ABRUPTO

8.12.13


CONFUSÕES SOBRE A VIOLÊNCIA 


 Foi confrangedor ouvir o último Prós e Contras sobre a dualidade do “conformismo versus radicalismo”, onde se sucediam intervenções de enorme confusão, centradas na vontade da apresentadora de confirmar uma das linhas do nosso pensamento instalado: os portugueses compreendem o “ajustamento”, sabem que não há “alternativa” e por isso não se “revoltam”. 

Seguindo esta tese, completamente absurda e que abre caminho para surpresas várias, já comparei o governo e os seus amigos a um forcado provocando um touro inexistente com gritos de “é touro, se não és violento, não existes”, “podes fazer o que quiseres que não te ouço enquanto não partires qualquer coisinha”. De facto, está a pedi-las, mais uma insensatez da “comunicação política” governamental. Depois, quando há uns vislumbres de que as coisas podem aquecer, berra por todo o lado que afinal o touro é mesmo mau, parece querer bastão, espada, ou metralhadora. Afinal a “violência” está aí, e a “ordem” vai ser reestabelecida custe o que custar. A invasão das escadarias do parlamento é sem dúvida grave, não pelo acto em si, que se percebe ser simbólico, mas pelo facto de outros polícias mostrarem cumplicidade. Isso sim, deveria tirar o sono dos responsáveis governamentais, e o episódio da demissão do comandante da polícia está longe de ser esclarecido, como quase tudo aliás que acontece neste país. Já as “ocupações” dos ministérios tem outro tipo de significado, que também pouco tem a ver com a violência, mas mostra que o PCP e a CGTP, assim como alguns sectores do “Que se lixe a troika” estão a fazer um upgrade dos conflitos para a desobediência civil. 

Porque, no meio de todas esta confusão com a “violência”, esquece-se uma coisa simples: pode haver ilegalidade e não haver violência. É isso que se chama desobediência civil. A lenda de que há “conformismo” ignora que, dos polícias aos trabalhadores dos Estaleiros, dos empresários da restauração aos enfermeiros, dos trabalhadores dos transportes aos magistrados, dos professores aos estivadores, muitos e muitos reformados e pensionistas, alguns desempregados e “precários”, centenas de milhares de portugueses tomaram parte activa em acções de protesto e resistência de uma ponta a outra do país. Parte activa, muito mais do que concordar. Pelos vistos, enquanto não partirem uma montra, são irrelevantes e não contam para nada. É um erro que o governo pode pagar caro.

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© José Pacheco Pereira
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