ABRUPTO

16.9.11


COISAS DA SÁBADO: A BANDEIRA A MEIA HASTE 


Houve um comissário europeu alemão Günther Oettinger, que veio fazer em público duas sugestões que geraram uma pequena indignação nacionalista: colocar “técnicos qualificados”, presumivelmente alemães, holandeses, finlandeses, a controlar a economia e as finanças dos países incumpridores e colocar a bandeira a meia-haste nesses países para lhes lembrar a vergonha do incumprimento. A segunda sugestão é que indignou os nacionais, visto que a primeira tinha que ser prudentemente esquecida e disfarçada, num país que já é efectivamente governado por esses “técnicos qualificados”. Ou seja, é melhor assobiar para o lado e fazer de conta quanto aos “técnicos”, mas lá a bandeirinha a meia haste isso é inadmissível. 

Ora o que eu tinha para me indignar já me indignei há muito tempo, para perder agora um segundo de pathos com o comissário europeu. É que os indignados actuais bateram palmas aos sucessivos tratados de sujeição ao directório, inúteis aliás como se viu e vê. Os indignados tardios não quiseram ouvir as múltiplas prevenções quanto ao caminho que a UE estava a tomar, que era objectivamente hostil aos interesses portugueses desde que se abandonou (no tempo de Guterres, Barroso, Sócrates e com a concordância de Passos Coelho) a posição tradicional da diplomacia portuguesa: uma comissão forte, um parlamento europeu sem muitos poderes, um conselho moderado na sua intervenção.

Os autores do nosso desastre nacional, a começar também por Guterres, hipotecaram a nossa frágil soberania gastando muito acima das nossas possibilidades e colocando-nos nas mãos dos credores. Os indignados da bandeira acharam normal que a troika fizesse declarações públicas em conferências de imprensa muito para além das suas funções, quando isso favorecia a luta eleitoral. Acharam normal que decisões sobre as nossas forças armadas fossem tomadas pelos “técnicos qualificados” estrangeiros, como se isso não fosse muito pior do que ter a bandeira a meia haste. Consideraram que a Europa “renascia” quando a Sra. Merkel e Sr. Sarkozy exigiram alterações constitucionais a países independentes, esquecendo-se que a Constituição, na tradição democrática que vem da Grécia antiga, passa pela Revolução Americana e termina no liberalismo oitocentista, é o símbolo da soberania do povo e da nação. Eu sei disto muito bem porque escrevi solitariamente, ou quase, contra essas coisas na altura certa. E continuei sempre a ver essa estranha manifestação de “pensamento único” que é o “europeísmo” transformado primeiro em engenharia política utópica, e depois em racionalização da mão estendida dos necessitados, que já estão mais que disposto a serem governados por “técnicos qualificados” e ainda querem mais, que se institucionalize tal governo num federalismo qualquer sob égide alemã. 

Poupem-me por isso à indignação com a bandeira a meia haste. É porque se repararem bem ela já está a meia haste há muito tempo, para nossa vergonha.

(url)

© José Pacheco Pereira
Site Meter [Powered by Blogger]