ABRUPTO

13.7.10


COISAS DA SÁBADO: A VULGATA IDEOLÓGICA DOS SOCIALISTAS

Nesta cena da PT veio mais uma vez ao de cima a paupérrima vulgata que passa por ideologia no PS. Ele é alimentada por várias fontes: Mário Soares, o principal esquerdista do PS, José Sócrates, o principal bipolar do PS, Santos Silva, o principal propagandista do PS e o azorrague dos seus inimigos da “direita”. Todos têm andado nos últimos dias a repetir uma espécie de versão ideológica sobre a crise que atravessamos, cá dentro e lá fora. Na verdade, esta vulgata já dura há muito mais tempo, e não é “dos últimos dias”, mas o facto de estarem a repeti-la em Julho de 2010, dá-lhe um tom particularmente irrealista, isolado da realidade, e, no sentido não clínico da palavra, autista, assim como, no sentido surrealista da palavra, absurdo. Absurdo em tudo: primeiro, como análise é um puro discuso propagandista; segundo, como ideologia, mesmo à esquerda, é grosseiro e primitivo; terceiro, como prática, não existe.

Em que é que consiste a “narrativa” dessa vulgata: nos últimos quarenta anos,com altos e baixos, mas coincidindo com o ciclo Thatcher – Reagan – Bush pai e acima de tudo o tenebroso Bush filho, o mundo foi governado por “neo-liberais”, gente que construiu uma “economia de especulação financeira”, assente em variedades globais de sistemas como o da D. Branca, esse prócere do “neo-liberalismo” caseiro. Abandonou-se a “economia real” e caminhou-se para uma “economia de casino”, desregulando tudo, reduzindo o estado a um malfeitor envergonhado, pisando as “políticas sociais”, e criando uma “bolha” que o Nouvel Observateur e o Le Monde Diplomatique (se existisse) já dizia há quarenta anos que ia rebentar. Rebentou e dos criminosos “neo-liberais” apenas o senhor Madoff foi parar à cadeia, deixando o mundo em pantanas. Tão em pantanas que nem Santo Obama ainda recuperou, nem a Santa União Europeia se recompôs, porque, com excepção dos socialistas, é governada por gente que ainda vem dos tempos do Madoff, como a senhora Merkel.

O que é que há a fazer? Os socialistas sabem muito bem: mais investimento público, mais Keynes, mais Marx, um estado com maior presença na economia, aperto na regulação, confisco dos ricos que andaram a “empochar” à Madoff (esta parte Louçã faz melhor) e defesa intransigente do “estado social”. Pois, pois. Se não fosse um insulto à história da Carochinha, esta fábula mereceria um prémio.

A PRÁTICA DOS SOCIALISTAS


O problema é que , para além da fábula, há a realidade, a prática, aquilo que os marxistas aprendiam como sendo o “critério de verdade na teoria do conhecimento do materialismo dialéctico”. A parte prática, executada por Sócrates – Teixeira dos Santos, martelada contra os infièis por Santos e Silva e apoiada ainda mais à esquerda por Soares, é a que mostra o absurdo a que chegou a vulgata, porque enchendo a boca com o “estado social”, propõe-se salva-lo exactamente com a medicina dos “neo-liberais”, ou seja com medidas cuja lógica é a que é exorcisada pelo discurso ideológico. Parece confuso? É confuso e intelectualmente muito pobre, mas é o que a casa socialista hoje gasta.

Claro que na prática, a vulgata tem os seus custos. Ela funciona como uma resistência, como os maus condutores resistem à passagem dos electrões: gera enormes desperdícios, atrasa tudo e produz uma enorme quantidade de calor inútil que se dissipa no ar. É o que hoje o PS parece: faz a política que diz abominar, e retira-lhe muita da eficácia, porque a faz sempre com má fé, atrasado, mal, com desperdício e mais caro.

Se o mundo fosse como na fábula ideológica acima contada, os socialistas deveriam estar a fazer exactamente o contrário daquilo que fazem: a avançar com as grandes obras públicas em nome de Keynes, a não mexer em salários, nem reformas, a aumentar as regalias sociais, a fortalecer o estado nacionalizando e a apertar o pescoço do BES. Pois, pois.

Isso teria sido muito bonito, se pudéssemos continuar a viver de dinheiro emprestado que cada vez menos temos capacidade de pagar, e que cada vez menos gente nos empresta. E como não há dinheiro, não há vícios nem socialismo. Podemos apenas vociferar contra os “especuladores” e essa tenebrosa conspiração internacional que “de lá de fora” nos quer tirar o euro e abater a Europa, para além de destruir a gloriosa obra de José Sócrates, tão perfeita, tão perfeita que levou a nossa dívida aos píncaros e o nosso défice ao clímax. A culpa de facto é do Madoff, o socialismo pode continuar intangível na sua perfeição moral e política a cavar a sepultura da esperança dos portugueses em viverem um pouco melhor, só um pouco melhor.

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© José Pacheco Pereira
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