Mãe, porque era o nome feminino de Zeus. Quando, numa outra encarnação, me deu para tentar fazer uma genealogia da mitologia grega, Dione perturbava tudo: era filha de Cronos e de Gaia? Ou de Oceanus e Tetis? Ou a mãe de Afrodite? Casada com Tantalo, e mãe de Niobe parece que era. Nem Hesíodo me salvava na confusão. Mas agora que ela posa para a fotografia, bem se lhe podia perguntar pelos pais...
 


EARLY MORNING BLOGS 371

EL INFANTE ARNALDOS

¡Quien hubiera tal ventura sobre las aguas del mar
como hubo el infante Arnaldos la mañana de San Juan!
Andando a buscar la caza para su falcón cebar,
vio venir una galera que a tierra quiere llegar;
las velas trae de sedas, la ejarcia de oro terzal,
áncoras tiene de plata, tablas de fino coral.
Marinero que la guía, diciendo viene un cantar,
que la mar ponía en calma, los vientos hace amainar;
los peces que andan al hondo, arriba los hace andar;
las aves que van volando, al mástil vienen posar.
Allí hablo el infante Arnaldos, bien oiréis lo que dirá:
-Por tu vida, el marinero, dígasme ora ese cantar.
Respondióle el marinero, tal respuesta le fue a dar:
-Yo no canto mi canción sino a quién conmigo va.

*

Eu sei que já aqui coloquei o romance. Mas é como se fosse um hino, não faz mal repeti-lo.

Bom dia!

26.11.04
 


PARVOÍCE

A jornalista da TVI a perguntar aos delegados do Congresso do PCP se sabem "quem é uma santanete".
 


AR PURO


Levitan
 


EARLY MORNING BLOGS 370

Hymne au Dragon couché


Le Dragon couché : le ciel vide, la terre lourde, les nuées troubles ; soleil et lune étouffant leur lumière : le peuple porte le sceau d'un hiver qu'on n’explique pas.

Le Dragon bouge : le brouillard aussitôt crève et le jour croît. Une rosée nourrissante remplit la faim. On s'extasie comme à l'orée d'un printemps inespérable.

Le Dragon s'ébroue et prend son vol : à Lui l'horizon rouge, sa bannière, le vent en avant-garde et la pluie drue pour escorte. Riez d'espoir sous la crépitation de son fouet lancinant : l'éclair.

o

Hé ! Las ! hé, Dragon couché ! Enspiralé ! Héros paresseux qui sommeille en l'un de nous, inconnu, engourdi, irrévélé,

Voici des figues, voici du vin tiède, voici du sang : mange et bois et flaire : nos manches agitées t'appellent à grands coups d'ailes.

Lève-toi, révèle-toi, c'est le temps. D'un seul bond saute hors de nous ; et pour affirmer ton éclat,

Cingle-nous du serpent de ta queue, fais-nous malades au clin de tes petits yeux, mais brille hors de nous, -- oh ! brille !


(Victor Segalen)

*

Bom dia!

24.11.04
 


AR PURO


Levitan
 


A ENTREVISTA - PLÁSTICO

Com o Primeiro-ministro tudo é plástico. Tudo pode ser ou não ser. Uma coisa corre mal, pode-se mudar, não há problema nenhum. Aconteceu assim e esperava-se que acontecesse assado. Não é muito importante. Fizemos isto. Já estava previsto que o fizéssemos. Tudo é desvalorizado, nada é cortado a direito. Amanhã torce-se a memória de hoje e não fica nada.

Num certo sentido é o que o primeiro-ministro deseja, que fique apenas a imagem, o som, um certo adormecimento colectivo. Um canto, monótono é certo, mas um canto.

23.11.04
 


A ENTREVISTA - DINÂMICA

O que move o discurso do primeiro-ministro é apenas o que dizem os jornais. Não há nenhuma dinâmica que tenha a ver com o país, com os problemas dos portugueses, apenas sobre os jornais. A frase está morta e só se alumia quando há um comentário ou notícia jornalística a que quer responder ou ripostar.Aí anima-se e tudo se torna fluído. Viu-se em toda a entrevista.
 


A ENTREVISTA - SOLIDEZ DA COLIGAÇÃO

É verdade que ninguém contestou a manutenção da coligação no Congresso do PSD. Mas a estabilidade da coligação não existe se o PP estiver convencido que vai sozinho às eleições. Será só uma questão de tempo.

Como é que o PP concorre às eleições sozinho em 2006? Onde é que vai buscar os votos numa campanha que vai ser fortemente polarizada entre o PSD e o PS? Como é que se desenvolve um discurso eleitoral, que encontre votos, sem demarcação com o PSD e com o governo? Como é que se espera que o PP aceite concorrer às eleições nestas condições, sabendo que o seu peso numa qualquer negociação futura será muito menor do que tem hoje?

A hipótese é absurda. Sem garantias, públicas ou privadas, de listas conjuntas não há estabilidade governativa. Como se vê.
 


A ENTREVISTA - O RECADO

O Primeiro-ministro deu o recado claríssimo a todos os responsáveis por órgãos públicos e privados: substituam o comentário político pelos debates entre os partidos. Vamos ver como evolui a situação nos órgãos de comunicação social do estado, em particular a RTP que praticamente já não tem comentário político.

A primeira parte da entrevista é o retrato de um político acossado, convencido que é vítima de uma conspiração generalizada e de que é capaz, pelo seu verbo, de inverter a situação. Tudo o que ele diz reflecte duas posturas complementares: quer menos comentário, porque o comentário é pela sua própria natureza hostil (o comentário é “deles”, o Outro que o persegue e que se percebe que não é o eng. Sócrates) e quer ter mais tempo de antena.
 


INTENDÊNCIA

Colocado no VERITAS FILIA TEMPORIS, um contributo para o pensamento europeu do Dr. Portas, O DIÁLOGO DA BATATA LUSA COM A BATATA CASTELHANA (Setembro 1999).
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: PARVOS E TOMADOS POR PARVOS

"Parece-me que, salvo melhor opinião, quanto a esta matéria os portugueses podem ser divididos em quatro grupos:

– O primeiro, constituído por partidários convictos do SIM ao referendo nestes moldes, é o daqueles que gostam de fazer os outros de parvos (do latim parvùlu-, «insignificante»);

– O segundo, constituído por aqueles que se vão estar nas tintas para responder ao referendo, é o dos que não se importam de ser tomados por parvos;

– O terceiro, que desejo que seja o de menor expressão, será constituído pelos que não chegam a perceber a pergunta nem nenhuma das suas implicações e que, por isso, não irão aparecer no referendo ou, caso o façam, dividir-se-ão pelo SIM e pelo NÃO, consoante a opinião de quem sobre eles exerça influência;

– O quarto e último, constituído por todos os que irão votar conscientemente NÃO, é o dos que não gostam, em nenhuma circunstância, de serem chamados ou tomados por parvos.

Esperemos que, em matéria tão decisiva, estes últimos não sejam uma pequena minoria, mas representem antes um largo movimento da opinião pública portuguesa que, lutando pelo terceiro e por si próprios, faça corar o segundo e ponha um travão às vergonhosas manipulações do primeiro grupo."


(João Galvão Teles)
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: OS PEQUENINOS OBEDECEM AOS GRANDES



Tetis passa junto do polo sul de Saturno, perturbado por tempestades maiores do que o satélite viajante. Aqui não há luta de classes que valha: os pequeninos obedecem aos grandes. Ponto.
 


APRENDENDO COM BRUTUS 1 SOBRE A VAIDADE HUMANA

"Dave Striver loved the university. He loved its ivy-covered clocktowers, its ancient and sturdy brick, and its sun-splashed verdant greens and eager youth. He also loved the fact that the university is free of the stark unforgiving trials of the business world -- only this isn't a fact: academia has its own tests, and some are as merciless as any in the marketplace. A prime example is the dissertation defense: to earn the PhD, to become a doctor, one must pass an oral examination on one's dissertation.

Dave wanted desperately to be a doctor. But he needed the signatures of three people on the first page of his dissertation, the priceless inscriptions which, together, would certify that he had passed his defense. One of the signatures had to come from Professor Hart.

Well before the defense, Striver gave Hart a penultimate copy of his thesis. Hart read it and told Striver that it was absolutely first-rate, and that he would gladly sign it at the defense. They even shook hands in Hart's book-lined office. Dave noticed that Hart's eyes were bright and trustful, and his bearing paternal.

At the defense, Dave thought that he eloquently summarized Chapter 3 of his dissertation. There were two questions, one from Professor Rodman and one from Dr. Teer; Dave answered both, apparently to everyone's satisfaction. There were no further objections.

Professor Rodman signed. He slid the tome to Teer; she too signed, and then slid it in front of Hart. Hart didn't move.

``Ed?" Rodman said.

Hart still sat motionless. Dave felt slightly dizzy.

``Edward, are you going to sign?"

Later, Hart sat alone in his office, in his big leather chair, underneath his framed PhD diploma."


Este texto não foi escrito por um humano, mas sim por uma máquina, um computador do projecto Brutus 1. O tema foi a "traição". Os seus autores consideram que "AI is moving us toward a real-life version of the movie Blade Runner, in which, behaviorally speaking, humans and androids are pretty much indistinguishable."

Sobre o Brutus 1 aqui.

Sobre o problema da computação do "comportamento" este artigo complexo, difícil e com uma matemática acima dos meus conhecimentos, mas, mesmo assim, muito, muito interessante.
 


LINHA DE DIVISÃO, ESCOLHA E PROMOÇÃO

Os critérios de escolha e de promoção nos órgãos de comunicação social do estado ou nacionalizados (os da PT) são simples: há uma linha de demarcação entre os que acham que o governo quer controlar a comunicação social e os que não acham. Essa linha manifesta-se nos comentários ao “caso Marcelo”, às declarações de Morais Sarmento, às conclusões da AACS, à “central”. Os que não acham são escolhidos e promovidos, os que acham caminham para o limbo.

Os que não acham podem achar tudo mais: que o Ministro das Assuntos Parlamentares devia ter ficado calado, que o governo só faz asneiras nesta área, que tem havido incompetência, podem achar tudo o que quiserem desde que considerem que isso não é o essencial, é o acessório. O essencial é que o governo deve governar, tem direito a “estado de graça”, e merece uma “oportunidade”. É uma opinião, legitima como todas. Só que hoje na comunicação social do estado é o caminho mais certo e seguro para uma promoção. E tantos lugares estão a mudar de mãos…
 


AR PURO


Levitan
 


EARLY MORNING BLOGS 369

The Sycophantic Fox and the Gullible Raven


A raven sat upon a tree,
And not a word he spoke, for
His beak contained a piece of Brie.
Or, maybe it was Roquefort.
We'll make it any kind you please --
At all events it was a cheese.

Beneath the tree's umbrageous limb
A hungry fox sat smiling;
He saw the raven watching him,
And spoke in words beguiling:
"J'admire," said he, "ton beau plumage!"
(The which was simply persiflage.)

Two things there are, no doubt you know,
To which a fox is used:
A rooster that is bound to crow,
A crow that's bound to roost;
And whichsoever he espies
He tells the most unblushing lies.

"Sweet fowl," he said, "I understand
You're more than merely natty;
I hear you sing to beat the band
And Adelina Patti.
Pray render with your liquid tongue
A bit from Gotterdammerung."

This subtle speech was aimed to please
The crow, and it succeeded;
He thought no bird in all the trees
Could sing as well as he did.
In flattery completely doused,
He gave the "Jewel Song" from Faust.

But gravitation's law, of course,
As Isaac Newton showed it,
Exerted on the cheese its force,
And elsewhere soon bestowed it.
In fact, there is no need to tell
What happened when to earth it fell.

I blush to add that when the bird
Took in the situation
He said one brief, emphatic word,
Unfit for publication.
The fox was greatly startled, but
He only sighed and answered, "Tut."

The Moral is: A fox is bound
To be a shameless sinner.
And also: When the cheese comes round
You know it's after dinner.
But (what is only known to few)
The fox is after dinner, too.


(Guy Wetmore Carryl)

*

Bom dia!


22.11.04
 


A LER

Sobre o Tempo que Passa na Europa.

As "perguntas" de João Miranda no Blasfémias , como esta: "Lembra-se de ter votado em referendo em todas as disposições da Constituíção Europeia que agora nos dizem que já há muito estão em funcionamento?"
 


BIBLIOFILIA



Mais livros "livres" da destruição. Um Gide numa edição brasileira, com uma capa que parece de um romance policial. Uma publicação anticomunista de Chang Kai Chek. E um Stefan Zweig, um apenas entre muitos. Aqui está um autor que foi imensamente popular e agora quase esquecido. A Antígona vai agora republicar um título O Combate com o Demónio, mas os bons dias de Zweig já passaram. Por isso, como sempre, ver uma antiga biblioteca é um passeio pelo tempo. Ido.
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: DA ESPERANÇA COMO UM TIRO PARA OS CÉUS



Lançamento do satélite Swift para investigar pontos de origem de raios gama. Um pequeno tiro nos céus à procura de grandes explosões.
 


SE NÃO PERCEBES A PERGUNTA, VOTA NÃO (2)

Queixam-se os defensores do “sim” à Constituição Europeia que o debate corre o risco de acabar por ser sobre a pergunta e não sobre a Constituição. Ainda bem, porque a pergunta “diz” mais sobre as razões porque se deve votar “não” do que tudo o resto. Ela exemplifica, na sua matriz anti-democrática (esta pergunta não tem nem um átomo de respeito pelos portugueses), o que está mal no actual momento da construção europeia: défice democrático, elitismo iluminado, truques de uma burocracia longínqua e pouco escrutinada, que encontram eco nos grupos dirigentes partidários locais que não se importam, ao mesmo tempo que enchem a boca com a palavra “Portugal”, em ceder poderes nacionais que ninguém em Portugal acabará por controlar, muito menos o parlamento português. É, a pergunta é um retrato feio, não deixemos de a discutir.
 


AR PURO


Levitan
 


EARLY MORNING BLOGS 368

Miroirs

Ts'ai-yu se mire dans l'argent poli afin d'ajuster ses bandeaux noirs et les perles sur ses bandeaux.

Ou si le rouge est trop pâle aux yeux, ou l'huile blanche trop luisante aux joues, le miroir, avec un sourire, l'avertit.

Le Conseiller s'admire dans l'histoire, vase lucide où tout vient s'éclairer : marches des armées, paroles des Sages, troubles des constellations.

Le reflet qu'il en reçoit ordonne sa conduite.

o

Je n'ai point de bandeaux ni perles, et pas d'exploits à accomplir. Pour régler ma vie singulière, je me contemple seul en mon ami quotidien.

Son visage, -- mieux qu'argent ou récits antiques, -- m'apprend ma vertu d'aujourd'hui.

(Victor Segalen)

*

Bom dia

21.11.04
 


BIBLIOFILIA



Livros salvos de uma biblioteca que ia ser destruída. Mais: livros da minha vida, porque foram os primeiros que pedi para me comprarem, livros com o entusiasmo da curiosidade. Aprendi lá mil e uma coisas que nunca esqueci, imagens que me ensinaram pequenas coisas: que a televisão é mais um olho do que um ecrã e a persistência de Madame Curie (nunca Maria Curie, nunca senhora Curie, mas sim sempre Madame Curie) a trabalhar no seu frio laboratório, até que o rádio brilhou no escuro.
 


QUEM NÃO TEM VERGONHA, TODO O MUNDO É SEU

é o provérbio mais adaptado aos tempos que correm.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES / ANTOLOGIA DA PEDRA (4ª série)


1. ROCHAS DE ACHILL



(Enviadas da Irlanda por Mariana Magalhães)

2. "THERE ARE PLENTY OF RUINED BUILDINGS IN THE WORLD BUT NO RUINED STONES"

All is lithogenesis – or lochia,
Carpolite fruit of the forbidden tree,
Stones blacker than any in the Caaba,
Cream-coloured caen-stone, chatoyant pieces,
Celadon and corbeau, bistre and beige,
Glaucous, hoar, enfouldered, cyathiform,
Making mere faculae of the sun and moon
I study you glout and gloss, but have
No cadrans to adjust you with, and turn again
From optik to haptik and like a blind man run
My fingers over you, arris by arris, burr by burr,
Slickensides, truité, rugas, foveoles,
Bringing my aesthesis in vain to bear,
An angle-titch to all your corrugations and coigns,
Hatched foraminous cavo-rilievo of the world,
Deictic, fiducial stones. Chiliad by chiliad
What bricole piled you here, stupendous cairn?
What artist poses the Earth écorché thus,
Pillar of creation engouled in me?
What eburnation augments you with men’s bones,
Every energumen an Endymion yet?
All the other stones are in this haecceity it seems,
But where is the Christophanic rock that moved?
What Cabirian song from this catasta comes?

Deep conviction or preference can seldom
Find direct terms in which to express itself.
Today on this shingle shelf
I understand this pensive reluctance so well,
This is not discommendable obstinacy,
These contrivances of an inexpressive critical feeling,
These stones with their resolve that Creation shall not be
Injured by iconoclasts and quacks. Nothing has stirred
Since I lay down this morning an eternity ago
But one bird. The widest open door is the least liable to intrusion,
Ubiquitious as the sunlight, unfrequented as the sun.
The inward gates of a bird are always open.
It does not know how to shut them.
That is the secret of its song,
But whether any man’s are ajar is doubtful.
I look at these stones and know little about them,
But I know their gates are open too,
Always open, far longer open, than any bird’s can be,
That every one of them has had its gates wide open far longer
Than all birds put together, let alone humanity,
Though through them no man can see,
No man nor anything more recently born than themselves
And that is everything else on Earth.
I too lying here have dismissed all else.
Bread from stones is my sole and desperate dearth,
From stones, which are to Earth as to the sunlight
Is the naked sun which is for no man’s sight.
I would scorn to cry to any easier audience
Or, having cried, to lack patience to await the response.
I m no more indifferent or ill-disposed to life than death is;
I would fain accept it all completely as the soil does;
Already I feel all that can perish perishing in me
As so much has perished and all will yet perish in these stones.
I must begin with these stones as the world began.

[...]


We must be humble. We are so easily baffled by appearances
And do not realise that these stones are one with the stars.
It makes no difference to them whether they are high or low,
Mountain peak or ocean floor, palace, or pigsty.
There are plenty of ruined buildings in the world but no ruined stones.

[...]



Hugh MacDiarmid, “On a Raised Beach”, Stony Limits, and other Poems (London: Gollancz, 1934), enviado por Daniela Kato.
 


AR PURO


Levitan
 


EARLY MORNING BLOGS 367

HAGAMOS UN TRATO


Cuando sientas tu herida sangrar
cuando sientas tu voz sollozar
cuenta conmigo

(de una canción de CARLOS PUEBLA)

Compañera
usted sabe
puede contar
conmigo
no hasta dos
o hasta diez
sino contar
conmigo

si alguna vez
advierte
que la miro a los ojos
y una veta de amor
reconoce en los míos
no alerte sus fusiles
ni piense qué delirio
a pesar de la veta
o tal vez porque existe
usted puede contar
conmigo

si otras veces
me encuentra
huraño sin motivo
no piense qué flojera
igual puede contar
conmigo

pero hagamos un trato
yo quisiera contar
con usted
es tan lindo
saber que usted existe
uno se siente vivo
y cuando digo esto
quiero decir contar
aunque sea hasta dos
aunque sea hasta cinco
no ya para que acuda
presurosa en mi auxilio
sino para saber
a ciencia cierta
que usted sabe que puede
contar conmigo.


(Mario Benedetti)

*

Bom dia!
 


SE NÃO PERCEBES A PERGUNTA VOTA NÃO

A fórmula mais eficaz de fazer campanha caso a actual pergunta absurda, cozinhada pelo PS-PSD-PP para induzir ao sim e à abstenção no referendo sobre a Constituição Europeia, seja a escolhida, é: “se não percebes a pergunta vota não”.

Tem sentido? Tem todo o sentido porque os partidários do “sim” nas direcções do PS-PSD-PP estão a tentar manipular o referendo com uma pergunta deliberadamente complicada, amalgamando matérias distintas e ocultando outras, pretendendo tornar desigual o “sim” e o “não” na resposta. A pergunta pura e simplesmente não é honesta, trata os portugueses de forma indigna, mancha a democracia com a sua óbvia manipulação.

Ora basta isto para responder “não”, nem que seja para obrigar a fazer novo referendo, com nova pergunta clara, daqui a uns bons anos.

20.11.04
 


BIBLIOFILIA



Duas "novelas" publicadas por uma editora operária, ligada aos sindicalistas da Batalha. Manuel Ribeiro foi um dos primeiros comunistas portugueses, antes de se converter aos cristianismo. Mais mundo do passado morto.
 


ANTOLOGIA DA PEDRA (3ª série)

1. JARDIM KARESANSUI



2. LITTLE STONE

How happy is the little Stone
That rambles in the Road alone,
And doesn't care about Careers
And Exigencies never fears --
Whose Coat of elemental Brown
A passing Universe put on,
And independent as the Sun
Associates or glows alone,
Fulfilling absolute Decree
In casual simplicity --


(Emily Dickinson)
 


OUVINDO



O Concerto para Piano nº 2 de Chostakovitch interpretado por Bernstein, com alguma surpresa pelo lirismo da peça. Não o recordava assim. Uma coisa é certa: só um russo o podia ter escrito. Porquê? Sei lá. Sei que sei.



Um muito jovem Schumann, as Variações Abegg, um Opus 1, que parece que voa e se entre-voa (a palavra não existe mas serve) nas mãos de Lang Lang no DVD do concerto no Carnegie Hall.
 


ANTOLOGIA DA PEDRA (2ª série)

1. ROCHAS



da ilha de Achill, na Irlanda. Aqui Graham Greene esteve por várias vezes, uma das quais com Catherine Walston, e na ilha trabalhou no The Heart of the Matter. Greene chegou a pensar casar com Catherine, deixar de escrever e dedicar-se a gerir um pequeno hotel. Aqui está uma ilha poderosa.

2.PIEDRITAS

Piedritas en la Ventana

De vez en cuando la alegria
tira piedritas contra mi ventana
quiere avisarme que esta ahi
esperando pero me siento calmo
casi diría ecuanime voy a guardar
la angustia en un escondite
y luego a tenderme la cara al techo
que es una posicion gallarda y comoda
para filtrar noticias y creerlas quien
sabe donde quedan mis proximas huellas
ni cuando mi historia va a ser computada
quien sabe que consejos voy a inventar
aun y que atajo hallare para no seguirlos
esta bien no jugare al desahucio no
tatuare el recuerdo con olvidos mucho
queda por decir y callar y tambien
quedan uvas para llenar la boca esta
bien me doy por persuadido que la alegria
no tire mas piedras abrire la ventana.


(Mario Benedetti)

3. SAL



4.FUCKING A ROCK

Unnatural Selections: A Meditation upon Witnessing a Bullfrog Fucking a Rock


Amalgam of electric jelly,
constellated neural knots
in the briny binary soup,
as surely as stimulus prods response
brains are made to choose.
And through a major error in pattern recognition
or a significant cognitive fault,
the bullfrogs brain has selected
a two-pound rock
as the object of his rampant affection,
a rock (to my admittedly mammalian eye)
that neither resembles
nor even vaguely suggests
the female of his species.

He does seem to be enjoying himself
in a blunted sort of way,
but since the rock so obviously remains unmoved
one suspects it's not the blending of sweet oblivions
that fuels his persistence,
but a serious kink in a feedback loop--
or perhaps just kinkiness in general.
The less compassionate might even call him
the quintessentially insensitive male.

Assuming a pan-species gender bond
and a common fret,
I advise my amphibious pal,
"Hey, I don't think she's playing hard to get.
That's the literal case you're up against, Jack--
true story, buddy; stone fact.
And I'd be fraternally remiss if I didn't share
my deep and eminently reasonable doubt
that she'll be worn down
however long and spectacular the ardor."

Ignoring my counsel
as completely as he has my presence,
the bullfrog continues his fruitless assault
with that brain-locked commitment to folly
which invariably accompanies
dumb, bug-eyed lust.

But, in fairness,
whose brain hasn't shorted out in a slosh of hormones
or, igniting like a shattered jug of gas,
fireballed into a howling maelstrom
where a rock indeed might seem a port?
One can only conclude
that such impelling concupiscence
serves as a species' life-insurance,
sort of a procreative override
of any decision requiring thought,
thought being notoriously prey to thinking,
and the more one thinks about thinking
the thinkier it gets.
Therefore, though the brain is made to choose,
its very existence ultimately depends
on the generative supremacy of brainless desire--
for with all respect to Monsieur Descartes
you am before you can think you are.
Dirt-drive compulsions riding powerful desires
render any choice moot, along with
reason, morality, taste, manners,
and all those other jars of glitter
we pour on the sticky and raw.

The hard truth is we never chose to choose:
not the brains we use to pick
between competing explanations for our sexual mess
nor these hearts we've burdened with our blunders
in the name of love.
Do whatever we decide we will,
the choice isn't free;
we live at the mercy of more pressing needs.

Thus, urges urgently surging,
we mount a few rocks by mistake.
A bit more embarrassing than most of our foolishness, true--
but so what?
The power of the imperative
coupled with the law of averages
virtually guarantees enough will get it right
to make more brains to be made up
about exactly what steps to take
toward what we think we need to do
on this stony journey between delusion and mirage--
when to move, where to hide our dreams--
a journey where we finally learn
freedom is not a choice
a brain is free to choose.

Fortunately, my warty friend,
the soul is built to cruise.


(Jim Dodge)
 


APRENDENDO COM O PADRE ANTÓNIO VIEIRA SOBRE O AMOR

Poucos dias antes de Cristo mandar aos apóstolos a pregar pelo mundo, fez esta pergunta a S. Pedro: Simon Joannis, diligis me plus his (Jo. 21,15)? Pedro, amas-me mais que todos estes? Respondeu o santo: Etiam, Domine, tu scis quia amo te: Senhor, bem sabeis vós que vos amo. Ouvida a resposta, torna Cristo a fazer segunda vez a mesma pergunta: Simon Joannis, diligis me plus his? Pedro, amas-me mais que todos estes? Respondeu S. Pedro, com a mesma submissão e encolhimento, que bem sabia o Senhor, que o amava: Tu scis quia amo te. Ouvida a mesma resposta segunda vez, torna Cristo terceira vez a repetir a mesma pergunta, e diz o texto que se entristeceu São Pedro: Contristatus est Petrus, quia dixit ei tertio, amas me? Entristeceu-se Pedro, porque Cristo lhe perguntou a terceira vez se o amava. — E verdadeiramente que a matéria e a instância era muito para dar cuidado. Quando eu li estas palavras a primeira vez, pareceu-me que seria este exame de amor tão repetido, para Cristo mandar a S. Pedro que fosse a Jerusalém, que entrasse pelo palácio de Caifás, e que, no mesmo lugar onde o tinha negado, se desdissesse publicamente, e confessasse a vozes que seu Mestre era o verdadeiro Messias e Filho de Deus verdadeiro, e, que se por isso o quisessem matar e queimar, que se deixasse tirar a vida e fazer em cinza. Para isto cuidava eu que eram estas perguntas e estes exames tão repetidos do amor de S. Pedro. Mas depois que o santo respondeu na mesma forma a terceira vez, que amava, o que o Senhor lhe disse foi: Pasce oves meas (Jo. 21,17): Pois, Pedro, já que me amas tanto, mostra-o em apascentar as minhas ovelhas. -Agora me admiro eu deveras. Pois, para apascentar as ovelhas de Cristo tanto aparato de exames de amor de Deus? Uma vez, se me amas, e outra vez, se me amas, e terceira vez, se me amas? E não só, se me amas, senão, se me amas mais que todos? Sim.
 


AR PURO


Levitan
 


EARLY MORNING BLOGS 366

Circe's Power


I never turned anyone into a pig.
Some people are pigs; I make them
Look like pigs.

I'm sick of your world
That lets the outside disguise the inside. Your men weren't bad men;
Undisciplined life
Did that to them. As pigs,

Under the care of
Me and my ladies, they
Sweetened right up.

Then I reversed the spell, showing you my goodness
As well as my power. I saw

We could be happy here,
As men and women are
When their needs are simple. In the same breath,

I foresaw your departure,
Your men with my help braving
The crying and pounding sea. You think

A few tears upset me? My friend,
Every sorceress is
A pragmatist at heart; nobody sees essence who can't
Face limitation. If I wanted only to hold you

I could hold you prisoner.


(Louise Glück)

*

Bom dia!

19.11.04
 


AFINADOR DE MÁQUINAS

São tão estúpidas as críticas, as insinuações, a gozação a Jerónimo de Sousa por ser (ou por ter sido) operário, como se essa condição fosse um impeditivo ou uma menor valia para o exercício do cargo de dirigente de um dos principais partidos portugueses. O que é interessante é que têm origem ou nos aduladores do demagogo do “para o avô e para o bebé”, ou nos bloquistas que revelam aqui a sua indisfarçável marca de classe social.
 


INTENDÊNCIA

Colocados no VERITAS FILIA TEMPORIS vários textos sobre a Europa:

DISCURSO DE ACEITAÇÃO DA CANDIDATURA AO PARLAMENTO EUROPEU (Abril 1999).

OS QUE MANDAM E OS QUE OBEDECEM (Janeiro 2003)

A LAGARTIXA E O JACARÉ 11, sobre a Constituição Europeia.
 


ANTOLOGIA DA PEDRA

1. PEDRO


"Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. " (Mateus 16,18)

2.A PEDRA DO MEDO


Phobus

3. A EDUCAÇÃO PELA PEDRA

Uma educação pela pedra: por lições;
para aprender da pedra, freqüentá-la;
captar sua voz inenfática, impessoal
(pela de dicção ela começa as aulas).
A lição de moral, sua resistência fria
ao que flui e a fluir, a ser maleada;
a de economia, seu adensar-se compacta:
lições de pedra (de fora para dentro,
cartilha muda), para quem soletrá-la.
Outra educação pela pedra: no Sertão
(de dentro para fora, e pré-didática).
No Sertão a pedra não sabe lecionar,
e se lecionasse não ensinaria nada;
lá não se aprende a pedra: lá a pedra,
uma pedra de nascença, entranha a alma.


(João Cabral de Melo Neto)

(Continua)
 


AR PURO


Levitan
 


EARLY MORNING BLOGS 365

Delight's Despair at setting


Delight's Despair at setting
Is that Delight is less
Than the sufficing Longing
That so impoverish.

Enchantment's Perihelion
Mistaken oft has been
For the Authentic orbit
Of its Anterior Sun.


(Emily Dickinson)

*

Bom dia!
 


FÚRIA

Ainda bem que não perdi a capacidade de ficar furioso, é a palavra certa, furioso, com determinados actos políticos. A pergunta aprovada por PSD-PP-PS para o referendo europeu é um insulto a todos os portugueses, e mostra, melhor do que nenhuma outra coisa, o desprezo que quem a aprovou tem pelo povo, por Portugal, palavra com que enchem a boca na razão directa do mau trato que dão ao país onde nasceram e a todos nós.

Voltarei ao assunto, mas penso que é importante discutir já se, em vez de uma campanha para votar "não", se devia organizar um movimento cívico de recusa deste falso referendo e de contestação da sua legitimidade.

(Só depois de ter escrito esta nota comecei a ler o que se diz no mesmo sentido em vários blogues. Não são muito importantes aqui as autorias, mas o protesto colectivo e a exigência que esse protesto tenha meios de se expressar nos grandes meios de comunicação social com a mesma relevância dos defensores do "sim" que votaram esta pergunta manipuladora.)

*

A "pergunta" : "Concorda com a Carta de Direitos Fundamentais, a regra das votações por maioria qualificada e o novo quadro institucional da União Europeia, nos termos constantes da Constituição para a Europa?"

18.11.04
 


ANTES DE PARTIR

Haverá livros novos? Já está o Natal em força? Entre as importações, que nos dão cabo da balança, haverá alguns livrinhos ou só automóveis? As editoras cumprem o seu dever de empresas capitalistas e preparam os seus produtos da "estação" para obter chorudos lucros e nos dar prazer? Vamos ver.
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: NUVENS, NUVENS, EM TODO O LADO





Nuvens em Marte, nuvens em Urano. Em Marte, puff...Em Urano, sim Urano, também lá está nos céus, uma tempestade no hemisfério norte, move-se sobre o azul perfeito.
 


AR PURO


Levitan, Outono dourado
 


EARLY MORNING BLOGS 364

Salome's Dancing-Lesson


She that begs a little boon
(Heel and toe! Heel and toe!)
Little gets- and nothing, soon.
(No, no, no! No, no, no!)
She that calls for costly things
Priceless finds her offerings-
What's impossible to kings?
(Heel and toe! Heel and toe!)

Kings are shaped as other men.
(Step and turn! Step and turn!)
Ask what none may ask again.
(Will you learn? Will you learn?)
Lovers whine, and kisses pall,
Jewels tarnish, kingdoms fall-
Death's the rarest prize of all!
(Step and turn! Step and turn!)

Veils are woven to be dropped.
(One, two, three! One, two, three!)
Aging eyes are slowest stopped.
(Quietly! Quietly!)
She whose body's young and cool
Has no need of dancing-school-
Scratch a king and find a fool!
(One, two, three! One, two, three!)


(Dorothy Parker)

*

Bom dia!

17.11.04
 


CHUVA DE FOGO









Estamos em plena chuva de fogo nocturna, os meteoritos conhecidos como “Leónidas”. O céu está propício, com este frio alto e sem nuvens e uma lua turca. Em vez de andarmos o dia todo inebriados(as) pelo sol de Inverno, e a fazermos as asneiras que tanta beleza solar costuma favorecer, vale a pena embrulharmo-nos num cobertor e olhar para cima. Ninguém pode impedir os desejos por cada traço de fogo, mas os meteoritos são muitos, pelo que é necessária alguma prudência.
 


ISAAK LEVITAN 2



Levitan, na Estrada Vladimirka, pinta o caminho que os exilados usavam para irem para a Sibéria. A Rússia, o imenso espaço sem limites, um forte sentido de destino, de sentido, o sofrimento inscrito invisivelmente na paisagem, encontra aqui um retrato perfeito. Nada inquieta nesta estrada, está bom tempo, os campos estão verdes, há sinais da presença humana, mas quem nela caminhava sabia que, no fim, o mundo era outro.
 


ISAAK LEVITAN

Um dos efeitos catastróficos da Revolução Russa foi isolar a grande cultura russa do século XIX e do princípio do século XX das correntes artísticas da Europa e dos EUA. A pintura sofreu mais do que a literatura, com os pintores russos relegados para o esquecimento de museus estatais mal cuidados, em Moscovo e na província, sem edições de qualidade, e sem a possibilidade de os amadores de arte e outros artistas poderem ver o que estava em museus de tão difícil acesso como os da Arménia, ou do interior siberiano. Muitas colecções privadas foram nacionalizadas ou desmembradas com a fuga para o estrangeiro dos seus donos, ou a venda, em condições péssimas, dos seus bens. Isaak Levitan, nos seus parcos quarenta anos de vida (1860-1900), foi um extraordinário paisagista, interpretando a terra russa na sua vastidão como ninguém, pintando a noite como noite, algo muito difícil de fazer. Como muitos intelectuais russos do seu tempo preocupava-se com a democratização da arte e era um dos “itinerantes” (Peredvizhniky) cujas obras circulavam pelo interior da Rússia, para que um maior número de pessoas as pudessem ver.
 


AR PURO


Levitan
 


EARLY MORNING BLOGS 363

Story


Tired of a landscape known too well when young:
The deliberate shallow hills, the boring birds
Flying past rocks; tired of remembering
The village children and their naughty words,
He abandoned his small holding and went South,
Recognised at once his wished-for lie
In the inhabitants' attractive mouth,
The church beside the marsh, the hot blue sky.

Settled. And in this mirage lived his dreams,
The friendly bully, saint, or lovely chum
According to his moods. Yet he at times
Would think about his village, and would wonder
If the children and the rocks were still the same.

But he forgot all this as he grew older.


(Philip Larkin)

*

Um pouco tarde, bom dia!

16.11.04
 


O ÚLTIMO DOS MOICANOS

Há o último dos moicanos e o último dos cavaquistas, lugar a que me candidato humildemente. Eu apoiarei Cavaco Silva como candidato presidencial, mas o que verdadeiramente eu quero é Cavaco Silva como candidato a Primeiro-ministro de Portugal. O que faz toda a diferença. Assim seja.
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS / UM VULCÃO QUE CUMPRE O SEU DEVER



A fotografia, (bom, não é bem uma fotografia, é uma fotografia com cores que nós não vemos), no seu grande esplendor, está aqui.O vulcão é o Monte de S. Helena e a tecnologia usada para ver outros planetas revela no nosso, o vulcão quente dentro do vulcão frio.
 


APRENDENDO COM EUGENIO MONTALE SOBRE AS VIAGENS

PRIMA DEL VIAGGIO

Prima del viaggio si scrutano gli orari,
le coincidenze, le soste, le pernottazioni
e o doccia, a un letto o due o addirittura un flat ):
si consultano
le guide Hacchette e quelle dei musei,
si cambiano valute, si dividono
franchi da escudos, rubli da copechi:
prima del viaggio si informa
qualche amico o parente: si controllano
valige e passaporti, si completa
il corredo, si acquista un supplemento
di lamette da barba, eventualmente
si dá un'occhiata al testamento, pura
scaramanzia perché i dasastri aerei
in percentuale sono nulla:
prima
del viaggio si é tranquilli ma si sospetta che
il saggio non si muova e che il piacere
di ritornare costi uno sproposito.
E poi si parte e tutto é O.K. e tutto
é per il meglio e inutile.
E ora che ne sará
del mio viaggio?
Troppo accuratamente l'ho studiato
senza saperne nulla. Un imprevisto
é la sola speranza . Ma mi ddicono
ché una stoltezza dirselo.

(enviado por Sofia P.)

 


CRIAR UM NOVO PARTIDO

Pedro Santana Lopes está a fazer ao PSD o que Paulo Portas fez ao CDS: criar dentro de um partido, um novo partido o PP. É mais difícil fazê-lo no PSD, que tem um lastro muito especial e é um partido de grande dimensão, menos plástico a “refundações”, mas, se lhe for dado tempo e oportunidade, é o que ele tentará fazer. Não é aliás um projecto novo, já tem história no muito esquecido projecto de um “partido social-liberal”, pensado por Lopes e anunciado pelo Independente de Portas.

Os sinais estão bem à vista: a tendência para o partido unipessoal, à PP de Portas, com o culto de personalidade assente na “subjectividade” do líder, a interpretação messiânica do destino manifesto, a ênfase na “geração” como mecanismo de exclusão, a identidade nacionalista entre “Portugal” e o líder, a acentuação de um princípio de comando (“eu” foi a palavra mais forte do Congresso), a tentação populista do contacto directo entre o líder e o “povo” através daquilo que, com ignorância do significado das palavras, os fãs chamam, ou “inteligência emocional” ou “carisma”, e o exercício brutal do poder de estado ao serviço não de causas, mas de pessoas. A complacência com alguns políticos pouco honestos que passeavam pela sala, sempre sem mácula partidária, façam o que fizerem, a contrastar com a violência verbal contra os críticos. A perigosa enfatuação da palavra “líder”.

Esta semana escreverei sobre tudo isto, até que a voz me doa. O que é difícil de acontecer.
 


A LER

Versi scritti per tenere allegro Montale em Cura di Sé

Ele há pequenas notícias que explicam muita coisa, O Guterres de Gaia no Jaquinzinhos.
 


AR PURO


Levitan
 


EARLY MORNING BLOGS 362

Soneto (do Parnaso Español)


Enseña a morir antes y que la mayor parte de la muerte es la vida y esta no se siente, y la menor, que es el último suspiro, es la que da pena.

Señor don Juan, pues con la fiebre apenas
se calienta la sangre desmayada,
y por la mucha edad, desabrigada,
tiembla, no pulsa, entre la arteria y venas;

pues que de nieve están las cumbres llenas,
la boca, de los años saqueada,
la vista, enferma, en noche sepultada,
y las potencias, de ejercicio ajenas,

salid a recibir la sepoltura,
acariciad la tumba y monumento;
que morir vivo es última cordura.

La mayor parte de la muerte siento
que se pasa en contentos y locura,
y a la menor se guarda el sentimiento.


(Francisco de Quevedo)

*

Bom dia!

15.11.04
 


A PEDRA

No Porto a pedra está omnipresente. Há uma solidez absoluta na cidade, que se faz lembrar a todos pela dureza do granito. A cidade não tem cenários. Se quiséssemos dizer, como naquelas descrições estereotipadas, “vemos daqui o cenário da cidade”, como se fossem trapos pintados, ou estuque, ou cartão, ou umas bandeiras ao vento, é porque não é o Porto. Esta cidade dá à força da gravidade o seu verdadeiro nome.

No centro da cidade, mesmo no centro da cidade, há duas pedreiras eternas que ninguém parece ser capaz de eliminar. É um pouco absurdo que um século de urbanismo e de “mobiliário urbano” não tenham conseguido eliminar essa estranheza de ter pedreiras nos equivalentes portuenses do Rossio e do Terreiro do Paço. Uma, à entrada da Ponte D. Luís, outra, na Trindade, ao lado da Igreja e da Ordem, coberta hoje por um dos edifícios mais feios, sujos e escalavrados que se possa imaginar. Ambas as pedreiras resistem a desaparecer, como se fizessem parte da pele da cidade. Já as vi pintadas, com pichagens, cobertas de tapumes, de toda a maneira. A da Trindade deve recusar o seu edifício como um corpo rejeita um transplante. Mas continuam lá.

Pedra. Passando pela R. de D.Hugo, no absoluto silêncio de uma manhã de domingo. Pedra à volta nas casas, pedras, grandes lajes no chão, apenas perturbadas pelos furos da drenagem. O pequeno jardim quase veneziano, com o seu poço de pedra, da Casa Museu Guerra Junqueiro. O ferro forjado dos portões. A capela ao fundo, quando a rua se bifurca e descem as escadas para o rio e brilha de novo o sol sobre o muro em frente do Paço Episcopal. Não há sol na R. de D. Hugo.
 


AR PURO


Levitan
 


EARLY MORNING BLOGS 361

Very Like A Whale


One thing that literature would be greatly the better for
Would be a more restricted employment by authors of simile and metaphor.
Authors of all races, be they Greeks, Romans, Teutons or Celts,
Can'ts seem just to say that anything is the thing it is but have
to go out
of their way to say that it is like something else.
What foes it mean when we are told
That the Assyrian came down like a wolf on the fold?
In the first place, George Gordon Byron had had enough experience
To know that it probably wasn't just one Assyrian, it was a lot
of Assyrians.
However, as too many arguments are apt to induce apoplexy and thus
hinder longevity,
We'll let it pass as one Assyrian for the sake of brevity.
Now then, this particular Assyrian, the one whose cohorts were gleaming
in purple and gold,
Just what does the poet mean when he says he came down like a wolf
on
the fold?
In heaven and earth more than is dreamed of in our philosophy there
are
a great many things,
But i don't imagine that among then there is a wolf with purple
and gold
cohorts or purple and gold anythings.
No, no, Lord Byron, before I'll believe that this Assyrian was actually
like a wolf I must have some kind of proof;
Did he run on all fours and did he have a hairy tail and a big red
mouth and
big white teeth and did he say Woof woof?
Frankly I think it very unlikely, and all you were entitled to say,
at the
very most,
Was that the Assyrian cohorts came down like a lot of Assyrian cohorts
about to destroy the Hebrew host.
But that wasn't fancy enough for Lord Byron, oh dear me no, he had
to
invent a lot of figures of speech and then interpolate
them,
With the result that whenever you mention Old Testament soldiers
to
people they say Oh yes, they're the ones that a lot
of wolves dressed
up in gold and purple ate them.
That's the kind of thing that's being done all the time by poets,
from Homer
to Tennyson;
They're always comparing ladies to lilies and veal to venison,
And they always say things like that the snow is a white blanket
after a
winter storm.
Oh it is, is it, all right then, you sleep under a six-inch blanket
of snow and
I'll sleep under a half-inch blanket of unpoetical
blanket material and
we'll see which one keeps warm,
And after that maybe you'll begin to comprehend dimly,
What I mean by too much metaphor and simile.


(Ogden Nash)

*

Bom dia!


14.11.04
 


SEMPRE O PORTO

Hoje as gaivotas voltaram ao centro da cidade, porque o Porto não é uma cidade fluvial, mas marítima. A luz brilhante dos dias frios mostrava a enorme dignidade do granito. Havia silêncio.

13.11.04
 


EARLY MORNING BLOGS 360

"Star Light, Star Bright--"


Star, that gives a gracious dole,
What am I to choose?
Oh, will it be a shriven soul,
Or little buckled shoes?

Shall I wish a wedding-ring,
Bright and thin and round,
Or plead you send me covering-
A newly spaded mound?

Gentle beam, shall I implore
Gold, or sailing-ships,
Or beg I hate forevermore
A pair of lying lips?

Swing you low or high away,
Burn you hot or dim;
My only wish I dare not say-
Lest you should grant me him.


(Dorothy Parker)

*

Bom dia!

12.11.04
 


A LER

No Homem a Dias Muqata, banana e cola e, como comentário acertado, no Blasfémias O fenómeno Timor-Lorosae revisitado. Tanta palermice sobre Arafat que se tem ouvido, de todos, desde as "altas autoridades" aos jornalistas excitados, que ao mais pequeno pretexto ideológico se revelam prontos a morrer como profissionais (simbolicamente claro) pela causa. Falta tudo: pudor, critérios, vergonha, conhecimento, juízo.
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: O NOTÍCIAS DO UNIVERSO



Pouco a pouco, as notícias são do Universo, embora o suplemento mais activo seja hoje do Sistema Solar. A sonda Opportunity desiste de subir pela parede da cratera (foto). Ondas atravessam os anéis de Saturno. É Plutão um verdadeiro planeta? Já viram o retrato em raio X da Próxima Centauri? Problemas com as rodas da frente do Spirit. Correm bem os preparativos para lançar um barco à vela muito especial, movido pelo vento solar. Nova fotografia de Tetis e das suas crateras. Pouco a pouco.
 


AR PURO


Carl Agricola
 


EARLY MORNING BLOGS 359

La dulce boca


La dulce boca que a gustar convida
un humor entre perlas destilado,
y a no invidiar aquel licor sagrado
que a Júpiter ministra el garzón de Ida,

¡amantes! no toquéis si queréis vida:
porque entre un labio y otro colorado
Amor está de su veneno armado,
cual entre flor y flor sierpe escondida.

No os engañen las rosas que al Aurora
diréis que aljofaradas y olorosas
se le cayeron del purpúreo seno.

Manzanas son de Tántalo y no rosas,
que después huyen dél que incitan ahora
y sólo del Amor queda el veneno.


(Luis de Góngora)

*

Bom dia!

11.11.04
 


EM VEZ DO ESTADO A PARÓQUIA

Os Conselhos de Ministros fora de Lisboa não são novidade. O actual governo tem-se especializado nesse tipo de reuniões, mas seria injusto atribuir-lhe apenas este tipo de práticas. A percursora foi a eng. Pintasilgo, mas muitos outros governos do PS e PSD também andaram em passeio pelo "interior". É uma maneira fácil de parecer que se faz alguma coisa sobre a parte mais deprimida do país e, face à indiferença da comunicação social nacional, sempre se pode obter algum interesse da regional. Em véspera de eleições autárquicas, tem também alguma utilidade.

Só que há mais outra coisa. Nota-se outra coisa: a dificuldade que tem o Primeiro-ministro em entender a governação acima do nível das autarquias, ao nível do Estado. Ele tem tendência para governar o país como se fosse o Presidente da Câmara de Portugal. Tem pouco interesse e conhecimento das matérias exclusivas do Estado, Negócios Estrangeiros, Defesa, Administração Interna, que deixa praticamente em autogestão aos respectivos ministros. Na macro-economia não se mete, o que faz bem. Na micro já não estou certo, porque a politização dos nossos negócios é enorme.

Sobra o que sobra: a gestão político-partidária a partir do estado, a propaganda, chamada “imagem”, matérias a que sabemos dedica grande atenção. E depois sobra aquele misto de governo paternalista, envolvendo clientelas e patrocinato, proximidade e festa popular, banda, majoretes e desfile dos bombeiros, inaugurações e foguetes, boletim com cem fotografias e cartazes de promessas, notáveis agradecidos e “sessões solenes”, que é tão típico da forma paroquial como são geridas as autarquias.
 


INTENDÊNCIA

Actualizadas as notas A FELICIDADE, IDEIA NOVA NA EUROPA 2, e APRENDENDO COM O PADRE ANTÓNIO VIEIRA.

Em actualização os ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO.
 


OUÇAM COMO SE ESCREVIA

numa vulgar revista popular, há meio século, quando o povo ainda estava "lá na sua":

(...) é no dia 11 de Novembo, dia de S.Martinho, ditoso Bispo de Tours, nascido na Hungria e discipulo do papa Santo Hilário – que o culto da castanha se unifica com Baco, sacrificador de quantos tonéis virgens escaparam à gula de católicos e pagãos. Talvez por isso, a sabedoria popular esceveu um axioma inviolável e usureiro:

No dia de S. Martinho
Mata o porquinho
Abre o pipinho
Rebusca o soitinho
E põe-te de mal com o teu vizinho.

Lá na sua, o povo quer dizer que, em familia, se devem saborear os últimos bocados gostosos do ano: as febras do porco, o vinho novo e as derradeiras castanhas achadas ao rebusco.


(da revista Ver Para Crer, nº 19, Novembro de 1946, enviada por R.)

 


UM VULCÃO QUE CUMPRE O SEU DEVER

 


EARLY MORNING BLOGS 358

Rhetorical Questions

How do you think I feel
when you make me talk to you
and won't let me stop
till the words turn into a moan?
Do you think I mind
when you put your hand over my mouth
and tell me not to move
so you can "hear" it happening?


And how do you think I like it
when you tell me what to do
and your mouth opens
and you look straight through me?
Do you think I mind
when the blank expression comes
and you set off alone
down the hall of collapsing columns?


(Hugo Williams)

*

Bom dia!

10.11.04
 


BIBLIOFILIA 2



Folha de um catálogo de tatuagens com os preços manuscritos.
 


APRENDENDO COM O PADRE ANTÓNIO VIEIRA: AS DUAS CHAVES

"Não sei se reparais em que deu Cristo a S. Pedro não só chave, senão chaves: Jibi dabo claves. Para abrir as portas do céu bastava uma só chave: pois, por que lhe dá Cristo duas? Porque assim como há caminhos contra caminhos, assim há portas contra portas: Portae inferi non praevalebunt adversus eram. Há caminhos contra caminhos, porque um caminho leva a Cristo, e outro pode levar a Herodes; e há portas, contra portas porque umas são as portas do céu, e outras as portas do inferno, que o encontram. Por isso, é necessário que as chaves sejam duas, e que ambas estejam na mesma mão. Uma com que Pedro possa abrir as portas do céu, e outra com que possa aferrolhar as portas do inferno; uma com que possa levar os gentios a Cristo, e outra com que os possa defender do demônio, e seus ministros. E toda a teima do mesmo demônio e do mesmo inferno, é que estas chaves e estes poderes se dividam, e que estejam em diferentes mãos."

*

"Essa do “Aprendendo com o Padre António Vieira” é um mistério, pois nunca percebi o que é suposto aprender! Que é um delírio lê-lo, é sim. Que ainda é mais delirante lê-lo citando Jesus Cristo e em latim (dois factos só por si do domínio do virtual), é sim. Mas aprender aprender, só se for algo sobre a prosa barroca portuguesa. "

(J.)

*

"O que eu aprendi com o Padre António Vieira no Abrupto:

Duas Chaves

Há caminhos contra caminhos, porque um caminho leva a Cristo, e outro pode levar a Herodes; e há portas, contra portas porque umas são as portas do céu, e outras as portas do inferno, que o encontram. Por isso, é necessário que as chaves sejam duas, e que ambas estejam na mesma mão.

Breu da barca

Mas eu não me posso persuadir que, quando S. Pedro acabava de honrar a Cristo por seu Pai, com o nome de Filho de Deus vivo, o Senhor lhe respondesse com o que tanto lhe tocava no vivo, como ouvir em público a indignidade do seu.

Como se dissera o divino Mestre com resposta muito digna da sua grandeza: «Tu, Pedro, dizes que eu sou Filho do Eterno Padre? Pois eu te digo que tu és filho do Espírito Santo»."

O Ó

A figura mais perfeita e mais capaz de quantas inventou a natureza e conhece a geometria é o círculo.

As línguas falam, o fogo alumia

Para converter almas, não bastam só palavras: são necessárias palavras e luz.

Uns aprendem, outros não

O mestre na cadeira diz para todos, mas não ensina a todos. Diz para todos, porque todos ouvem; mas não ensina a todos, porque uns aprendem, outros não.

Acho que basta, por ora."

(R.M.)
 


BIBLIOFILIA



Uma volta pelos alfarrabistas revelou coisas curiosas: um cartaz anti-alcoólico dos anos cinquenta do Congo Belga, e um livro anticomunista sobre Lenine, traduzido para português, e publicado nos anos trinta.
 


A FELICIDADE, IDEIA NOVA NA EUROPA 2

"É muito reveladora a questão da felicidade e da alegria e paz, assim como a forma como as palavras são utilizadas ao longo dos tempos.
Mas o que importa é que o latim era uma língua composta, essencialmente, por vocábulos concretos e, principalmente, ligados às actividades dos homens. Assim FELIX, ICIS significava fecundo, fértil, só mais tarde passou a adquirir o significado que lhe damos hoje. Enquanto a palavra alegre, do latim ALACER, ALACRIS,(-IS, -E) significava vivo, esperto, alegre. Daí provavelmente, as palavras alegria e paz serem as que aparecem na Bíblia.
Quanto a Bonheur (bon heur>> sendo a combinação de bon(bonus,a,um) e heur que ainda existe em françês e significa sorte, logo o significado de bonheur é mais próximo de boa sorte, i.e., algo aleatório, algo não controlável, algo deixado ao acaso... e a sorte de Saint Just acabou como a de Robespierre."

(Ana da Palma)

*

"Penso que não se deverá esquecer o termo "bem-aventurados", muito repetido no sermão das bem-aventuranças, que significará o mesmo que "felizes". Quando Jesus Cristo afirma «bem-aventurados os que sofrem», no fundo, julgo, quer dizer «felizes os que sofrem», ou melhor, «alcançarão felicidade os que sofrem»; a felicidade aqui entendida como a «glória celestial». "

(Mário Azevedo)


*

"Entretanto, e a propósito do luminoso esclarecimento do leitor ácerca da “bem-aventurança” – e que me parece de facto cabal – ocorrem-me outras afirmações bíblicas que me parecem de maior valor existencial que a frase de Cristo que o leitor cita. Nomeadamente, a afirmação: “bem-aventurados os pobres de espírito porque será deles o reino dos céus”.

Se associar isto à parábola sobre os “lírios do campo”, julgo que fica bem expressa a ideia de que a felicidade requer conformismo com o curso essencial da vida (da nossa e da dos outros em geral). O que obviamente está nos antípodas da visão comunista sobre a capacidade do Homem se transformar a si próprio (e aos outros) pela força da vontade. Visão, de resto, comum ao fascismo militante e aos fundamentalismos religiosos."

(José Luís Pinto de Sá)
 


COISAS SIMPLES


Karel Appel, Nu couché
 


EARLY MORNING BLOGS 357

Catch a Little Rhyme


Once upon a time
I caught a little rhyme

I set it on the floor
but it ran right out the door

I chased it on my bicycle
but it melted to an icicle

I scooped it up in my hat
but it turned into a cat

I caught it by the tail
but it stretched into a whale

I followed it in a boat
but it changed into a goat

When I fed it tin and paper
it became a tall skyscraper

Then it grew into a kite
and flew far out of sight...


(Eve Merriam)

*

Bom dia!
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: ONDAS



nos anéis de Saturno. Ondas, sinais, perturbações no meio, flutuações. Augúrios. Os planetas falam.
 


APRENDENDO COM ROSALIA DE CASTRO SOBRE A "VENTURA"

A VENTURA É TRAIDORA


Tembra a que unha inmensa dicha
neste mundo te sorprenda;
grorias, aqui, sobrehumanas
trán desventuras supremas
Nin maxines que pasan os dores
como pasan os gustos na terra;
hai inferno na memória,
cando n’os hai na concencia!


Cal arraigan as hedras nos muros,
Nalguns eitos arraigan as penas,
e unhas van minando a vida
cal minan óutralas pedras.
Si; tembra cando no mundo
sintas una dicha inmensa:
val máis que a túa vida corra
Cal corre a iagua serena.


(Enviado por R.M.)
 


INTENDÊNCIA

Actualizado A FELICIDADE, IDEIA NOVA NA EUROPA.

9.11.04
 


COISAS SIMPLES


Helen Allingham, Thomas Carlyle
 


A FELICIDADE, IDEIA NOVA NA EUROPA

Numa conferência citei a frase de Saint Just, no dia 3 de Março de 1794, na Convenção : « Le bonheur est une idée neuve en Europe. ». Numa conversa a seguir, O.A. disse-me: “Na Bíblia nunca se usa a palavra felicidade, só se fala de alegria e paz”, o que tornava a frase de Saint Just ainda mais interessante e certeira. Fui verificar e encontrei a palavra “felicidade” apenas duas vezes na Bíblia e num contexto que só confirma a razão de Saint Just com a “novidade” da ideia. Uma, em Job 30,15, “como nuvem passou a minha felicidade”, e outra em Lamentações 3, 17, “esqueci-me do que seja a felicidade”. Em ambos os casos a “felicidade” é um estado passado e nunca um objectivo.

*

A S. fez uma procura suplementar com a palavra "feliz" e encontrou dezoito resultados. Embora "feliz" e "felicidade" não sejam a mesma coisa, a análise dos resultados só confirma o que se diz antes. Por exemplo:

"Feliz é o homem que me dá ouvidos, velando cada dia às minhas entradas, esperando junto às ombreiras da minha porta." [Provérbios 8,34]

"O que despreza ao seu vizinho peca; mas feliz é aquele que se compadece dos pobres." [Provérbios 14,21]

"O que atenta prudentemente para a palavra prosperará; e feliz é aquele que confia no Senhor." [Provérbios 16,20]

"Tenho-me por feliz, ó rei Agripa, de que perante ti me haja hoje de defender de todas as coisas de que sou acusado pelos judeus" [Actos dos Apóstolos 26,2]

"Será, porém, mais feliz se permanecer como está, segundo o meu parecer, e eu penso que também tenho o Espírito de Deus." [I Coríntios 7,40]

*

"Como alemã e protestante, posso lhe garantir, que Lutero na sua tradução da Bíblia somente uma única vez utiliza a palavra "Glück" nos exemplos citados (Provérbios, 16,20). Não quero entrar em pormenores, mas o contexto em Provérbios 8,34 é de tal forma, que a tradução "feliz" deturpa a mensagem. Este pormenor lembra-me, antes de mais, as definições e distinções que Hannah Ahrendt faz relativamente às culturas europeias que conheceram ou não a Reforma."

(Monika Kietzmann Lopes)

*

"Assim não vale! Então os tempos presente (muitas vezes com sentido de futuro prometido) e futuro confirmam que "a 'felicidade' é um estado passado e nunca um objectivo"? :)
Mais felicidade bíblica (outra tradução) aqui e aqui".

(S.)

*

"É uma discussão interessante porque há também ainda “restos” da ideia contrária imputada ao catolicismo, que se está na vida para sofrer e que esse sofrimento é que nos leva ao céu, ou à vida eterna. Claro que a felicidade e o sofrimento longe de serem ideias opostas são meramente reversos de uma mesma medalha, pois o sofrimento, neste caso, vale como a não-aceitação da felicidade enquanto objectivo a perseguir, por ser tão indigna, tão pagã? É também interessante porque nos obriga a pensar e procurar o que movia as pessoas antes dessa busca da felicidade, e ver o que realmente mudou na forma de pensar de estar na vida. E finalmente fica a questão de se no mundo não ocidental essa busca é também o cerne da vida dos homens e das mulheres ou se ela vem com o “package” da ocidentalização e do “americam way of life” a que se aspira."

(J.)

*

"É preciso ver o latim da Vulgata e o grego dos Setenta. Ora nos versículos dos Provérbios que foram referidos o termo é sempre beatus. E sobre a beatitude futura há na Escritura mais de uma centena de ocorrências. Que Lutero fugia da felicidade é coisa sabida (Calvino ainda mais…), mas será que o mesmo se pode dizer do Novo Testamento? Entre tantos passos escolhidos estranho que ninguém se tenha lembrado da Magna Carta da felicidade, o bem conhecido Sermão da Montanha, Mt 5, 1-12 (ou Lc 6, 20-35). (em boa verdade não estranho nada) Claro que aqui não se trata da 'felicidade' revolucionária que matou milhões de infelizes (na guilhotina, a tiro ou à baioneta: Paris, Vendeia, guerras napoleónicas, etc.), nem da 'felicidadezinha' do bem-estar (curiosa esta substituição do ser pelo estar), mas simplesmente da real bem aventurança que se experimenta já e ainda não…"

(fbp)
 


LER, ESCREVER, CONTAR E VER TELEVISÃO

O que a escola deve ensinar hoje.

(Contraditório: que a escola não pode ensinar-nos hoje, porque a escola mais eficaz já é a televisão, e a televisão não tem espessura para se ver a si própria.)

Ou, mais exactamente, ler, escrever, contar e saber ler/ver o fluxo digital que nos chega por vários média (televisão, CDs, rádio, Internet) e que no futuro nos chegará de forma integrada numa nova forma de Internet, que terá tudo: música, imagem, televisão, interactividade, jogos.

E que estará perto de nós. Que estará muito perto de nós: nas paredes da casa, na roupa, no corpo.

8.11.04
 


A VER

Uma bela Astronomy Picture of Today, tirada na terra dos turcos.
 



Helena Almeida
 


EARLY MORNING BLOGS 356

Départ



Ici, l'Empire au centre du monde. La terre ouverte au labeur des vivants. Le continent milieu des Quatre-mers. La vie enclose, propice au juste, au bonheur, à la conformité.
Où les hommes se lèvent, se courbent, se saluent à la mesure de leurs rangs. Où les frères connaissent leurs catégories : et tout s'ordonne sous l'influx clarificateur du Ciel.
o
Là, l'Occident miraculeux, plein de montagnes au-dessus des nuages ; avec ses palais volants, ses temples légers, ses tours que le vent promène.
Tout est prodige et tout inattendu : le confus s'agite : la Reine aux désirs changeants tient sa cour. Nul être de raison jamais ne s'y aventure.
o
Son âme, c'est vers Là que, par magie, Mou-wang l'a projetée en rêve. C'est vers là qu'il veut porter ses pas.
Avant que de quitter l'Empire pour rejoindre son âme, il en a fixé, d'Ici, le départ.

(Victor Segalen)

*

Bom dia!

7.11.04
 


POEIRA DE 7 DE NOVEMBRO (2)

Hoje, há oitenta e sete anos, em Petrogrado, um pequeno partido socialista radical que não queria aceitar os resultados das eleições, organizou uns grupos armados que tomaram as sedes do governo na cidade. Praticamente não houve resistência, e, no Palácio de Inverno, só meia dúzia de mulheres soldados renderam-se sem combate. O que aconteceu neste dia mudou totalmente o século XX. Quem se lembra?
 


POEIRA DE 7 DE NOVEMBRO

Entre ontem e hoje, há sessenta e seis anos, Cesare Pavese descreveu assim o seu dia (noite): "Passei toda a noite sentado diante de um espelho para fazer companhia a mim próprio". No limite, há quem acabe assim, com o espelho por companhia. Não me parece brilhante, até porque acho que falam os dois do mesmo.
 


APRENDENDO COM O PADRE ANTÓNIO VIEIRA: O BREU DA BARCA

"Quando S. Pedro acabou de fazer a sua confissão, disse-lhe o mesmo Cristo assim exaltado: Beatus es, Simon Barjona: Bem-aventurado és, Simão Barjona. Era este o apelido humilde de Pedro, e que cheirava ainda ao breu da barca; e têm para si alguns expositores, quis o Senhor lembrar-lhe nesta ocasião a baixeza do seu nascimento, para que a dignidade, a que logo o havia de levantar, o não desvanecesse. Mas eu não me posso persuadir que, quando S. Pedro acabava de honrar a Cristo por seu Pai, com o nome de Filho de Deus vivo, o Senhor lhe respondesse com o que tanto lhe tocava no vivo, como ouvir em público a indignidade do seu. E o que em tal caso não faria nenhum homem de bem, não havemos de crer que o fizesse o bem dos homens. Qual foi logo a razão daquele nome ou sobrenome, e em resposta do que Pedro tinha dito? Barjona na língua hebréia ou siríaca que naquele tempo era a vulgar, significa filius columbæ, filho da pomba; e dizem comumente os Santos Padres que aludiu o Senhor à pomba, em cuja figura desceu o Espírito Santo no baptismo sobre o mesmo Cristo. Como se dissera o divino Mestre com resposta muito digna da sua grandeza:__ «Tu, Pedro, dizes que eu sou Filho do Eterno Padre? Pois eu te digo que tu és filho do Espírito Santo»."
 


INTENDÊNCIA

Em actualização os ESTUDOS SOBRE COMUNISMO.

Colocados os textos O ASSALTO AO INDIVÍDUO e o TORRÃOZINHO DE AÇÚCAR, ambos de Novembro 2000, no VERITAS FILIA TEMPORIS.
 


AR PURO


Levitan, Sombras. Noite de Luar
 


EARLY MORNING BLOGS 355

Cold Morning

Through an accidental crack in the curtain
I can see the eight o'clock light change from
charcoal to a faint gassy blue, inventing things

in the morning that has a thick skin of ice on it
as the water tank has, so nothing flows, all is bone,
telling its tale of how hard the night had to be

for any heart caught out in it, just flesh and blood
no match for the mindless chill that's settled in,
a great stone bird, its wings stretched stiff

from the tip of Letter Hill to the cobbled bay, its gaze
glacial, its hook-and-scrabble claws fast clamped
on every window, its petrifying breath a cage

in which all the warmth we were is shivering.


(Eamon Grennan)

*

Bom dia!

6.11.04
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: OS CÍRCULOS

"Escreve-se hoje no Abrupto:
"Tenho repetido à saciedade que existe um efeito de Big Brother nas políticas em democracia: tudo o que é importante não se vê, ao mesmo tempo que as pessoas têm a ilusão que sabem de tudo, em directo e a cores".
Concordo plenamente com o facto e sobretudo com as ilações. Mas (...) dentro da compulsão quase natural do sistema político essas coisas não se podem dizer, pelo menos desse modo, pois não? Existe uma margem de reflexão que escapa, ou que se contém irremediavelmente, quando o exercício do poder atravessa a enunciação dos mundos de quem escreve. Existe, de facto, um estar fora do círculo e um estar por dentro desse mesmo círculo. Que é o do poder, directo, real, exercido. O poder não é uma ferramenta pejorativa ou artificiosa, mas acaba sempre por ditar ou condicionar a medida e o momento em que a palavra é materializada em discurso.(...) . A dissimulação entretece o dizer da política, enquanto a discrição - e tão-só a discrição - entretece o poder autónomo e corrosivamente livre da palavra."

(Luis Carmelo)
 


INTENDÊNCIA

Colocado no VERITAS FILIA TEMPORIS a LAGARTIXA E O JACARÉ 10 sobre porque razão a oposição do PS é débil, o "mar cão" que mata, o ruído e Weber e a selvajaria do futebol.
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: NADA DE NOVO SOBRE A TERRA, TUDO DE NOVO NOS CÉUS






Chão de Titã, em falsas cores. Chão de Marte, a preto e branco, como os fotógrafos gostam. Chão novo, onde se olha pela primeira vez, com a mesma frescura, curiosidade, emoção e algum medo, com que os nossos portuguesinhos de antigamente chegavam a novas terras. Será que haverá ali unicórnios, homens de duas cabeças, monstros de rabo de peixe, a borda do mundo? Adamastores haverá certamente, nalguma esquina do espaço, perto de nós. Riquezas também. Saberes, muitos.
 


AGIR COMO MILITANTES, RECEBER COMO PROFISSIONAIS

(Nota breve: tudo o que se diz abaixo aplica-se ao PSD e ao PS.)

O texto do Público de hoje, assim como uma reportagem da Sábado sobre as “agências de comunicação”, são leitura obrigatória para perceber a linha para onde hoje o poder se recolhe, para fugir à falsa transparência do escrutínio em tempo real. Tenho repetido à saciedade que existe um efeito de Big Brother nas políticas em democracia: tudo o que é importante não se vê, ao mesmo tempo que as pessoas têm a ilusão que sabem de tudo, em directo e a cores. O que é importante está do lado de trás da câmara ( a célebre “produção" do Big Brother, os vidros negros e os espelhos que ocultavam as filmagens) ao mesmo tempo que as personagens estão a nu para o “voto” dos “portugueses”. Falsa transparência, real obscuridade.

Uma parte do mundo de “negócios” que circula ao lado e dentro dos partidos é constituída por empresas que vivem das encomendas dos partidos (nas campanhas eleitorais) e dos governos. Muitas dessas empresas são formadas por antigos militantes e, nalguns casos, funcionários partidários, que começaram por prestar voluntariamente ou profissionalmente, dentro dos partidos, os serviços que agora vendem. São empresas de todo o tipo de dimensão, que existem a nível local, regional e nacional (neste caso quase só lisboeta), ligadas quer aos aparelhos dos partidos, quer das juventudes. Têm todas em comum serem constituídas por “pessoas de confiança” política, baseadas em amizades pessoais e políticas e conhecedoras dos mecanismos de decisão interna partidária. Fornecem tudo, desde serviços de tipografia, canetas made in China, construção de sites na Internet, “brindes”, marketing, “relações públicas” e “comunicação”. São uma das razões porque as campanhas eleitorais têm muita dificuldade em escapar aos modelos tradicionais, baseados em elevadíssimas despesas de propaganda, que são um excelente negócio que ninguém quer perder.

Nos partidos, há toda uma série de intermediários para este tipo de serviços e de “negócios” e existe uma competição entre os fornecedores de serviços, que passa também pelos conflitos internos dentro dos partidos. A promiscuidade é total e uma parte do que se chama habitualmente “aparelho” é exterior às estruturas partidárias. Como em todas as coisas há aqui diferenças significativas de dimensão e sofisticação entre as “encomendas” de uma campanha autárquica no interior e as “encomendas” nacionais, envolvendo fundos muito significativos. Aí o que está em jogo é muito importante, e as paradas são muito altas.

Com a sua obsessão pela propaganda, o marketing, a publicidade, e a “imagem” , o grupo à volta do actual Primeiro-ministro tem profundas relações com estes meios, com jornalistas, profissionais de “relações públicas” e de “comunicação”. Este é o outro lado complementar da tentativa directa de controlo da comunicação, ou seja, parte do mesmo processo. Em todos os sítios por onde passou, as despesas deste tipo elevaram-se exponencialmente, dando emprego e “negócios” a toda uma série de próximos que lhe manifestam, como é de esperar, fortes fidelidades pessoais e de grupo.

Acontece que este grupo não é constituído por necessariamente as mesmas pessoas e empresas que “já lá estavam” com os anteriores dirigentes do partido, portanto há toda uma partilha a fazer, com gente a ganhar e outra a perder. Isto ajuda a explicar o significado da denúncia do antigo director do Diário de Notícias, que levanta o véu sobre uma realidade política, insisto política, que até agora não tinha sido realmente escrutinada, porque está por detrás das paredes da casa do Big Brother.

(Continua)
 


EARLY MORNING BLOGS 354

Eros e Psique



... E assim vedes, meu Irmão,
que as verdades que nos foram
dadas no Grau de Neófito, e aquelas
que vos foram dadas no Grau de
Adepto Menor, são, ainda que opos-
tas, a mesma verdade.

DO RITUAL DO GRAU DE
MESTRE DO ÁTRIO NA ORDEM
TEMPLÁRIA DE PORTUGAL.

Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.

Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.

A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera.
Sonha em morte a sua vida.
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.

Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado.
Ele dela é ignorado.
Ela para ele é ninguém.

Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.

E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E, vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora.

E, ainda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.


(Fernando Pessoa)

*

Bom dia!

5.11.04
 


COISAS SIMPLES

 


EARLY MORNING BLOGS 353

silence...


silence

.is
a
looking

bird:the

turn
ing;edge,of
life

(inquiry before snow


(e.e. cummings)

*

Bom dia!

4.11.04
 


MAIS DO MESMO - TRÊS NOTAS SOBRE COMUNICAÇÃO SOCIAL



1.Sócrates disse que nunca passou pela cabeça de ninguém que a compra da Lusomundo pela PT poderia levar à instrumentalização dos órgãos de informação do grupo. Tretas. Passou, pelo menos, pela minha cabeça. Escrevi isto em Dezembro de 2000, imediatamente a seguir à operação:

"A compra da Lusomundo pela PT e a hipótese de se concretizar idêntica compra da Media Capital, junta na PT um dos grupos mais poderosos de comunicação social em Portugal. Com um mesmo dono ficarão entre outros o Diário de Notícias, o Jornal de Notícias, a TSF, portais do Internet e eventualmente a TVI, o Diário Económico, e vários outros jornais regionais e rádios. A justificação oficial dessa compra está na necessidade de unir "conteúdos" com plataformas de telecomunicações, uma tendência característica dos "negócios" na área estratégica da nova economia. Tudo isto parece idêntico ao que se passa nos outros países e o "negócio" fundamentado em tendências correntes da economia. Mas esta inocente análise, tão conveniente ao poder, esconde uma perigosa consequência para a qualidade da nossa democracia.
O que se passa na realidade é a re nacionalização da comunicação social em Portugal pelo estado, feita por um governo socialista que tem uma longa tradição de defender uma comunicação social do estado, e com idêntico historial de se opor à privatização. Nenhuma privatização de qualquer órgão de comunicação social do estado foi de iniciativa do PS, (…) Hoje tal desejo estatizante foi conseguido por detrás da capa dos novos "negócios" e será provavelmente esta a via que condicionará a evolução da RTP, que será parcialmente (e falsamente) "privatizada", colocando nas mãos disfarçadas do Governo, através das mãos descobertas dos gestores por ele escolhidos, decisões fundamentais para a liberdade de expressão e o debate contraditório em Portugal. Todo este processo está a desenvolver se no meio da habitual indiferença da opinião pública e incompreensíveis hesitações da oposição.
Alguns directores de órgãos de comunicação social do grupo Lusomundo, entenderam escrever editoriais ou dizerem que o "negócio" não impedia a liberdade editorial que eles próprios garantiam nos órgãos de comunicação. Não contesto a genuinidade das suas convicções de que assim seja, mas acho que, estão a ser pouco cautelosos e a desprevenir os seus leitores e ouvintes, e em geral os portugueses quanto às consequências do que se está a passar. De facto, como jornalistas, com responsabilidades de direcção, eles devem ser os primeiros a saber que justificar o que se passou como se fosse "apenas" um "bom negócio" nestes tempos de nova economia ilude o essencial: o papel do governo no "negócio" e a dependência do governo da PT através da chamada "golden share". Eles vieram garantir com grande ingenuidade, que nenhum comando político será possível, visto que as opções do "negócio" não terão reflexos editoriais e, que se tratava por parte da PT, apenas de comprar "conteúdos", para potenciar a sua plataforma de distribuição. A própria justificação deste "negócio", feita desta forma acrítica, é já preocupante.
O que se passa é que nesta aquisição da PT há questões políticas incontornáveis e que devem ser descritas com toda a clareza para se perceber bem: quem manda na PT é o governo, e dificilmente alguém imagina a decisão da compra da Lusomundo (e eventualmente de outras compras a haver) sem que tal passasse por uma decisão do governo. Tem sido política do tandem, Primeiro Ministro Guterres, Ministro Pina Moura, privatizar na aparência, e reforçar o controle do governo através de golden shares, do exercício da tutela e da nomeação de gestores de confiança política, e da interferência directa do governo em actos normais de gestão. Isto coloca a decisão da PT numa luz diversa da de um mero "negócio". A PT não é uma empresa privada qualquer é um instrumento "estratégico" do governo e do poder socialista e já não é de agora que é assim.
Dito com a brutalidade das grandes verdades, a cadeia de comando vai do Ministro Jorge Coelho, para o Presidente do Conselho de Administração Murteira Nabo e, quer um quer outro, não são pessoas vulgares mas socialistas com funções politizadas: o Ministro Coelho é o que se sabe e o Eng. Murteira Nabo só não foi ministro, pela razão que também se sabe. Com a golden share do estado, as decisões últimas sobre qualquer grande negócio da PT vão a Conselho de Ministros, formal ou informal, e é por isso que quando eles estão a mexer nos "conteúdos", mesmo que em nome dos "negócios", se possa suscitar necessariamente uma questão política séria de liberdade e pluralismo. E se não se suscita, então a coisa é ainda mais séria, porque se está a jogar ou no amorfismo ou, pior ainda, em obscuros compromissos de que muitas vezes a própria oposição não está isenta, em empresas geridas pelo método do "bloco central".
Na verdade, o que se está a passar é que sob a autoridade última do governo socialista, se encontra hoje o mais poderoso grupo da comunicação social existente em Portugal e a acrescer exponencialmente, somando se aos canais da televisão e da rádio pública eles também cada vez mais governamentalizados. Este grupo, que tem aliás todos os tiques de um monopólio de estado, agora possui "conteúdos". A palavra "conteúdos", é um eufemismo enganador, que também tem sido usado com uma displicência inadmissível pelos defensores do "negócio". Esses "conteúdos" são o jornal que nós lemos, a televisão que vemos, a rádio que ouvimos. Antes era jornalismo, agora é um "conteúdo".
Já ninguém é suficientemente ingénuo para pensar que a interferência do governo na comunicação social se faz por telefonemas directos dos ministros, embora ainda os haja. As formas são mais sofisticadas, uma das quais são as "reestruturações" em nome da eficácia dos "negócios" que condicionam carreiras, postos, compromissos e o destino de jornais e rádios. Também aí há alguém a premiar quem se porta bem e quem se porta mal e esse alguém está no governo, ou depende do governo."


A verdade é que na altura, PS, PSD, PP e PCP, e os jornalistas não ligaram nada ao que estava acontecer.

2. As declarações de Fernando Lima na AACS são das mais importantes lá proferidas, porque acrescentaram factos (sobre a sua demissão) e uma interpretação que chama a atenção para um aspecto que tem permanecido obscuro em todo este processo: o papel das empresas de comunicação e relações públicas, constituídas por jornalistas, e que competem entre si pelos negócios que a “central de informação”, muitos ministérios e gabinetes se preparam para fazer (ou já fizeram). É uma área obscura onde promiscuidades de todo o tipo abundam.

3. Os noticiários da TVI com Manuela Moura Guedes são um insuportável comício pessoal, ao melhor estilo do ressentimento de café e do populismo invejoso, a perfeita sobrevivência pública do estilo do PP de Monteiro-Portas, de que a locutora foi (e é?) membro. O mundo é simples: Manuela Moura Guedes é um poço de virtudes, e, a partir de um metro da sua figura, são todos ladrões, crápulas, corruptos e incompetentes.
 


APRENDENDO COM PHILIP ROTH

"You fight your superficiality, your shallowness, so as to try to come at people without unreal expectations, without an overload of bias or hope or arrogance, as untanklinke as you can be, sans cannon and machine guns and steel plating half a foot thick; you come at them unmenacingly on your own ten toes instead of tearing up the turf with your caterpillar treads, take them on with an open mind, as equals, man to man, as we used to say, and yet you never fail to get them wrong. You might as well have the brain of a tank. You get them wrong before you meet them, while you're anticipating meeting them; you get them wrong while you're with them; and then you go home to tell somebody else about the meeting and you get them all wrong again. Since the same generally goes for them with you, the whole thing is really a dazzling illusion empty of all perception, an astonishing farce of misperception. And yet what are we to do about this terribly significant business of other people, which gets bled of the significance we think it has and takes on instead a significance that is ludicrous, so ill-equipped are we all to envision one another's interior workings and invisible aims? Is everyone to go off and lock the door and sit secluded like the lonely writers do, in a soundproof cell, summoning people out of words and then proposing that these word people are closer to the real thing than the real people that we mangle with our ignorance every day? The fact remains that getting people right is not what living is all about anyway. It's getting them wrong that is living, getting them wrong and wrong and wrong and then, on careful reconsideration, getting them wrong again. That's how we know we're alive: we're wrong. Maybe the best thing would be to forget being right or wrong about people and just go along for the ride.
But if you can do that - well, lucky you.
"

(Philip Roth, American Pastoral)
 


COISAS SIMPLES


William Gillies
 


EARLY MORNING BLOGS 352

)when what hugs stopping earth than silent is... (16)


)when what hugs stopping earth than silent is
more silent than more than much more is or
total sun oceaning than any this
tear jumping from each most least eye of star

and without was if minus and shall be
immeasurable happenless unnow
shuts more than open could that every tree
or than all life more death begins to grow

end's ending then these dolls of joy and grief
these recent memories of future dream
these perhaps who have lost their shadows if
which did not do the losing spectres mime

until out of merely not nothing comes
only one snowflake(and we speak our names


(e.e. cummings)

*

Bom dia!

2.11.04
 


DO DIÁRIO DE NOTÍCIAS PARA OS BLOGUES

José António Barreiros iniciou hoje A Revolta das Palavras.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: QUANDO NÓS SOMOS OS OUTROS 3

"A propósito das entradas recentes "Quando nós somos os outros", é curioso observar como os discursos orientalistas se constituiram tantas vezes como uma espécie de galeria de espelhos, onde, munidos de toda a espécie de essencializações culturais, procuramos e encontramos imagens distorcidas de nós próprios e dos "outros". E os "outros", por seu turno, fazem o mesmo... O orientalista - e o ocidentalista - um eterno Narciso ? Ou estaremos antes perante um encontro de Narcisos? Discutível, sem dúvida, mas Ernest Fenollosa parece não ter tido grandes dúvidas quando, em 1892, escreveu os versos:


Let us forget like a chanted tune
Shadowy types of the dying races.
History nods to her ancient rune.
Ages lapse with their tidal traces,
Blend in the vision of future faces.

Fold like the wing of a new-born creature,
East and West in a Janus trance!
Tear off the mask of the twofold feature;
Kiss in the mirror with eyes askance,
Love, Narcissus, thine own sweet glance.



Ernest Fenollosa, East and West (Upper Saddle River, N.J.: Literature House, 1970)"

(Daniela Kato)
 


PORQUE É QUE O DIÁRIO DE NOTÍCIAS TEM UM PROBLEMA DE CREDIBILIDADE?

Por coisas como estas. Acabou esta semana de colaborar no jornal José António Barreiros escrevendo isto:
"Circunstâncias de alinhamento gráfico fazem com que eu compartilhe esta página com dois membros da Administração deste jornal.

Ambos convergiram numa decisão: afastar o director. Um deles anunciou-o ao País através de uma televisão, da qual é comentador.

Entretanto, uma senhora que, afinal, eles já haviam convidado para ser a próxima directora, veio publicamente dizer que não existiam condições para fazer deste jornal um diário «de referência, isenção e aceitação pública. Chegadas as coisas a este ponto, compreendam os leitores que eu saia deste lugar.

É patente o que está actualmente em causa na comunicação social portuguesa: o domínio dos media pelo grande capital, a entente cordiale entre esse grande capital e o actual Governo.»

Desapareceu Barreiros, apareceu José Francisco Gandarez, que uma pesquisa no Google revela ser “advogado” da “Rui Gomes da Silva e Associados – Sociedade de Advogados”, e cujos artigos, de pura propaganda do governo, nenhum jornal que se tomasse a sério aceitaria. Não é pelo conteúdo - é perfeitamente legítimo ser a favor do governo; é por não terem qualquer qualidade como artigos de opinião e serem apenas propaganda. Completamente ineficaz, diga-se de passagem.
 


PARA QUE FIQUE CLARO

Se fosse americano, votaria Bush. Fica dito, até porque é muito possível que ganhe Kerry. Não vale a pena somar muitas explicações ao que tenho vindo a dizer nos últimos anos. Kerry trará confusão e hesitação numa política de guerra que não sobrevive sem determinação. No dia seguinte, os assassinos da Al Qaida e do Baas começarão a retirar as lições e a jogar tudo por tudo no terror. Bush trará excessos e erros, como no passado, mas manterá o rumo numa política que é a única que hoje defronta o terrorismo apocalíptico na sua essência.
 


COISAS COMPLICADAS: S. JORGE COMBATENDO O DRAGÃO


Albrecht Altdorfer
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: QUANDO NÓS SOMOS OS OUTROS 2

"Nós e os outros:
CHAPITRE XIV- De certaines choses diverses et extraordinaires qu'on ne peut réduire aux chapitres précédents.

1. Nous tenons la pierre à feu dans la main gauche et la frappons pour allumer de la main droite; eux font le contraire.
2. Nous montrons notre émotion devant la perte de nos biens ou l'incendie de notre maison; les Japonais semblent considérer tout cela avec beaucoup de légèreté.
13. Chez nous, hommes, femmes et enfants ont peur de la nuit; au Japon, au contraire, ni les grands ni les petits n'en ont la moindre crainte.
21. Nous mettons l'honneur dans les substantifs; les Japonais dans les verbes.
27. Pour nous, offrir plusieurs choses est un signe d'affection; au Japon, moins elles sont nombreuses, plus l'hommage est grand.
56. Par amitié, en Europe, nous offrons un bouquet de roses; les Japonais offrent seulement une rose ou um oeillet
58. Nous succombons souvent à la colère et ne dominons que rarement notre impatience; eux, de manière étrange, restent toujours en cela très modérés et réservés.
Traité de Luís Fróis, S.J. (1585) sur les contradictions de moeurs entre Européens et Japonais, Paris, Éditions Chandeigne, 1994, p.111"


(Ana da Palma)
 


A LER

Muito atentamente este artigo, porque o problema que Sarsfield Cabral levanta, o da “cartelização” do PSD, é nos nossos dias bem mais importante do que a pulsão psicótica pela popularidade, que lhe serve apenas de instrumento. Não é por acaso que Marcelo lembrou, há dias, o seu artigo antigo contra os partidos-cartel, publicado no Expresso. Aparentemente foi um estranho artigo para ser escrito por um dirigente partidário, mas cujas circunstâncias conheço bem, bem demais. Quando foi escrito, Marcelo sabia o tipo de pressões de dentro e de fora que estavam a ser feitas sobre o PSD, e as dificuldades que encontrou, numa altura em que o “mundo dos negócios” (um eufemismo) namorava Guterres e não admitia que, na oposição a este, fossem contestadas as suas amizades e acordos com o poder socialista. Como os “negócios” são pela sua natureza do “bloco central”, eles admitem tudo no plano da política, todas as alternâncias, menos a ruptura dos interesses instalados.

É também porque altos interesses se levantam e encontram fácil caminho na acefalia populista, que há uma enorme radicalização contra os opositores do actual governo, antes de tudo no PSD porque, como se vê, o PS aqui não faz oposição. Marcelo pagou o preço com a expulsão da TVI. Outros pagarão se falarem, porque vale tudo neste jogo, bem mais perigoso e a sério que tudo o resto. A comunicação social terá nesse jogo um papel central, daí as grandes manobras posicionais.
 


EARLY MORNING BLOGS 351

Tattoo


The light is like a spider.
It crawls over the water.
It crawls over the edges of the snow.
It crawls under your eyelids
And spreads its webs there--
Its two webs.

The webs of your eyes
Are fastened
To the flesh and bones of you
As to rafters or grass.

There are filaments of your eyes
On the surface of the water
And in the edges of the snow.


(Wallace Stevens)

*

Bom dia!
 


VER O DIA

Onde é que está o dia? Uma muralha de cinzento à minha frente, entrecortada por um loureiro, com a dignidade que têm os loureiros, em que cada folha brilha da humidade.

1.11.04
 


COISAS SIMPLES


Mário Augusto
 


APRENDENDO SOBRE A MENTIRA NUM POEMA DE PEG BOYERS

(O poema é longo, tirado do livro Hard Bread, e a voz ficcional é a de Natalia Ginzburg, a escritora italiana morta em 1991.)

Coat

At eleven I learned to lie.
Disobedience and its partner,
deception, became my constant companions.

How enormous then that first transgression,
against Father's command, a sin damning as Adam's:
walking to school alone.

We all lied, mother explained,
it was. . .necessario.
How else to survive

Father's rages,
his sweeping interdicts
and condemning opinions?

Oh sweet allegiance of lies:
siblings and mother bound
together in a cozy tie!

My brothers' lies
were manly,
obdurate, built to last.

Mother's were infirm little things,
infected from birth by her obstinate grace,
fated to die as soon as they hit the air.

But this lie, the lie about me, was sturdy,
knit, as it was, from the fiber of maternal love
and a wife's defiance.

Go ahead; it's right.
Walk alone. Grow up.
Each assurance a coercion, each coercion a shame.

The lie was a coat of mail
I'd don each day, threading my arms
through its leaden sleeves,

pulling its weight over my head,
steeling myself
for my father's wrath.

In it I was strong and getting stronger,
but tired, always tired.
Oh to rest, shuck the lie and confess!

Father forgive me, I knew not what I did!
At night I'd rehearse the lines
and pray for his cleansing fury.

In the morning I'd meet him in the hall,
already crabby in his gray lab coat,
barking his harsh observations

about my robe (pink: ridiculous)
about my face (vacant)
about my voice (inaudible).

Mother, how did we produce such an insect!

I was used to this.

Exasperated, he would stuff his red frizz into a beret,
hurl himself into his loden cape
and bolt out the gate--too rushed for truths.

Silenced again, I would resume my solitary mission,
lugging my books, wearing my lie to school
and back again, through the maze of city streets.

One day the mist briefly lifted and I saw
the winter sun pulsing silver and pale
through a hole in the sky--a quiet disk

hopeful as the moon.
A face emerged, white whiskers smiling,
familiar, professorial--an angel perhaps,

or a friend of the family--
here to guide me safely
across the river to school.

He took my bag and my arm,
allaying my fears with talk
calculated to soothe, flatter, amuse.

Gentile, cosí gentile.
Ever faithful, he met me at my gate
morning after sweet morning.

We chatted carelessly the whole way,
intimate as lovers,
never a snag

or worry to hold us up--
I, grateful and happy,
he gently leading the way.

My trust deepened daily with his purpose
and burrowed
in the snug darkness of short days

where the new lie took root.
From deep in the loam, the probing
stem pushed to the surface.

Meanwhile, the first lie grew light with practice.
And my coat assumed
the comfort of a uniform.

His purpose, obscured from the start by fear,
suppressed tenaciously
by innocence--canny innocence--

flared up in a question,
betraying an ignorance
both clear and obscene:

"Little Girl, would you touch me--here?"

Suddenly my hand, sweetly warming
in his flannel pocket, was pushed
to the hard, oozing center.

My hand recoiled.
But the ooze stuck.
In that minute my childhood ended.

I ran home as fast as my legs would carry me
to hide my shame in the place
where secrets were made and kept,

willful little liar, disobedient
sinner trying to find my way alone
through fog, through lies.

My life was filling up with secrets
and deceit's secretions,
loneliness and melancholy.

I hugged my coat tight against my body
so that the lies and I were one.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: QUANDO NÓS SOMOS OS OUTROS

"Em Londres , Encounters: The meeting of Asia and Europe, 1500-1800, no Victoria & Albert Museum até 5 de Dezembro

O link é este.

No International Herald Tribune de 30-31 Outubro pode ler-se, a propósito desta exposição:

" In the Far East, the search for exoticism took an outright turn toward the burlesque. In her essay "Visual Responses:Depicting Europeans in East Asia", Jackson quotes some lines written in 1639 by an anonymous Japanese wag:

A southern Barbarian trading vessel came to our shores. From this ship emerged an unnamable creature, somewhat similar in shape to a human creature but looking more like a long-nosed goblin

Japanese artists transcribed with alacrity this vision of long-nosed goblins. On a 17th century lacquer box, beaming Portuguese men with enormous noses and exaggeratedly baggy trousers smile vaguely , like clowns in a pantomine.
"

(João Costa)
 


SOBRE O PORTO - REPETIÇÕES

O Porto é a minha cidade "moral". Nem eu sei bem o que isso é, mas sei que é. Para complementar a "geografia", aqui ficam dois textos antigos sobre o Porto:

"O Porto não é a cidade dos anjos, nem a cidade da luz, nem a cidade branca. É feito de uma pedra onde todas as partes brilham - e no entanto é escura, sólida, tensa, pesada.

É feito de mica que é um pequeno espelho mineral, de quartzo que pode ser absolutamente transparente, ou de feldspato, de cor sedosa, vagamente rosa. Mas, a pedra do Porto, feita de tanta luz, é escura e a cidade é assim uma cidade do Norte, iluminada por essa luz que ninguém melhor do que os pintores dinamarqueses de Skagen conheciam. É na Foz do Douro que esta luz começa e depois sobe pelas colinas cobertas de casas, pelas ruelas, até onde termina a cidade novecentista, as avenidas que a transportam até uma periferia de onde partiam as "estradas". Para Amarante, para Guimarães, para Braga, para Entre-os-Rios, para um interior que está profundamente ligado com a cidade cujo nome diz que nunca ninguém a venceu.

O olhar do Porto é por isso um olhar grave como o granito. É um olhar que já vem de muito longe e foi sempre o mesmo. É um olhar burguês, dos que vivem e trabalham no burgo e que na cidade encontram um refúgio e as liberdades. As liberdades e não a democracia, porque o Porto é mais liberal do que democrata.

Este olhar burguês é contrário à dissipação, ao desperdício. É também por isso que no Porto nem os yuppies, nem as rapariguinhas do shopping esconderam as centenas de milhares de vidas de trabalho antigas que estão pregadas em todas as fachadas da cidade. Vidas de estivadores, de caldeireiros, de tipógrafos, de tabaqueiros, de carvoeiros, de comerciantes, de carrejonas, de merceeiros e marçanos, de alfaiates, de cobradores, de ourives, de criadas de servir, de taberneiros, de talhantes, de armazenistas. São estas vidas que fizeram o Porto e que olham por dentro do olhar das pessoas do Porto."


*

"O Porto fez-me gostar de uma qualidade sem grandes elogios nos dias de hoje e também sem grande reconhecimento social, por muita retórica que à sua volta se ouça, a integridade. Muita da vida pública portuguesa não seria o que é se houvesse um pouco mais de reconhecimento social da integridade. Se os íntegros não parecessem personalidades obstinadas, com mau feitio, “pouco maleáveis”, como agora se diz.

O Porto fez-me gostar das pessoas simples, integras, ainda não tocadas pela inutilidade das palavras, ainda não ecléticas, ainda não dominadas pelo amor-próprio destrutivo, ainda não obcecadas pelas suas virtudes e pela sua facilidade, ainda não acumulando superfícies como quem acha que a vida é um longo espelho, ainda não distraídas, ainda não impacientes, ainda querendo mais alguma coisa com uma tenacidade de absoluta dedicação. Como o Porto é feito de granito em vez de calcário, selecciona a dureza, a persistência, o trabalho, as boas contas, as “contas à moda do Porto”.

Nunca mostrei a minha cidade, mostrar de mostrar, a quem eu não ache integro."


*

"Diz Alexandre Dumas que "quando se mostra a um amigo uma cidade já conhecida, põe-se nisso a mesma presunção que se usa para mostrar uma mulher de quem se foi amante."

Mas foi por partilhar consigo essa cidade “moral” e não por ociosa prova de erudição – que não tenho! – a espontaneidade do comentário. Talvez a inflexibilidade do granito, que ao Porto enobrece frontarias, tenha limitado o inchar dos egos balofos e que de si próprios, ou de quem lhes é útil, se alimentam. E depois, quem sabe, talvez o brilho da mica que reluz na mancha cinzenta granítica seja o reduto da autenticidade a fazer mais que diferença."

(Tati)
 


A MINHA GEOGRAFIA


(Original em Avenida dos Aliados)

Vista do céu, a minha mais próxima geografia (vê-se mal, mas eu vejo-a totalmente, pouco importa, estão lá as casas e os sítios):

Biblioteca Pública Municipal do Porto em S. Lázaro, o segundo sítio onde me fiz.

Largo do Padrão e café do Padrão, onde me preparava para ir para a Biblioteca.

Jardim de S. Lázaro, um jardim romântico único, com as suas grades fechadas, as estátuas e as grandes árvores.

Café S. Lázaro.

Escola Superior de Belas-Artes.

A casa do Eugénio no andar de cima, a da Rosa no andar de baixo.

Nos limites da fotografia, o Campo 24 de Agosto, o Liceu Alexandre Herculano, a sede da PIDE no Porto, as Fontaínhas, o lugar do antigo edíficio da fábrica de tabacos, a Rua Santos Pousada, a loja do alfarrabista Marinho, a minha casa.
 


AR PURO


N. Astrup
 


EARLY MORNING BLOGS 350

And You Thought You Were the Only One


Someone waits at my door. Because he is
dead he has time but I have my secrets--

this is what separates us from the dead.
See, I could order take-out or climb down

the fire escape, so it's not as though he
is keeping me from anything I need.

While this may sound like something I made up,
it is not; I have forgotten how to

lie, despite all my capable teachers.
Lies are, in this way, I think, like music

and all is the same without them as with.
The fluid sky retains regret, then bursts.

He is still there, standing in the hall, insisting
he is someone I once knew and wanted,

come laden with gifts he cannot return.
If I open the door he'll flash and fade

like heat lightning behind a bank of clouds
one summer night at the edge of the world.


(Mark Bibbins)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES; O SERVIÇO PÚBLICO VISTO DO REINO UNIDO

"(...) No Reino Unido, o serviço público está a sofrer uma revisão. Ao longo deste ano, a agência das comunicações OFCOM realiza vários processos de consulta com académicos, a indústria, os profissionais, organizações várias e, muito importante, o público. Estive na semana passada numa dessas sessões, divulgadas e abertas a qualquer um, onde todos são encorajados a colocar questões, enviar pareceres e fazer com que os seus interesses sejam ouvidos. A prova de que o serviço público funciona e satisfaz foi expressa pela maioria da população britânica inquirida pela OFCOM, que revelou estar disposta a pagar o mesmo ou um pouco mais para manter a BBC e outras derivações de serviço público (a presente taxa de rádio e televisão custa cerca de 170 euros por ano e é obrigatória).

Na mesma sessão, um senhor que tinha garantidamente mais de oitenta anos – “eu lembro-me de ouvir a minha primeira emissão de rádio da BBC, em 1924” – fez ouvir a sua voz. O facto de o serviço público ter uma história longa e respeitada por aqui, faz com que os britânicos tenham um sentimento de pertença relativamente aos destinos dos seus espaços mediados de comunicação.

No ano passado, a BBC Scotland fez uma revisão da sua grelha informativa. Para isso, o director da estação regional passou dois meses a viajar pelo país para melhor sondar as necessidades informativas do escoceses. Isso implicou passar pelos sítios mais remotos – as ilhas do norte, as highlands, as comunidades urbanas e rurais – e promover debates locais. Isto é serviço público. Não é complicado, nem elitista, nem pretencioso. É apenas o garante de um espaço que se procura aproximar de um nível equilibrado e representativo do debate público, onde a audiência não é reduzida ao lugar de consumidor mas também tratada como um centro de cidadania. O espaço audiovisual português deteriorou-se a uma velocidade galopamente. Os governos que recusam conduzir um debate sério sobre o assunto estão a negar aos portugueses o seu desenvolvimento democrático."


(Claudia Monteiro)
 


WILLIAM HAMILTON E DUGALD STEWART VISTOS POR WILLIAM JAMES

(Ambos citados no poema de Edgar Lee Masters da Spoon River Anthology de hoje de manhã. James começa assim as conferências que deram origem à The Varieties Of Religious Experience - A Study In Human Nature :)

"IT is with no small amount of trepidation that I take my place behind this desk, and face this learned audience. To us Americans, the experience of receiving instruction from the living voice, as well as from the books, of European scholars, is very familiar. At my own University of Harvard, not a winter passes without its harvest, large or small, of lectures from Scottish, English, French, or German representatives of the science or literature of their respective countries whom we have either induced to cross the ocean to address us, or captured on the wing as they were visiting our land. It seems the natural thing for us to listen whilst the Europeans talk. The contrary habit, of talking whilst the Europeans listen, we have not yet acquired; and in him who first makes the adventure it begets a certain sense of apology being due for so presumptuous an act. Particularly must this be the case on a soil as sacred to the American imagination as that of Edinburgh. The glories of the philosophic chair of this university were deeply impressed on my imagination in boyhood. Professor Fraser's Essays in Philosophy, then just published, was the first philosophic book I ever looked into, and I well remember the awe-struck feeling I received from the account of Sir William Hamilton's class-room therein contained. Hamilton's own lectures were the first philosophic writings I ever forced myself to study, and after that I was immersed in Dugald Stewart and Thomas Brown. Such juvenile emotions of reverence never get outgrown; and I confess that to find my humble self promoted from my native wilderness to be actually for the time an official here, and transmuted into a colleague of these illustrious names, carries with it a sense of dreamland quite as much as of reality."
 


DIA DOS MORTOS / SCRITTI VENETI

Na ilha de San Michele há um pequeno convento franciscano. É uma obra histórica da arquitectura renascentista, com a primeira fachada neo-clássica, um edifício belíssimo, com a porta voltada para a laguna, com as ondas a tocarem os degraus num embarcadouro de mármore. Ao lado uma lápide lembra outro habitante dos Piombi, Sílvio Pellico , o das “minhas prisões”. Um dos habitantes do convento, Fra Luciano Neri, viveu toda a sua vida no cemitério, tornou-se “il frate del cimiterio”. Uma humilde brochura que não deve existir em nenhum sítio senão aqui, pousada a um canto da igreja com uma caixa de esmolas ao lado, lembra-o, num testemunho de uma vida entre os mortos por dedicação aos vivos. Na capa, uma fotografia de um velho com um sorriso bondoso mas relutante, com uma reserva que se pode reconhecer na sua mais antiga fotografia, um jovem frade diante da Madonnina dell”orto. Um dos capítulos fala da “sapenza della semplicitá”, noutro, o cardeal patriarca escreve: “Nel paradiso possa continuar ela sua opera, che era grande dono per chi cercava uno sprazzo di speranza.” A sua campa está lá, a foto a esmalte e um rosário, e as datas dos seus quase noventa anos de vida (1909-1998).

© José Pacheco Pereira
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