ABRUPTO

28.12.08


BOAS / MÁS / PÉSSIMAS COISAS NA COMUNICAÇÃO SOCIAL PORTUGUESA EM 2008
VISTAS POR UM GRANDE (EM QUANTIDADE) CONSUMIDOR



NOTAS DE ABERTURA

Escrevo no Público e na Sábado e participo em programas da SICN e do RCP. Se esses são conflitos de interesse, aqui ficam registados. Este balanço depende muito do que li, ouvi e vi directamente, logo pode ser desigual e injusto com muito de bom ou mau na comunicação social. Ouço pouca rádio (este ano quase não ouvi a TSF), e vejo poucas vezes a TVI com excepção dos noticiários, mas leio quase toda a imprensa.

Estas primeiras notas são ainda uma aproximação incompleta, em muitos casos enunciando apenas a questão para posterior desenvolvimento. Como sempre, espero dos leitores do Abrupto opiniões, sugestões, correcções e debate, antes de fazer um texto definitivo.

*

GERAL

De um modo geral, a comunicação social portuguesa piorou em quase todos os aspectos. A espectacularização de toda a vida pública é hoje ao mesmo tempo uma causa da degradação da comunicação social e um seu poderoso efeito. A comunicação social funciona como uma fábrica de irrelevância, violando o seu contrato democrático original de ser o pilar do espaço público e da liberdade. Há muitas razões para acontecer o que está a acontecer, mas nenhuma justifica o que acontece à revelia da ética profissional dos jornalistas e das opções de um público supostamente responsável e exigente. Sem uma coisa e outra, a comunicação social torna-se uma fonte de desgaste da democracia. (Continua)


sA opinião, análise e o comentário são cada vez mais substituídos pelo engraçadismo, nas televisões, nas rádios, nos blogues. Como a maioria do engraçadismo é tudo menos engraçado, nasce mais da preguiça do que do trabalho (o "culto do amador" também se aplica ao engraçadismo), existe um real retrocesso na função da racionalidade que o debate público deve conter.



Sobre a ERC. (Em breve.)

Para mim há dois casos do expoente máximo do circo em que está transformada a nossa comunicação social:
1. "Caso Esmeralda" - aqui com evidente e escandalosa cumplicidade dos adultos que reclamam entre si a criança como se fosse um troféu. Inexplicável e incrível. O que será desta criança daqui a uns anos? É algo que vai ter de merecer um estudo académico quando a poeira assentar.
2. Eleições nos EUA- Com algumas excepções, a cobertura dos meses pré-eleitorais e do momento do voto, revelou-se de grande simplismo, com a demonização de um candidato e um endeusamento de outro. No meio ficou o público que gostaria de perceber melhor quem eram os dois homens sem a hipertrofia opinativa dos nossos jornalistas. Neste particular o "óscar" vai para Márcia Rodrigues da RTP.
Por fim, o que é mais importante, preocupante e fundamental em tudo isto, é aquilo que referiu: o total alheamento dos portugueses em relação a estado de coisas e a sua não reivindicação por uma imprensa de qualidade. É muito, muito, muito preocupante. Há dias em que ligo a televisão e me sinto numa espécie de mundo surreal, kafkiano, de casos e contra-casos, tudo coisas sem sentido, e que são terreno propício a uma qualquer anarquia e subsequente aparecimento de uma figura "para pôr a casa em ordem"... (Alberto Fernandes)

TELEVISÕES

A governamentalização da RTP acentuou-se de forma que devia ser escandalosa para todos, mas que permanece invisível para a ERC.


De todos os noticiários da RTP aquele que mais subserviente é com o governo é o das 13 horas. De tal modo algumas peças são de serviço ao governo, que o noticiário das 20 horas , com mais audiência e exposição, não as passa.

Os noticiários da TVI ganham por comparação com os da RTP e da SIC no alinhamento das notícias em função da relevância e são neste momento os menos subservientes face ao governo.

Vi menos os Gatos Fedorentos que nos outros anos. O que vi foi desigual, e acabou por ter menos força na imagem dos ditos do que aquelas palhaçadas sem graça nenhuma do Meo.

Quanto à televisão, julgo que são de saudar certos programas onde a História tem grande relevo. Estou a pensar nos documentários transmitidos pela RTP relativos ao centenário do Regicídio e aos noventa anos do assassinato de Sidónio Pais, bem como na luxuosa adaptação à televisão do Equador (naturalmente, estou a extrapolar a partir de um único episódio). (José Carlos Santos)

*

Concordo com muito do que diz sobre a Comunicação Social, mas acho que não tem em conta todo o panorama quando fala da RTP, especialmente no caso do noticiário das 13.00, como o "canal do Governo".

Unicamente pelo seguinte: já examinou com rigor o noticiário da SIC, especialmente o da hora do almoço? Se a RTP perde a respectiva idoneidade jornalística quando noticia "por encomenda", o que dizer do noticiário das 13.00 da SIC, que claramente tem uma agenda anti-governo? Anti-governo significa bom jornalismo? No noticiário da SIC, tenho visto de tudo: comentários sarcásticos por parte do jornalistas às políticas ou notícias sobre o Governo, manipulação evidente de determinadas notícias favoráveis ao Governo, entrevistas de rua escolhidas a dedo, em que só falam aqueles, com particular preferência para representantes da terceira idade, que se queixem das medidas do Governo, da crise, da falta de dinheiro, ou seja, tudo aquilo que sirva para desanimar e dar uma aparência geral de desânimo e descontentamento; entrevistadores, nomeadamente Bento Rodrigues, que com uma insolência indescritível para com os entrevistados em estúdio tem o descaramento de declarar, numa das entrevistas a um Ministro, penso eu, "…é o que os portugueses querem saber…", como se ele alguma vez representasse seja quem for do povo português? É isto o bom jornalismo?

Os Gato Fedorento, que passam da RTP para a SIC e, repentinamente, passam a fazer os sketches sobre Sócrates e sobre o Magalhães, constituem um excelente exemplo da forma como a SIC encara o Governo. Só mostra que, também eles, podem ser comprados.

Parece-me óbvio que a linha editorial do Público e da SIC é de anti-governo, por isso não entendo a sua revolta contra a RTP. Qual seria o cenário ideal, uma RTP isenta e objectiva, e a SIC
anti-governo? O facto da RTP ser pública obriga-a a ser 100% isenta? É óbvio que não concordo com esta falta de isenção, mas compreendo-a, especialmente quando olho para o que a concorrência faz. Se a RTP é subserviente para com o Governo, para quem é subserviente a SIC? Estamos a falar de bom jornalismo ou jornalismo em função dos interesses, sejam eles quais forem?

O problema da Comunicação Social dos dias de hoje é o facto de subestimarem o seu público. A Comunicação Social crê-se "fazedora d opiniões". Acreditam em demasia nas célebres palavras de Emídio Rangel, quando dizia ser capaz de eleger Presidentes. Na realidade, o público que atingem, comparativamente escasso tendo em conta a população do país, tem inteligência e senso comum suficientes para identificarem quando estão a ser manipulados. O "povo", esse, pouco lê e poucos noticiários vê, nem está nestas coisas interessado. Não digo isto com desrespeito nem arrogância, mas sim como constatação. A manipulação de algumas notícias é tão evidente que, não duvide, exerce o efeito contrário ao pretendido.

Só lhe peço que examine com igual isenção a linha editorial da SIC e do Público e conclua se é esse ou não o rigor jornalístico que almeja e exige.
(BT)

JORNAIS E REVISTAS

- Público e Diário de Notícias. (Em breve.)



Um ano depois, a edição do Diário de Notícias em linha continua muito má.


Os suplementos do Expresso pioraram. A Única perdeu consistência e tornou-se uma colecção fragmentada de inutilidades, o Actual está muito feio, todos os números parecem iguais e é ilegível.
Concordo com os seus comentários relativos aos suplementos do Expresso, mas, no caso do Actual, não posso deixar de lembrar que é aí que saem as crónicas do Luís Fernando Veríssimo, um daqueles autores que têm a capacidade de tornar a realidade bastante difusa ao meu redor enquanto os leio. (José Carlos Santos)

A Time Out continua a merecer ser comprada. Nem toda a gente que faz a revista dos restaurantes sabe comer e alinha muito em modas, mas de um modo geral as recomendações urbanas são acertadas.

As duas revistas de artes e mercado das artes, a Artes e Leilões e a L+arte valem o dinheiro que custam. Também servem para mostrar uma das áreas em que o gato por lebre prolifera.

Nenhum jornal é mais misterioso do que o Semanário. Não se percebe quem o faz, quem o compra, quem o paga. No entanto, os recados percebem-se bem demais e talvez isso explique o resto.


BLOGOSFERA

A blogosfera está cada vez pior. Ganhou todos os defeitos do jornalismo, quer os públicos, quer os de bastidores (que conseguem ser ainda piores que os públicos e hoje estão à vista nos blogues dos jornalistas) e nenhuma das qualidades. Está a tornar-se numa colecção de dichotes, pseudopiadas, ajuste de contas, e "bocas" que passam por ser opiniões. No geral é tudo muito mau, mesmo muito mau.

Pelas mesmas razões e com os mesmos personagens (na maioria jornalistas) a blogosfera politizou-se no pior sentido, de forma obscura e pouco transparente. Com escreveu César das Neves:
"O mais curioso é que, embora a imprensa escrita e falada seja intensamente opinativa, nunca se assume em termos políticos. Não existe em Portugal o alinhamento ideológico explícito de jornais e emissoras de referência que existe em todos os países. O público não é informado da orientação do meio que escolheu, porque todos dizem apenas a verdade. Todos os repórteres têm opinião, mas todos são isentos de orientações e partidarismos."

O blogue que eu mais leio continua a ser o Portugal dos Pequeninos. O que João Gonçalves escreve é muitas vezes irritante, tem o defeito de aceitar como válidas informações em segunda mão, - o que num blogue "pesado" ainda resulta mais errado ou injusto, - mas continua a ser das poucas e cada vez menos coisas legíveis na blogosfera.

De forma sistemática, leio o Da Literatura, o Mar Salgado, a A Terceira Noite, a Natureza do Mal e "vejo" o fworld.

Há dois blogues cuja ausência da sua lista me surpreendeu: o Blasfémias e o Vox Pop, o primeiro porque já o elogiou e citou no passado e o segundo por ser o sucessor do Bloguítica. (José Carlos Santos)
(Continua)

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