ABRUPTO

14.11.09


ÍNDICE DO SITUACIONISMO (106):
É QUANDO É A DOER QUE SE PERCEBE MELHOR...


A questão do situacionismo não é de conspiração, é de respiração.
E, nalguns casos, de respiração assistida.

... o Diário de Notícias e o Jornal de Notícias pela voz dos seus responsáveis. Veja-se o tom. Marcelino (director) no Diário de Notícias:
Já não bastava mais uma polémica com o primeiro-ministro. (...) Além do mais, no terreno, os administradores da justiça estão notoriamente empenhados em devassar, de novo, os processos que deveriam defender e investigar de forma recta e sem mácula.

É preciso que o País se habitue a investigar e castigar os poderosos, sim senhor, mas é absolutamente imprescindível que o faça num quadro europeu, de Estado de direito, em que toda a gente seja considerada séria até ao momento em que, de facto, deixa de o ser.

Não é isso que acontece e ontem foi um dia curioso neste sentido. No preciso momento em que José Sócrates viu a respeitada e insuspeita polícia inglesa arquivar o processo Freeport (que produziu por cá as consequências de todos conhecidas), abriu- -se já uma nova frente a partir de escutas entre o primeiro-ministro e o seu amigo Armando Vara.

Não sabemos de que factos falamos. Não sabemos se as conversas são criminalmente relevantes. Não sabemos, sequer, da respectiva legalidade. Mas a realidade está à vista de todos: crescem as notícias, florescem os comentários, impõe-se uma comunicação doentia em que não faltam sequer os poucos escrúpulos de grupos de jornalistas ávidos de acertar contas com o passado.

2 A guerrilha, mais uma vez, está instalada e a culpa, sendo de muitos, é sobretudo de dois homens que eu acuso de serem os principais responsáveis pela actual crise que afecta a sociedade portuguesa: José Sócrates e Cavaco Silva.

É à sombra de ambos que os exércitos se acantonam e combatem, na justiça e na comunicação social.

Sob a passividade de São Bento e Belém, escorre a intriga na política.

São os seus operacionais que movidos pelo ódio (já não só político) estão a conspurcar a vida pública nacional.

(...)
A intervenção de Manuela Ferreira Leite no Parlamento, esta semana, é ilustrativa do que atrás disse. A presidente do PSD farejou uma última oportunidade e voltou à campanha, sem qualquer pudor. Não foi politicamente séria, mas teve eficácia popular. (...)
Paulo Ferreira (subdirector) no Jornal de Notícias:
Uma das consequências deste emaranhado está à vista: temos hoje um primeiro-ministro sobre o qual recaem suspeitas de enorme gravidade e andamos há semanas a assistir a um lamentável jogo do empurra entre duas das principais figuras do Estado: o procurador-geral da República e o presidente do Supremo Tribunal de Justiça. É por isso que José Sócrates tem razão, quando diz que "isto está a passar das marcas". Eu diria mais: isto é verdadeiramente insustentável. Não se trata de reclamar que os "tempos" da Justiça se verguem aos "tempos" da política. Trata-se de reclamar que os principais agentes da Justiça não permitam, como permitiram, que o novelo cresça como cresceu. É que não é apenas a imagem do primeiro-ministro que está aqui em causa. É a imagem do país.

Este caldo permite, como é óbvio, aproveitamentos políticos que têm o condão de fazer alastrar a mancha. A intervenção feita sobre o caso por Manuela Ferreira Leite, ou a suprema hipocrisia usada por Pacheco Pereira na análise do mesmo, são bons exemplos disso. A líder do PSD chegou a exigir, no Parlamento, ao primeiro-ministro que se pronunciasse sobre as escutas! Uma de duas: ou Ferreira Leite conhece o conteúdo das escutas, o que é muito grave; ou não conhece e perdeu uma boa oportunidade para estar calada.

A confusão justifica uma pergunta: deve José Sócrates fazer uma declaração formal ao país sobre a matéria, como reclama a líder social-democrata? É duvidoso. Se o fizer, isso pode ser entendido como um sinal de fraqueza. Se não o fizer, arrisca-se a ser queimado em lume brando.

No ponto a que chegámos talvez seja melhor esperar pelas conclusões do processo. (...) A menos que nos dê um especial gozo viver no país do consta que o primeiro-ministro..

Duas características comuns nos jornais pertencentes ao grupo que é referido nas conversas entre Sócrates e Vara como tendo que ser ajudado (como é que eu soube? Vem nos jornais.): os alvos (magistrados, Manuela Ferreira Leite, eu); e o completo silêncio sobre a possibilidade de haver interferência do poder político na comunicação social, matéria que, em condições de liberdade e de independência do poder, seria a principal preocupação editorial dos jornalistas. Pelos vistos, tornou-se tão secundária que nem vale a pena falar.

ANEXO:


O problema é que o que pensam os responsáveis dos dois jornais da Global Notícias condiciona o tratamento informativo, como se vê pelas capas. Um jornal que considera que a matéria mais importante do dia de ontem neste processo é a abertura de "inquéritos à violação do segredo de justiça", diz tudo sobre as suas prioridades.

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© José Pacheco Pereira
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