ABRUPTO

10.8.08


COISAS DA SÁBADO: A COMUNICAÇÃO DO PRESIDENTE E A DEGRADAÇÃO DA POLÍTICA NA COMUNICAÇÃO SOCIAL



A ideia da SIC de ir para a rua perguntar às pessoas se tinham “entendido” a comunicação do Presidente é tão absurda como de má fé. Ela parte do pressuposto que a comunicação é incompreensível, – não se sabendo exactamente porquê e muita matéria haveria para explorar se fossemos por aqui - , e vai utilizar uma técnica para encontrar na “vox populi” uma confirmação (e uma humilhação) para o despautério do Presidente. Este tem o desplante de achar importante que lhe tentem diminuir os poderes, e fala sobre isso, mas, como o tema da comunicação do Presidente não é “juicy”, não aumenta as audiências, logo, o homem está-nos a fazer perder tempo tão ocupados que estamos com a silly season. Experimentem ir perguntar ao “povo” o que percebeu de muitas outras comunicações governamentais, ou sequer de certas peças noticiosas, por exemplo sobre debates parlamentares, e verão o resultado.

Os jornalistas não perceberam a mensagem do Presidente ou contestam a oportunidade e a forma da mensagem do Presidente que os fez trabalhar no Verão, o que é uma maçada? É que as duas coisas não são o mesmo, embora o drama da mediatização seja exactamente esse mesmo: tornar o meio e a mensagem na massagem, logo torna-los indistintos. Se eu disser isto aos meus amigos da SIC eles dirão que a culpa é do Presidente e dos seus assessores que disseram durante o dia duas coisas: que a mensagem era “importante”, o que dramatizava, e, quando se aperceberam da bola de neve que já rolava incontrolada, como se o pais fosse entrar em guerra à noite, puseram água na fervura dizendo que não era verdade que o Presidente tivesse interrompido as férias para fazer a comunicação, o que desdramatizava. Mas entregue a si própria e ao Verão, essa coisa já hoje tão rara que é não “antecipar” uma mensagem ganhou foros de crise nacional. A SICN fez um fabuloso programa à tarde, com telefonemas dos espectadores, em que se discutia o que é que seria a mensagem do Presidente, sendo que ninguém sabia qual era. Jornalismo-ficção no seu melhor.

Os jornalistas não estão habituados a segredos que não conseguem “furar” e irritam-se particularmente quando não conseguem “antecipar” o que vai acontecer, porque isso é uma negação do seu poder. Os “tabus”, hoje tão banalizados que qualquer recusa em responder de manhã às perguntas de um jornalista sobre um anúncio a fazer à noite se transforma num “tabu”, são uma forma de arrogância do jornalismo que não admite e, pior ainda, pune, não se lhes servir a novidade na hora sejam quais forem as razões que justifiquem não o fazer, a começar pelas razões institucionais.

O tempo do jornalismo, resultado das pressões do “estar sempre em cima do acontecimento”, tornou-se uma máquina de banalização e qualquer perturbação desse tempo é recebida com hostilidade pela profissão, até porque é uma exibição pública de que a comunicação social não pode tudo, que o seu poder tem limites quando se tem autoridade para ficar calado. O Presidente foi penalizado por isso, por mostrar que na sua voz manda ele e não os jornalistas, mas é mau que não se possa voltar à substância do que ele disse. E como já não é “novidade” vai ser difícil.

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© José Pacheco Pereira
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