ABRUPTO

14.3.10


COISAS DA SÁBADO: PROVOCAÇÃO



O Governo precisou e precisa de votos para aprovar o Orçamento de Estado. A oposição deu-lhos e vai dá-los, para que não tenhamos a nossa variante da “crise grega”. Foi a “crise grega” que fez passar um mau orçamento, porque não era apenas o orçamento que estava em causa, porque se o fosse o PSD, pelo menos, votaria contra. Manuela Ferreira Leite disse-o e com ela é para tomar a sério. Estava em causa impedir o descalabro financeiro, que evitamos à tangente pelo menos para mais uns tempos. O Ministro das Finanças sabe disso muito bem. Sabe até melhor do que nós como o Orçamento sofreu uma metamorfose de última hora (e o PEC também) que deixou ficar na gaveta a intenção do Governo de só se preocupar com as contas públicas em vésperas de 2013, ou até depois, se Portugal tivesse a cobertura de alguns dos grandes da UE que podem também chegar a essa data em falta. Depois se veria, ou então quem viesse a seguir que resolvesse o problema como já aconteceu com a herança de Guterres.

Analisando tudo o que José Sócrates anunciou no mês seguinte às eleições percebia-se que iríamos continuar a ter défices “virtuosos” em nome do keynesianismo de pacotilha que dá um “ismo” a uma política de gastar mal e sumptuosamente e depois ver como se paga. Em Outubro e Novembro continuaríamos a festa das inaugurações, mas depois veio o bang grego seguido do “ataque dos mercados” a Portugal. Foi o susto no Ministério das Finanças e alguma travagem no descalabro. O Ministro deve ter dito a José Sócrates que teria que inaugurar creches com assobios à porta em vez de fazer grandes sessões de aparato em tendas de luxo, com a fina flor das “empresas amigas” a anunciar megaprojectos, aqueles em que Portugal está à frente de todo o mundo. E José Sócrates reagiu com furor e mesmo com os credores a ameaçarem bater à porta, fez uma mini-crise de zanga e psicodrama. Está-lhe na natureza da “ferocidade”.

Agora o Governo não precisa de nenhum voto para o PEC. Devia moderar os seus ímpetos guerreiros, tentar passar por entre os pingos da chuva que, como se sabe, é já muita, e tentar convencer o “estrangeiro” de que o PEC é um plano sério para por as nossas contas em ordem, sem grande turbulência social. Nós todos sabemos que o PEC tem a mesma receita conjuntural e o mesmo defeito estrutural: controla o défice aumentando impostos e congelando na função pública e pouco faz na contenção das despesas do estado. Mas como se não bastasse ao Governo saber que a oposição tem muitas reservas ao PEC, mas que isso não precisa de se traduzir em votos, o “animal feroz” quer obrigar a oposição a votar um documento qualquer de apoio ao PEC. Trata-se de uma provocação, desnecessária porque o voto de que precisa, o do Orçamento, já o tem e o outro é como dizem os brasileiros “forçar a barra”, tentar humilhar a oposição, o PSD em particular, para lhe fazer pagar o custo das perguntas incómodas sobre a conspiração da TVI e a mentira no Parlamento. Lá vamos ter nós mais uma crise e um psicodrama completamente desnecessário, para conforto psicológico de José Sócrates nas suas atribulações. O resultado é que o corpo é que paga, o corpo dos portugueses.

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© José Pacheco Pereira
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