ABRUPTO

13.2.09


COISAS DA SÁBADO: O BLOCO DA EXTREMA-ESQUERDA POPULISTA



Seria injusto para Miguel Portas, Luís Fazenda, Fernando Rosas e para muitos outros dirigentes do BE acusá-los de demagogos populistas, mas Francisco Louçã é-o até à medula dos ossos. As suas intervenções políticas tem esse condimento que no populismo engana muita gente: a promessa de soluções fáceis, imediatas e apocalípticas, sempre com um “nós” e um “eles” inscrito a fogo no discurso, apelando a distinções que começam no moral e terminam no político, com a divisão absoluta a preto e branco que um qualquer inquisidor faria na sua doutrina.

Ele transporta a rigidez das distinções morais para a política, num discurso inflamado que procura publicidade para um lado que ele quer iluminado (e a comunicação social corre a iluminar com todos os holofotes) e obscuridade para outro. O lado obscuro encontra-se no sistema de ideias e práticas que faz Louçã um comunista na sua variante trotsquista, que nunca enuncia com clareza o que pretende porque não pode, não é politicamente correcto, não teria boa imprensa. Ele caminha de “bandeira fechada” e não de “bandeira aberta” e não pode nunca avançar muito na caracterização do regime em que as suas soluções teriam cabimento. Haveria repressão das ideias contra-revolucionárias? Louça negaria a pés juntos, ele que não é “estalinista” mas “democrata”. Mas haveria repressão e prisão contra os “sabotadores da economia socialista”? Sem dúvida, como criminosos que são. Bom, sabe-se muito bem como isto evolui. Ele sabe mas a maioria das pessoas que se podem entusiasmar com as suas catilinárias morais contra os ricos que devem “pagar a crise”, não sabe.

Bem vistas as coisas, na sua mecânica e não na sua substância, o discurso de Louçã é muito parecido com o de Jardim, com demérito para o primeiro e mérito para o segundo. Como Jardim tem os “cubanos” e o “continente”, Louçã tem os “ricos” e a “banca”, como Jardim entende que o bem está do lado da Madeira e o mal do lado de “Lisboa”, Louçã faz um trejeito especial com a fala para exprimir a sua indignação moral contra os capitalistas, os “figurões” que andam a roubar-nos todos os dias. Pensam que ele está a falar apenas dos gestores do BPN e do BPP? Não, ele está a falar dos capitalistas em geral, como explicou muito bem no discurso que fez na semana passada. Ele é anti-capitalista, mas tenho a certeza que a economia e a sociedade alternativa em que está a pensar não é a dos vendedores de bugigangas artesanais que tinha à porta do pavilhão. A economia em que ele está a pensar, nunca a nomeia.

Porém, Jardim tem três, vejam bem três, enormes vantagens sobre Louçã: tem genuínas preocupações sociais, é um patriota e é sincero. E não acrescento como quarta razão a de ter feito obra, porque não quero cair no truque populista (esse sim em que Jardim cairia facilmente) de menosprezar o trabalho intelectual e académico de Louçã. Louçã é um intelectual e como intelectual tem obra. Já no resto, Jardim ganha em tudo e por uma razão simples: Jardim é o que é, representa o papel que talhou para a sua medida, enquanto Louçã representa vários papéis e nem todos se revelam na demagogia esquerdista com que nos brindou. Para Louçã, e nisso é muito parecido com Sócrates, a “sinceridade” serve para passar uma mensagem sob as vestes de uma convicção.

E por último, se alguém pensa que o discurso demagógico do BE tem alguma coisa a ver com qualquer genuína preocupação social, desengane-se. Aquilo é pura ideologia e tenho a certeza que Louçã consideraria qualquer outra coisa que “não vá ao fundo da questão”, que não ataque o “sistema”, como pouco mais do que caridade, que ele abomina. Caridade já é ser bondoso, ele acha que é “caridadezinha”, uma coisa que só pode ser um entrave à revolução, demasiado cristã para ter como base a análise marxista da exploração. Louçã sonha com uma revolução anti-capitalista, não quer é dizê-lo. Tudo o resto é instrumental.

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© José Pacheco Pereira
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