ABRUPTO

3.6.11


COISAS DA SÁBADO
A SOLUÇÃO PARA A GORDURA DO ESTADO: MANDÁ-LO PARA O PROGRAMA DA JÚLIA PINHEIRO

Eu não tenho dúvida que temos Estado a mais, onde ele deveria estar a menos, e a menos, onde ele deveria estar a mais. Há pelo menos vinte anos isto é uma verdade de La Palice, aquele que "un quart d'heure avant sa mort, il était encore en vie." Mas “mexer” no Estado exige conhecimento do país, - cada país seu estado, cada país sua configuração do estado, cada país sua “história” do estado - , e conhecimento concreto de como ele existe e dos seus procedimentos, funções e disfunções. Esta parte já tem uma componente programática e ideológica, mas tem sentido se for acompanhada por saber real e não por dogmatismos ideológicos e receitas genéricas. Mas, infelizmente, com aquela propensão nacional de passar do oito para o oitenta, agora toda agente que se preze tornou-se anti-estatista e manifesta uma noção do estado muito próxima da de Bakunine e Kropotkine ou de um mau aluno de sociologia. E, claro, uma abissal ignorância sobre o que se está a falar.

E quem vos diz isto é um tenebroso liberal, estatista em matéria de defesa e negócios estrangeiros, semi-estatista em matéria de segurança interna, e muito, muito liberal em tudo o resto. E mais ainda, alguém que acha que o crescimento do estado nas mãos de socialistas e social-democratas nos últimos anos é uma das causas da incapacidade de Portugal crescer e da dívida que nos amarra aos credores. E também quem dito por quem sabe que não há em Portugal muitas forças endógenas para a genuína reforma do estado que se necessita. Convinha aliás não confundir o anti-estatismo demagógico, voltado para aquilo que são ou se pensam ser as prebendas do estado, com um apoio efectivo a qualquer reforma de fundo que implique, como tem que implicar, diminuição das despesas “sociais” e despedimentos da função pública.

Só que me custa muito ver o efeito da moda, que é a pior conselheira para o discernimento político e muito, muito ignorante. E a moda agora é dizer frases contra a “gordura” do estado, publicar estatísticas absurdas como as que deram origem a dois livrinhos de “investigação” do Diário de Noticias , uma súmula dos lugares comuns actuais sobre o estado, misturando coisas muito diferentes, em números genéricos e cobrindo realidades diversas como se tudo fosse igual, ter uma empresa municipal que duplica serviços para garantir mordomias ou ter um sistema de emergência médica, ou um serviço de atendimento telefónico anti-venenos.

É por tudo isto que penso muitas vezes que esta maneira de falar da “gordura” do estado (mais uma metáfora conveniente em períodos estivais), está ao nível do programa da SIC da Júlia Pinheiro, e que certamente em matérias de soluções para o problema, vai-se dar à mesma receita: que tal mandarmos o estado ao programa da SIC competir com os outros “gordos” na ignomínia pública e no espectáculo grosseiro e indigno. É que o pensamento sobre o estado que circula nesta campanha eleitoral está ao mesmo nível, na análise do problema e na solução.

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© José Pacheco Pereira
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