ABRUPTO |
semper idem Ano XIII ...M'ESPANTO ÀS VEZES , OUTRAS M'AVERGONHO ... (Sá de Miranda) _________________ correio para jppereira@gmail.com _________________
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30.7.12
COISAS DA SÁBADO:
O REINO DOS EUFEMISMOS, DO ATIRAR PARA O LADO, DA FRASE QUE DISTRAI
“No que depende de nós as contas estão controladas” é uma frase que se ouve do lado do governo para justificar a derrapagem da execução orçamental. É mais uma frase justificatória e uma frase que aponta para o lado da distracção, quer enganar-nos e distrair-nos. A escola de Sócrates, um grande especialista na frase ao lado, na estatística ao lado, na frase que de spin destinada a circular contra as evidências dos factos como um soundbite, deixou discípulos.
A frase, se vista para lá do manto de confusão em que nos pretender envolver e do caminho errado que nos quer fazer seguir, não se sustenta um segundo. Começa por nos dizer que na execução orçamental há dois lados, um de responsabilidade do governo (as despesas) que corre gloriosamente “bem”, e outro do lado da “nuvem”, um misto de economia espanhola, de economia portuguesa, de fuga ao fisco, de economia paralela, de acaso, dos malvados efeitos da “surpresa” do desemprego, da “queda acima do esperado” da procura interna, e de mais meia dúzia de imponderáveis com que o governo nada tem a ver (as receitas) e que corre muito mal. Claro que começa por presumir que despesas e receitas não estão ligadas entre si, como nem vale a pena perder tempo a referir. Como se pode perceber a quebra das receitas que vai levar ao incumprimento do défice, se não tivermos em conta a política global do governo? Não pode ser…
Acresce que o controlo das despesas assenta essencialmente no corte de salários e subsídios na função pública, que não é propriamente uma medida estrutural. O próprio governo admitia-a como transitória e de excepção, para acabar em 2013, 2014, 2015, ou 2018, seja lá quando for, mas provisória. Hoje sabe-se que a medida é considerada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional, como aliás de há muito se suspeitava, pelo que ainda mais conjuntural e excepcional ela parece. Ajuda em 2012, mas não chega, e desaparece em 2013.
Por isso, aquilo em que a frase “no que depende de nós” enche o peito de ar, ´pouco mais do que ar de lá sai, porque a dura realidade dos factos é que o governo não vai atingir o seu objectivo central, quase único, de cumprir o aspecto central do acordo com a troika. A troika fecha os olhos, ou porque precisa de um exemplo positivo para mostrar aos malditos gregos, ou porque uma parte da troika começa a perceber que o programa de laboratório não resulta nos testes com os ratinhos, ou porque, avaliando Portugal, se avalia a si própria e não quer dar má nota a si mesma.
Mas o problema destas frases de spin é que escondem o facto tenebroso: o problema que existia, continua lá; ou não é o problema que foi apontado e é outro; ou os remédios não servem, ou os médicos não sabem o que estão a fazer e preparam-se para matar o doente, pensando que estão a fazer um grande artigo para o New England Journal of Medicine. Neste caso para o Financial Times.
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© José Pacheco Pereira
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