ABRUPTO

31.8.04
 


APRENDENDO COM O PADRE ANTÓNIO VIEIRA: "SE PERGUNTA A SABEDORIA DIVINA, PORQUE NÃO PERGUNTARÁ A IGNORÂNCIA HUMANA?"

"Vos autem quem me esse dicitis?" (S. Mateus, XVI.)

"Mui seguro está do seu valor quem tira a sua opinião ao campo. E se é temeridade tomar-se com muitos, com todo o mundo se tomou quem desafiou sua fama. Na ocasião de que fala S. Mateus (cujo é o Evangelho que hoje nos propõe a Igreja) diz que perguntou Cristo, Senhor nosso, que diziam dele os homens: "Quem dicunt homines esse Filium hominis?"

Perguntou o Senhor, para que os senhores que mandam o Mundo se não desprezem de perguntar. Se pergunta a sabedoria divina, porque não perguntará a ignorância humana? Mas esse é o maior argumento de ser ignorância. Quem não pergunta, não quer saber; quem não quer saber, quer errar. Há porém ignorantes tão altivos, que se desprezam de perguntar, ou porque presumem que tudo sabem, ou porque se não presuma que lhes falta alguma cousa por saber. Deus guie a nau onde estes forem os pilotos.

Não perguntou o Senhor o que era, senão o que se dizia: "Quem dicunt?" Antes de se fazerem as cousas, há-se de temer o que dirão; depois de feitas, há-se de examinar o que dizem. Uma cousa é o acerto, outra o aplauso. A boa opinião de que tanto depende o bom governo, não se forma do que é, senão do que se cuida; e tanto se devem observar as obras próprias, como respeitar os pensamentos e línguas alheias. A providência com que Deus permite a murmuração, é porque talvez de tão má raiz se colhe o fruto da emenda. E se eu de murmurado me posso fazer aplaudido, porque me não informarei do que se diz?"

 



Monet
 


EARLY MORNING BLOGS 298

Memory


My mind lets go a thousand things,
Like dates of wars and deaths of kings,
And yet recalls the very hour--
'Twas noon by yonder village tower,
And on the last blue noon in May--
The wind came briskly up this way,
Crisping the brook beside the road;
Then, pausing here, set down its load
Of pine-scents, and shook listlessly
Two petals from that wild-rose tree.


(Thomas Bailey Aldrich)

*

Bom dia!

30.8.04
 


PRIMEIRO NOS SELOS, DEPOIS NOS LIVROS



Os coleccionadores de selos são uma forma especial de doidos mansos, em particular os que, contrariamente a todas as recomendações, coleccionam tudo. Sobre o Oceano Pacífico alemão, aprendi com os selos coloniais alemães, antes de reencontrar o “Grosse Stiller Ozean”no Corto Maltese da Balada do Mar Salgado.


Sobre as batalhas desesperadas dos exércitos e guerrilhas, deixados perdidos no extremo oriente pela derrota alemã e pela revolução bolchevique, conhecia-as da selva dos selos russos dos anos 1918-1924, antes de ler a história em Hopkirk, num magnifico livro onde também andam personagens que Hugo Pratt usou para o Corto Maltese.
 


ESPELHO UM DO OUTRO

Que os radicais “fracturantes” das organizações do Bloco de Esquerda trouxessem cá o barco para organizarem uma operação de propaganda usando a “causa” do aborto, vá que não vá, estão no seu papel. (Dois caveat. O primeiro é que se violarem a lei devem sofrer as consequências, tanto mais que se trata de uma iniciativa claramente política, não um trágico aborto às escondidas em estado de necessidade de uma infeliz mulher. Não é a mesma coisa. Numa democracia é assim, mesmo quando não se concorda com a lei. O segundo é que, ao transformar a questão do aborto numa guerrilha radical, fazem estragos consideráveis no esforço moderado e necessário para acabar com a criminalização do aborto. Convém não esquecer que, seja qual for a evolução da situação, deverá haver um referendo, e no referendo os excessos pagam-se.)

Agora que o governo português resolva actuar como um espelho do Bloco, como um grupo radical de sentido contrário, com todos os tiques do radicalismo ideológico, com a agravante de abusar dos meios do Estado, é que coloca uma questão muito mais grave do que o folclore do barco. Se o barco foi uma provocação, este governo respondeu-lhe ao mesmo nível.
 


UMA PERIGOSA ESTUPIDEZ

As revistas feitas pela Polícia Marítima a um barco português só se justificam caso haja séria suspeita de que este esteja envolvido numa actividade criminosa. Não se fazem revistas a um barco (ou a um carro, ou seja lá o que for) para intimidar as pessoas que lá vão. As forças armadas portuguesas não podem ser usadas para acções de intimidação contra cidadãos que não estão a violar nenhuma lei, mesmo que não se concorde com as suas acções e opiniões. As forças armadas portuguesas não podem ser usadas para servir de cobertura a encenações políticas. O Presidente da República é posto directamente em causa se não fizer ou disser nada.
 


UMA CARA ESTUPIDEZ

Mas que cara estupidez é essa de ter dois barcos de guerra a controlar um pequeno barco, só para fazer figura? Não estou aqui a discutir a decisão de impedir o barco de atracar, que é uma outra questão. Só pergunto se não há outros meios mais baratos e discretos de controlar um barco nas águas internacionais. É que este espavento, (caro, insisto), é uma marca de água do ocupante da Defesa, que envergonha os militares sob sua alçada. Show off.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: UMA PERGUNTA

"Gostaria de fazer uma pergunta relativa ao «barco do aborto»: o que se passaria se o «barco do aborto» fosse o «barco da excisão feminina»?"

(José Carlos Santos)

*

"A técnica de discussão de arrastar para o campo oposto ideias ou situações indefensáveis é velha e funciona bem. São no entanto situações incomparáveis, que se saiba as mulheres que desejem, proceder a uma interrupção voluntária da gravidez não vão ser arrastadas à força para a embarcação da Woman on Waves. Já no caso da excisão feminina não sei se seria esse o caso."

(João Figueiredo)


 


A LER E A VER

todos os Jogos Olímpicos no bomba inteligente. (Este nome encanita-me, como diz o Vasco PV).

Claro que há perfeição. Os gregos descobriram-na há quase três mil anos. Ao mesmo tempo descobriram a imperfeição.
 


SOBRE A MINHA INVICTA TERRA

o Avenida dos Aliados.

De que roubo a fotografia da ponte D. Maria abandonada.

Quantas vezes a atravessei de comboio, vendo o medo dos lisboetas que acreditavam numa lenda urbana , a de que a ponte estava para cair? Muitas e algumas a pé. Faltava-se às aulas no Alexandre Herculano, um pouco lá para trás, e das Fontainhas passava-se por aquele sinistro colégio e depois pela escarpa abaixo passando as linhas-férreas e atravessando os túneis, sempre a olhar para as reentrâncias cavadas na rocha, não viesse um comboio. Era uma verdadeira aventura porque, quando chovia, a água que se infiltrava nos túneis escorria do tecto, misturada com a fuligem do carvão das máquinas e sujava a roupa, indício seguro de asneira. Depois passava-se por uma cerca de arame, meia derrubada e chegava-se ao tabuleiro. Então corria-se para atravessar a ponte, não fosse aparecer um comboio num dos lados. A ponte era de via única e havia um “testemunho” que os maquinistas recebiam nas Devezas e entregavam em Campanhã. Sem “testemunho” não se podia atravessar a ponte. Correr na ponte era perigoso porque a ponte era exclusivamente ferroviária e não era suposto ser atravessada por peões. O pequeno passeio lateral para manutenção era coberto por tábuas pequenas, muitas das quais já tinham desaparecido ou estavam partidas e podres e pelos buracos via-se o Douro a correr lá muito abaixo. Muito abaixo. Depois chegava-se ao lado de Gaia e era voltar pelo mesmo caminho. Não se esquece.


*

"Mais interessante ainda era estar no pequeno passeio lateral quando de facto o comboio passava! Não se imagina, indo lá dentro, o que a ponte abana cá fora. Só me aventurei uma vez... Se já metia medo só de olhar lá para baixo sem nada a passar, quando a máquina avançava lentamente parecia que a trepidação nos ia inevitavelmente projectar para o Douro. Agarrei-me ao ferro da ponte e decidi rapidamente que haveria de certeza outros locais muito interessantes para fotografar noutro lado qualquer..."

(Tiago Azevedo Fernandes)

*

"Recordo os momentos mais próximos que tive com o meu Pai. Sair de casa (do lado de Gaia), procurar a entrada para a ponte algures nos terrenos adjacentes ao campo de tiro do regimento de artilharia da Serra do Pilar, e lançarmo-nos á aventura! De tantos em tantos metros (pareciam-me muitos, era bem pequeno), havia refúgios, que permitiam ficar protegido do efeito de sucção do comboio. A ponte vibrava, mas sentia-se maior protecção... Inexistente, todavia, a sucção, porque os comboios reduziam a sua velocidade a 30 ou 40 km, já não me lembro bem. Depois, chegar a campanhã, apanhar o autocarro de volta ao centro, e o 'trólei' de volta para Gaia, já em segurança, na ponte D. Luís. E lembro-me, claro da viagem de despedida: vindo de Lisboa, propositadamente saímos em Campanhã, para espreitar da janela o rio e sentir a vertigem que tanto assustava os viajantes do resto do País.

As pontes do Porto têm um brilho especial. E disto fazem parte também os túneis para S.Bento e para a Alfândega. Há tempos li um projecto de reaproveitamento deste circuito. Porquê ser megalómano? Mais fácil seria abrir a ponte para percursos pedestres... aliás, é desta ponte que se tem a mais bonita vista doPorto: a Escarpa de Gaia, as Fontanhias, o colégio. E olhando para o outro lado, ver (será que ainda se vê?), o Monte Castro, o Areinho, o Palácio do Freixo.

Memórias doces... Mas aqui fica a sugestão! Em vez de comboios antigos, porque não, pura e simplesmente, abrir a ponte á travessia de pessoas?"

(Daniel Rodrigues)
 


AR PURO: VEM OUTONO


Isaak Levitan

*

"Não fora uns ramos de um abeto no lado esquerdo do quadro, e eu diria que Levitan se tinha sentado ali na "alverca", na estrada entre a Golegã e a Azinhaga, e tinha decidido pintar um cenário que me é bem familiar. Uma das coisas boas da vida é ter memória e memórias. Li aqui há tempos alguém que dizia que somos só memória. O que faz imenso sentido. Tudo o que somos já foi, acabou de ser. Não se trata de nostalgias ou saudades. É termos uma história. É vida. Não é querer voltar a viver o que já se viveu ou querer voltar para trás, nem sequer é usar as memórias para ocupar o presente. É sermos o que somos, com o que já fomos.

Venha o Outono! (Com Inverno, Primavera e Verão já incorporados…)
"

(RM)
 


EARLY MORNING BLOGS 297

ROMANCE DEL JURAMENTO QUE TOMÓ EL CID AL REY DON ALONSO

En santa Gadea de Burgos, do juran los hijosdalgo,
allí le toma la jura el Cid al rey castellano.

Las juras eran tan fuertes que al buen rey ponen espanto;
sobre un cerrojo de hierro y una ballesta de palo:

—Villanos te maten, Alonso, villanos, que no hidalgos,
de las Asturias de Oviedo, que no sean Castellanos;
mátente con aguijadas, no con lanzas ni con dardos;
con cuchillos cachicuernos, no con puñales dorados;
abarcas traigan calzadas, que no zapatos con lazo;
capas traigan aguaderas, no de contray ni frisado;
con camisones de estopa, no de holanda ni labrados;
caballeros vengan en burras, que no en mulas ni en caballos;
frenos traigan de cordel, que no cueros fogueados.
Mátente por las aradas, que no en villas ni en poblado;
sáquente el corazón por el siniestro costado;
si no dijeres la verdad de lo que te fuere preguntando,
si fuiste ni consentiste en la muerte de tu hermano.—

Jurado había el rey que en tal nunca se ha hallado,
pero allí hablara el rey malamente y enojado:
—Muy mal me conjuras, Cid, Cid, muy mal me has conjurado;
mas hoy me tomas la jura, mañana me besarás la mano.
—Por besar mano de rey no me tengo por honrado,
porque la besó mi padre me tengo por afrentado.
—Vete de mis tierras, Cid, mal caballero probado,
y no vengas más a ellas dende este día en un año.
—Pláceme, dijo el buen Cid, pláceme, dijo, de grado,
tú me destierras por uno, yo me destierro por cuatro.—

Ya se parte el buen Cid, sin al rey besar la mano,
con trescientos caballeros, todos eran hijosdalgo,
todos son hombres mancebos, ninguno no había cano;
todos llevan lanza en puño y el hierro acicalado,
y llevan sendas adargas, con borlas de colorado;
mas no le faltó al buen Cid adonde asentar su campo.


(Anónimo)

*

Bom dia!
 


A LUA

de novo. O ar tem a humidade do Outono, a melhor das estações. A caminho.

29.8.04
   


A VER E A LER

o Companhia de Moçambique e o Ma-Schamba que estão a publicar um album de fotografias de Moçambique, feito pelo comerciante José dos Santos Rufino, nos anos vinte. Os textos da Companhia de Moçambique são um muito interessante retrato da nossa história colonial e das pessoas que a fizeram.
 



G. H. Davis, Closing Up
 


EARLY MORNING BLOGS 296

Artificial Horizon


Thirty-five hundred feet above the earth, I said goodbye
to the heartland with its musk of animals and alfalfa,

to the Coralville Reservoir and its wounded
peregrine falcon with the dusky blue feathers,

to the lattice of pastures interlaced like Celtic spirals,
full of pink-snouted spotted pigs and overflowing corncribs,

to the cemetery with its black angel and tombstones
engraved with contemporary memento mori--

Garfield the cat, a pack of Marlboros, a Corvette--
instead of death's heads and winged cherubs.

We flew farther--saw the golden dome of the Maharishi
levitating and the barges on the Mississippi marking twain.

And hard by my hip, my pilot star, your long fingers
controlled the ailerons, practicing skid and slip,

Touch and go, bank and stall, keeping a steady hand
as we flew beyond the bounds of the artificial horizon.


(Sue Standing )

*

Bom dia!
 


VER A NOITE

Hoje a Lua cumpriu o seu dever. De manhã muito cedo, os amadores da "early morning", podem, nos próximos meses, ver as "luzes do Zodíaco", um falso nascer do Sol resultado da poeira dos céus. Mas primeiro esperem que a Lua encolha de novo.

28.8.04
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: BONS CONSELHOS

"A propósito de Esposa e Mãe, escolho Conselhos a uma Noiva da Condessa de Vinhó e Almeida. (Começa por explicar que "estes despretenciosos Conselhos a uma Noiva" se destinavam a uma "sua sobrinha muito querida a ela confiada desde pequenina" a quem os deu como presente de casamento.) Mando-te este conselho que não tem nada a ver com casamentos, noivas, crianças ou coisa próxima:
"Para subir com dignidade na sociedade é preciso sobretudo saber esperar, e ás vezes recusar. Aceitar cargos e honrarias extemporaneas, ocupar lugares para os quais não estamos aptos, não é avançar, é recuar. Tudo se quer a seu tempo e ganho com manifestas provas de capacidade. O que perdeu Portugal foi todos os politicos se julgarem indignos d'outra posição que não fosse a de presidente de conselho."
Disse isto, a boa Senhora, em 1927. Perguntarás e bem: porquê dar tão bizarro conselho a uma noiva?"

(R.)
 


OUVINDO HOROWITZ EM MOSCOVO

Este é um dos discos em que, se não fosse gravado ao vivo, se perdia metade da força. O concerto, em 1986, foi um daqueles momentos de emoção única na história da música ao vivo e uma bofetada na tragédia cultural e histórica do comunismo soviético. Horowitz, que deixara a sua Ucrânia em 1925 para o exílio, aparecia agora anunciado num único cartaz que dizia “Recital de piano de Vladimir Horowitz (USA)” nas paredes do Conservatório de Moscovo. Bastou para se fazerem filas pela noite dentro. O Conservatório de Moscovo é uma casa muito especial e quem teve a sorte de assistir a concertos na sua sala nobre (eu tive-a várias vezes) sabe que o que se respira lá está na essência do que é a cultura ocidental: um público de amadores, no melhor sentido da palavra, um público intenso e entusiasta, de gente que sabe o que ouve e gosta da música. Ponto. É esse público que perturba neste disco, tanto quanto as interpretações sem paralelo de Horowitz. O pianista começa com Scarlatti e Mozart, e o público bate palmas. Mas a coisa começa a aquecer quando Horowitz se transcende em dificuldade e beleza com Scriabin, Liszt , Schumann, Moszkowski e Rachmaninov e, a cada momento, na exacta altura em que ainda soa no ar o último som do último acorde, a assistência rompe num imediato “bravo” , num italiano “bravo”, de pura emoção.

 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: AS VOLTAS QUE TENHO QUE DAR



nesta cratera, para não perder o pé. Mas chego lá.
 


COMO IDENTIFICAR A MÃO DA CENTRAL DE INFORMAÇÕES NAS NOTÍCIAS


Dürer

1- Exemplos de sugestio falsi (de férias que não são férias mas sim trabalho. Onde? Na piscina? Na praia?) :

"O primeiro-ministro está em Espanha, nas Ilhas Baleares, onde irá gozar três dias de férias, disse fonte do gabinete de Pedro Santana Lopes. Segundo a mesma fonte, o primeiro-ministro irá aproveitar a deslocação às Baleares para se encontrar com empresários espanhóis. Santana Lopes deverá ainda encontrar-se com o ex-comissário Europeu e ex-ministro dos Negócios Estrangeiros espanhol Abel Matutes, que também se encontra nas Baleares, adiantou a fonte. O primeiro-ministro deverá regressar a Portugal na quinta- feira." (Lusa)

2 - Sugestio falsi (de força onde há fraqueza) e omissio veri (sobre os motivos):

"Com a França e a Alemanha a prepararem-se para violar o défice pelo quarto ano consecutivo, o Governo aposta que 2005 será o ano da flexibilização das regras de disciplina orçamental dos países da zona euro.E com José Manuel Barroso a chefiar a Comissão Europeia prevê-se que seja dada maior atenção à dívida pública em detrimento do «estúpido» limite dos 3% do PIB para o défice, como o apelidou Romano Prodi, o seu antecessor em Bruxelas.
Este empenho súbito de Portugal na revisão do PEC vem ao encontro de uma reivindicação antiga da esquerda. Mas o objectivo não é fazer a vontade à oposição. A questão é que o próximo Orçamento de Estado (OE), decisivo para o ciclo eleitoral que se inicia, dificilmente conseguirá encaixar um défice abaixo dos 3% do PIB." (Expresso, hoje)

Os recados estão a vermelho.
 


O PROBLEMA É QUE É MESMO ASSIM

Como diz o Ruben de Carvalho em a “A verdade de nada” no Diário de Notícias.

Ou Rui Tavares em Um livro, um amigo no Barnabé, tornado mais ridículo pela legenda sobre a «a leitura em dia sentado num dos recantos mais apreciados por Salazar». Há coisas em que nada há de mais contraproducente do que a política do "parecê-lo".

Ou no Expresso (que não tem ligações em linha) que continua a revelar, através das suas “fontes” na "central", aquilo que está em curso desde a tomada de posse do governo: a preparação psicológica para o aumento do défice. Já se está na fase de passar da preparação psicológica (o aumento do défice é “inevitável” como a chuva) para a preparação política.
 


EARLY MORNING BLOGS 295

Fonte frida


Fonte frida, fonte frida
fonte frida y con amor,
do todas las avecicas
van tomar consolación,
sino es la tortolica,
que está viuda y con dolor.
Por ahí fuera a pasar
el traidor del ruiseñor;
las palabras que le dice
llenas son de traición:
«Si tú quisieses, señora,
yo sería tu servidor.»
«Vete de ahí, enemigo,
malo, falso, engañador,
que ni poso en ramo verde
ni en ramo que tenga flor,
que si el agua hallo clara
turbia la bebiera yo;
que no quiero haber marido
porque hijos no haya, no;
no quiero placer con ellos
ni menos consolación.
¡Déjame triste, enemigo,
malo, falso, mal traidor;
que no quiero ser tu amiga
ni casar contigo, no!»


(Romance anónimo)

*

Bom dia!

27.8.04
 


INTENDÊNCIA

Actualizadas, com comentários de leitores, as notas: PROVÉRBIOS DE GRANDE ACTUALIDADE SOBRE O PRINCÍPIO DE PETER e AR PURO

 


VALE A PENA ACOMPANHAR

o Casa em Construção . Para além do mérito deste “(quase) diário em Timor Leste(…)Histórias de uma viagem a Dili como médico voluntário da AMI”, a última nota que li é uma sensata observação sobre o barco das "Women on Waves", concluindo com esta evidência que salta aos olhos: “Em apenas duas semanas, o trabalho dos grupos pró-aborto mais moderados estará (se não destruido) seriamente dificultado.
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: TÃO PERTO E TÃO LONGE (LAMENTO DA “OPPORTUNITY”)



Aqui estou eu, tão perto e tão longe. Queria ir ver aquelas duninhas (será que eu escrevi isto, duninhas? Existe?), e não me deixam. Dizem do JPL que não se anda em terreno que não se conhece, que falta rocha para eu por os pés, que as areias podem ser traiçoeiras, que há ir e voltar e aqui pode-se não voltar, que sou muito preciosa para ser perdida por curiosidade, só por interesse. Seja. Manda quem pode, obedece quem deve. Eu digo-lhes à noite, não me chame eu “oportunidade”, quando ninguém me vê e eles estão distraídos com o “Espírito”…
 


EARLY MORNING BLOGS 294

The Daffodils


I wandered lonely as a cloud
That floats on high o'er vales and hills,
When all at once I saw a crowd,
A host, of golden daffodils;
Beside the lake, beneath the trees,
Fluttering and dancing in the breeze.

Continuous as the stars that shine
And twinkle on the Milky Way,
They stretched in never-ending line
Along the margin of a bay:
Ten thousand saw I at a glance,
Tossing their heads in sprightly dance.

The waves beside them danced, but they
Out-did the sparkling waves in glee:
A Poet could not but be gay,
In such a jocund company:
I gazed--and gazed--but little thought
What wealth the show to me had brought:

For oft, when on my couch I lie
In vacant or in pensive mood,
They flash upon that inward eye
Which is the bliss of solitude;
And then my heart with pleasure fills,
And dances with the daffodils.


(William Wordsworth )

*

Bom dia!



26.8.04
 


BIBLIOFILIA

Numa gaveta esquecida, numa cómoda abandonada, numa casa familiar que já ninguém habita, havia um monte de lixo, de papéis velhos. Tinha-os metido num caixote para ver o que era, numa altura em que houvesse sol e vento. O pó era tanto que era difícil abrir o caixote dentro de uma casa. De lá, sai o tempo, como é costume. Os amadores de papel velho sabem muito bem como é. Restos, restos de vidas. Aqui estão três desses marcadores do tempo.









Um é um manual sobre o automóvel, de autoria de João Almeida e Vasconcelos, da velha Livraria Simões Lopes do Porto. Data de 1938 a segunda edição, e é dedicada ao médico que salvou a vida ao autor. No Prefácio, o autor queixa-se que nenhum dicionário acolheu até agora as palavras “garagem” e “derrapagem”…









O mais surpreendente foi o "livro" que tem o símbolo do trabalhador batendo o ferro, numa imagem muito próxima das vinhetas usadas pela Internacional Comunista. É o verso de um livro de recibos da fábrica de “cortumes” “Rio Porto” que existia nos anos trinta em S. Vicente de Pereira, Ovar.


Por último este manual brasileiro de Cármen Otero, Esposa e Mãe. Conselhos às jovens esposas e mães, publicado no Rio em 1948. Lá se dão estes sábios conselhos:

Deves também ensinar os teus filhos que, em presença de crianças menos favorecidas pela sorte, não devem comer gulodices sem lhes dar um pouquinho, mas, como as vezes são muitos e ninguém ficaria servido, é melhor evitar a cobiça dos não favorecidos, afastando-se por ocasião da refeição.
As crianças bem-educadas também não devem caçoar das roupas humildes e dos sapatos gastos dos seus coleguinhas mais pobres e, na hora de se fazer justiça, como na hora da brincadeira, todos, ricos e pobres, tem o mesmo direito.


Como é normal nestas gavetas, só livros úteis.
 


AR PURO

O meu ar puro de ontem foi uma pequena excursão de “naturalista amador” às lagoas de Arrimal e à depressão da Fórnea em Alvados (Porto de Mós), ambos os sítios no Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros. Das lagoas, a mais pequena, estava cheia de lixo, garrafas, sacos de plástico, detritos produzidos por detritos, a “grande” mantinha uma calma digna, entre um pelourinho antigo e uma bizarra e gigantesca flor-de-lis em pedra deixada pelos escuteiros. A depressão é mesmo uma depressão, banhada pelo sol quente, com os restos de árvores ardidas e o leito seco de uma levada. A “livraria” de pedra estratificada entusiasma qualquer bibliófilo, que a saiba ler.

O saque do “naturalista amador” foi escasso. Hortelã selvagem para secar, um pequeno ramo de flores imediatamente mumificado, dois fósseis e um cristal de quartzo. O cristal é humilde, imperfeito, partido, atravessado por uma inflorescência castanha avermelhada (hematite?). Dos fósseis, um é interessante cheio de uma espécie de vermes tubulares (crinóides?) em várias posições na rocha, incrustados uns, outros só se vê o círculo tubular. Um deles, o que primeiro me chamou a tenção, quando lavei a rocha, saiu intacto do seu leito de morte, pequeno tubo de pedra vindo de um mar antiquíssimo.
O ar estava puro, a não ser um indistinto pó vindo das pedreiras.

*

"O ambiente que se vive em muitos dos Parques Naturais é francamente de lamentar, quando comparamos com aquilo que esperamos encontrar em tais espaços e o que se vê por esses países fora. Em alguns paises os Parques Naturais estão sob uma tutela Nacional, devidamente sensibilizada para essa área que, com a participação muitas vezes de mecenas zelam pela conservação, melhoramento e limpeza dos parques naturais. E aí dá prazer visitar esses parques, onde tudo é considerado não só do ponto de vista do ambiente, mas também com facilidades para os seus frequentadores. Claro que, como em outras coisas, nós temos os Parques que merecemos porque não sabemos, ou merecê-los ou até utiizá-los, ou talvez falta de um plano geral de desenvolvimentos de tais espaços, e é pena.

Outro dia, por exemplo, visitei Caldas da Rainha, e logo à entrada, quem vem de Lisboa, encontra o seu Parque D. Carlos I, que em tempos já foi muito mais cuidado do que actualmente. Há placas assinalando vários espaços, e um deles é o do Parque das Merendas; o espaço está lá, mas o que falta são os equipamentos para as merendas, e é ver as pessoas sentadas pela relva, fora do tal espaço, com as suas merendas, quando uns bancos e mesas rústicas ou outro equipamento do género completaria o espaço., que seria acolhedor, deixando talvez saudade de voltar de novo.

Nós apontamos e reclamamos, mas tudo continua na mesma, tudo leva sempre muito tempo para que as coisas se endireitem. Bem podemos reclamar e exigir, mas somos sempre mandados para a bicha..."


(C Marcos)
 


FIFTY-SEVEN CHANNELS AND NOTHIN' ON

Razão tem o Bruce Springsteen quando canta

I bought a bourgeois house in the Hollywood hills
With a trunkload of hundred thousand dollar bills
Man came by to hook up my cable TV
We settled in for the night my baby and me
We switched 'round and 'round 'til half-past dawn
There was fifty-seven channels and nothin' on


porque nós também temos muitos jornais e nenhuma notícia. Corrijo: a única notícia veio da blogosfera ( do Portugal profundo, do Bloguitica) e é passada para os jornais sem qualquer indicação de fontes, como se fossem outros a descobri-la. Posso estar enganado e ser outra a circulação da notícia (dos factos da notícia), mas a verdade é que a li com 24 horas de antecedência em blogues e não vi indicada a sua origem no jornal. Hábitos.
 



William De Morgan, desenhos para azulejos
 


EARLY MORNING BLOGS 293

Rages de Césars


L'homme pâle, le long des pelouses fleuries,
Chemine, en habit noir, et le cigare aux dents :
L'Homme pâle repense aux fleurs des Tuileries
- Et parfois son oeil terne a des regards ardents...

Car l'Empereur est soûl de ses vingt ans d'orgie !
Il s'était dit : " Je vais souffler la liberté
Bien délicatement, ainsi qu'une bougie ! "
La liberté revit ! Il se sent éreinté !

Il est pris. - Oh ! quel nom sur ses lèvres muettes
Tressaille ? Quel regret implacable le mord ?
On ne le saura pas. L'Empereur a l'oeil mort.

Il repense peut-être au Compère en lunettes...
- Et regarde filer de son cigare en feu,
Comme aux soirs de Saint-Cloud, un fin nuage bleu.


(Rimbaud)

*

Bom dia!

25.8.04
 


PROVÉRBIOS DE GRANDE ACTUALIDADE SOBRE O PRINCÍPIO DE PETER

Na Sábado usei o provérbio brasileiro "quem nasceu para lagartixa nunca chega a jacaré" como título de uma coluna. Vim agora a saber que no Porto há um provérbio idêntico: "quem nasceu para cinco, nunca chega a dez".

*

"Ácerca das versões do provérbio "Quem naceu para lagartixa, nunca chega a jacaré", aqui lhe deixo outra que a minha mãe, agora com 78 anos, utilizava frequentemente "Quem nasceu para pataco, nunca chega a tostão".

(Edite Soares)

*

"Sobre os ditados semelhantes ao "quem nasceu para lagartixa nunca chega a jacaré", recordo-me de um que a minha avó, tripeira como nós, usava com frequência: “quem torto nasce, tarde ou nunca se endireita”. "

(Jorge Ricardo Pinto)



 


BIBLIOFILIA



Victor Davis Hanson, Why the West Has Won. Carnage and Culture From Salamis to Vietnam, Nova Iorque , Faber and Faber, 2001

Escrevi sobre este livro na última Sábado, e, na próxima semana, colocarei o texto em linha na VERITAS FILIA TEMPORIS, ou mesmo no Abrupto, se tiver a oportunidade de desenvolver a nota de leitura. Mas devo já dizer que é um livro muito bom, muito bem escrito, de autoria de um professor de "clássicas". A sua análise da "forma" de guerra ocidental, e das suas relações com a cultura, a sociedade e a política, associada a batalhas com conteúdo de choque "civilizacional", é polémica quanto baste, mas muito útil para o repensar de conceitos que tinham entrado em declínio como o de "civilização".
 


A LER COM ATENÇÃO

"Ser e Parecer" (I e II) no Bloguitica.
 


EARLY MORNING BLOGS 292

3 do Book of Nonsense

There was an Old Lady of Prague,
Whose language was horribly vague;
When they said, "Are these caps?"
She answered, "Perhaps!"
That oracular Lady of Prague.

There was an Old Man at a easement,
Who held up his hands in amazement;
When they said, "Sir, you'll fall!"
He replied, "Not at all!"
That incipient Old Man at a casement.

There was an old Person of Burton,
Whose answers were rather uncertain;
When they said, "How d'ye do?"
He replied, "Who are you?"
That distressing old person of Burton.


(Edward Lear)

*

There was a hidden man of Obladia
Each morning saying “Bom dia!”

24.8.04
 


AR PURO


Isaak Levitan
 


EARLY MORNING BLOGS 291

The Road and the End


I shall foot it
Down the roadway in the dusk,
Where shapes of hunger wander
And the fugitives of pain go by.
I shall foot it
In the silence of the morning,
See the night slur into dawn,
Hear the slow great winds arise
Where tall trees flank the way
And shoulder toward the sky.

The broken boulders by the road
Shall not commemorate my ruin.
Regret shall be the gravel under foot.
I shall watch for
Slim birds swift of wing
That go where wind and ranks of thunder
Drive the wild processionals of rain.

The dust of the traveled road
Shall touch my hands and face.


(Carl Sandburg)

*

Bom dia!

23.8.04
 


AR PURO


Ivan Shishkin
 


A LER ABSOLUTAMENTE

A entrevista de Jonathan Lunine sobre porque é que o planeta Titã é muito importante de estudar e conhecer.
 


EARLY MORNING BLOGS 290

As aldeias


Eu gosto das aldeias sossegadas,
com o seu aspecto calmo e pastoril,
erguidas nas colinas azuladas,
mais frescas que as manhãs finas de Abril.

Pelas tardes das eiras, como eu gosto
de sentir a sua vida activa e sã!
Vê-las na luz dolente do sol-posto,
e nas suaves tintas da manhã!...

As crianças do campo, ao amoroso
calor do dia, folgam seminuas,
e exala-se um sabor misterioso
de agreste solidão das suas ruas.

Alegram as paisagens as crianças
mais cheias de murmúrios do que um ninho:
e elevam-nos às coisas simples, mansas,
ao fundo, as brancas velas dum moinho.

Pelas noites de Estio, ouvem-se os ralos
zunirem nas suas notas sibilantes...
E mistura-se o uivar dos cães distantes
com o cântico metálico dos galos.


(Gomes Leal)

*

Bom dia, às aldeias! Nenhuma das quais é assim. Ou é? Para o praticante da aurea mediocritas ...

22.8.04
 



S. Gerasimov
 


EARLY MORNING BLOGS 289: "Pentiti, scellerato! / No, vecchio infatuato!"

Don Giovanni o l'empio punito - Atto Secondo - Scena Diciannovesima

Il Convitato di Pietra e detti

La Statua:
Don Giovanni, a cenar teco
M'invitasti e son venuto!


Don Giovanni:
Non l'avrei giammai creduto;
Ma farò quel che potrò.
Leporello, un altra cena
Fa che subito si porti!


Leporello (facendo capolino di sotto alla tavola):
Ah padron! Siam tutti morti.

Don Giovanni (tirandolo fuori):
Vanne dico!

La Statua (a Leporello che è in atto di parlare):
Ferma un po'!
Non si pasce di cibo mortale
chi si pasce di cibo celeste;
Altra cure più gravi di queste,
Altra brama quaggiù mi guidò!


Leporello:
(La terzana d'avere mi sembra
E le membra fermar più non so.)


Don Giovanni:
Parla dunque! Che chiedi! Che vuoi?

La Statua:
Parlo; ascolta! Più tempo non ho!

Don Giovanni:
Parla, parla, ascoltando ti sto.

La Statua:
Tu m'invitasti a cena,
Il tuo dover or sai.
Rispondimi: verrai
tu a cenar meco?


Leporello (da lontano, sempre tremando):
Oibò;
tempo non ha, scusate.


Don Giovanni:
A torto di viltate
Tacciato mai sarò.


La Statua:
Risolvi!

Don Giovanni:
Ho già risolto!

La Statua:
Verrai?

Leporello (a Don Giovanni):
Dite di no!

Don Giovanni:
Ho fermo il cuore in petto:
Non ho timor: verrò!


La Statua:
Dammi la mano in pegno!

Don Giovanni (porgendogli la mano):
Eccola! Ohimé!

La Statua:
Cos'hai?

Don Giovanni:
Che gelo è questo mai?

La Statua:
Pentiti, cangia vita
È l'ultimo momento!

Don Giovanni (vuol scoigliersi, ma invano):
No, no, ch'io non mi pento,
Vanne lontan da me!


La Statua:
Pentiti, scellerato!

Don Giovanni:
No, vecchio infatuato!

La Statua:
Pentiti!

Don Giovanni:
No!

La Statua:
Sì!

Don Giovanni:
No!

La Statua:
Ah! tempo più non v'è!
(Fuoco da diverse parti, il Commendatore sparisce, e s'apre
una voragine.)

Don Giovanni:
Da qual tremore insolito
Sento assalir gli spiriti!
Dond'escono quei vortici
Di foco pien d'orror?


Coro di diavoli (di sotterra, con voci cupe):
Tutto a tue colpe è poco!
Vieni, c'è un mal peggior!


Don Giovanni:
Chi l'anima mi lacera?
Chi m'agita le viscere?
Che strazio, ohimé, che smania!
Che inferno, che terror!


Leporello:
(Che ceffo disperato!
Che gesti da dannato!
Che gridi, che lamenti!
Come mi fa terror!)

(Cresce il fuoco, compariscono diverse furie, s'impossessano
di Don Giovanni e seco lui sprofondano.)

(Libreto de Lorenzo da Ponte, música de Wolfgang Amadeus Mozart)

*

Bom dia!

21.8.04
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: LOSPALOS

"Há tempos consultei o relatório sobre a missão a Timor do PE e verifiquei que aparece erradamente designada a capital do distrito(anteriormente ocupação conselho/circunscrição administrativa) de Lautem, ou seja a localidade de Lospalos, que surge na redacção do PE ( eventualmente por importação terminologica do departamento de assuntos políticos da UNTAET, que deve ter assessorado a visita), como Los Palos.
Não sei se a etimologia das designações toponímicas segue as linguas de origem- Los Angeles, é o hispânico de Os Anjos, La Guardia é a Guarda, Buenos Aires os Bons Ares. Mas parece-me que Lautem está muito para lá de qualquer lado de Tordesilhas. A língua local é o fataluko, da família melanésia e Lospalos, local pacífico e ermo, foi durante muito tempo, da administração colonial e na ocupação designado pelo mesmo termo. Quando as Nações Unidas chegaram( e antes ainda no período do referendo alguns jornalistas portugueses, ajudaram à propagação do erro) muitos funcionários internacionais, habituados à hispanização do mundo, colocaram os Palos, onde nunca os houve, como se pode confirmar na designação administrativa estabelecida na Constituição aprovada com a independência, onde são aliás confirmada outras designações tradicionais e do período de administração portuguesa( Cova Lima, para o distrito cuja capital é Suai e Oecusse-Ambeno para o enclave em Timor Ocidental).
"

(Jorge Lobo Mesquita)
 



Thomas Graham

20.8.04
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: HOLLYWOOD AJUDA A APANHAR UM BOCADO DO SOL

Não é brincadeira. É mesmo: daqui a uns dias, helicópteros, pilotados por gente habituada a fazer as acrobacias e os efeitos especiais dos filmes de Hollywood, vão apanhar, a meio da queda, uma cápsula que contem um bocado de Sol transportado pela sonda Génesis. Os saberes mais imprevistos tendem a juntar-se sempre, um dia.

Há uma nova página no JPL para acompanhar a missão.
 


EARLY MORNING BLOGS 288

Photo of Home From Home


I used to leave this granite house
after everyone else was asleep,
and, walking down the hill, come to the
woods just behind you snapped
this photo, old friend, who think I can bear
to look at it.

The full moon loomed so close
I'd think I could reach out and gather it
into folds, until I noticed
one star fallen out of the side,
blinking to know where it was,
dead probably, by then, or now.

One night when I was seven
I stood in the dining room, staring
at the decanter on the drinks cart
shining like fool's gold, its liquor smelling
of honey and rosin, belly flat
as mother's breast
as she lay back to sleep beside me.

Later, I caught the moon,
through the dormer window nearest the spot
this photo was taken, a crescent
chunk of old ice.


(Richard Deutch)

*

Bom dia!


19.8.04
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: DIREITO DE EXPLICAÇÃO

"Leitor habitual de José Pacheco Pereira, por quem tenho enorme respeito intelectual, não posso deixar de esclarecer algumas informações feitas no Abrupto de 08-08-04, sobretudo quando refere que “os dois autarcas disseram-nos (...) que têm imensos espaços vazios que, pelos vistos, foram construídos sem objectivo definido, porque senão estavam cheios”.

Não é o caso da Câmara Municipal de Santarém. Efectivamente a Câmara Municipal de Santarém não tem espaços vazios, mas antes falta deles para poder instalar condignamente trabalhadores e serviços.

O Presidente da Câmara limitou-se a indicar ao Governo e à comunicação social instalações pertença de privados (CNEMA - cujos accionistas são, entre outros, o próprio Ministério da Agricultura e a Câmara Municipal), ou edifícios públicos (Governo Civil, Estação Zootécnica Nacional, CAE) que, disponibilidades de espaço e que em simultâneo têm dignidade para acolher organismos governamentais.

Compete ao Governo quando anuncia com pompa e alarde medidas de descentralização de serviços, averiguar previamente se as mesmas são exequíveis e em que prazo. Não foi o que o Governo fez.

Para mais esclarecimentos, queira consultar a Carta Aberta ao Primeiro-Ministro, publicada no Jornal “Público” de 15 de Agosto e também no Jornal Regional “O Ribatejo” de 19 do corrente.
"

(Rui Pedro de Sousa Barreiro, Presidente da CM Santarém)
 


POEIRA DE 19 DE AGOSTO: FACE IT KID

Hoje há cinquenta e dois anos, Sylvia Plath dava-se a si própria um empurrão para cima:

Face it kid, you've had a hell of a lot of good breaks. No Elizabeth Taylor, maybe. No child Hemingway, but god, you are growing up. In other words, you've come a long way from the ugly introvert you were only five years ago. Pats on the back in order? O.K., tan, tall, blondish, not half bad. And brains, `intuitiveness' in one direction at least. You get along with a great many different kinds of people. Under the same roof, close living, even.You have no real worries about snobbishness, pride, or a swelled head. You are willing to work. Hard, too. You have willpower and are getting to be practical about living - and also you are getting published. So you got a good right to write all you want. Four acceptances in three months - $500 Milk, $25, Sin Seventeen, $4.50 Christian Science Monitor (from caviar to peanuts, I like it all the way).

Não durou muito, porque tudo o que sobe tem que cair. Terá? Einstein, numa experiência do pensamento, mostrou que …
 



Andrew Wyeth
 


EARLY MORNING BLOGS 287

Chorus Sacerdotum from "Mustapha"

Oh, wearisome condition of humanity,
Born under one law, to another bound;
Vainly begot, and yet forbidden vanity,
Created sick, commanded to be sound.
What meaneth nature by these diverse laws?
Passion and reason self-division cause.
It is the mark or majesty of power
To make offences that it may forgive;
Nature herself doth her own self deflower,
To hate those errors she herself doth give.
For how should man think that he may not do,
If nature did not fail and punish too?
Tyrant to others, to herself unjust,
Only commands things difficult and hard,
Forbids us all things which it knows is lust,
Makes easy pains, unpossible reward.
If nature did not take delight in blood,
She would have made more easy ways to good.
We that are bound by vows and by promotion,
With pomp of holy sacrifice and rites,
To teach belief in good and still devotion,
To preach of heaven's wonders and delights:
Yet when each of us in his own heart looks
He finds the God there far unlike his books.


(Fulke Greville, Baron Brooke)

*

Bom dia!

18.8.04
 


INTENDÊNCIA

Actualizado O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: WHAT IF?.
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: OLHANDO DE CIMA


Marte, "Espírito" olhando para a planície atravessada.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: O POVO

"Um Sábado há uns meses atrás, no concurso "Um contra Todos" na RTP, tive oportunidade de assistir a um momento raro de televisão. Verdadeiro serviço público.

À concorrente, a "Um", trinta e poucos anos, não sei como se chamava, é feita a pergunta "Segundo a Constituição a quem pertence o poder político?" e dadas três hipóteses de resposta, "O Presidente da República, o Primeiro Ministro ou o Povo".

Os receios de quem lá em casa assistia ao programa confirmaram-se. A resposta tardou porque a concorrente hesitava entre o Sr. Presidente e o Sr. Primeiro Ministro. Em momento algum deu mostras de sequer lhe passar pela cabeça que o poder político, segundo a Constituíção, pertence ao Povo. Uma mulher com trinta e poucos anos, que viveu a quase totalidade da sua vida em Democracia.

A história vai ainda a meio. Os "Todos" com ela se defrontava responderam à mesma pergunta. Estariam ainda em jogo à volta de 30 concorrentes. Nenhum acertou. Nenhum."


(Mário Almeida)


*

"Também assisti ao programa da RTP, hoje citado pelo Mário Almeida, o concurso "Um contra todos".
Confirmo e acrescento, que me recordo da própria concorrente, nas suas hesitações entre o primeiro ministro e o presidente, ter dito peremptóriamente - ao Povo é que não é!
O que ainda deu um tom irónico à coisa... "


(Carlos Santos)

*

"Perante o cenário político que se nos apresenta em Portugal, não acho que a concorrente tenha propriamente falhado a resposta… Existe constituição em Portugal? Existe, mas parece que não é só o “povo” dos concursos que a desconhece… aliás, parece que quem mais a cita é quem menos a aplica…O que será pior? E o que é mais grave: falhar num concurso de TV ou num mandato político? Para bom entendedor…"

(Filipa Guimarães)

*

"Não sei o que é mais aflitivo (surpreendente, trágico?), se a suposta ignorância da concorrente - que como a maioria dos portugueses nunca leram a Constituição - se o abismo que separa as nossas leis da realidade, a começar pela lei fundamental. "

(Amora da Silva)
 


EARLY MORNING BLOGS 286

Os paraísos artificiais


Na minha terra, não há terra, há ruas;
mesmo as colinas são de prédios altos
com renda muito mais alta.

Na minha terra, não há árvores nem flores.
As flores, tão escassas, dos jardins mudam ao mês,
e a Câmara tem máquinas especialíssimas para desenraizar as árvores.

O cântico das aves — não há cânticos,
mas só canários de 3º andar e papagaios de 5º.
E a música do vento é frio nos pardieiros.

Na minha terra, porém, não há pardieiros,
que são todos na Pérsia ou na China,
ou em países inefáveis.

A minha terra não é inefável.
A vida na minha terra é que é inefável.
Inefável é o que não pode ser dito.


(Jorge de Sena)

*

Bom dia, na minha terra!


17.8.04
 


OBRIGADINHA - 2

Os advogados da defesa, os jornalistas a mando, os conspiradores, os cabalistas, as partes interessadas no processo, as partes desinteressadas no processo (mas interessadas na sua venda comunicacional), todos podem falar, que, numa democracia que funcione, não afectam a justiça. Podem cometer um crime falando, podem criar dificuldades à justiça, podem desenvolver “estratégias”, mas, se tudo o resto funcionar bem, não podem impedir a justiça. Só uma parte não o pode fazer, por razões que estão muito para lá da lei, e que tem a ver com o funcionamento da democracia e a ética social: a PGR, os magistrados, os juízes e os polícias, que detêm sobre o processo (e um processo são pessoas: vítimas, inocentes e culpados) poderes com origem nas prerrogativas do seu estatuto profissional. Podem prendê-los, podem interrogá-los, podem escutar-lhes o telefone, podem copiar-lhes o disco duro dos computadores, fazer-lhes buscas a casa. Não podem é falar. Nem demais, nem de menos, não podem falar. A sua “fala” própria é a condução do processo de modo a dar satisfação às vítimas e punição aos culpados.

A enorme perturbação que atravessa a sociedade portuguesa, a que se interessa por estas coisas e é dedicada à causa pública, os melhores de nós todos, que exactamente por isso se sentem mais ofendidos, é a constatação inequívoca, insisto, inequívoca, de que esta regra básica não foi cumprida, sem consequências de maior.

*

"Estamos tão só a assistir à materialização da crise da Justiça na sua verdadeira essência. Não é nada de novo pois já tivemos Camarate, já tivemos o microfone no gabinete de Cunha Rodrigues. Invariavelmente os protagonistas são os mesmos, apenas mudará um ou outro rosto.
Neste aspecto a mediatização até que acaba por ter um efeito positivo, na medida em que algo ainda vai soando junto da opinião pública. Um misto de mensagem e de ruído, que obriga a decifrar a realidade. Chegamos ao cúmulo de se aproveitar a violação de princípios legais e éticos, para que alguma verdade escondida se revele. Sem uma publicação das cassetes, parcial ou não, fidedigna ou não, não seria possível aceder a uma parcela da verdade. É claro que tudo de advém de gravações feitas sem consentimento, de declarações feitas ao arrepio de deveres éticos e deontológicos, de publicações abusivas e ilícitas.
A serpente do mal parece enroscada em si mesma, mordendo-se, envenenando-se, como se a sua presa não a saciasse mais.
"

(Carlos Bote)
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: CRÓNICA DA BELEZA IMPURA


Parece uma fotografia que não vale nada, mas dentro daquele quadradinho está um novo parente da família solar: S/2004 S1. S/2004 S1 e S/2004 S2 são os dois novos satélites de Saturno descobertos pela Cassini. A fotografia está "impura", restos de raios cósmicos, "ruído" está lá tudo. E uma pequena pedra, com cerca de 3 quilómetros, no meio de forças gigantescas, passeando solta (presa) às voltas, batendo contra tudo. Oh guarda, che / bella gioventù.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: WHAT IF?

"Acabei de ler aquele que é talvez o trabalho "definitivo" sobre a campanha Napoleónica na Rússia ("1812 . Napoleon's Fatal March on Moscow" de Adam Zamovski), que recomendo vivamente. Há uma curiosidade que vem do "Guerra e Paz" sobre o pré e pós-Borodino (pronuncia-se bárádinô), a que mesmo quem não seja um adepto de historiografia militar não consegue ficar alheio. A batalha crucial (foi preciso esperar pelo primeiro dia da ofensiva no Somme em 1916 para morrerem mais homens num só dia ) e a retirada em pleno Inverno fazem parte das referências psicológicas colectivas de muito boa gente dos povos envolvidos. Há no livro até referências à Legião Portuguesa e ao Marquês d'Alorna bem como à forma heróica como um batalhão comandado por um tal Castro actuou no trabalho de protecção da retaguarda da Grande Armée envolvida no trajecto trágico do regresso. Mas estou a deambular para fora daquilo ao que vinha. A saber: muito perto do final do livro fala-se da inúmera literatura que resultou daquela campanha. Das memórias, todas mais ou menos indulgentes para com os respectivos memorialistas, sabemos bem, mas houve também um pequeno livro (escrevo de memória, deixei o "1812" em casa) que imagina o que seria se Napoleão tivesse marchado para São Petersburgo e imposto a paz a Alexandre. Na prática redundaria num Império global com Paris como nova Roma. Mas o pormenor que achei uma delícia foi o destino dos Ingleses. Napoleão atravessa a Mancha, conquista Londres, proclama nos Comuns a dissolução do Reino, permite ao Monarca que se mude para Glasgow com o título de Rei da Escócia e da Irlanda, e a Inglaterra própriamente dita é dividida numa mão cheia de Départements e incorporada no território França! Como "wishful thinking" dum francês com a Pérfida Albion atravessada é difícil fazer melhor!"

(JTP)

*

"Lembro que no Reino Unido existe uma grande tradição para visitar campos de batalha desenvolvendo um tipo de turismo cultural, praticamente desconhecido entre nós. Repare, no que é proposto neste sítio (este é apenas um dos muitos que encontrei).

Repare que à Batalha do Porto, uma das mais surpreendentes e rápidas vitórias de Wellesley em Portugal é dedicada um dia! Quem em Portugal sabe o que se passou com pormenor e se dedica a divulgar essa interessante história? O uso de 2 ou 3 barcos rabelos para transportar tropas inglesas para o "Seminário" sem que as sentinelas francesas dessem conta, as baterias inglesas no Monte da Virgem "varrendo" as colunas francesas e a fuga precipitada de Soult abandonando a sua refeição no Palácio das Carrancas. Tudo "histórias" que nos dizem respeito e ignoradas!

Recordo também que a bibliografia anglo-saxónica sobre as Invasões Francesas é imensa, como se comprova introduzindo "Peninsular War" na Amazon. No campo da ficção destaco as novelas de "Sharpe" de Bernard Cornwell que começaram agora a ser traduzidas para Português. O último livro deste autor (Sharpe's Escape)cobre o período da Batalha do Buçaco, Saque de Coimbra e as Linhas de Torres Vedras."


(Jose Paulo Andrade)
 


EARLY MORNING BLOGS 285

Ballade des proverbes


Tant gratte chèvre que mal gît,
Tant va le pot à l'eau qu'il brise,
Tant chauffe-on le fer qu'il rougit,
Tant le maille-on qu'il se débrise,
Tant vaut l'homme comme on le prise,
Tant s'élogne-il qu'il n'en souvient,
Tant mauvais est qu'on le déprise,
Tant crie-l'on Noël qu'il vient.

Tant parle-on qu'on se contredit,
Tant vaut bon bruit que grâce acquise,
Tant promet-on qu'on s'en dédit,
Tant prie-on que chose est acquise,
Tant plus est chère et plus est quise,
Tant la quiert-on qu'on y parvient,
Tant plus commune et moins requise,
Tant crie-l'on Noël qu'il vient.

Tant aime-on chien qu'on le nourrit,
Tant court chanson qu'elle est apprise,
Tant garde-on fruit qu'il se pourrit,
Tant bat-on place qu'elle est prise,
Tant tarde-on que faut l'entreprise,
Tant se hâte-on que mal advient,
Tant embrasse-on que chet la prise,
Tant crie-l'on Noël qu'il vient.

Tant raille-on que plus on n'en rit,
Tant dépent-on qu'on n'a chemise,
Tant est-on franc que tout y frit,
Tant vaut "Tiens !" que chose promise,
Tant aime-on Dieu qu'on fuit l'Eglise,
Tant donne-on qu'emprunter convient,
Tant tourne vent qu'il chet en bise,
Tant crie-l'on Noël qu'il vient.

Prince, tant vit fol qu'il s'avise,
Tant va-il qu'après il revient,
Tant le mate-on qu'il se ravise,
Tant crie-l'on Noël qu'il vient.


(François Villon)

*

Bom dia!

16.8.04
 


BIBLIOFILIA



Duncan Brack / Iain Dale, Prime Minister Portillo and Other Things That Never Happened, Londres, Politico's, 2003

John Baxter, A Pound of Paper. Confessions of a Book Addict, Londres, Doubleday, 2002

Dois livros-tipo de escritas que não se fazem por cá: a ficção histórica do género "o que é que aconteceria se...", e livros sobre o amor aos livros, obsessivo, doentio, total.

(Em breve.)
 


EARLY MORNING BLOGS 284

"INDIGNATION" JONES


You would not believe, would you,
That I came from good Welch stock?
That I was purer blooded than the white trash here?
And of more direct lineage than the New Englanders
And Virginians of Spoon River?
You would not believe that I had been to school
And read some books.
You saw me only as a run-down man,
With matted hair and beard
And ragged clothes.
Sometimes a man's life turns int a cancer
From being bruised and continually bruised,
And swells into a purplish mass,
Like growths on stocks of corn.
Here was I, a carpenter, mired in a bog of life
Into which I walked, thinking it was a meadow,
With a slattern for a wife, and poor Minerva, my daughter
Whom you tormented and drove to death.
So I crept, crept, like a snail through the days
Of my life.
No more do you hear my footsteps in the morning,
Resounding on the hollow sidewalk,
Going to the grocery store for a little corn meal
And a nickel's worth of bacon.


(Edgar Lee Masters)

*

Bom dia, na nossa Spoon River!

15.8.04
 


POEIRA DE 15 DE AGOSTO 2



Hoje, há quarenta e três anos, ergueu-se o Muro que Conrad Schuman saltou em nome da liberdade contra o "socialismo real".
 


A LER

Vale a pena ler "Vale a pena?" e "Juristas" no Portugal dos Pequeninos.
 


MAIS E MAIS AR PURO


Ilya Ostrukov
 


POEIRA DE 15 DE AGOSTO

(Cortesia de João Costa que lembrou esta “poeira”)

Hoje, há oitenta e seis anos, Churchill foi a Paris como Ministro do Armamento e daí escreve à sua mulher Clementine :

Paris, 15 August, 1918

My Darling One:
I never saw anything like the tropical brilliancy of the weather here.
Each day is more perfect than the other. It was provoking to be cooped up in a conference hour after hour...It is quite an impressive gathering - the 4 great nations assembled along the tables with their ministers & generals etc. We arranged that each gt power represent one of the little powers (so as to restrict members).
France took Greece, Italy was given Serbia, the U.S. Belgium, & we took the Portuguese; so we were like four kangaroos each with an infant in the pouch.
Ours is rather a dirty brat I am afraid...

Always yr devoted
W.


Pois é.
 


EARLY MORNING BLOGS 283

Baif, qui, comme moi, prouves l'adversité


Baif, qui, comme moi, prouves l'adversité,
Il n'est pas toujours bon de combattre l'orage,
Il faut caler la voile, et de peur du naufrage
Céder à la fureur de Neptune irrité.

Mais il ne faut aussi par crainte et vilité
S'abandonner en proie : il faut prendre courage,
Il faut feindre souvent l'espoir par le visage,
Et faut faire vertu de la nécessité.

Donques sans nous ronger le coeur d'un trop grand soin,
Mais de notre vertu nous aidant au besoin,
Combattons le malheur. Quant à moi, je proteste

Que je veux désormais fortune dépiter,
Et que si elle entreprend le me faire quitter,
Je le tiendrai, Baïf, et fût-ce de ma reste.


(Joachim du Bellay)

*

Bom dia!

14.8.04
 


MAIS AR PURO


Fyodor Vasilev
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: SILLY SEASON

"A notícia é espantosa. Cientistas russos afirmam que encontraram os destroços de uma nave espacial extra-terrestre que se despenhou em 1908 em Tunguska, na Sibéria, anunciou quarta-feira à noite a agência noticiosa Interfax. Infelizmente a notícia não diz que parte da nave é que encontraram. Terá sido o motor, as asas ou a cozinha? Mas ainda é mais espantoso que notícias destas apareçam hoje em dia na comunicação social e que passem no rodapé dos noticiários da TV, como se fosse algo credível. Será que se alguém dissesse que na Rússia encontraram o Gagarin vivo também iam passar a notícia? Ou que a estrela de Belém pousou mesmo na gruta do menino Jesus? Também passavam tão assombrosa descoberta?"

(José Matos)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: CRATERAS FEMININAS

"Como nomes, também podia dar:

- Guilhermina Suggia, que também poucos conhecem. Existe também uma confusão, não sei se já desfeita, com as lápides com o nome dos pais, ausência quase total de gravações dela acessíveis, etc. ( ver Blogger com o seu nome),

- Luísa Todi, cuja campa se situa algures numa cave dum prédio, se bem depreendi do que ouvi num programa da A2.
"

(Rui Laia)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: REVISTAS LIDAS NO CABELEIREIRO

"(...) vi a capa da revista VIP. Fiquei a saber que:

Marcelo Rebelo de Sousa já esconde mal as suas ambições. Desta vez, e a primeira, pois tanto quanto me apercebi, até agora só temos visto as partes do puzzle (são as revistas que eu vejo no cabeleireiro as poucas vezes que lá vou), apareceu com a famílias no seu completo em férias: namorada de há vinte anos (...), filha e genro, filho e nora. Tenho acompanhado com interesse o seu recente gosto contido programado e eficaz de aparecer nas revistas cor-de-rosa. Primeiro aparece ele e falar dele. Uns meses depois aparece ele e o neto, e já fala ou pouco da sua vida pessoal e da relação com os seus filhos. Depois aparece ele a falar da sua namorada de há vinte anos (...) e a explicar o quanto ela gosta da privacidade.
Depois aparece ele e o filho no mar de fato térmico no Inverno a dizer-nos do seu amor pelo mar partilhado com o filho. Depois, umas primeiras fotografias tímidas com a namorada de quem diz maravilhas. Depois também aparece na Quinta do Lago de férias com a filha no mar em que louva as qualidades da filha e fala da sua cumplicidade com ela. Agora finalmente vemos todas as peças do Puzzle e a família no seu completo.

Nada se deixa ao acaso nesta caminhada com objectivos bem definidos. Que faltará agora? Aguardo com paciência. As idas ao cabeleireiro darão os seus frutos! Ou me engano muito, ou vai lá chegar (e com o meu voto!)
. "

(JPC)
 


EARLY MORNING BLOGS 282

There was an Old Man who supposed,
That the street door was partially closed;
But some very large rats,
Ate his coats and his hats,
While that futile old gentleman dozed.


(Edward Lear)

*

Bom dia!

13.8.04
 



Isaak Levitan, Vento fresco no Volga, 1895

(Isto estava lá em baixo no limbo do blogue, rapidamente soterrado pelos eventos. Mas, penso que se há coisa que os eventos precisam é de ser varridos com ventos e seria injusto que esta lufada de ar fresco não fizesse mais parte do dia de hoje do Abrupto. E subiu cá para cima.)
 


CORREIO

Algum correio, enviado entre o fim da manhã de hoje e as 15 horas, foi apagado por engano. Pedia aos que me escreveram, em particular sobre a questão do OBRIGADINHO, que repetissem o envio.
 


OBRIGADINHA

Correio da Manhã – Posso escrever isto? Fonte do MP? Correcto?
Sara Pina – Pode o quê?
CM – Fonte do MP, soube o “Correio da Manhã”.
SP – Não pode pôr fonte nenhuma.
CM – Fonte próxima do processo e está a andar.
SP – Não pode.
CM – Fonte próxima do processo e…
SP – Não pode. Isso muito menos.
CM – Então, pronto, soube o “Correio da Manhã”, o “Correio da Manhã” apurou junto de qualquer coisa (…)
SP – Isso pode pôr.
CM – Tanto que, ao contrário de…
SP – Ponha assim, o “Correio da Manhã” apurou que é mais do que uma criança, pronto, mas não põe fonte nenhuma, nem judicial, nem do MP e muito menos fonte do processo, senão sou morta na segunda-feira.
CM – Tá bem, não morre nada.
SP – O “Correio da Manhã” apurou.
CM – O “Correio da Manhã” apurou que (…)
SP – Não ponha fonte nenhuma senão nunca mais lhe dou uma informação.
CM – Tá bem Sara, obrigadinha.


(Uso a transcrição do Barnabé)

Esta mulher já está na rua das suas funções ou não? O PGR sabia ou não que a sua porta-voz (a que transporta a voz) falava assim com um jornalista ou não? Porque se sabia, a porta é a mesma. E rápido.

*

"O grande problema que envolve o assunto em questão prende-se com a impossibilidade real e factual de se poder controlar e fiscalizar o segredo de justiça.
Que tipo de instrumentos é que podem evitar que alguém com conhecimento de um determinado processo judicial passe informação para o exterior? Muitas vezes, as leis no papel são bonitas, mas nada eficazes. A do segredo de justiça é uma delas...
Só quando uma dessas situações ilícitas for exemplarmente julgada é que o medo se poderá instalar nas mentes daqueles que com acesso a processos judiciais facilmente vendem informação aos jornalistas. Aí sim, pensarão duas vezes antes de violarem o segredo de justiça..."


(Pedro Peixoto)

*

"Neste país raramente alguém é posto porta fora. Sabe isso. Todos sabemos.
Raramente alguém é demitido. Outra coisa, sim, e bem mais agradável até em termos curriculares, é ser aceite o pedido de demissão. Em Portugal quem faz asneira em cargos de responsabilidade, principalmente asneira grosseira, por regra, apresenta a sua demissão, não tem de sofrer o vexame de ser demitido.
O trabalhador, na privada ou na função pública, esse sim, é despedido por base numa justa causa legalmente estabelecida. Agora os altos responsáveis não estão sujeitos a esse tipo de coisas. Seria um vexame. É assim há muito tempo e o caso de Adelino Salvado mostra que assim continuará. Os processos de branqueamento seguem-se logo após os escândalos. Assim ditam as nossas boas regras.
"

(Carlos Bote)

*

"Porque é que nesta transcrição do Barnabé está o Correio da Manhã e não o Octavio Lopes?... Aliás, no Barnabé está um subtítulo assim: "Conversa entre Sara Pinto, Porta-Voz do Procurador-Geral da República, Souto Moura, e um jornalista do "Correio da Manhã", publicada no "Independente". Todos têm nome menos o jornalista do Correio da Manhã?... Ora em "O Independente" não está um "jornalista do Correio da Manhã", está Octavio Lopes. Ele já está a perder o nome?... Está a desaparecer enquanto pessoa que fez as gravações?

(...) estou a manifestar uma enorme desconfiança quanto ao conteúdo muito selectivo de O Independente de hoje, e a tentar entender os meandros do mais absurdo proteccionismo corporativo que está a ser dado a Octavio Lopes."

(Henrique Jorge)
 


TENDÊNCIAS

Numa fase ainda muito errática, é prematuro definir tendências. Há mais sobrevivências do que tendências. Mas há sinais interessantes, saibamos nós lê-los:

- já começou a preparação psicológica para a ultrapassagem do défice, feita, muitas vezes, como é da regra, com promessas de o manter.

Bibliografia: notícia do Independente sobre Bagão Félix e o défice.

- em áreas em que o Governo não têm grande margem de manobra, em que não há, a curto prazo, high stakes, ou em que os interesses do Governo e da oposição são os mesmos, as escolhas são típicas do “bloco central”. O “bloco central” é em Portugal a melhor garantia de governar sem se ser incomodado e já deu muitas provas da sua eficácia nos momentos difíceis, nos tribunais, nas polícias, nas empresas públicas, na empregabilidade dos gestores. Para os amadores da teoria das conspirações é também nestes sectores que os poderes discretos das várias maçonarias funcionam.

Bibliografia: saber de experiência feita com coisas vistas e conhecidas;

artigo de José António Barreiros no Diário de Notícias.
 


NOMES

Naquela que deve ter sido uma das mais bizarras intervenções numa comissão política de um partido (o PSD, neste caso, ao tempo de Cavaco Silva), numa discussão qualquer que havia sobre a nossa “auto-estima”, ou sobre o satélite português, eu perguntei-me porque razão usávamos pouco a possibilidade de dar nomes portugueses a alguns dos acidentes da geografia dos planetas. A necessidade de nomenclatura crescia exponencialmente, à medida que se iam conhecendo melhor os planetas com as sondas dos anos 70 e 80.

Já havia pelo menos uma “Vasco da Gama” na Lua, mas era pouco. Acho que dei o exemplo de Vénus, cujas regras de nomenclatura conhecia. Eu sabia que não tínhamos nomes para as Fossae, que tinham que ser “deusas da guerra”, nem para as Chasmata, que tinham que ser “deusas da caça”, mas sempre se podia fazer alguma coisa para as Crateras, acima dos 20 km, que tinham nomes de mulheres famosas. Acho que o primeiro nome que me veio à cabeça foi o de Florbela Espanca. Ninguém sabe quem é, disse-me um outro participante na reunião. Também há uma cratera chamada "Suzanne Valadon", porque os franceses não deixam os seus créditos por mãos alheias, e pouca gente sabe quem é... Alguém, sensato, passou adiante.

Em Marte, onde se podem dar nomes de cidades a pequenas crateras, há uma Lisboa, identificada como um “porto português”, misturada com Viana (Brasil), Platte no Dakota do Sul, Porvoo (Finlândia), etc., etc. Mas não há sequer a minha terra, o Porto (o que é que tu esperas, Rui?...).

*

"(...) pelo menos o nome do seu rio "Durius" foi atribuído a um vale marciano. O meu rio "Munda" tambem, tal como o "Tagus". Lisboa, Aveiro e Funchal são os nomes de cidades portuguesas atribuídos a crateras marcianas."

(Rui Curado Silva da Klepsydra)

*

"Nomes portugueses na Lua listados, junto com as coordenadas:

Acosta 5.6S 60.1E 13.0 EU PG 080B4 LTO 5 1976
0 AA Cristobal; Portuguese doctor, natural historian (1515-1580).

[Camoens] 0.8N 84.9E 33.0 EU PG 063C3 LTO 6 0
0 AA Luis de; Portuguese author (1524-1530).

Magelhaens 11.9S 44.1E 40.0 EU PG 79 LAC 5 1935
66 AA Fernao De (Ferdinand Magellan); Portuguese explorer (1480-1521).

Nonius 34.8S 3.8E 69.0 EU PG 112 LAC 5 1935
66 AA Nunez, Pedro; Portuguese mathematician (1492(?)-1578).

Vasco da Gama 13.6N 83.9W 83.0 EU PG 1 LOC 5 1935
66 AA Portuguese navigator, explorer (1469-1524).

Num dia como hoje, é reconfortante lembrar grandes portugueses."


(S)
 


EARLY MORNING BLOG 281

Poderoso caballero es don Dinero.


Madre, yo al oro me humillo;
él es mi amante y mi amado,
pues, de puro enamorado,
de contino anda amarillo:
que, pues, doblón o sencillo,
hace todo cuanto quiero,
Poderoso caballero
es don Dinero.

Nace en las Indias honrado,
donde el mundo le acompaña;
viene a morir en España
y es en Génova enterrado.
Y pues quien le trae al lado
es hermoso, aunque sea fiero,
Poderoso caballero
es don Dinero.

Es galán y es como un oro,
tiene quebrado el color,
persona de gran valor,
tan cristiano como moro;
pues que da y quita el decoro
y quebranta cualquier fuero,
Poderoso caballero
es don Dinero.

Son sus padres principales
y es de noble descendiente,
porque en la venas de Oriente
todas las sangres son reales;
y pues es quien hace iguales
al duque y al ganadero,
Poderoso caballero
es don Dinero.

Mas, ¿a quién no maravilla
ver su gloria sin tasa
que es lo menos de su casa
doña Blanca de Castilla?
Pero pues da al baxo silla
y al cobarde hace guerrero,
Poderoso caballero
es don Dinero.

Sus escudos de armas nobles
son siempre tan principales,
que sin sus escudos reales
no hay escudos de armas dobles;
y pues a los mismo robles
da codicia su minero,
Poderoso caballero
es don Dinero.

Por importar en los tratos
y dar tan buenos consejos,
en las casas de los viejos
gatos le guardan de gatos.
Y pues él rompe recatos
y ablanda al juez más severo,
Poderoso caballero
es don Dinero.

Y es tanta su majestad
(aunque son sus duelos hartos),
que con haberle hecho cuartos
no pierde su autoridad:
pero pues da calidad
al noble y al pordiosero,
Poderoso caballero
es don Dinero.

Nunca vi damas ingratas
a su gusto y afición,
que a las caras de un doblón
hacen sus caras baratas.
Y pues las hace bravatas
desde una bolsa de cuero,
Poderoso caballero
es don Dinero.

Más valen en cualquier tierra,
(mirad si es harto sagaz),
sus escudos en la paz,
que rodelas en la guerra.
Y pues al pobre lo entierra
y hace propio al forastero,
Poderoso caballero
es don Dinero.


(Francisco de Quevedo)

*

Bom dia!

12.8.04
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES; ELOGIO DO VERDE TINTO

"Mas nada está perdido: a pequena caneca de barro branca com riscas azuis tem sido a minha principal cúmplice. Nela está o verde tinto que só aqui tem a particularidade de fazer milagres. Sabe-me fresca e divinamente e encerra em si o mistério da “pertença”. A toalha de papel fica suja e de um roxo quase negro das pingas que escorrem da imperfeição do bico da caneca - são sempre muito estreitos. Os copos ficam maravilhosos com aquele vermelho espesso que só o verde tinto nos sabe dar, e os nossos cantos dos lábios? Aqui não saberia beber outra coisa. Regresso a casa “slightly dizzy” do exercício do meu pequeno prazer privado que nem o Homem Aranha nem a Britney Spears chamuscam."

(J.)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:A GIRAFA

"A propósito do poema Le Chameau et les Bâtons flottants (EARLY MORNING BLOGS 278):

Dizem que quando o Luis XIV (ou XV?) viu uma girafa, pela primeira vez, assestou a luneta e disse: «Este animal, provavelmente, NÃO existe!».

A girafa, com o seu pescoço de dois metros e o seu olhar penetrante, tem um horizonte mais amplo que todos os outros animais terrestres; deve ser, por isso, um animal sábio: já sabe que no mar flutuam troncos desgarrados, enquanto o comum da parentela de quatro ou duas patas, ainda treme pela aproximação da Armada de Filpe II."


(Luis Manuel Rodrigues)

 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: MAU JORNALISMO

"Mais um exemplo de mau jornalismo...

Ontem vi escrito em vários lados que "JPP era a favor da publicação do conteúdo das cassetes". Como as notícias se baseavam no Abrupto e eu não tinha percebido nada disso quando li os seus textos, vim cá hoje novamente verificar. Pois é: divulgar os nomes não é o mesmo que divulgar o conteúdo. Não sei o que pensa sobre o assunto, mas de facto o que consta do Abrupto é diferente daquilo que foi divulgado por quem aparentemente não sabe ler.
"

(Tiago Azevedo Fernandes)

Toda a razão, toda a razão. E ainda há as notícias, e os comentários, feitos a partir do Abrupto, sem o citar. Costumes.
 


MAY I GOVERN MY PASSION WITH AN ABSOLUTE SWAY

 


EARLY MORNING BLOG 280

The Old Man's Wish


If I live to be old, for I find I go down,
Let this be my fate: In a country town
May I have a warm house, with a stone at the gate,
And a cleanly young girl to rub my bald pate.
May I govern my passion with an absolute sway,
And grow wiser and better as my strength wears away,
Without gout or stone, by a gentle decay.

Near a shady grove, and a murmuring brook,
With the ocean at distance, whereupon I may look,
With a spacious plain without hedge or stile,
And an easy pad-nag to ride out a mile.
May I govern my passion with an absolute sway,
And grow wiser and better as my strength wears away,
Without gout or stone, by a gentle decay.

With Horace and Petrarch, and two or three more
Of the best wits that reign'd in the ages before,
With roast mutton, rather than ven'son or veal,
And clean though coarse linen at every meal.
May I govern my passion with an absolute sway,
And grow wiser and better as my strength wears away,
Without gout or stone, by a gentle decay.

With a pudding on Sundays, with stout humming liquor,
And remnants of Latin to welcome the vicar,
With Monte-Fiascone or Burgundy wine,
To drink the King's health as oft as I dine.
May I govern my passion with an absolute sway,
And grow wiser and better as my strength wears away,
Without gout or stone, by a gentle decay.

With a courage undaunted may I face my last day,
And when I am dead may the better sort say,
In the morning when sober, in the evening when mellow,
He's gone, and left not behind him his fellow.
May I govern my passion with an absolute sway,
And grow wiser and better as my strength wears away,
Without gout or stone, by a gentle decay.


(Anónimo)

*

Bom dia!

11.8.04
 


SOBRE "PODER CORPORATIVO E RESPONSABILIDADE"

"Partilho das suas preocupações sobre a gravidade deste episódio da cassette (?) roubada, mas pretendo chamar a sua atenção para algumas incorrecções nos seus textos sobre a matéria: de facto, a lei (Código Penal) proibe a gravação de conversas sem o consentimento do outro interlocutor ou ilegalmente gravadas. Apenas em situações limite se pode excluir a ilicitude dessas gravações, nomeadamente em casos de legítima defesa. E não são os jornalistas que deliberam sobre o chamado "interesse público" dessa actuação.
Por outro lado, existem limites ao direito ao sigilo profissional, que não é já um direito absoluto como fora consagrado na Lei de Imprensa de 1975. O tribunal imediatamente superior àquele onde esteja a decorrer um julgamento, cujo magistrado entenda dever limitar esse direito, poderá decidir da quebra do sigilo com a consequente prestação do depoimento, se entender existir um interesse preponderante (CPP, art. 135.º). É verdade que o Código deontológico do Jornalista lhe impõe manter o sigilo profissional, mas a lei em vigor limita esse direito.
Estou de resto absolutamente convicto de que um juiz imporia a quebra do sigilo se isso possibilitasse o público conhecimento do(s) autor(es) de uma violação tão grosseira do segredo de justiça como as que temos presenciado.
Finalmente, permito-me recordar que em Julho do ano passado, o Expresso do nosso arq. Saraiva publicou um chamado "Código de Conduta do Expresso", onde, aí sim, se admitia que os jornalistas do semanário poderiam "recorrer a aparelhos de escuta ou à intercepção de conversas telefónicas privadas" caso existisse "interesse público", então definido como "evitar um crime ou um delito grave, proteger a segurança ou a saúde públicas" etc.
Na altura, perante o silêncio geral, como julgo que os jornalistas nunca deveriam praticar este tipo de actos ou serem interpretes únicos do conceito de interesse público, sobretudo quando muitas vezes apenas depois de praticado o acto criminoso se pode averiguar se esse interesse tinha ou não existido, fiz uma queixa à Alta Autoridade para a Comunicação Social, que viria a criticar o jornal, recomendando a modificação do dito código. Até hoje...
"

(Alberto Arons de Carvalho)

*

"Talvez Robert Herrick (1591-1674) tenha razão:

THINGS MORTAL STILL MUTABLE

Things are uncertain; and the more we get,
The more on icy pavements we are set"


(João Costa)

*

"As considerações - aliás, desprimorosas - feitas no escrito POBRE PAÍS 1 - O PODER CORPORATIVO E A IRRESPONSABILIDADE referem genericamente os jornalistas e os magistrados. Como magistrado judicial no activo, um de entre milhares que exercem as suas funções com honestidade, e avesso à exposição mediática, entristece-me a facilidade com que toma o todo pela parte. Creio mesmo que serão muito poucos os magistrados judiciais que se enquadram no modelo que o seu escrito pretende transmitir.
As nomeações políticas de magistrados judiciais para cargos de subordinação hierárquica, como por exemplo, a Polícia de Segurança Pública, Direcções-Gerais, Serviços de Informações e outros (com regresso posterior à magistratura), além de degradantes para a Justiça, contribuem muito mais para a promiscuidade de interesses que o Sr. critica, e bem, no seu escrito.
"

(A. Costa)
 


LOGO À NOITE



Ó incréus, olhai para cima, para ver chover luz, se estas nuvens não nos traírem o olhar e nos derem chuva de água em vez de fogo. São as Perseidas e estão aqui (cortesia da NASA).



*

"É impressionante a quantidade de asneiras que ouvimos na rádio e na TV sobre as perseidas. Numa rádio local logo pela manhã, uma jornalista insistia em dizer que o planeta Tutle tinha passado pelo espaço e deixado um rasto de poeiras. Confundir um planeta com um cometa será normal? Não é uma coisa que se aprende na escola? Não devia um jornalista saber distinguir um planeta de um cometa para perceber o absurdo da afirmação? À noite na TVI, a pivot do Jornal da Noite falava no "meteorito das perseidas" que vai passar pela Terra e na peça logo a seguir, o jornalista dizia que Marte estava em aproximação à Terra e que isso ia afectar as observações. Ora isto é daquelas coisas completamente inventadas. Onde é que o jornalista foi desenterrar uma história destas? Tudo isto mostra a falta de atenção e cuidado com que é elaborado um texto para um teleponto ou para uma reportagem. Ainda por cima, saiu hoje no Público um artigo sobre o fenómeno correcto em todos os aspectos. Bastava ler o Público ou ir à net para se fazer um bom texto. Por isso, não percebo como pode haver confusões deste tipo?"

(José Matos)
 


BIBLIOFILIA A DOIS

Hoje, no Diário de Notícias, o Vasco Graça Moura escreve sobre as nossas deambulações bibliófilas por Bruxelas e Estrasburgo. Também eu tenho saudades, mas, como fiel Eckermann, tenho cá em casa guardada uma mão cheia dos poemas repentinos de Estrasburgo (mais de Estrasburgo do que de Bruxelas), que o Vasco fazia em português e francês, com aquele domínio da palavra que ele tem como quem respira.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: COSTUMES

"E porque não citar Séneca ( filosofo latino do século I ) em relação à actual crise da nossa justiça :

" O mal não tem remédio quando os vícios se transformaram em costumes".


(António Monteiro Pais)
 


 


EARLY MORNING BLOGS 279

Alguns provérbios e "cantares" de Antonio Machado:

El ojo que ves no es
ojo porque tú lo veas;
es ojo porque te ve

*

Para dialogar
preguntad primero
después...escuchad

*

Hoy es siempre todavía.

*

Busca a tu complementario
que se marcha siempre contigo
y suele ser tu contrario

*

Si vino la primavera
volad a las flores
no chupeís cera

*

En mi soledad
he visto cosas muy claras
que no son verdad

*

Pero yo he visto beber
hasta en los charcos del suelo
Caprichos tienen la sed

*

Despacito y buena letra:
el hacer las cosas bien
importa más que el hacerlas

*

Enseña Cristo: a tu prójimo
amarás como a ti mismo
más nunca olvides que es otro


(Antonio Machado)

*

Bom dia!


10.8.04
 


POBRE PAÍS - 3 - INTERESSE PÚBLICO

O “interesse público” tem as costas maiores que eu conheço. Tem a vantagem de não ter ninguém que o defina, logo servir para tudo.

Só que agora, eu sei bem o que é que era de interesse público: a divulgação dos nomes dos magistrados que desonram a sua função falando sob processos em que estão envolvidos, dos polícias que desonram a sua profissão revelando segredos profissionais, dos advogados que pisam a deontologia para promoverem os seus clientes. Sim. Esses é que era do interesse público sabermos quem são.

Só que a sacrossanta protecção das “fontes” o impede, apesar de ser difícil de comprovar que o anonimato que é protegido tenha alguma coisa a ver com qualquer “interesse público”. Estas pessoas não falaram aos jornalistas por amor da verdade ou para impedir um mal maior. Falaram porque são irresponsáveis e têm todos uma pequena agenda a promover.

Claro que o problema vem de cima, vem da cabeça, a tal que começa a apodrecer no peixe, gangrenando o corpo. Quando os principais responsáveis governamentais e da oposição, a maioria esmagadora dos grupos parlamentares e por aí adiante promovem a sua carreira com inconfidências e intrigas, é difícil esperar que actuem neste processo a não ser para se proteger a prazo, como “fontes”.
 


POBRE PAÍS - 2- TRANSPARÊNCIAS

Eu não quero que instituições como a justiça, procuradores, juízes, polícias sejam “transparentes”. Quero que eles respondam por aquilo que façam de errado. Quero accountability, não escrutínio em tempo real para vender “comunicação”, com a inevitável consequência que, quando é assim, são os poderosos que escapam, e os pobres que são punidos. A justiça e o trabalho das polícias é, deve ser, pela sua própria natureza, discreto e secreto, ou então não é. Se não o é, a injustiça cresce, na exacta medida dos títulos retumbantes de jornais e televisões.
 


POBRE PAÍS 1 - O PODER CORPORATIVO E A IRRESPONSABILIDADE

Toda esta trapalhada grave, muito grave, das cassetes roubadas, revela uma questão estrutural mais de fundo: nos últimos vinte anos, o poder de algumas corporações ultrapassou o do estado. Dois casos são hoje absolutamente pertinentes: o dos jornalistas e dos magistrados. À sua volta outros poderes cresceram, mais clássicos, o do dinheiro em particular, mas, no cômputo geral, o poder dos poderosos aumentou.

O crescimento do poder dos jornalistas e magistrados fez-se durante os mesmos anos e pelas mesmas razões: a pressão populista das oposições e a cedência cobarde de governos, para a constituição de contra-poderes que fizessem, fora do sistema político, aquilo que deveria ser feito por uma Assembleia forte e um sistema judicial equilibrado e eficaz. Como ninguém quis fortalecer a democracia onde ela devia ser fortalecida, criou-se um monstro que, a prazo, devora quem o gerou e degrada a vida pública.

O poder destas corporações levou-as ao local ideal: o da irresponsabilidade que gera a impunidade. Magistrados e jornalistas não podem ser chamados a qualquer responsabilidade, porque conquistaram uma absoluta irresponsabilidade. Nenhuma lei se lhes aplica efectivamente e só existem excepções nuns desgraçados apanhados a nível local e regional, sem a protecção dos maiores. Mas, na capital, nos grandes órgãos de comunicação, no limite, não há responsabilidade. Sempre que há uma crise, alguns jornalistas juram a pés juntos que certas coisas nunca mais irão acontecer… até à próxima crise em que elas acontecem de novo. Hoje estão-se a tornar tão habituais que estão a criar novos standards de comportamento. Já ninguém sabe como era, já só se sabe como é.

Não é legal gravar alguém sem o seu consentimento. Mas um jornalista pode fazê-lo. Não é legal divulgar conversas gravadas ilegalmente, mas um jornalista pode fazê-lo. Não é legal roubar e vender a um receptador (ou vários) o produto de um roubo, mas um jornalista pode ser receptador de um objecto roubado. Nada é legal, mas há sempre uma excepção para os jornalistas. Os jornalistas podem fazer o que um polícia ou um serviço de informações não pode. Os jornalistas podem fazer praticamente tudo, que não são responsáveis por nada. Basta invocar o “interesse público” que eles próprios definem. Depois quando se espera justiça, quem a devia garantir diz logo à cabeça que ela é impossível.

É verdade que tudo isto acontece pela miserável prática, que quase toda a gente acha normal, de fazer confidências como “fonte” dos jornais e televisões. Esta prática gera cumplicidades, e impedimentos que depois introduzem mais silêncios e incomodidades no completo esclarecimento dos casos. Acaba por haver culpados de um lado e de outro e, no momento decisivo, eles calam-se para não se comprometerem e se protegerem. Como na corrupção.

Se é verdade que desde o director da PJ, a agentes, magistrados envolvidos nos processos, advogados de defesa, políticos, seja lá quem for que entende defender a sua causa, os seus interesses, ou valorizar-se junto de jornalistas, ou pura e simplesmente mostrar-se loquaz e incontinente sobre segredos que lhe dão a guardar, eu só acredito num estado e num governo que os ponha na rua no dia seguinte. Por justíssima causa.
 


PROBLEMAS QUE NÃO SÃO NOVOS: ESTAREMOS ERRADOS?

Em Outubro de 1953, o jornal Ler, criação de Francisco Lyon de Castro e obra de Fernando Piteira Santos, publicou este texto sem indicação de autor. O autor é certamente Piteira Santos, que sabia que aquele era o último número do jornal, proibido pela Censura e atacado com a maior das hostilidades pelo PCP, que lhe chamava o “jornal do SNI”.

"Porque se quis apenas ser um ‘jornal de Letras, Artes e Ciências’ – e só isso – procurou-se, com a objectividade de que os homens que vivem de pés fincados na terra são capazes, servir a cultura. Não se ignorava que as culturas se dividem e se opõem, mas cuidou-se, consciente e sinceramente, que, antes, antes de opção, o problema primacial e urgente era o de opor a noção de cultura e todos os valores culturais autênticos à deplorável subversão de valores, ao triunfo da ignorância, das capelinhas do elogio mútuo, dos grupos de escaladores da glória e à lepra de uma mistificação que grande parte da imprensa poderosa auxilia e que conduz, inevitavelmente, ao delírio do futebol, ao ópio do fado e a essas tristes exibições de mau gosto, incultura e boçalidade que são os programas radiopublicitários."

“Nós temos a ingenuidade de considerar que o depoimento do escritor Joaquim Paço d’Arcos sobre Holywood ou as lições do matemático Hugo Baptista Ribeiro na Universidade de Berkeley, na Califórnia, êxitos da fadista Amália Rodrigues nas boites de Nova Iorque; nós temos a ingenuidade de supor que o escritor Ferreira de Castro leva o nome de Portugal mais longe e mais alto do que o ‘matador’ Manuel do Santos; nós temos a ingenuidade de nos sentir mais diminuídos do concerto das nações pela percentagem de analfabetismo do que com o pesado score de uma derrota na Áustria. Estamos errados? Estaremos, realmente, a errar?"

“Mas comparem-se o 6300 exemplares da tiragem de Ler – número que os entendidos não consideravam provável e possível e número que nenhum jornal do género em Portugal atingiu – com o volume das tiragens dos jornais desportivos e ter-se-á uma imagem clara e significativa da situação que explica que no calor de uma campanha eleitoral o discurso do Prof. João Cid dos Santos ou a palestra do Eng. Cunha Leal assumam menor vulto nas discussões políticas do que os sucessos e os insucessos do Sporting, do Benfica ou Futebol Clube do Porto."

“E atente-se igualmente em que nos mesmo dias em que se explica a chamada ‘crise do livro’ por razões económicas, pelas dificuldades da classe média, pelo baixo nível dos trabalhadores, não há crise para a frequência aos espectáculos de futebol; e não se esqueça que o ritmo de venda dos romances de Aquilino Ribeiro, de Alves Redol ou de Francisco Costa é de longe excedido pelo ritmo de venda dos romances policiais traduzidos directamente do americano ou grosseiramente decalcados das edições brasileiras."

 



James Ensor
 


EARLY MORNING BLOGS 278

Le Chameau et les Bâtons flottants


Le premier qui vit un Chameau
S'enfuit à cet objet nouveau ;
Le second approcha ; le troisième osa faire
Un licou pour le Dromadaire.
L'accoutumance ainsi nous rend tout familier.
Ce qui nous paraissait terrible et singulier
S'apprivoise avec notre vue,
Quand ce vient à la continue.
Et puisque nous voici tombés sur ce sujet,
On avait mis des gens au guet,
Qui voyant sur les eaux de loin certain objet,
Ne purent s'empêcher de dire
Que c'était un puissant navire.
Quelques moments après, l'objet devient brûlot,
Et puis nacelle, et puis ballot,
Enfin bâtons flottants sur l'onde.
J'en sais beaucoup de par le monde
A qui ceci conviendrait bien :
De loin c'est quelque chose, et de près ce n'est rien.


(La Fontaine)

*

Bom dia!

9.8.04
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: O MAR

" (...) a propósito do poema de hoje no ABRUPTO: não sei que idade teria eu, mas tinha a suficiente para me lembrar da primeira vez que o meu avô paterno viu o mar. Lembro-me de que todos nós ficámos excitados com a ideia e olhávamos para ele com um ar emocionado. E ele, pasmado, limitou-se a dizer com uma voz sumida: “então é isto ...” e depois ficou para lá calado a olhar até o arrastarmos de volta para casa.

Eu achei que era um Grande Momento e por isso me lembro bem dele.

E lembrei-me, por associação de ideias, de que a minha Avó achava que tudo o que passava na televisão era mentira. E dava graças a Deus por isso senão “ já viste se esta gente toda morresse mesmo...”. E eu optei por concordar e ficar ali, serenamente, a ver mentiras com ela. É certo que tudo isto se passou já no século passado e eu, afinal, sou velha como o tempo. E o meu avô morreu há mais de vinte anos, com a primeira vez que viu o mar."

(RM)

*

"Não sei o que pareço ao mundo; aos meus próprios olhos sou apenas um rapaz que brinca na praia e se diverte, que de vez em quando encontra um seixo mais liso ou uma concha mais bonita do que o costume, enquanto que o grande oceano da verdade permanece por descobrir diante de mim." - Newton (enviado por S,)

*



"Esta fotografia, tirada na mais movimentada das duas praias que frequento no Verão (a sério!). Fica num dos poucos locais da costa ocidental portuguesa a Norte do estuário do Sado junto ao qual não passa qualquer estrada."

(José Carlos Santos)
 


MAU SINAL

Na economia daquilo que o Primeiro-Ministro considera necessário chamar à sua coordenação directa, não se incluíram os fogos, mas o “caso” (muito mal contado) das cassetes “roubadas” sobre o processo Casa Pia. A escolha é muito interessante, porque o Primeiro-ministro revela a sua peculiar sensibilidade a questões que envolvam “fontes”, boatos, inconfidências, polícias, magistrados e jornalistas. Mau sinal. Nada justifica que o Primeiro-Ministro se envolva directamente nesta questão. A matéria é quando muito para o Ministro da Justiça, embora, em bom rigor, deveria ser apenas com a justiça (houve um roubo ou não houve?) e não com o Governo. Envolver o Governo, a começar por cima, no processo Casa Pia, que é onde tudo vai acabar por desaguar, é um erro que Durão Barroso não cometeria.
Mau sinal.
 


A LER

Rui Tavares, "O que se passa com "artificial"?" no Barnabé.

Para a discussão, alguns exemplos de coisas absolutamente artificiais: a democracia, a cultura, a liberdade, o mercado, a “mão invisível”, as aspas, o socialismo, o tecnécio, a anestesia, Deus, o soneto, etc. (o etc. também é artificial).

Naturais? Talvez a segunda lei da termodinâmica, mas nem disso estou muito certo.

*

"Os sonhos são naturais ou artificiais?!!!"

(I.)

*

"Esta pergunta é natural ou artificial?"

(S.)

*

"Os meus exemplos favoritos de coisas absolutamente artificiais: as vacinas e os métodos anti-conceptivos. "

(José Carlos Santos)
 



Henri Roland de la Porte
 


EARLY MORNING BLOGS 277

La primera vez que vio la mar


¡Válate Dios, el charco, el que provocas
con verte a helar el alma de las venas,
Adán de tirubones y ballenas,
almejas viles y estupendas focas!
Cerúleo sorbedor por tantas bocas
de más naves que vio tu centro arenas;
teatro en quien oyó trágicas scenas,
sentada la Fortuna entre estas rocas.

Tú, que enseñaste al Draque, a Magallanes
lo más estrecho de tu campo oblico,
a pesar de sirenas y caimanes,

en España nací con solo el pico,
cansado estoy de trajinar desvanes,
dime, ¿por dónde van a Puerto Rico?


(Lope de Vega)

*

Bom dia!

8.8.04
 


COISAS VISTAS NO ESPELHO DO MUNDO

Parabéns à SIC (penso não me enganar e ter sido a SIC) por aquela visita guiada comparativa aos locais em Santarém e Golegã, feita pelos autarcas no papel de cicerones da televisão: “aqui fica o gabinete do senhor secretário de Estado”, “aqui ficam os assessores”, “aqui está a escadaria monumental que permite um acesso directo ao senhor secretário de Estado”. É espantoso como os autarcas se prestam a estas cenas ridículas, principalmente o autarca de Santarém, preterido na escolha, trazido de umas merecidas férias douradas para a turbulência de explicar porque é que lhe tiraram o brinquedo das casinhas do Governo da sua terra.

Há um aspecto de serviço público informativo na reportagem: ver como as autarquias gastam dinheiro em obras inúteis, e subaproveitadas. Os dois autarcas disseram-nos, na ponta dos seus dedos indicadores, que têm imensos espaços vazios que, pelos vistos, foram construídos ou reconstruídos sem objectivo definido, porque senão estavam cheios. Caso contrário, não nos explicaram o que é que vai sair dos espaços para entrar ocasionalmente, muito ocasionalmente, o “senhor Secretario de Estado”. (Suspeito que, na Golegã, a julgar pelo que se via numa sala, irá sair o arquivo histórico e um fundo antigo de biblioteca…Para onde irá?). E vimos aquelas gigantescas instalações do CNEMA (Centro Nacional de Exposições e Mercados Agrícolas) em Santarém, quase todo o ano vazias, e onde já várias vezes fui e sempre vi menos de 10% do espaço a funcionar, com excepção da Feira da Agricultura, o pó acumulando-se no resto (não vale a pena dizerem-me porque eu sei que as obras são do período cavaquista). Talvez, uma vez por ano, aquele anfiteatro magnífico, encha a metade, numa capital de distrito que não tem uma verdadeira livraria, apesar de ter universidade…
 


EARLY MORNING BLOGS 276

First Fig


MY CANDLE burns at both ends;
It will not last the night;
But ah, my foes, and oh, my friends--
It gives a lovely light!


(Edna St.Vincent Millay)

*

Bom dia!

7.8.04
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: O CHÃO



Este é o chão no fundo da cratera Endurance, com uma cor falsa para o vermos melhor. A "Oportunidade" olha para este chão de areia e pergunta-se: acabarei ali?
   


ESTADO DO III VOLUME DA BIOGRAFIA DE ÁLVARO CUNHAL

São-me pedidas informações sobre o “estado” do III volume da biografia política de Cunhal, sobre a qual tenho trabalhado nos últimos anos. Aqui segue uma lista provisória dos títulos dos capítulos, que pode dar uma ideia do conteúdo final do volume. Os capítulos 1, 2, 3, 4, 5, 6, 11, e 15 estão praticamente encerrados. Os outros estão em fases distintas de acabamento e os capítulos 13 e 14 bastante atrasados.

ÁLVARO CUNHAL – O PRESO (1949-1960)

(todos os títulos são também provisórios)

1 – O choque: da prisão ao julgamento

2 - Os anos mais duros (1949-52): os expulsos, os “traidores” e os mortos

3 – O PCP sozinho

4 - Cunhal na Penitenciária: “a estrela de seis pontas”

5 - Estratégias contra a solidão: ler , escrever e desenhar

6.- A purga dos intelectuais

7 - A continuação das purgas

8 - Fogaça e Cunhal à distância

9 - Cunhal em Peniche (1956-60)

10 - O PCP à luz de Krutchov e o combate ao “sectarismo”

11 - V Congresso (1957)

12.- A emergência da questão colonial

13 - O “furacão” Delgado

14 - Depois de Delgado

15. - A fuga de Peniche


Como aconteceu já com os outros volumes, cada período cronológico da biografia tem problemas próprios. No caso destes anos existem dois tipos de problemas: um diz respeito ao processo narrativo e pode ser resumido nesta questão – como é que se escreve um texto sobre um homem que está preso e tem os seus gestos rigidamente controlados e repetitivos? Trinta páginas chegam para descrever o quotidiano de um preso e há que encontrar mecanismos para ligar essa aparente (e real) monotonia de gestos com o fio de uma “vida”. O segundo problema é que estes anos 1949 – 1960 são “malditos” na história oficial do PCP por várias razões contraditórias – o “sectarismo”, primeiro, e depois o que veio a ser conhecido como o “desvio anarco-liberal” e por isso são muito pouco conhecidos e estudados. Mais importante: a memorialistica em que o PCP é fértil, ilude quase completamente a política neste período, concentrando-se nas “lutas” e na repressão, o que dificulta muito saber-se o que realmente se passou. Acresce que, enquanto nos anos trinta, havia uma direcção relativamente concentrada e com uma cadeia de comando facilmente definida, os anos cinquenta são os mais confusos, entre as purgas, expulsões e decisões contraditórias.
 



John Frederick Peto, The Poor Man Store
 


EARLY MORNING BLOGS 275

There was an Old Man with a beard,
Who said, "It is just as I feared!--
Two Owls and a Hen,
Four Larks and a Wren,
Have all built their nests in my beard!"

(Edward Lear)

*

Bom dia!


6.8.04
 


POEIRA DE 6 DE AGOSTO

Hoje, há quarenta e dois anos, Noel Coward escreveu no seu diário uma nota sobre o suicídio ontem de Marilyn Monroe:

"Marilyn Monroe committed suicide yesterday. The usual overdose. Poor silly creature. I am convinced that what brought her to that final foolish gesture was a steady diet of intellectual pretentiousness pumped into her over the years by Arthur Miller, and `The Method'. She was, to begin with, a fairly normal little sexpot with exploitable curves, and a certain natural talent".

Depois estragaram-na.

*

"Não vejo, não consigo ver, qual o interesse em citar um tipo machista e coward."

(EM)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES / OBJECTOS EM EXTINÇÃO: "LEMBRETE"

"Lembrete pertence a um interessante conjunto de palavras e ou expressões que a minha avó (de Viana do Castelo) usava e o meu Pai ainda usa (e até eu) mas que caíram em desuso. Algumas eram com certeza quase regionalismos outras puro arcaismo. Fazem parte desse grupo: pêco, pespego, salvo erro, badejo (os galegos ainda têm badejo), e tantas outras que não me vêm agora à cabeça."

(JPC)

*

"Em relação aos objectos em extinção, lembrete está bastante divulgado pelo menos entre aqueles que têm um telemóvel da Nokia com a linguagem em português. Na parte da agenda, quando escolhemos um dia aparece entre outras opções o lembrete. Em relação ao salvo-erro, costumo ouvi-la de vez em quando. Uma que a minha avó diz que não ouço ninguém dizer é "badagaio"(não sei se é assim), do estilo "qualquer dia dá-me o badagaio" : )"

(Hugo Filipe)

*

"Uns Kms a Sul : ......"o jetas",...."cor de burro quando foge",...."bronhóis com água da mina",......"ir ás mércolas"......."passou-me uma nuvem"..........."mudam o nome aos bois".......etc."

(C.Indico)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: A SOCIEDADE DA ENTREVISTA

"Pois, é por isso que há quem diga que vivemos na "sociedade da entrevista". A sociedade em que o eu se torna objecto de narração pessoal, em que a tecnologia confessional se estende dos rituais religiosos aos procedimentos das ciências sociais e humanas e depois ao trabalho dos mass media, sempre na busca da desocultação do sentimento privado autêntico.
Paradoxalmente, assim se engendram modos publicamente partilhados de sentir e exprimir sentimentos de forma socialmente aceitável. De tal forma que o próprio espectáculo se banaliza e esvazia.
"

(Tiago Neves)
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: MONTINHOS



O “Espírito” tem frio. Está Inverno. Tem pouco Sol em cada sol. Tem que se colocar a jeito para receber o pouco calor que recebe. Mas viu um montinho. Um montinho marciano. Na sua infinita memória lembrou-se:

Seus seios altos parecem
(Se ela estivesse deitada)
Dois montinhos que amanhecem
Sem Ter que haver madrugada.


O “Espírito” já tem menos frio. Se se virar para Norte, a terra das oportunidades, vai conseguir os seus 380 watts."Sem Ter que haver madrugada."
 



Gustave Caillebotte
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: "ISTO PARECE O FORUM DA TSF"


"Hoje, ao ler a quantidade de posts de leitores do abrupto, não resisti: isto parece um “fórum TSF” online."

(Jorge Machado)

 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: AS UNIVERSIDADES ESTÃO A TENTAR FAZER O QUE DEVIA SER FEITO NO ENSINO SECUNDÁRIO (2ª série)

"Também eu sofro com o Ensino. Sou adolescente, estudante do Secundário. Todos os dias observo a ignorância dos meus colegas. Não que eu seja excepcionalmente inteligente, mas considero que, ter amigos do mesmo ano (11º)e idade, que ignoram a existência de Viriato, a fórmula química da água, é absolutamente inaceitável. Todavia, é assim que o nosso país pretende alcançar o pelotão da frente da União Europeia. Com o facilitismo, com a extrema borucracia que impede os professores de reprovar os seus educandos. Não é com mais licenciados que nos vamos desenvolver. É necessária qualidade, em vez de quantidade. Converter o Secundário em Ensino obrigatório é dar mais um passo rumo ao facilitismo.
Sinceramente, não sei onde vamos parar. Só espero estar preparado para o futuro que me espera na Universidade... Ou talvez seja melhor pensar primeiro nos exames nacionais. Desculpe o desabafo. Não estava previsto.
"

(Viriato O Porta-Bandeira )

*

"1-Nunca consegui perceber porquê que depois do 25/4/74, rebentaram com o ensino liceal, tendo-se baixado intencionalemte o nível e a quallidade do ensino.
2-Nunca consegui perceber porque rebentaram também com o ensino técnico ( o Cavaco Silva, por ex. vem do ensino técnico);
3-Nos trinta anos de Democracia, os ministros da Educação foram quase sempre do PSD.
4-Nunca consegui perceber como é que o Bagão Félix, na altura em que foi secretário de estado da formação profissional ( os anos doirados dos fundos europeus), não foi capaz de compreender que os dinheiros do FSE eram para aplicar no ensino técnico e jamais para oferecer aos habituais beneficiaários do OGE.
5-Jamais serei capaz de compreender a cultura nacional do facilitismo.
6-Considero um crime histórico de proporções catastróficas, aquela brincadeira (já na altura, evidente à saciedade) da criação das universidades privadas, ocorrida sob o período dourado do cavaquismo.
7-Finalmente: como sobreviver aos póximos vinte anos de declínio, ainda que haja coragem para pôr o ensino ao serviço dos estudantes?
"

(Maria Teresa Carvalho)

*

"Na universidade privada onde dou aulas". Não diz "na universidade privada onde sou professor", dá aulas, assim vai o ensino "superior"...

(Manuel Rocha Carneiro)

*

"Na sequência do que foi escrito a cerca do estado do ensino universitário em Portugal e da eloquente defesa do sistema feita pelo cibernauta, continuo a afirmar que a forma como o ensino, seja ele primário, secundário ou superior, é encarado e levado a cabo neste país por professores, alunos, pais, enfim, por todos os intervenientes no assunto é fruto direto da forma como o Governo encara a Educação, isto é, como assunto obviamente não prioritário ! A falta de exigência e de responsabilização passa-se a todos os níveis, embora, a meu ver, seja uma atitude fixada desde tenra idade, desde os bancos escolares, copiada dos exemplos que surgem todos os dias, de todos os lados e perpetuados "ad eternum"! Infelizmente enquanto não se ultrapassar essa necessidade de aparecer a qualquer custo, fazendo obras grandiosas em vez de dar formação e salários dignos aos professores para que possam cumprir suas funções de forma eficaz, será muito difícil alcançar um desenvolvimento digno do termo."

(Luiza Rosado)
 


EARLY MORNING BLOGS 274

Judeu errante


Hei de seguir eternamente a estrada
Que há tanto tempo venho já seguindo
Sem me importar com a noite que vem vindo
Como uma pavorosa alma penada.

Sem fé na redenção, sem crença em nada
Fugitivo que a dor vem perseguindo
Busco eu também a paz onde, sorrindo
Será também minha alma uma alvorada.

Onde é ela? Talvez nem mesmo exista...
Ninguém sabe onde fica... Certo, dista
Muitas e muitas léguas de caminho…

Não importa. O que importa é ir em fora
Pela ilusão de procurar a aurora
Sofrendo a dor de caminhar sozinho.


(Vinicius de Moraes, cortesia de DBH do No Quinto dos Impérios)

*

Bom dia!

5.8.04
 


EARLY MORNING BLOGS 273

Spring is like a perhaps hand

III


Spring is like a perhaps hand
(which comes carefully
out of Nowhere)arranging
a window,into which people look(while
people stare
arranging and changing placing
carefully there a strange
thing and a known thing here)and

changing everything carefully

spring is like a perhaps
Hand in a window
(carefully to
and fro moving New and
Old things,while
people stare carefully
moving a perhaps
fraction of flower here placing
an inch of air there)and

without breaking anything.


(e.e.cummings)

*

Bom dia!

4.8.04
 


INTENDÊNCIA

Actualizado O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: AS UNIVERSIDADES ESTÃO A TENTAR FAZER O QUE DEVIA SER FEITO NO ENSINO SECUNDÁRIO

e o último BIBLIOFILIA.
 


EARLY MORNING BLOGS 272

Un deux trois


Un deux trois
J'irai dans les bois
Quatre cinq six
Cueillir des cerises
Sept huit neuf
Dans mon panier neuf
Dix onze douze
Elles seront toutes rouges.


("Comptine"
a

ni
ma
ná,ná,ná,ná )

*

Bom dia!
 


O ESTADO DA NAÇÃO


Jim Dine

3.8.04
 


SEMPRE O MESMO ESPECTÁCULO, TODOS OS DIAS, EM TODAS AS TELEVISÕES

Anteontem o futebol, ontem os incêndios, hoje as derrocadas. Já repararam como tudo é tão parecido? Como tudo ocupa o mesmo lugar nos telejornais? Como uma coisa sucede à outra, ocupando o tenebroso vazio dos dias em que não há imagens “fortes”.

Na televisão todos estes eventos são-nos dados como espectáculos, usando mecanismos narrativos e fílmicos semelhantes, com actores idênticos – a tríade do Sujeito (os jogadores, o seleccionador, os incendiários invisíveis, os bombeiros, os “responsáveis”), da Sorte /Azar, e dos Espectadores Participantes (o “povo”, do futebol, das vítimas dos incêndios, dos habitantes, “levantado do chão” pelos jornalistas demiurgos).

O papel de cada um é rigidamente estabelecido: o “povo” emociona-se com as bandeirinhas, ou chora desesperado a sua desgraça, ou grita insultos contra “eles”. O “povo” na televisão só tem direito à emoção, nunca à razão. Os Sujeitos seguem a regra portuguesa, hoje génios e heróis, amanhã bestas, dependendo da Sorte /Azar, o lugar do deus ex-machina na narrativa. Quem manda? Os jornalistas, senhores da palavra, invocadores das iras e alegrias do “povo”, os que decidem se as imagens são belas ou repulsivas, escolhem a música de fundo, os planos lentos do drama, tudo. Os mestres do espectáculo.
 


HOMENS / MULHERES

O editorial do José Manuel Fernandes de hoje (que não está em linha) é pelo menos, para não dizer outra coisa, um pouco bizarro. José Manuel Fernandes fala das diferenças entre os homens e as mulheres, oscilando entre o biológico e o cultural, manifestadas nos comportamentos sexuais. No exemplo com que abre o editorial, procura mostrar (demonstrar) que as mulheres são menos promíscuas do que os homens. Tudo isto o leva a louvar a “coerência “ da posição do Papa sobre a condição feminina, pilar da família.

A mim parece-me que se fosse verdade o que lá é dito, a Igreja teria então cometido um erro de proporções históricas fazendo dos homens (dos padres) os pilares da sua actuação, em vez das mulheres, muito mais fáceis de levar ao e de conservar o celibato, e de manter a “família” cristã unida… O conservadorismo nos costumes prega-nos muitas partidas.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: AS UNIVERSIDADES ESTÃO A TENTAR FAZER O QUE DEVIA SER FEITO NO ENSINO SECUNDÁRIO (Actualizado)

"O contribuinte Aires Almeida (1.8.04) queixa-se ("com o tipo de ensino superior que temos em Portugal, nem que tivéssemos o dobro de licenciados de outros países europeus nos conseguiríamos aproximar deles"), com alguma razão, da falta de qualidade do ensino superior em Portugal. Só que nós estamos perante um dilema: se tivéssemos em Portugal o grau de exigência que se deve esperar de uma universidade, o número de alunos que teríamos não seria muito superior ao que tínhamos em 1973.

Na universidade privada onde dou aulas apenas cerca de 10% dos meus alunos estão à altura dessas exigências. O resto arrasta-se penosamente, ou nem sequer lá devia estar. Só que é este arremedo de ensino superior que pode tirar os portugueses do analfabetismo funcional. Por muito maus que os alunos sejam, saem das universidades a saber mais do que sabiam quando para lá entraram, e por vezes até começam a acordar para a cultura, o conhecimento e o rigor intelectual. Os filhos destes, quando chegarem à universidade, já estarão mais perto de poderem aproveitar as oportunidades do ensino superior, e poder-se-á exigir-lhes o que não foi possível exigir aos pais. Não esqueçamos que a maioria dos alunos universitários são oriundos de famílias onde nunca houve antes licenciados. No fundo as universidades estão hoje a tentar fazer o que devia ter sido feito no ensino obrigatório e no secundário. Em vez de criticarmos o ensino superior, devíamos tentar compreender o que está na origem dos problemas apontados, e agradecer o trabalho mais do que ingrato de aqueles que tentam ensinar a esse nível.

Dentro de uma ou duas gerações julgo que poderemos ter universidades tão exigentes como as estrangeiras. Entretanto lutamos por ultrapassar as consequências de um subdesenvolvimento multissecular. Não é uma tarefa que possa ser realizada de um dia para o outro, pelo que não vale a pena atirar-nos pedras. Exijam, sim, rigor e competência ao ensino obrigatório e ao ensino secundário, e talvez assim consigamos acelerar um pouco este processo de desenvolvimento.
"

(Nuno Cardoso da Silva)


*

"Li o texto que publicou no seu Abrupto acerca do que se passa no ensino superior nos dias de hoje da autoria de Nuno Cardoso da Silva e não posso deixar de expressar a minha total discordância pelo que ali está escrito. Um professor dizer que só 10% dos alunos é que mereciam estar no estabelecimento de ensino superior onde dá aulas é, além do mais, uma falta de respeito, além de se desconhecer que tipo de estudo objectivo dá ao autor do texto qualquer base científica para aquela afirmação grave. Mas sempre será de dizer que o insucesso de um aluno, ou mais grave a incapacidade de 90% de alunos que alegadamente se arrastam penosamente ou nem sequer lá deveriam estar, é um enorme atestado de incompetência a quem ensina. Ou será que os professores são meros despachantes administrativos? Não lhes cabe ajudar, incentivar, estimular o aluno? O insucesso de um aluno não é também um insucesso do professor?
Afirmar que se as universidades tivessem o devido grau de exigência teríamos o mesmo número de alunos de 1973, exala um lamentável saudosismo do antigamente. Um saudosismo fascista que se denuncia pelo facto daquele autor fazer referência que muitos alunos provêm de famílias onde não há licenciados. E depois? Em 1973 não havia alunos oriundos de famílias operárias? Claro que havia. Em plena democracia fazer a defesa encapuzada do elitismo selectivo é no mínimo de um anacronismo lamentável.
O ensino superior carece de um ensino obrigatório e de um ensino básico melhores, disso não há dúvida. Comece-se por aí. Agora não venham falar em percentagens de empirismo viciado ou em enquadramentos sociológicos descabidos. O texto em causa é um insulto às conquistas da democracia e ao acesso à ciência e ao conhecimento que a mesma possibilitou. Por muito que cause saudades os tempos em que se fazia do analfabetismo e da ignorância os pilares fundamentais de interesses instituídos.
Por último quero dizer o seguinte: tenho formação académica e sei bem a exigência a que fui sujeito, juntamente com muito colegas meus, quer em termos programáticos quer em termos de avaliação. Não se queira dar a ideia que em Portugal reina a balda e a anarquia. O que reina, sim, é a contínua divergência entre o ensino (básico, secundário e superior) e o mercado de trabalho. O que reina são a falta de meios com que professores e alunos se deparam dia-a-dia nas universidades. O que reina é a falta de apoio a quem quer cá ficar no campo da investigação.
Os problemas são bem visíveis, não se tente fazer fumo.
"

(Carlos Bote)


*

"O Sr. Carlos Bote pode revoltar-se contra as opiniões do Sr. Nuno Cardoso da Silva. Mas não pode revoltar-se contra a constatação que ele faz, de que apenas 10% dos alunos têm capacidades (e penso que não fala de capacidades inatas, genéticas) para estar no ensino, mesmo que a a afirmação não seja sustentada por nenhum estudo científico.
Licenciei-me há 4 anos no Técnico. Penso que o meu curso foi bastante exigente, tive de me superar sucessivamente e fui melhorando a performance ao longo do curso, que acabei com uma boa média. É claro para mim que a minha preparação (em termos de rigor, ritmo de trabalho e, menos importante, conhecimentos) era à partida insuficiente.
Dou agora aulas noutra universidade pública (menos exigente que a minha). Os alunos que ensino estão ainda mais incapazes do que eu era. A grande diferença é que eu tinha umas luzes de como pegar num livro e aprender e de como estar numa aula, sentado, sem perceber o que o professor dizia mas a tentar. Esse esforço, sempre frustrante, é impensável para os meus alunos (que me reconhecem bom domínio da matéria e capacidade de a transmitir).
Escapei por um ano às primeiras reformas do ensino secundário. Será aqui que está a diferença?
"

(Ricardo Resende)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: O TRIUNFO DO TRIVIAL

"Do NYTimes de 30 de Julho de 2004, transcrevo Paul Krugman:

Under the headline "Voters Want Specifics from Kerry", The Washington Post recently quoted a voter demanding that John Kerry and John Edwards talk about "what they plan on doing about health care for middle-income or lower-income people. I have to face the fact that I will never be able to have health insurance, the way things are now. And these millionaires dont seem to address that".

Mr. Kerry proposes spending $650 billion extending health insurance to lower-and-middle-income families. Whether you approve or not, you can´t say he hasn´t addressed the issue. Why hasn´t this voter heard about it?

Well. I´ve been reading 60 days´worth of transcripts from the places the four out of five Americans cite as where they usually get their news: the major cable and broadcast TV networks. Never mind the details - I couldn´t even find a clear statement that Mr. Kerry wants to roll back recent high-income tax cuts and use the money to cover most of the uninsured. When reports mentioned the Kerry plan at all, it was usually horse race analisys - how it´s playing, not what´s in it.

(...)

Somewhere along the line, TV news stopped reporting on candidates´policies, and turned instead to trivia about that supposedly reveal their personalities. We hear about Mr. Kerry haircuts, not his health care proposals. We hear about George Bush´s brush cutting, not his environmental policies.

(...) A Columbia Journalism Review Web site called campaigndesk.org, says its analisys " reveals a press prone to needlessly introduce Senators Kerry and Edwards and Kerry´s wife, Teresa Heinz Kerry, as millionaires or billionaires, without similar labels for President Bush or Vice President Cheney."

As the site points out, the Bush campaign has been "hammering away with talking points casting Kerry as out of the mainstream because of his wealth, hoping to influence press coverage (,...). Republicans, of all people, are practicing the politics of envy, and the media obediently go along.

In short, tht triumph of the trivial is not a trivial matter. (...)."

Por este caminho a Democracia faz-se substituir pela mediocracia."


(H. Preto)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: ONDE NOS QUEREM COLOCAR

"
"A foto foi tirada na cidade onde habito praticamente desde a nascença, Guimarães, e pretende simbolizar as peças de um jogo que nós somos, manipulados, nas linhas e colunas onde nos querem colocar. "Nós não somos aquilo que somos, mas o que os outros pensam de nós."

(Paulo Pinto)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES. A OFERTA E A PROCURA NOS INCÊNDIOS

"Já há muito tempo que os incêndios são um negócio que envolve montantes elevados e o mais diverso tipo de interesses. O Estado, todo ele (Central, semi-central, autárquico, empresas públicas, institutos públicos, protecções civis), como sempre é o "pivot" de tudo.O dinheiro que o Estado arrecada e gasta é conseguido a muito baixo custo, através de impostos.

Ora, o Estado, há três décadas, que se convenceu (ou foi convencido) que o problema dos incêndios se apaga atirando para cima deles dinheiro, esquecendo que as notas são de papel e quanto mais notas se atiram, mais os incêndios crescem. É A LEI DA OFERTA E DA PROCURA.Quanto mais dinheiro há para combater os incêndios e tudo o que os rodeia, mais fogos aparecem e aparecerão!

Os dados da protecção civil não deixam dúvidas: Na década de 70, o incêndio médio consumia 4 hectares de floresta! Começa o dinheiro do Estado para os fogos! Na década de 80, o incêndio médio passa para 40 hectares de floresta! É preciso mais dinheiro! Faltam meios! Na década de 90, o incêndio médio passa para 400 hectares! Mais, mais, mais dinheiro, aviões, helicópteros, indemnizações .... Actualmente, início do século XXI, o incêndio médio passou para 4 000 hectares!!!

Será preciso extrair qualquer conclusão! A minha pequena vila da Beira Litoral tinha há 30 anos, 3 carros de bombeiros. Hoje tem 30 e sofisticadíssimos, nunca houve tanto incêndio como actualmente e as queixas de meios insuficientes são permanentes!!! Mal se iniciou o verão deste ano e perante o primeiro incêndio pequeno, o autarca local veio logo exigir que o Estado fosse rápido a pagar as indemnizações para o seu concelho e, para isso, propunha que a disponibilização desses dinheiros estivesse isenta de qualquer formalidade ou processo burocrático. Venha o dinheiro e já!!! Os incêndios são altamente rentáveis para muita gente!!!

O espectáculo das televisões é extraordinário!!! Dezenas de jornalistas, eqUipamentos, materiais, helicóteros alugados a bom preço, nos locais para fazer a reportagem dos fogos, como da Volta a Portugal se tratasse! E, de facto, tal como os ciclistas lá aparecem como previsto, também os incêndios não defraudam as expectativas da indústria dos "media" lá comparecendo, à hora certa, para gáudio do negócio jornalístico!

As TVs estão quase a ganhar coragem para passar a incluir nas reportagens dos incêndios: "Vamos ligar, em directo ao incêndio da Serra do Caldeirão, com o patrocínio do Banco ... e, de seguida, vamos ver como está o fogo de Viana do Castelo com o patrocínio da Cerveja ... Fique connosco, a TV que melhor cobertura fez dos incêndios em 2003, de acordo com a Markteste!!!"


(João Augusto)
 


CONSULTA OBRIGATÓRIA

Página Eu Sou Astrónomo, de iniciativa de Pedro Guinote. E a Astronomy Picture of the Day, que, à primeira vista, não vi incluída nas muitas ligações da página portuguesa.
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: UM SOCIAL DEMOCRATA...

"Gostei imenso do discurso do Dr. Miguel Veiga. Eu não fazia a mínima ideia que alguém activo no PSD ainda acreditava na social democracia! Quero dizer, que alguém no PSD acreditava que as pessoas deviam ter todas direito à sua dignidade, ou que alguém no PSD ainda se atrevia a acreditar nas políticas sociais e fiscais que o PSD defendia quando eu fazia campanha pela AD: erradicar a pobreza, quebrar o ciclo da miséria, educar todos, restaurar a auto-estima dos mais pobres e ensiná-los a ganhar dinheiro, etc. Ficamos a saber que ainda há UM social democrata neste PSD conservador, católico, liberal (social liberal), nacionalista e anti-intelectual, onde os pobres não contam e os ministros falam em baixar o salário mínimo para “melhorar a economia” e criar mais “empregos”.

Desculpe-me que lhe diga, mas não creio que o Dr. Miguel Veiga faça uma grande diferença neste PSD que nos todos vemos como uma ala moderada do PP. Mais um Miguel Veiga, menos um Miguel Veiga... vamos continuar a falar da localização do casino e a dívida externa vai subir para 250 billiões de dólares. No fim do dia, tudo considerado, eu acho que o PSD (e o CDS do Prof. Freitas do Amaral) eram largamente partidos de pessoas que acreditavam na democracia, que queriam ter uma palavra a dizer em relação aos seus futuros. Claro que estavam cheios de fascistas e de imbecis, e de snobs, e de arrivistas que achavam que iam fazer carreira a lamber as botas aos ricos e aos poderosos. Mas este PSD e este PP são partidos de gente que anda à procura de um líder que “saiba” o que é melhor para eles, que lhes meta medo e depois os prometa defender, que os roube e lhes diga que “dos pobres é o reino dos céus”, que lhes dê procissões, milagres e canonizações em Fátima, e um Big Show SIC permanente na comunicação social. Pode ser triste admiti-lo, mas há que dizê-lo: o Dr. Santana Lopes e o candidato que melhor representa o PSD hoje.
"

(Filipe Vieira de Castro)
 


BIBLIOFILIA

Nancy Schoenberger, Dangerous Muse. A Life of Caroline Blackwood, Londres, Weidenfield, 2001

Uma história de mulher: um pouco das Mitford (um blend das várias irmãs), um pouco de Lou Andreas Salomé, um pouco de harpia, um pouco de Plath, muita bebida, maridos pouco recomendáveis (Lucien Freud, Robert Lowell e outro), decadência, literatura a mais.

Quando se é muito belo(a) na juventude, e tudo pára à volta, os estragos da vida são muito visíveis e dificilmente se envelhece bem, se é que isso existe. As fotografias do livro mostram a deterioração da beleza com grande crueldade e percebe-se como Lady Caroline e os seus homens contribuíram activamente para o resultado. Freud, que via figuras e não abstracções nas suas pinturas, percebeu-o muito bem, retratando-a, em Hotel Bedroom de 1954, feia e velha quando ela era ainda muito bela.


*

"Envelhecer bem ou mal é um daqueles conceitos que me exasperam. Não se envelhece bem nem mal. Envelhece-se. Bem e mal. E assim assim. Conforme os dias. É como crescer (aliás, em bom rigor, são a mesma coisa.)

A ideia do “envelhecer bem” é um conceito absolutamente mundano, dos muitos que por ai pululam, que nos fazem prisioneiros do vazio. (e dos cremes anti rugas). Lembrei-me agora de um detalhe de há uns anos (...) que me deixou gelada. Um grande amigo meu morreu. No velório, alguém me perguntou: “Já o viu? Está muito bem.” Claro que não o vi. Nem queria ver. Bem? Não. Morto. Bem e mal."


(RM)
 


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: BOA VIAGEM, MENSAGEIRO









para o planeta de ferro, com asas nos pés, o comerciante, o ladrão, o portador das boas notícias, o veloz, o enganador, o atleta, o deus dos rebanhos que também a nós pastoreias, as “tribos dos homens mortais”, através da “negra noite”. Hermes Promakhos, campeão, Hermes Trikephalos, que nos guias nas estradas, Hermes Dolios, com todas as habilidades, Hermes Epimêlios, que proteges os rebanhos. Nosso Mercúrio, dos gentios.
 


EARLY MORNING BLOGS 271

A la noche


Noche, fabricadora de embelecos,
loca, imaginativa, quimerista,
que muestras al que en ti su bien conquista
los montes llanos y los mares secos;
habitadora de cerebros huecos,
mecánica, filósofa, alquimista,
encubridora vil, lince sin vista,
espantadiza de tus mismos ecos:

la sombra, el miedo, el mal se te atribuya,
solícita, poeta, enferma, fría,
manos del bravo y pies del fugitivo.

Que vele o duerma, media vida es tuya:
si velo, te lo pago con el día,
y si duermo, no siento lo que vivo.


(Lope da Vega)

*

Bom dia!

2.8.04
 



Alfons Walde
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: HEPATITE C

"Sou um portador do vírus da Hepatite C, uma doença grave, que ameaça tornar-se numa das maiores epidemias da história da humanidade. Descobri isso há cerca de 3 anos e meio e de lá pra cá tenho travado uma grande batalha para obter informações e apoio, para além de já me ter submetido a dois prolongados ( o primeiro por 8 meses e o segundo por 1 ano ) tratamentos à base de Interferão e Ribavirina, com imensos e penosos efeitos colaterais e mesmo sociais ( a nivel profissional e não só ).

Há muito pouca informação disponivel e nenhuma Associação de apoio aos portadores desta doença que pode ser mortal ou tornar-se crónica. Estima-se que em Portugal já existam cerca de 125.000 portadores, embora sómente 10% o saibam. A Hepatite C é uma doença assintomática e contagiosa. Seu vírus ( HCV ) transmite-se básicamente pelo sangue contaminado e pode permanecer até trinta anos no corpo humano. Por isso a maioria dos infectados ( para além dos chamados grupos de risco ) está nas faixa dos cinquenta anos, ou seja : foram contaminados antes do apertado controlo do sangue que se deu depois do surgimento da SIDA. Em Portugal, por exemplo, sabe-se que os ex-combatentes e mulheres que tenham recorrido à cesariana antes do surgimento da SIDA, são potenciais portadores do vírus.

Por isso tomei a iniciativa de criar um Blog que pretende ser um ponto de apoio e fonte de informação aos demais portadores. Ocorre que é muito dificil divulgá-lo. Venho solicitar, se possível, a sua inestimável colaboração para a divulgação deste Blog."

(Almeida Neto)
 


ELOGIO DE MIGUEL VEIGA

As intervenções que Miguel Veiga fez nos Conselhos Nacionais do PSD, em Julho, são dois documentos únicos na nossa vida partidária actual. Tenho pena que o seu texto integral não seja conhecido e, com autorização do seu autor, publiquei-as no VERITAS FILIA TEMPORIS. Ficam para a nossa história política. Não conheço paralelo em nenhum outro partido, nos dias de hoje, de um seu responsável eleito manifestar a sua discordância face a um quase unanimismo (e, nesses dias, um unanimismo agressivo, como se vê nos momentos em que foi interrompido), usando de uma clara argumentação política que separa todas as águas. Não há nessas intervenções nenhuma retórica: Miguel Veiga diz a Durão Barroso e a Santana Lopes, e aos conselheiros do PSD, o que deve ser dito, de forma clara e límpida, e com uma acutilância política que não deixa nenhuma pedra por virar.

Claro que não são soundbites, e ninguém se deu ao trabalho de as relatar em função da sua relevância, nem os jornalistas dão importância a estes discursos mais elaborados e argumentados. Veiga é tratado com displicência, quando não no tom insultuoso de Meneses, por jornalistas que se irritam por ele falar de coisas que não cabem em duas frases e que lhes parecem “complicadas”. Como alguns deles medem os políticos pela sua ambição face aos cargos e ao “protagonismo”, e como Veiga não tem nenhuma, não conta. Mas, ao cumprir, em condições difíceis, a sua obrigação política e moral, restituiu ao PSD a honradez dos homens do Porto que, como Sá Carneiro, o fizeram. Nele, o sopro genético que fez o PSD, no pensamento e na acção de Sá Carneiro, vivem pelos princípios, pelo pensamento e pela política, e não por uma mimética fúnebre assente em arroubos coreográficos.
 


NOLI ME TANGERE

O papel da “cultura” como instrumento de propaganda do Estado moderno (e dos seus governos) é essencial no paradigma Malraux – Lang, de que o actual Primeiro-Ministro já se proclamou discípulo no passado. A “cultura” é, junto com o desporto e o espectáculo urbano, uma das formas modernas do circo que se substitui ao pão. Será ele, o Primeiro-Ministro, o verdadeiro “ministro da cultura”, e aí pode desenvolver, com pequenos custos, operações de propaganda usando esse meio intangível, fortemente dependente do Estado e muito venal.

É uma área onde se move bem e onde sabe como actuar, onde sabe como fazer operações pontuais de sucesso garantido. (Outro ministro que também aprendeu a fazê-lo foi Morais Sarmento, envolvendo na reprogramação da “2”, um canal péssimo sob todos os pontos de vista, um grupo de intelectuais, os quais depois ficaram naturalmente constrangidos ou silenciosos na sua crítica ao produto final). É só contar os dias até ver que intelectual (ou artista) da esquerda vai aceitar colaborar com o governo (melhor, com o seu Primeiro-Ministro), calando um sector crítico e suscitando elogios pela escolha.

*

"O Dr. Pacheco Pereira gosta de fingir que ignora certas coisas. Pretende fazer passar a ideia de que as ideias sobre a cultura de André Malraux, de Jack Lang, e, no caso português, de Manuel Maria Carrilho, são em tudo idênticas às ideias de Pedro Santana Lopes. Mas sabe que existem diferenças abissais entre eles.
Os três primeiros são (ou foram) pessoas extremamente empenhadas na cultura e nas artes, não só na vertente patrimonial, mas também na vertente de produção contemporânea, e que, por isso, têm (ou tiveram) um projecto cultural que passa(va) pelo apoio aos agentes culturais, com vista a promover a criação. Não vejo como consegue o Dr. Pacheco Pereira pôr em causa a honestidade das suas opções políticas. Poderá não concordar com as suas ideias, mas não têm o direito que dizer que elas se limita(va)m a "operações de propaganda". Além disso, sendo pessoas empenhadas nas manifestações artísticas e culturais conhecem muito bem o mundo em que se move(ra)m e apresenta(ra)m projecto consistentes
Com Santana Lopes, pelo contrário, nada disso acontece. Ele não é definitivamente uma "homem da cultura" e apresenta grandes deficiências quanto a conhecimentos culturais e artísticos, sobretudo no que toca a arte contemporânea (refiro-me à criação dos últimos 200 anos). As suas medidas na área da cultura são muito erráticas, não apresentam nenhuma consistência, funcionando muito mais para fazer alarido (como, aliás, acontece em todas as outras áreas em que intervém) . O exemplo do Parque Mayer é sintomático. A ideia de procurar ressuscitar a Revista Portuguesa, um género teatral sem nenhum interesse cultural, só pode vir de alguém que não percebe nada de teatro mas que sabe muito bem como fazer passar para os portugueses a convicção de que é um político com preocupações culturais.
Para finalizar, gostaria de acrescentar que muito mais rapidamente compreenderia que o Dr. Pacheco Pereira estabelecesse uma relação entre Malraux, Lang e Carrilho e Teresa Patrício Gouveia. Por que razão esta relação não é feita? Porque interessa muito mais juntar os três primeiros a uma personagem do PSD incompetente."

(Mário Azevedo)
 


EARLY MORNING BLOGS 270

Henri quatre


Henri quatre
Voulait se battre
Henri trois
Ne voulait pas
Henri deux
Se moquait d'eux
Henri un
Ne disait rien.


("Comptine" anónima)

*

Bom dia!



1.8.04
 



Diebenkorn, Ocean Park
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: UMA PORTUENSE NO EXÍLIO REGRESSA A CASA

"1 - Vou comprar o jornal e o rapaz, corpulento mas ainda adolescente lança-me um “Bom-dia menina!”. No supermercado para pagar pedem-me “na outra caixa, menina”, nas lojas perguntam-me “a menina já está atendida?”.

Fico surpreendida, não me lembrava que fosse assim, ou porque não o era de facto, ou era de facto, mas porque também eu era “menina” tudo era e soava natural. Mas feitas as contas o “menina” é bem mais afável e simpático do que o indiferente e deseducado “você” com que me brindam habitualmente noutros locais nos dias de hoje.

2 – “Como se chama o teu irmão?”. Responde-me a criança prontamente: “Dabide!” com “b” e “d” bem soprados. (It feels like home!)

3 – Certa manhã acordei com um som da minha infância: a ronca dos nevoeiros de verão! (It’s home!) E eu a pensar que tal já não existia; pelos vistos enquanto houver nevoeiros no verão…

4 – Os “croissants” que como para tirar a barriga de misérias, não são afrancesados e folhados, mas sim fofos e cheios.
"

(JPC)
 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: INCÊNDIOS - UM TESTEMUNHO

"No domingo passado entre os muitos incêndios que infelizmente surgiram por todo o país, houve também um incêndio no Alentejo, na minha terra, junto à casa dos meus pais e de muitos vizinhos e amigos que conheço desde que nasci. Não causou danos maiores do que os já suficientemente graves da área ardida, isto é, não arderam casas, não houve mortos nem feridos mas ficou destruída, evidentemente, vegetação, cortiça, pastagem para gado. Acontece que contactar mais de perto com esta realidade me fez tomar consciência da forma como as coisas estão organizadas e ter a vontade de as gritar bem alto para que todos as conheçam. Esta pequena aldeia (Fornalhas Novas), fica a mais de 50 Kms de distância da sede do Concelho a que pertence – Odemira, portanto Distrito de Beja. Existem duas corporações de bombeiros relativamente próximas, uma a cerca de 12 kms (Alvalade-Sado) e outra a cerca de 20 (Cercal do Alentejo). Ambas na área territorial do Concelho de Santiago do Cacém, Distrito de Setúbal.

Quando os residentes locais deram conta do deflagrar do incêndio chamaram evidentemente os bombeiros, e, salvo melhor opinião, muito correctamente chamaram os que se encontram mais próximos. Segundo me foi relatado os bombeiros desta corporação chegaram mesmo a deslocar-se ao local do incêndio e lá foram informando que não sendo do concelho, nada poderiam fazer. E nada fizeram. Nessa altura o fogo rapidamente teria sido circunscrito. Mas não. Foi preciso esperar pela corporação certa, a do Concelho, que fica a mais de uma hora de distância! É possível compreender isto? Não consigo conceber que burocracias de divisões administrativas e territoriais se sobreponham ao combate a um incêndio. E ponham em causa bens e, mais grave do que isso, vidas humanas. Infelizmente percebo agora muito melhor as razões de tanta calamidade um pouco por todo o país.

Não consigo compreender a actuação dos bombeiros. Acredito que se têm este tipo de actuação é porque recebem instruções neste senti do. O que indubitavelmente tem de se colocar em causa é a forma como as coisas estão organizadas. Muito provavelmente por quem não faz a mínima ideia das realidades no terreno, não faz ideia das distâncias. Ultrapassa completamente a minha capacidade de entendimento ficar à espera dos bombeiros certos permitindo que o fogo avance e destrua tudo à sua passagem. A mim parece-me lógico e evidente que não se deve esperar que o fogo avance. Este não escolhe concelhos nem freguesias. Quando avança, avança. Não tem jurisdição. Porque é que o seu combate há-de ter? Terão os responsáveis a noção das consequências deste tipo de actos administrativos? Não deveriam ser criadas áreas de actuação independentes das divisões administrativas? Será que nem para combater incêndios somos capazes de nos organizarmos? Será assim tão impensável que os municípios colaborem uns com os outros? Será que a Protecção Civil de Setúbal e a de Beja não podem pôr um pé no território uma da outra? Enquanto is so tudo arde???? Um incêndio não é propriamente um papel que anda de secretária em secretária até que “encontre” o funcionário “certo” para tratar do assunto... Sem retirar gravidade a este acto, mas essa é outra discussão..."

(Maria Santos Silva)
 


ELOGIO DA CAPITAL

A Capital é hoje um jornal que vale a pena ler, até porque a sua agenda é muito diferente da dos outros jornais diários. O jornal é bastante mais à esquerda do que todos os outros, mas não é só por isso que faz a diferença. É porque reflecte, talvez por ter uma equipa pequena, a idiossincrasia dos seus redactores e do seu director. É um jornal maison, íntimo, e por isso é um jornal urbano interessante, que publica trabalhos jornalísticos com informação nova e temas pouco tratados, ou tratados de um ponto de vista diferente das redes de contactos estabelecidas na imprensa tradicional.

A “cultura”, nome dado hoje quase que exclusivamente às industrias culturais, tem por exemplo na Capital um tratamento distinto daquele que é dado no Público, no Expresso ou no Jornal de Letras, onde habitualmente se ouve a voz dos médios e grandes “empresários” - “criadores”. (No livro de Péan sobre o Le Monde, um dos capítulos mais interessantes é aquele sobre as redes de influência e patrocinato nos suplementos culturais, e que, transposto para Portugal, daria resultados muito reveladores.)

Na Capital falam os “pequenos”. A reportagem de hoje sobre os “criadores” culturais é reveladora do seu peso nas indústrias culturais, com as suas pequenas empresas urbanas, e a sua dependência do Estado e das autarquias. No centro de toda a reportagem, está um discurso - entre o afectivo e o ad terrorem - sobre os subsídios do Estado central e das autarquias, elaborado por Alexandre Melo, referido no jornal como “o especialista”. Vale a pena ler o “especialista”:

Quando se tenta pôr em causa, em termos gerais, a existência de subsídios como instrumento de política cultural, julgo que não se está avaliar bem as consequências disso numa sociedade como a portuguesa”(…) “Em Portugal, caso desaparecessem totalmente os subsídios, desaparecia o cinema, a dança, o teatro, a música. Desaparecia praticamente tudo o que fosse criação cultural excepto algumas formas de criação decalcadas do modelo televisivo e que alinham pelo mínimo denominador comum de uma população caracterizada por níveis de analfabetismo, ignorância e subdesenvolvimento cultural massivos, que estão entre os mais baixos da Europa e do chamado mundo desenvolvido” (Alexandre Melo)

E os seus ecos:

Pedro Penim reforça essa ideia: “O teatro não subsiste por si, precisa de ser apoiado. Esse apoio permite ter uma estrutura de produção a tempo inteiro, pagar aos actores e ter um espaço para ensaiar e apresentar as peças”.
Foi precisamente a partir do momento em que passou a receber o subsídio estatal que o Teatro Praga – uma jovem companhia nascida em 1995 e de que Penim é um dos mentores – começou a actuar de acordo com uma estrutura mais profissional.


 


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: O ESTADO DAS COISAS

"Penso que foi o mesmo Carlyle que teria dito haver três tempos em política (cito de memória): "o tempo da ideologia, o tempo do pragmatismo e o tempo do oportunismo". Estaremos de acordo que atingimos o terceiro stadium..."

(Rui Mota)

*

"(...) a ler o excelente artigo de Desidério Murcho em sobre a qualidade do ensino da filosofia em Portugal (já agora, permita-me que lhe sugira uma visita ao site dirigido por Desidério Murcho sobre filosofia e que é, em minha opinião, um dos melhores que se podem encontrar em toda a net).

É comum atribuir-se o atraso português aos nossos baixos níveis de instrução (não falo só do atraso cultural: dado o nosso país não ter os artistas, os cientistas, as orquestras, etc. que seria de esperar de um país europeu com mais de 800 anos de história). E os media dão frequentemente como exemplo os números de licenciados e doutorados, comparando esses números com os de outros países europeus. Considero que o diagnóstico está correcto, mas a simples comparação acerca dos números de licenciados e de doutorados esconde um problema muito mais grave: com o tipo de ensino superior que temos em Portugal, nem que tivéssemos o dobro de licenciados de outros países europeus nos conseguiríamos aproximar deles. O problema não está no número, mas na qualidade do ensino superior. A indigência do nosso ensino superior é um dos maiores cancros do país e quase ninguém fala disso. Talvez porque quem tem voz pública faça quase sempre parte da pseudo-comunidade científica nacional e contribua activamente para o triste panorama que refiro. Só agora, quando alguns dos nossos concidadãos doutorados noutros países começam a leccionar nas nossas faculdades (sobretudo nos departamentos de ciências) é que se começam a ver alguns sinais de esperança. Mas nos departamentos das chamadas «ciências humanas», literaturas e filosofia, o panorama é simplesmente medonho. Para quê ter cursos superiores tirados nestas universidades? Eu licenciei-me em filosofia na FLUL e de filosofia nada aprendi. Acho quase miraculoso como não me conseguiram aniquilar o interesse pela filosofia, como sucedeu a muitos dos mais inteligentes colegas que tive. Em Portugal não há verdadeiro ensino de filosofia (e de muitas outras coisas) porque simplesmente não há verdadeira comunidade filosófica; o que abunda são umas eminências pardas, provincianas, desinformadas, improdutivas e mesquinhas que tentam passar por grandes pensadores e odeiam a ciência, o rigor os argumentos e as ideias.

O ensino superior em Portugal é um verdadeiro tabu nacional. Não lhe parece que isto merece ser discutido?"


(Aires Almeida)

*

"Li os seus escritos sobre o casal da margem sul.São 3.30 da madrugada de um sábado e tomo a liberdade de lhe dar a minha situação pessoal que, quanto a mim, reflecte e de que maneira alguns dos piores aspectos caracterizadores do pobre país que temos.
Não se consegue dormir no bairro onde habito, no Montijo, porque duas discotecas fazem um barulho infernal.

Já contactámos com a Câmara Municipal, de forma oficial, através de correio devidamente registado. Já fizemos inúmeras queixas à Polícia.
Nada acontece. E porquê?
Quanto a mim porque:

1.Na ânsia de satisfazer as clientelas autárquicas, se foi criando um monstro, entregando-lhe poderes excessivos que fazem que a própria polícia não actue com receio de represálias, uma vez que as licemças de funcionamento destes estabelecimentos, passaram, creio que durante um dos governos Guterres, a depender exclusivamente das Câmaras municipais.

2. Neste país de leis para tudo, falta "só" fazê-las cumprir e respeitar.Este é um dos cancros da nossa sociedade.

Ah, é verdade, não chamámos ainda as televisões. talvez seja por isso que o problema não foi resolvido...
"

(M. Barrona)

*

"Quando é que alguém critica a incompetência dos bombeiros. Incompetência pura! apesar da coragem que ninguém lhes retira, a maior parte não tem formação adequada, friso, adequada!

Isto para não falar da incompetência das chefias. Com o nível de literacia deste país dá vontade de pensar quantos bombeiros sabem ler um mapa militar? Quantos sabem orientar-se? qtos sabem servir-se de uma simples bússola? Se pensarmos que a maioria dos portugueses não percebe as instruções de uma máquina de lavar a roupa....

Pode escrever ou dizer publicamente alguma coisa sobre isto? É que sinceramente estou farto da desculpa do "maluco da aldeia" que gosta de ouvir as sirenes..."


(João Duarte)
 


POEIRA DE 1 DE AGOSTO

Hoje , há cinquenta e quatro anos, estava calor, humidade e chovia. Tempo de Verão no Massachusets. Sylvia Plath tinha dezoito anos. Sylvia estava “tentada” a escrever um poema. Olhou para a chuva e lembrou-se de uma carta rejeitando a publicação de um poema: depois de uma grande chuvada, poemas intitulados “Chuva”, “chovem” por todo o lado nas revistas e jornais. Desistiu. Há uma poesia a menos sobre a chuva.
 



John Constable
 


EARLY MORNING BLOGS 269

Romance del infante vengador


Helo, helo por do viene el infante vengador,
caballero a la jineta en un caballo corredor,
su manto revuelto al brazo, demudada la color,
y en la su mano derecha un venablo cortador;
con la punta del venablo sacarían un arador,
siete veces fue templado en la sangre de un dragón
y otras tantas afilado porque cortase mejor,
el hierro fue hecho en Francia, y el asta en Aragón.
Perfilándoselo iba en las alas de su halcón.
Iba buscar a don Cuadros, a don Quadros, el traidor.
Allá le fuera a hallar junto al emperador,
la vara tiene en la mano, que era justicia mayor.
Siete veces lo pensaba si lo tiraría o no
y al cabo de las ocho el venablo le arrojó;
por dar al dicho don Cuadros, dado ha al emperador,
pasado le ha manto y sayo, que era de un tornasol,
por el suelo ladrillado más de un palmo lo metió.
Allí le habló el rey, bien oiréis lo que habló:
-¿Por qué me tiraste, infante? ¿Por qué me tiras, traidor?
-Perdóneme tu alteza, que no tiraba a ti, no,
tiraba al traidor de Cuadros, ese falso engañador,
que siete hermanos tenía no ha dejado si a mí, no.
Por eso delante de ti, buen rey, lo desafío yo.
Todos fían a don Cuadros y al infante no fían, no,
sino fuera una doncella, hija es del emperador,
que los tomó por la mano y en el campo los metió.
A los primeros encuentros Cuadros en tierra cayó.
Apeárase el infante, la cabeza le cortó
y tomárala en su lanza y al buen rey la presentó.
De que aquesto vido el rey con su hija le casó.


(Anónimo do Romanceiro)

*

Bom dia!
 


VER A NOITE - BLUE MOON 2

J'ai vu dans la lune

"J'ai vu dans la lune
Trois petits lapins
Qui mangeaient des prunes
Comm' des p'tits coquins
La pipe à la bouche le verre à la main
En disant : " Mesdames,
Versez-nous du vin,
Tout plein. "


(Anónimo)



© José Pacheco Pereira
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