ABRUPTO |
![]() semper idem Ano XIII ...M'ESPANTO ÀS VEZES , OUTRAS M'AVERGONHO ... (Sá de Miranda) _________________ correio para jppereira@gmail.com _________________
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24.5.09
![]() A EUROPA E O "DEBATE" QUE NÃO TEM CONTRAS ![]() Todo este dinheiro atirado para cima de "acções de esclarecimento" nada tem de inocente. Contribui e muito para reforçar um falso debate, viciado à partida por ter um só lado. E um meio comunicacional já muito dependente de um aparente "consenso" europeu, que aliás reflecte o "consenso" político, ainda se torna mais pobre quando é manipulado por estas actividades. ![]() ![]() A razão por que refiro isto é que contribui e muito para a abafamento quase total, mesmo em período de eleições europeias, de qualquer alteridade na discussão, o atirar para debaixo de um grande tapete de tudo o que permita uma perspectiva crítica do caminho que se tem seguido na União Europeia na última década. Tudo começou na presidência portuguesa de Guterres, teve como tiro de partida o célebre discurso de Joschka Fischer, seguido do delírio constituinte, do fracasso dos referendos, do processo de fazer passar a Constituição disfarçada de Tratado de Lisboa, seguida de uma fuga escabrosa dos compromissos referendários e do voto contra irlandês. O caminho seguido pelos dirigentes europeus, com destaque para personagens como Chirac, Valéry Giscard d'Estaing, Tony Blair, Merkel, e Sarkozy entre outros, tem sido o de andar de desastre em desastre. Este caminho há muito erodiu todos os fundamentos do antigo espírito comunitário que fundou a Europa. O gigantesco consenso institucional - todos os partidos, todas as Igrejas, todas as "forças vivas" - está longe de corresponder à vontade popular, numa Europa cada vez menos democrática e que já funciona em regime de directório. Para um país como Portugal esta evolução é péssima, para não dizer trágica. Portugal precisava de uma Europa de coesão, que valorizasse os factores de um crescimento equilibrado, e em que Portugal estivesse como parceiro virtualmente igual com os mais fortes e os mais ricos. Foi assim que Monnet fundou a Europa muito prudente no seu upgrade político, assente nos "pequenos passos" dos fundadores. Portugal precisava de uma Comissão forte, um Parlamento fraco e um Conselho que respeitasse a Comissão. No desvario dos últimos anos, saiu-lhe uma Comissão cada vez mais fraca, um Parlamento cada vez mais forte e um Conselho transformado num directório com potências de primeira e de segunda. Tudo o resto na arquitectura europeia veio por consequência, originando um país mais fraco no seu poder europeu, marginalizado de qualquer decisão, fragilizado na soberania em questões cruciais como o mar territorial, e degradado na sua democracia pelo nulo poder do seu Parlamento e pela traição à promessa referendária. Era isto que devia ser discutido e não é. E se quem parecia ter alguma independência para esta alteridade solitária se deixa com toda a facilidade enredar nas malhas do "consenso", ainda ficamos pior. Não será do PS, nem do PSD, nem do CDS-PP (que abandonou totalmente qualquer veleidade de ter um pensamento europeu próprio), não será do BE, nem do PCP que virá essa tão necessária alteridade. Para estes dois últimos partidos, a discussão da Europa é subsidiária da crítica ao capitalismo, logo tudo se aceita na Europa desde que pareça ir no sentido dessa crítica. Falta por isso debate e muito. Debate interno, interior, dentro das baias da aceitação do "europeísmo" dominante, pouco me interessa. Debate que tenha a coragem de vir de fora, que diga as verdades que precisam de ser ditas sobre uma Europa que caminha a passos largos para destruir o adquirido comunitário a favor de uma realidade meramente geopolítica sem cabeça para um tronco grande de mais, isso é bem-vindo e faz falta. (Versão do Público de 24 de Maio de 2009.) (url)
© José Pacheco Pereira
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