ABRUPTO

23.3.14


   
 O PRECEDENTE DO KOSOVO E POLÍTICAS PERIGOSAS E INCONSEQUENTES 

 Veículos militares separando o Kosovo "albanês" do Kosovo "sérvio" na ponte de Mitrovica.

 A União Europeia e os EUA “fizeram” o Kosovo como país independente, mesmo quando uma parte desse país está praticamente autogovernado pela minoria que perdeu, neste caso os sérvios, e são precisas tropas estrangeiras permanentemente estacionadas para garantir que uma guerra civil congelada possa descongelar. E, no entanto, segundo o direito internacional, o Kosovo era território sérvio, embora com uma maioria albanesa. Ou seja, uma situação muito parecida com a da Crimeia. 

A Crimeia é parte da Ucrânia, mas tem uma maioria russa que não quer ser ucraniana, como os albaneses não queriam ser parte da Sérvia. Aviões dos EUA e ingleses, mísseis cruzeiro dos EUA, botas no chão de vários países da NATO, apoiadas na guerrilha albanesa, ocuparam o Kosovo, bombardearam Belgrado, mudaram o poder na Sérvia e prenderam alguns dos seus responsáveis e enviaram-nos ao Tribunal de Haia. Podiam ter feito o mesmo com Putin a propósito da Chechénia, mas nunca se atreveram sequer a sugerir que os russos estavam a cometar crimes de guerra no Cáucaso. Agora na Crimeia podem reclamar que os russos invadiram a Ucrânia, violando a integridade das fronteiras, mas não tem autoridade porque fizeram o mesmo no Kosovo. 

Em todos os sítios onde os EUA e a UE tocaram nos últimos anos deixaram uma embrulhada por resolver, nas Balcãs, na Líbia, na Síria, instigaram revoltas e apoiaram secessões, mas depois fizeram de conta que não era com eles e baixaram o tom, quando era preciso ser consequente e ir até ao fim. Isso implicava ou dividir nações, o que só na longínqua e pobre Etiópia se pode fazer, ou realizar ocupações militares a sério, que pudessem mudar tudo como no Japão e na Alemanha em 1945. Isso por razões geopolíticas, ou por cansaço das opiniões públicas da guerra, qualquer guerra, não podiam fazer. 

O resultado começa a ser perigoso e a dar à Rússia e a Putin a iniciativa de recompor o espaço geoestratégico da antiga URSS, que já era o do antigo império russo. É que eles têm a vontade e os meios, para travar todas guerras menos a nuclear, e os americanos e europeus hoje não tem vontade de travar nenhuma guerra, nem as pequenas, nem as médias. As guerras grandes, ou seja o conflito termonuclear, esse permanece felizmente fora de causa. Mas tudo o resto não está.

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© José Pacheco Pereira
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